O texto a seguir tem a ver com a declaração do Rosemberg Cariry (veja postagem anterior) de que que o filme Ave Poesia- Patativa do Assaré, teve seu começo com a nossa produção do filme: Passarim do Assaré.
EU E O CINEMA
Os filmes de Tarzan vieram bem depois já no cine El dourado! Antes, os filmes eram passados nas paredes amareladas da Igreja N. Sra das Dores pelo padre Argemiro. Que idéia maluca desse padre! A gente sentava no chão e esperava até as lâmpadas da rua serem apagadas. Ficava um breu! A gritaria tomava de conta. Não eram somente crianças, não! Gente grande, também. Quando a luz do projetor acendia e a luz projetava imagens em movimento na parede os nossos pequenos corações se agitavam. Eu nem lembro direito se tinha algum filme de santo, desses de céu, inferno, anjos e demônios. Não lembro não! Eu não esqueço é daquele filme que a gente chamava de “carro doido”. O carro passava por debaixo de trem, voava, batia em postes, atravessava casas... Era uma zona! A gente ria de perder o fôlego. Inesquecível!
O primeiro filme que vi em sala de cinema foi no cine El Dourado - na rua Sta. Luzia de Juazeiro do Norte : A Paixão de Cristo! Não era mais a versão muda e em preto e branco mas uma sonora e colorizada com papel celofane. As sessões eram concorridíssimas durante toda a Semana Santa. A cópia dublada não tinha qualquer preocupação com o sincronismo labial ou identificação com as personagens: a voz de Cristo era bem grave e um pouco medonha; Poncio Pilatos falava fino e abaitolado; a virgem Maria tinha uma voz de mezo-soprano muito sensual e Madalena era gasguita como a Tetê Espindola. A trilha sonora dramática, executada por uma daquelas orquestras sinfônicas européias e com gravação que devia trazer o selo de qualidade da Deutsch Gramophone, não fazia a mínima diferença para a pequena caixa acústica monofônica que a amplificava. Assisti a tantas sessões que cheguei a decorar o Sermão da Montanha com a mesma entonação cavernosa que o filme trazia.
Depois dos dez anos é que comecei a ir regularmente ao cinema. Já eram duas salas na cidade: o El dourado e o Capitólio. Minha iniciação foi com os filmes de Tarzan e seu grito Ahaaaaaaaaaah!, Jane, Chita e aquelas histórias fascinantes de heroísmo e bandidagem nas savanas da África, do Oriente e não sei mais onde. Mas antes da sessão principal tinham aquelas séries – uma novelinha em capítulos - que sempre deixava o mocinho em perigo iminente para criar a obrigação de vermos o próximo episódio numa outra sessão. Aquela expressão “perigo da série”, tão em voga na época, veio daí.. De Johnny Weissmuller- o melhor tarzan de todos os tempos-, que convivia numa boa com os índios, para John Weyne, o maior matador de índios da história do cinema, era só mudar de faixa etária e horário das sessões. Vieram depois os celebrados clássicos Ben-Hur e os Dez Mandamentos do Cecil. B.de Mille com mais de três horas de duração e “intervalo” ou os de guerra como Os Canhões de Navarone, A Ponte do Rio Kwai com aqulela musiquinha que a gente saia assobiando. E o que dizer daquela seqüência de “espaguettis italianos” estrelados por Franco Nero? Ou dos românticos Noviça Rebelde, Candelabro Italiano e Dio come ti amo! E a alegria do mestre Cantinflas? Os nacionais eram as chanchadas ( com aoas Eu sempre ia às sessões das 18:30h. Vi poucos filmes nacionaisAntes passava na casa de um amigo, O Zé Adauto, ficava um pouco na praça Pe. Cícero ouvindo o programa “Música Clássica para Quem não Gosta de Música Clássica” do CRP - Centro Regional de Publicidade - do Darim, transmitido por uma corneta de som que ficava no alto da coluna da hora e depois subia a rua São Pedro em direção ao cinema. Nem sempre eu tinha a grana disponível pro ingresso e aí me valia de uma das minhas irmãs, a Enedina, que já trabalhava numa biblioteca municipal e sempre atendia aos meus apelos de cinéfilo. Todos foram filmes que degustei na minha adolescência!
