Manel de Jardim na área
Foi ontem, num show de Leninha, no novo teatro do Sesc de Juazeiro. Ele estava lá, com sua arrasadora ironia existencial, servindo como fenômeno sobrenatural para aqueles que pensam ter controle pleno dos seus domínios. Manel tocou violão, tocou baixo e fez vôos rasantes e altos, demonstrando como a magia não pode ser engarrafada e vendida como um produto capaz de transformar a sua vida. A magia de Manel é sobreviver sempre, sem desculpas e solenemente. Percebeu na segunda música que o seu violão estava desafinado, depois disso entrou definitivamente no clima David Linchiano do show e não saiu mais de lá, está eternizado em um cartaz misterioso, pregado nas paredes dos becos e avenidas do tempo.
O show teve lá suas peculiaridades que matizam ainda mais o cartel de dúvidas sobre ser o Cariri um celeiro cultural, mas o que importa é que Manel estava lá, contrariando o destino e os urubus de plantão. Sei que em todo lugar existem urubus, mas em nenhum lugar existe uma concepção existencial tão complexa desses seres como aqui no Cariri. Nós convivemos com urubus perfumados, renomados, constitucionais, religiosos, dadivosos, afetados, educadamente infames, sorrateiramente canalhas, delicadamente patifes, escandalosamente sem escrúpulos, de todas as camadas e origens, de toda estirpe empresarial e de toda sorte de opção sexual, mas sempre urubus, com suas tarjas de rapina suprema instalada em seus fígados.
Manel tem uma postura magneticamente anarquista diante da vida. Passou seis dias em coma, seu corpo sucumbiu à loucura narcotizada impostas pelas armadilhas sociais. Estranhamente fez da UTI a sua ponte de desconexão por mais de dez dias seguidos. Quando acordou, segundo ele, mais frio do que uma pedra de gelo, o médico estava passando o gel da ressonância magnética e ele ironizou: “Como é doutor, o bebê tá na posição certa?”. O médico disse que a coisa tava séria e que ele teria que tirar a sua pressão. Manel respondeu de imediato com uma pergunta: “Vai botar ela onde? A coisa ta ruim com ela, imagine sem ela”. Manel é assim, um anarquista existencial. Para ele não importa se isso é certo ou errado, sempre afirma que a vida é dele.
Mas o seu talento, Manel, é nosso, por direito, por fama e por difamação. Eu, que morro um pouco mais por dia de desilusão, senti novo ânimo em continuar convivendo com tanta alma sebosa que infesta esse velho Cariri. Mais do que nunca eu sei que devo continuar desconfiando das boas intenções do sistema, dos panos bem passadinhos, das maneiras meticulosamente ensaiadas, dos sorrisos de dentrifícios, dos diplomas conseguidos na calada da noite, e dos carrinhos mais polidos do que a autenticidade. Mas, mais do que nunca sei que a vida vai nos provê sempre uma nota bem dissonante, capaz de revelar a fraude do coro dos contentes. E você Manel, não é uma nota só dissonante, você é um acorde inteiro, ainda bem.
Saúde, meu velho, e continue metendo a mão sem medo de errar. Deixe a consciência musical para quem precisa de bengalas. Nós precisamos é de caminhos, nem que sejam fora das margens. A intuição é fora das margens. É por isso, que se retirarem os trilhos o trem não chega a seu destino. E é por isso que a mediocridade é um trem ultra moderno. Precisamos é ir. Mas ir rindo dos ridentes.
Como é donâmico, bom e interessante o campo democrático. Acabei de comentar, no post acima, o editorial d'O Povo sobre o valor da monarquia. Agora, comento o "ineditorial" D'Marco sobre um rei que nunca perdeu a magestade, Manel D'Jardim, um rei louco, posto no palco, um rei deposto, um rei nu. Por isso tudo e sempre, rei, reiniciando os acordes que aprendeu e fim. (coda).
ResponderExcluirMarcos ... disse tudo !
ResponderExcluirBeijo solidário !
Foi boa Marcão! Só lembrando Raul para os hipócritas e urubus de plantão: FALTA DE CULTURA PRA CUSPIR NA ESCULTURA !
ResponderExcluirMAIS ANRQUIA E MENBOS COVARDIA!