I
O nome de água valente
Foi seu avô que botou
Nasceu na lua carente
Minguando de toda cor
Donzela estrela enfeitada
Por tranças embunitadas
Leveza de beija-flor.
II
Por detrás daquela serra
Se danou a fulorá
Pé no chão era menina
Vivia sempre a sonhar
Um dia sentiu o afago
Da má sorte, lá no lago
Onde ia se banhar.
III
água valente em rebento
Mulher, um dia sangrou
As mãos pintadas de sangue
A sua sorte traçou
Rio nascente vermelho,
Partido, caco de espelho,
Que a sua morte mirou.
IV
Vento leve era pueta
E atravessou seu camim,
A viola enluarando
Sua sina de passarim
Enfeitiçado cantô
Um mote de cantadô
Que ganhou no "palitim".
V
Deus amontou num fiapo
De luz que aparecia
Cruzou com o olhar dos dois
No passo da ventania
Vento leve quis provar,
Um beijo d'água me dar,
Com sede de poesia...
VI
Por desconto do pecado
Nas horas do sol se Pôr
Cantariando cantiga
O pai dela se alembrou
" água valente me espera,
sorrindo lá na janela,
cheirando suas fulô...
VII
E descendo de vagar,
De longe logo avistou
Água valente abraçada
Com num sei quem, não senhor,
E no seu peito um bote
De serpente virou, mote
Punhal, punhado de dor.
VIII
O pai de água valente
Vendo os dois se beijar
Amolou sua peixeira
Na pedra do se endoidar,
Viu o vestido melado,
Vermelho, todo encarnado,
Tratou de desatinar.
IX
Era o sangue do seu sangue
Honra jogada no chão
Semente colhida boa,
Perdida pra prantação
Apunhalou vento leve,
No coração, pôs uma breve
Semente de maldição..
X
Água Valente, chorou
Cacimbas cheias de estrelas
Se laminou, que nem sina
Carne de faca peixeira
Sangrou um rio, no chão,
Cigarra que no verão
É corgo de dor mais ligeira...
XI
Quem passa naquela serra
Avista um lago encantado
A lua cheia desenha
Com sua luz, um bordado,
Tirana de despedida,
Em dissonância, escrevida
Perdida, lá no passado.
XII
Essa tirana é que conta
Chorando lá na nascente
A lenda dum Vento Leve
E sua água valente,
Que o destino assoprou,
Perdidamente na dor,
Do olhar de dois inocentes.
XIII
Naquela serra inda hoje
Se escuta a doce canção
De Vento Leve entoando
Ponteios de solidão
Em noite de lua cheia
Lá na lagoa ondeia,
O braço de um violão.
XIV
E diz o diz-que-se-diz
Que o vento faz uma pestana
Se dana, numa cantiga,
com cheiro de jitirana,
àgua valente, assobia,
acordes de poesia,
nas folhas das umburanas.
XV
e um vento vem entoar,
Tão levezim, a correr,
Pertim dum pé de oiticica
Que testemunha o sofrer,
Água valente, menstrua,
E deus atira da lua,
Prefume de muçambê.
XVI
Se diz também que a tristeza
Acena duma ingazeira
Fica chorando de dor
Nos galhos da noite inteira.
Quem bebe daquela água
chorando um rio de mágoa,
Se perde na cordilheira.
Cleilson , grande !
ResponderExcluirFoi boa poeta! Alguém, muito incomodado, comentou comigo aí nessas paragens do convívio social, rsrsarsr, que nós, poetas do blog, somos corporativistas, sempre elogiamos uns aos outros, sem senso crítico. Mas não é verdade, os elogios são reconhecimentos. E não pode ser diferente com você poeta, de quem eu particularmente gosto muito e admiro sua técnica.
ResponderExcluirEsperamos por mais.
abraços