Hoje é dia de São Jorge Guerreiro, amigos, um dos mais fortes santos da nossa mitologia. Reza a história, que tão facilmente se mescla com as lendas, que teria nascido na Capadócia, atualmente território da Turquia. Teria vindo ao mundo no final do segundo século depois de Cristo. Ainda menino, migraria para Palestina e aos 23 anos, já fazia parte da corte imperial romana, como tribuno militar. Poderia ter levado uma vida na maciota, não fosse sua sublevação contra o martírio dos cristãos em tempos de Diocleciano. Consta ter tornado públicas sua revolta contra a perseguição e, também, sua fé no cristianismo. Terminou torturado e degolado há exatos 1706 anos, na Ásia Menor em Nicomédia. Sua popularidade é impressionante, é patrono da Inglaterra, Portugal, Geórgia, Catalunha, Lituânia, de Moscou e extra-oficialmente da Cidade do Rio de Janeiro. As artes o imortalizaram nos pincéis de Rafael, Donatello, Martinelli.
Mas de onde teria saltado a imagem mítica que temos de São Jorge a combater implacavelmente o seu dragão ? É possível que tenha surgido da mitologia nórdica na figura de Sigurd , o caçador de dragões. O certo é que as baladas medievais cantavam as suas peripécias como filho do Lord Albert de Conventry e que sua mãe faleceu no seu nascimento tendo ele sido criado pela Dama do Bosque. Seu corpo possuía três marcas: um dragão em seu peito, uma jarreira em volta de uma das pernas e uma cruz vermelho-sangue em seu braço. Já rapazinho, viajando muitos meses por mar, chegou a uma cidade da Líbia onde encontrou um pobre eremita que lhe pôs a par do sofrimento da sua cidade. Ali existia um dragão feroz, de hálito venenoso e coberto de uma carapaça inexpugnável. Todo dia devorava uma donzela e, só assim, aplacava sua ferocidade. Agora só existia Sabra, a filha do rei que seria sacrificada no dia seguinte. O monarca prometera casamento a quem impedisse o sacrifício da princesa. Jorge enfrenta a fera e a mata com sua espada chamada Ascalon. O rei, no entanto, não queria ver sua filha casada com um cristão e o envia para Pérsia ordenando aos soldados que lá o matassem. Jorge, no entanto, se livra do perigo e leva a noiva para Inglaterra onde se casa e vive feliz para sempre. Existem várias versões da mesma história, sempre narrando os heróicos atos do nosso Jorge Guerreiro e da sua valentia frente às adversidades. O interessante é que a ligação íntima de São Jorge com a lua é eminentemente brasileira. A nossa fortíssima influência afro é responsável por isso. Na Bahia, nosso Jorge é associado sincreticamente a Oxossi, o orixá ligado diretamente ao nosso satélite natural.
As lendas mitológicas não são histórias de Trancoso ou da Carochinha. Elas têm profundas raízes fincadas no inconsciente coletivo. O dragão , certamente, representaria o poder diabólico, a idolatria destruída com as armas da fé. A donzela seria a imagem onírica da província que se viu livre da heresia.O interessante é que Papa Paulo VI rebaixou nosso São Jorge a um santo menor, de terceira categoria, com culto opcional apenas em calendários locais. A força mítica, no entanto, falou mais forte, em 2000, João Paulo II terminou reconduzindo nosso guerreiro a um patamar de primeira instância, na hierarquia católica.
A história do nosso guerreiro nos dá margem para algumas reflexões. No fundo, a história narrada oficialmente está sempre embebida de lendas e mitos. Quanto mais o realismo se untar das fontes do fantástico mais perenes se tornarão seus relatos. A ficção é sempre mais palatável e digerível que a realidade nua e crua. O que adoramos em São Jorge não é sua valentia, sua santidade , mas a figura mágica que brota do meio de todas as lendas. O segundo ponto é que as figuras míticas sobreovam todos os livros sagrados; elas não pertencem a uma religião específica, mas se imiscuem em muitas crenças: apenas mudam um pouquinho o nome, as nuances. O mito, por outro lado, é indestrutível pelas armas convencionais; se os enfrentamos ferozmente ou os apoiamos eles crescem com a mesmíssima força. Não terá sido exatemente isso que aconteceu aqui pertinho com o Padre Cícero ? Perseguido, excomungado, de nada adiantou. Tornou-se santo pelas mãos míticas do seu povo. Tentar reabilitá-lo é apenas um mero artifício burocrático. O povo é que empunha a Ascalon , é ele que destrói seus dragões e salva suas Sabras. Às vezes, no entanto, é difícil perceber de onde rescende o hálito venenoso da fera .
