Todos os amantes da sétima arte se ressentiram com a fechamento do Cine Cassino, no final anos setenta. Era o último cinema da cidade que cerrava suas portas, depois de mais de sessenta anos de intensa atividade. A partir daí, os cinéfilos tiveram se contentar com o videocassete, que é apenas um arremedo, um retalho de cinema. Nada substitui o encanto da tela imensa, com os espectadores como que imergindo na fotografia, sem telefone para atrapalhar, sem pause possível, sem crianças apertando o controle remoto e , ainda, com as providenciais e deliciosas utilidades do escurinho do cinema. Preferir o vídeo ao cinema é como priorizar o jogo de botão em detrimento de uma partida de futebol com os amigos ou escolher o onanismo ao invés do amor carnal.
Há alguns anos foram inauguradas duas salas de cinema, no Shopping da nossa vizinha cidade. Salas pequenas comparadas aos palácios que tínhamos antes da chegada da TV e da disseminacão da praga do vídeo. Mas já dá para perceber que o encanto do cinema voltou, pelo brilho dos olhos das pessoas que saem do “Tittanic”ou do “Central do Brasil”. Algumas pessoas comuns carregam no olhar um brilho diferente, como se tivessem encontrado um novo significado para as suas vidas, como se pensassem: “Esse meu cotidiano é sem graça e sem cor, preciso encontrar um final apoteótico para a história do meu destino, como o mocinho conseguiu no filme “. O cinema , veiculado corretamente,volta a resgatar o objetivo final de qualquer arte, que é a capacidade de emocionar.
Exemplo claro de como a arte balança a estrutura das pessoas tive, há alguns meses, ao sair de uma sessão de um dos últimos filmes- catástrofe : “Deep Impact - Impacto Profundo”. Todo o enredo da película cicla em torno da possibilidade de destruição de toda a raça humana , pela colisão de um cometa gigante com a terra. Como aliás pode ter acontecido com os dinossauros há 60 milhões de anos. O papo de porta de cinema dizia respeito à atitude daqueles cidadãos comuns na hipótese da colisão acontecer de fato. Um disse que esperaria a morte anunciada, sentado na praia, tendo Vera Fisher nos braços ( não sei se já combinou com a Vera); um outro, com cara de pinguço ,afirmou que esperaria o impacto num bar e certamente veria duas pedras se aproximando da terra e tentaria pará-las com o bafo; um estudante de Arneiroz preferiu esperar a catástrofe em sua cidade natal, vestido de calção de banho, com uma prancha de surf debaixo do braço, esperando a onda mais radical que já se teve notícia e confirmando a teoria do conselheiro que o sertão vai virar mar. Seu Almir me disse ,depois, que aguardaria a ” bicha” vestido na camisa do flamengo, na certeza que Zico mataria a bolona nos peitos e a mandaria de volta para os ares, com um chutão sensacional. Alguns , na roda de conversa, acharam que dariam tudo para preservar a vida de algumas figuras reconhecidamente exageradas, só para depois elas poderem contar, com o devido e estrondoso acréscimo, qual o tamanho do cometa e como foi a batida fenomenal. Certamente Bosquinho diria que a pedra era do tamanho de uns trinta júpiter e que a checho botou na terra como o boi botou em mestre Alfredo.
Por trás de toda essa brincadeira , porém, há uma questão profunda, como o previsível impacto : o que você faria na iminência do mundo acabar. A pergunta procede e devemos pensar nela todo dia pois, se não para toda a humanidade, ao menos para nós ,em particular, o Cometa está vindo e, em dia indeterminado, irá cair justamente na nossa cabeça. E é bom, rapidamente , ir pensando o que você vai fazer enquanto a pedra não chega...
J. Flávio Vieira
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ResponderExcluirEste é o lado que gosto de Zé Flávio: o bom cronista que é.
ResponderExcluirMas, abrindo o seu desafio, confesso que se soubesse que o meu mundo fosse acabar proximamente, passaria a apreciar, exclusivamente, as grandes obras de arte e iria me aproximar mais das questões espirituais, principalmente de Deus e de mim mesmo.