Pra chegar aos grandes mestres da arte cinematográfica, demorou um tempão e a minha iniciação só se deu quando fui pra Fortaleza fazer vestibular e descobri o Cinema de Arte na Casa Amarela e as sessões dos sábados às dez da manhã no cine Diogo. Foi uma festa! Aí descobri Antonioni – Bergman – Antonioni - Vitório de Sica - Orson Wells - Pasoline - Eisenstein - Fritz Lang - Woody Allen – Mario Peixoto – Fasbinder – Hitchcock –Glauber Rocha e outros mestres do Cinema. Agora já citava Le Cahiers du Cinéma! Comecei a ler alguns roteiros disponíveis na Casa Amarela e descobri as semelhanças que tinham com uma peça de teatro (já fazia teatro). Quando vi alguns filmes russos é que essa semelhança ficou acentuada. Quis, então, escrever roteiros... Mas desisti em seguida. Continuei apenas vendo muitos filmes.
Os anos se passaram. Saí de Fortaleza pra São Paulo pra Recife pra Fortaleza! Assim se passaram dez anos! Foi quando reencontrei o Rosemberg Moura, hoje Cariry que, sabendo do meu retorno a Fortaleza, me envolveu com a produção do jornal Nação Cariry e me falou do seu desejo de fazer um documentário sobre o Patativa do Assaré utilizando um equipamento Super-8. Não deu outra: comprei uma câmera Cannon, um editor, um projetor e iniciamos as filmagens de “ Passarim do Assaré “, o primeiro registro cinematográfico da figura emblemática do maior poeta do sertão nordestino. A nossa equipe: Rosemberg Cariry, Bola Bantim, eu e Zé Roberto França. Saímos do Crato para Assaré e depois para o sítio em Serra de Santana onde nos arranchamos na casa de Patativa e Dona Belinha (uma santa). Foram sete dias gravando o que podíamos. Naqueles dias éramos parte da família. Patativa, sempre muito inteligente, talvez adivinhasse que a sua poesia e imagem pudessem ir mais longe com aquele filme e, com a sua grande humildade, sentia-se prestigiado. Dona Belinha, sua esposa, nos tratava com tanto carinho que nos sentíamos seus filhos. Foi uma experiência enriquecedora pra todos nós!
Os filmes de Tarzan vieram bem depois já no cine El dourado! Antes, os filmes eram passados nas paredes amareladas da Igreja N. Sra das Dores pelo padre Argemiro. Que idéia maluca desse padre! A gente sentava no chão e esperava até as lâmpadas da rua serem apagadas. Ficava um breu! A gritaria tomava de conta. Não eram somente crianças, não! Gente grande, também. Quando a luz do projetor acendia e a luz projetava imagens em movimento na parede os nossos pequenos corações se agitavam. Eu nem lembro direito se tinha algum filme de santo, desses de céu, inferno, anjos e demônios. Não lembro não! Eu não esqueço é daquele filme que a gente chamava de “carro doido”. O carro passava por debaixo de trem, voava, batia em postes, atravessava casas... Era uma zona! A gente ria de perder o fôlego. Inesquecível!
O primeiro filme que vi em sala de cinema foi no cine El Dourado - na rua Sta. Luzia de Juazeiro do Norte : A Paixão de Cristo! Não era mais a versão muda e em preto e branco mas uma sonora e colorizada com papel celofane. As sessões eram concorridíssimas durante toda a Semana Santa. A cópia dublada não tinha qualquer preocupação com o sincronismo labial ou identificação com as personagens: a voz de Cristo era bem grave e um pouco medonha; Poncio Pilatos falava fino e abaitolado; a virgem Maria tinha uma voz de mezo-soprano muito sensual e Madalena era gasguita como a Tetê Espindola. A trilha sonora dramática, executada por uma daquelas orquestras sinfônicas européias e com gravação que devia trazer o selo de qualidade da Deutsch Gramophone, não fazia a mínima diferença para a pequena caixa acústica monofônica que a amplificava. Assisti a tantas sessões que cheguei a decorar o Sermão da Montanha com a mesma entonação cavernosa que o filme trazia.