J. Flávio Vieira
Mas de onde teria saltado a imagem mítica que temos de São Jorge a combater implacavelmente o seu dragão ? É possível que tenha surgido da mitologia nórdica na figura de Sigurd , o caçador de dragões. O certo é que as baladas medievais cantavam as suas peripécias como filho do Lord Albert de Conventry e que sua mãe faleceu no seu nascimento tendo ele sido criado pela Dama do Bosque. Seu corpo possuía três marcas: um dragão em seu peito, uma jarreira em volta de uma das pernas e uma cruz vermelho-sangue em seu braço. Já rapazinho, viajando muitos meses por mar, chegou a uma cidade da Líbia onde encontrou um pobre eremita que lhe pôs a par do sofrimento da sua cidade. Ali existia um dragão feroz, de hálito venenoso e coberto de uma carapaça inexpugnável. Todo dia devorava uma donzela e, só assim, aplacava sua ferocidade. Agora só existia Sabra, a filha do rei que seria sacrificada no dia seguinte. O monarca prometera casamento a quem impedisse o sacrifício da princesa. Jorge enfrenta a fera e a mata com sua espada chamada Ascalon. O rei, no entanto, não queria ver sua filha casada com um cristão e o envia para Pérsia ordenando aos soldados que lá o matassem. Jorge, no entanto, se livra do perigo e leva a noiva para Inglaterra onde se casa e vive feliz para sempre. Existem várias versões da mesma história, sempre narrando os heróicos atos do nosso Jorge Guerreiro e da sua valentia frente às adversidades. O interessante é que a ligação íntima de São Jorge com a lua é eminentemente brasileira. A nossa fortíssima influência afro é responsável por isso. Na Bahia, nosso Jorge é associado sincreticamente a Oxossi, o orixá ligado diretamente ao nosso satélite natural.
As lendas mitológicas não são histórias de Trancoso ou da Carochinha. Elas têm profundas raízes fincadas no inconsciente coletivo. O dragão , certamente, representaria o poder diabólico, a idolatria destruída com as armas da fé. A donzela seria a imagem onírica da província que se viu livre da heresia.O interessante é que Papa Paulo VI rebaixou nosso São Jorge a um santo menor, de terceira categoria, com culto opcional apenas em calendários locais. A força mítica, no entanto, falou mais forte, em 2000, João Paulo II terminou reconduzindo nosso guerreiro a um patamar de primeira instância, na hierarquia católica.
A história do nosso guerreiro nos dá margem para algumas reflexões. No fundo, a história narrada oficialmente está sempre embebida de lendas e mitos. Quanto mais o realismo se untar das fontes do fantástico mais perenes se tornarão seus relatos. A ficção é sempre mais palatável e digerível que a realidade nua e crua. O que adoramos em São Jorge não é sua valentia, sua santidade , mas a figura mágica que brota do meio de todas as lendas. O segundo ponto é que as figuras míticas sobreovam todos os livros sagrados; elas não pertencem a uma religião específica, mas se imiscuem em muitas crenças: apenas mudam um pouquinho o nome, as nuances. O mito, por outro lado, é indestrutível pelas armas convencionais; se os enfrentamos ferozmente ou os apoiamos eles crescem com a mesmíssima força. Não terá sido exatemente isso que aconteceu aqui pertinho com o Padre Cícero ? Perseguido, excomungado, de nada adiantou. Tornou-se santo pelas mãos míticas do seu povo. Tentar reabilitá-lo é apenas um mero artifício burocrático. O povo é que empunha a Ascalon , é ele que destrói seus dragões e salva suas Sabras. Às vezes, no entanto, é difícil perceber de onde rescende o hálito venenoso da fera .
J. Flávio Vieira
Registro para prestigiar a sua produção, a qualidade informativa e formadora excelente.
ResponderExcluirParabéns,imensa consideração.
Cara Marta,
ResponderExcluirObrigado por suas palavras e pela paciência de ler os textos, geralmente tão compridos. É bom ter leitores como você.
Abraço,
É uma pena que alguns textos estão escritos em azul sobre fundo escuro, tornando ilegível a escrita, a exêmplo do texto sobre Tiradentes, dentre outros. Não seria possível mudar a cor da fonte?
ResponderExcluirGostei muito do blogue, e certo que voltarei.
ABRAÇO
IVAN SANTTANA