por Mino Carta, na Carta Capital (extraído do site Viomundo)
"Pergunto aos meus botões se não seria o caso de Fernando Collor, o senador ex-presidente da República, reconsiderar suas apreciações negativas a respeito da mídia nativa. Advogado da causa de um colega da nossa Câmara dos Lordes, também ex-primeiro mandatário, o nunca assaz falado José Sarney de quem já foi desafeto, tem razões contingentes para suas atuais manifestações.
Não lhe caberia recordar, contudo, que a mídia nativa tanto se empenhou para guindá-lo ao trono vinte anos atrás? E quem cunhou, então, a definição “caçador de marajás”? A revista Veja, algo assim como a vanguarda de um sistema de comunicações que chegaria ao clímax com a manipulação do debate final entre Collor e Lula no estúdio global pelas mãos sagradas do nosso colega Roberto Marinho, hoje nome de um conjunto viário de São Paulo batizado pela ex-prefeita Marta Suplicy, petista da gema.
À época, a mídia foi muito além de generosa com Fernando Collor. Ou, diria ele, justa? Haverá quem se apresse a lembrar que em 1992 o abandonaria ao seu destino em nome de mazelas inomináveis. Aí a rapaziada excitada pela emissora do doutor Roberto sairia às ruas de cara pintada para exigir o impeachment. Assim se escreve a história do Brasil, pobre Brasil e fajuta história.
Se houver marajás, sabemos perfeitamente onde encontrá-los. São sultões, emires, xeques. A raia miúda, dos serviçais, está em outro nível, muito distante. Mas é nesta que mira a mídia, nunca seus patrões. Já os meus botões são dados a citações em latim, e soletram repetita juvant, as repetições ajudam.
Em novembro de 1990, sete meses depois da posse de Fernando Collor, a IstoÉ que eu então dirigia publicou uma vasta reportagem de capa assinada pelo redator-chefe Bob Fernandes, sobre as aventuras de PC Farias, o Richelieu do presidente. Bob passara dois meses na tocaia do cardeal, e alinhavava em várias páginas tudo aquilo, absolutamente tudo, que um ano e meio após o irmão de Collor, Pedro, diria em entrevista à Veja.
Os leitores não padecerão de espantos agudos ao saber, se já não imaginam, que ninguém repercutiu a reportagem de IstoÉ, bem ao contrário do que se deu com a entrevista de Pedro Collor. Insisto, um ano e meio depois. A única novidade ali eram os supositórios de cocaína. Na opinião dos graúdos, é evidente, em fins de 1990 o caçador de marajás ainda não passara da conta.
Recordemos, entretanto, que, a despeito do irmão recalcado e loquaz, a mídia se conformava, na proximidade do segundo semestre de 1992, com o definitivo enterro do episódio. Pedro não tinha provas e a CPI montada a partir das suas denúncias não conseguira encontrá-las. Em compensação, a sucursal de Brasília de IstoÉ, chefiada por João Santana, havia localizado o motorista Eriberto França e os documentos que provavam a ligação entre a Casa da Dinda e PC Farias.
Santana e eu entrevistamos Collor no Planalto em uma manhã de fim de junho. Sabíamos o que o esperava, levamos a situação como se não soubéssemos. Pois é, jornalistas às vezes são inconfiáveis. Deu-se, porém, que no sábado seguinte, quando IstoÉ foi às bancas, tanto com a entrevista presidencial quanto com as provas apresentadas por Eriberto, a mídia foi forçada a ir atrás. Deu no que deu, como se diz.
Hoje Fernando Collor está ao lado de José Sarney e, portanto, de Lula. Coisas da realpolitik. Como de hábito a mídia nativa empenha-se até o último sangue contra o ex-metalúrgico que se tornou o presidente em todos os tempos mais popular do Brasil. Donde, contra quem ela aprovou e apoiou, em outras situações, de Sarney a Collor. A nossa mídia não pratica o jornalismo, porta-se de verdade como facção política. Patéticos são os seus donos e apaniguados – sabujos, jagunços, escravos – a afirmar terem independência, equidistância, pluralismo etc. etc.
A realpolitik obriga a alianças daninhas em um país de outra forma ingovernável, onde em lugar de partidos há clubes recreativos voltados a interesses de casta. Mesmo assim, a mídia vende a ideia de que varões de Plutarco existem sim, sobretudo os dotados de asas inúteis, incompetentes para o voo. Talvez fosse da sua conveniência deter-se na observação do semblante hodierno do senador Arthur Virgílio."
Adoro as suas contribuições ao blog, também sou assinante da Carta Maior faz tempo.
ResponderExcluirBoa semana de trabalho, querido. (quem me conhece de perto sabe que é usual esse termo nas minhas relações, apesar da sociedade atribuir pejorativamente ao "querido" um caráter de falsidade. Acho injusto.)
Ok, Marta. Eu não uso o termo nesse sentido de falsidade não. Então, és querida também! rsrsrs
ResponderExcluirPara você, tudo de bom também.