Depois dos dez anos é que comecei a ir regularmente ao cinema. Já eram duas salas na cidade: o El dourado e o Capitólio. Minha iniciação foi com os filmes de Tarzan e seu grito Ahaaaaaaaaaah!, Jane, Chita e aquelas histórias fascinantes de heroísmo e bandidagem nas savanas da África, do Oriente e não sei mais onde. Mas antes da sessão principal tinham aquelas séries – uma novelinha em capítulos - que sempre deixava o mocinho em perigo iminente para criar a obrigação de vermos o próximo episódio numa outra sessão. Aquela expressão “perigo da série”, tão em voga na época, veio daí.. De Johnny Weissmuller- o melhor tarzan de todos os tempos-, que convivia numa boa com os índios, para John Weyne, o maior matador de índios da história do cinema, era só mudar de faixa etária e horário das sessões. Vieram depois os celebrados clássicos Ben-Hur e os Dez Mandamentos do Cecil. B.de Mille com mais de três horas de duração e “intervalo” ou os de guerra como Os Canhões de Navarone, A Ponte do Rio Kwai com aqulela musiquinha que a gente saia assobiando. E o que dizer daquela seqüência de “espaguettis italianos” estrelados por Franco Nero? Ou dos românticos Noviça Rebelde, Candelabro Italiano e Dio come ti amo! E a alegria do mestre Cantinflas? Os nacionais eram as chanchadas ( com aoas Eu sempre ia às sessões das 18:30h. Vi poucos filmes nacionaisAntes passava na casa de um amigo, O Zé Adauto, ficava um pouco na praça Pe. Cícero ouvindo o programa “Música Clássica para Quem não Gosta de Música Clássica” do CRP - Centro Regional de Publicidade - do Darim, transmitido por uma corneta de som que ficava no alto da coluna da hora e depois subia a rua São Pedro em direção ao cinema. Nem sempre eu tinha a grana disponível pro ingresso e aí me valia de uma das minhas irmãs, a Enedina, que já trabalhava numa biblioteca municipal e sempre atendia aos meus apelos de cinéfilo. Todos foram filmes que degustei na minha adolescência!
Pra chegar aos grandes mestres da arte cinematográfica, demorou um tempão e a minha iniciação só se deu quando fui pra Fortaleza fazer vestibular e descobri o Cinema de Arte na Casa Amarela e as sessões dos sábados às dez da manhã no cine Diogo. Foi uma festa! Aí descobri Antonioni – Bergman – Antonioni - Vitório de Sica - Orson Wells - Pasoline - Eisenstein - Fritz Lang - Woody Allen – Mario Peixoto – Fasbinder – Hitchcock –Glauber Rocha e outros mestres do Cinema. Agora já citava Le Cahiers du Cinéma! Comecei a ler alguns roteiros disponíveis na Casa Amarela e descobri as semelhanças que tinham com uma peça de teatro (já fazia teatro). Quando vi alguns filmes russos é que essa semelhança ficou acentuada. Quis, então, escrever roteiros... Mas desisti em seguida. Continuei apenas vendo muitos filmes.
Os anos se passaram. Saí de Fortaleza pra São Paulo pra Recife pra Fortaleza! Assim se passaram dez anos! Foi quando reencontrei o Rosemberg Moura, hoje Cariry que, sabendo do meu retorno a Fortaleza, me envolveu com a produção do jornal Nação Cariry e me falou do seu desejo de fazer um documentário sobre o Patativa do Assaré utilizando um equipamento Super-8. Não deu outra: comprei uma câmera Cannon, um editor, um projetor e iniciamos as filmagens de “ Passarim do Assaré “, o primeiro registro cinematográfico da figura emblemática do maior poeta do sertão nordestino. A nossa equipe: Rosemberg Cariry, Bola Bantim, eu e Zé Roberto França. Saímos do Crato para Assaré e depois para o sítio em Serra de Santana onde nos arranchamos na casa de Patativa e Dona Belinha (uma santa). Foram sete dias gravando o que podíamos. Naqueles dias éramos parte da família. Patativa, sempre muito inteligente, talvez adivinhasse que a sua poesia e imagem pudessem ir mais longe com aquele filme e, com a sua grande humildade, sentia-se prestigiado. Dona Belinha, sua esposa, nos tratava com tanto carinho que nos sentíamos seus filhos. Foi uma experiência enriquecedora pra todos nós!
PS: A foto que ilustra esta postagem- que está na internet- é de minha autoria e foi feita na época das filmagens
Bravos homens do sertão a desbravar os caminhos mais áridos daqueles que se viriam a seguir. São pioneiros, em uma era difícil, onde filmar era uma coisa caríssima, máquinas caras, difíceis, usava-se filmes ainda, mesmo em super 8, tudo era difícil. Não tinham as ilhas digitais, nem os programas de edição NLE ( edição não linear ) de que dispomos hoje, e mesmo assim fizeram coisas memoráveis.
ResponderExcluirA minha visão de cinema é bastante particular. Talvez pelo fato de eu ainda não haver freqentado a escola de cinema ( lamentavelmente em certos aspectos, porque ainda não tive a felicidade de pegar um curso desses no início ), mas acho que o cinema também possui essa característica documental.
Por exemplo, o que seria se vcs não tivessem pego essas imagens do patativa ? não teriam extraído tantas coisas interessantes que ele deve ter falado ?
Isso é que é importante.
Discordo profundamente do Glauco Vieira, meu grande amigo, quando ele está tão interessado na linguagem de COMO contar uma coisa à luz do cinema que a própria coisa a ser contada é irrelevante.
