sábado, 14 de junho de 2008

DESEJOS SIMBÓLICOS E AMBIENTES ASSIMÉTRICOS

O quê liga a defesa da monarquia, o catolicismo e o estranhamento ao mundo laico? Certamente muitas coisas. Especialmente a unidade histórica medieval e um tanto da vida pós-renascimento como feroz resistência. A matriz desta liga era a terra. O feudo como principal unidade produtiva, de poder social e político. Todo momento que esta unidade não correspondeu às expectativas sociais e políticas o mundo, na terra e nos céus, se abalou. Os movimentos franciscanos, as revoltas camponesas e a avalanche das reformas protestantes resolveram crises insuportáveis naquela antiga ordem. Nem a cidades estado, tipo Veneza e Florença conseguiram formular algo realmente abrangente, pois sua experiência do novo era muito restrita a algumas cidades da Europa. O mundo continuava em tensão feudal. Mas não tem como negar que foi naquelas cidades que primeiramente o renascimento floresceu.

E no renascimento, renasceu o ser humano pelo menos como referência ao helenismo e ao romano livre. Nasceu o indivíduo agora como ator de sua vida, vivendo num mundo não mais vertical, mas, agora, horizontal. A verticalidade anterior, o homem da gleba vinculado ao rei que era a expressão divina na terra e este a Deus pelo linguajar do Latim Apostólico Romano. A língua do mundo vertical era o Latim. Quando se "horizontalizaram" os indivíduos, eles falaram a própria língua e criaram as nações para que mesmo como partículas, fossem partículas que pertenciam a algo. Inventaram as nações para substituir a verticalidade monárquica e religiosa.

Nisso é que o absolutismo e os famosos tribunais inquisitoriais, especialmente na península ibérica, se tornaram na reação ao renascimento e ao nascente iluminismo. A inquisição desta época, por exemplo, não é igual á medieval. Agora ela é uma delegação de Roma ao próprio Estado espanhol ou português, embora fosse conduzido por padres católicos. A nova inquisição é um instrumento do Estado para combater as divergências políticas e econômicas, especialmente após o enorme impacto que aconteceu na Europa por decorrência do Descobrimento das Américas. Sem prolongar: a exploração e colonização das Américas pôs as relações comerciais entre as principais nações de pernas para o ar. Aliás dificilmente sem esta não existiria e Inglaterra, a Holanda e certamente Portugal. È correto se afirmar que a Revolução Inglesa seja parte do mercantilismo que é o momento histórico da descoberta e colonização européia das Américas.

No estágio político das transformações do pós-capitalismo, do domínio da produtividade, da expansão das fronteiras do conhecimento (redundando em mais escolas filosóficas) fica muito difícil, a não ser como desejo, se imaginar uma sociedade monárquica e religiosa. Até poderia existir como estas espécies de seitas que buscam os símbolos arcaicos e baseadas em lideranças anacrônicas que podem ir até o limite do conflito armando e da auto-destruição. Mas estaríamos falando do drama humano e da sua enorme capacidade de busca dado que tudo o mais não existe para ele e com ele, apesar dele mesmo.

2 comentários:

  1. Meu caro José do Vale,

    Apenas para dizer que li e gostei do bom nível do seu artigo. E para lançar mais lenha na fogueira.
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    As palavras abaixo são idéias de Santo Tomás de Aquino (com quem concordo em gênero, número e grau) intercaladas (entre parêntesis) por rápidos comentários meus.

    A monarquia NÃO é a ÚNICA opção para o católico. A doutrina da Igreja, baseada em Santo Tomás, é de que a monarquia não é a única mas, em essência, é a melhor.
    (o que é verdade: a Monarquia é uma forma de governo moderna e eficiente. Das 12 economias mais fortes do mundo atual, 8 são monarquias).

    Santo Tomás diz que o Estado deve se parecer o mais possível com a família, pois ele é criação da família, fruto da família e como que uma autoridade da sociedade de famílias que compõem a Nação por ele presidida. Assim, não elegemos o pai de família. Logo, a autoridade hereditária é a que melhor se parece com a família.

    (O Monarca, sendo vitalício, pode inspirar e conduzir um projeto nacional, com obras de longo alcance e longo prazo.Ele não tem interesse em interromper os projetos de seus antecessores, dos quais participa antes mesmo de subir ao trono).

    A forma monárquica é também a mais orgânica, a mais natural, e a que mais defende os valores tradicionais da Nação, que são melhor encarnados no monarca, herdeiro de uma família cuja história se confunde com a do próprio povo.

    (E é também a mais barata. Na Grã-Bretanha, com toda a sua pompa e circunstância, o custo anual para o povo britânico sustentar a Rainha, sua família e todo o aparato é de US$ 1,87 per capita, e no Japão não chega a US$ 0,50.
    No Brasil do "presidente-operário" foi estimado que a Presidência custa à nação entre US$ 6,00 e US$ 12,00 per capita por ano).

    A Igreja sempre ensinou que a melhor forma de governo é a Monarquia, porque é a que mais se assemelha ao governo do próprio Deus e ao da Igreja, que é monárquica.

    Embora defendesse a Monarquia, Santo Tomás, além de dizer que as outras formas também eram boas (mas piores que a monarquia), via com bons olhos os regimes em que os três aspectos se combinavam harmoniosamente.
    Assim, nada impede que a uma monarquia tenha um parlamento (democracia) e mesmo a ajuda dos melhores da sociedade, de uma elite (aristocracia). É esse o tipo de monarquia adotado na maioria dos países de Primeiro Mundo.

    (Por ex:Bélgica,Dinamarca,Espanha,
    Holanda,Liechtenstein,Luxemburgo,
    Noruega, Grã-Bretanha - e por extensão Canadá, Austrália, Escócia, País de Gales, Irlanda do Norte e demais nações da Comunidade Britânica - Suécia,Japão , dentre outras)

    Grande abraço,
    Armando

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  2. Armando: não tem como negar. De vez em quando você futuca os vespeiros dos outros. Sempre resisti fazer isso com a sua defesa da monarquia. Mas neste dia fui mexer no vespeiro e você me respondeu à altura. Em outra postagem, nos comentários, eu disse que você tem o dom de levantar questões por provocação mas nem sempre temos o fôlego de completar esta provocação. O que é um grande desperdício e pode falar da provocação um mal entendido ou mero debate inútil além do mais ácido. Eu fico lhe devendo duas postagens: a) um conceito mais atual do que seja nação, não aquele da época de São Tomas de Aquino (1225); b) sob o atual estágio da família no mundo capitalista. Isso serveria de ampliação para o que levantas.

    Abraços

    José do Vale P. Feitosa

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