Glauco certa vez me disse que para ele, a estória de um filme, o enredo é o de menos, ele analisa como o filme foi feito.
Seria uma analogia se eu presenteasse um amigo com uma camisa, e ao invés de analisar se a camisa é bonita no seu todo, o amigo passasse a desconstruir a camisa para ver como ela foi feita...
Mostrei a ele o filme lindíssimo do Tornatore "A lenda do Pianista do mar", mas ao invés de assistir, de curtir o filme, ela passava o filme todo a analisar por parâmetros técnicos.
Às vezes, a ignorância também é útil. Senão, como vc vai curtir um filme como "Homem Aranha III" ?
Às vezes um bom Gibi do Pato Donald é muito mais gostoso de ler do que um livro de Cálculo Diferencial e Integral III...
ntão, na minha humilde visão, a intenção é importante. Esse filme aí dos meninos sobre Patativa é um documento muito mais valioso do que 300 filmes do "cinema devaneio".
"Cinema devaneio" é a expressão que eu uso para descrever aqueles filmes pós-modernos em que realmente não acontece nada de estória, vazios, mas que tem olha........... uma fotografia belíssima..... rs rs rs
Bravo, pioneiros! A Nau da história há de reconhecer o valor REAL, não apenas documental desse filme de vocês!
Dihelson Mendonça
Vocês tiveram sorte.
ResponderExcluirMinha geração só conhece os cinemas dos shoppings da vida.
E meus dois filmes marcantes foram "Lua de Cristal" e "Titanic".
!
Pois é, Amanda, que pena!
ResponderExcluirMas pelo menos aqui no Crato, Cariri, há núcleos de novos cineastas, estão se formando clubes de cinema-arte, e nós temos incentivado muito certas locadoras de dvds a pedir dvds de arte. E temos tido êxito. Grandes obras do cinema-arte estão formando prateleiras inteiras em certas locadoras, porque existe público ( e bom ) para isso.
Gostaria que esse fenômeno se espalhasse mais pelo Brasil afora...
Um grande abraço!
eis aqui uma onda: cinema me abriu umas portas essenciais.
ResponderExcluirSim, sim.
ResponderExcluirAgora não preciso mais ir até a Solaris pra alugar um bom filme.
Tinhamos também a Sessão de Arte do SESC, pena ter acabado. Mas restaram algumas opções, é verdade.
O que digo é que um cinema de porta de calçada faz falta. E também fazem falta as lembranças de uma infância menos medonha. rs
Observaçãozinha: nem tanto ao céu nem tanto ao mar. Acho, humildemente, que é importante tanto 'o que' é contado no cinema quanto o 'como', ou seja, o modo como é contado.
Até!
Minha cara Amanda,
ResponderExcluirNa locadora do "Walter"... no "germano", lá na MCB vídeo, enfim, vc encontra um setor somente dedicado ao Cinema-Arte!
Eu sou um dos que tem mais estimulado o Germano ( na verdade , pressionado ), para ele comprar DVDs de arte. E ele tem gostado muito desses filmes e está se viciando em coisas muito boas. É um cara formidável!
Um grande abraço!
Sim, sempre dou um pulinho lá!
ResponderExcluirTomara que ele realmente se vicie em coisas muito boas!
Todos saem ganhando com isso!
Até!
O Salatiel , da minha geração, sabe perfeitamente o encantamento que nos trouxe o Cinema.Esta para nós era a mais importante diversão, já que não tínhamos o teatro quase, o Circo era de passagem meteórica e a TV( "que ergue e destrói coisas belas") também ainda não havia chegado no interior. Assim o Cinema nos arrebatava e nossas primeiras paixões foram as sulfurosas artistas de Hollywood. Não bastasse isto o Cinema ainda nos trazia a cumplicidade do escuro, num tempo em que beijar a namorada era pecado mortal.Não desenvolvi assim muitos pruridos artísticos e gosto ( dependendo da lua) de quase todas modalidades: Westerns, dramas, policiais, comédias, desenhos, cinemas de arte. Talvez, assim, Amanda tenha se surpreendido um pouco com o arrebatamento dos coroas deste blog com o Cinema é que depois que fomos infeitiçados na infância com a telona nunca mais fomos os mesmos e nossa vida mudou totalmente de roteiro e nas horas mais difíceis de alguma maneira estamos sempre esperando a chegada da cavalaria...
ResponderExcluirA pimeira nudez de uma mulher que vi (em movimento) foi nas telas de cinema. Antes, "os catecismos" do Zéfiro é que ilustravam o meu culto a Onan.
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