quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Venezuela e Rússia anunciam acordo armamentista de US$ 2.2 bilhões

Por Bill Van Auken – wsws - 22 de setembro de 2009

O presidente da Venezuela Hugo Chávez anunciou que durante sua última viagem para Moscou fechou um acordo militar de US$ 2,2 bilhões com o governo russo, buscando suprir Venezuela com tanques de batalha e sofisticados mísseis terra-ar.

O acordo armamentista é um sintoma das tensões acumuladas na região, cada vez mais exacerbadas pelos conflitos entre Washington e outras potências da arena mundial.

No talk show semanal de domingo, "Aló Presidente", Chávez deixou claro que via o acordo militar como meio de contraposição à crescente ameaça de agressão por parte dos EUA, particularmente após o golpe em Honduras e o anúncio do acordo EUA-Colômbia que permite que forças militares americanas usem sete bases em território colombiano.

As armas russas, afirmou Chávez, proveriam a Venezuela com "os recursos mínimos necessários para garantir ao nosso povo a defesa de nosso território e de nossa riqueza energética". Dificultaria, assim, segundo ele "o bombardeio por parte de aviões estrangeiros". O pacote de armas inclui os sistemas de míssil terra-ar S-300, os tanques de batalha 92 T-70 e T92 e lançadores de foguete Smerch para uso contra blindados e outros alvos em terra. O governo russo está fornecendo à Venezuela financiamento para pagar as armas.

Entre 2005 e 2007, a Venezuela possuía contratos para cerca de US$ 4 bilhões em armas russas, incluindo caças, helicópteros e 100.000 rifles de assalto Kalashnikov.

O último acordo também inclui planos para que a Rússia forneça assistência ao programa de energia nuclear venezuelano. "Não faremos uma bomba atômica", Chávez assegurou, "então não nos incomodem como com o Irã."

De sua parte, a Venezuela concordou em permitir que um consórcio de companhias petrolíferas russas, lideradas pela Lukoil e pela Gazprom, se junte à estatal do petróleo venezuelana, a PDVSA, na exploração do campo de petróleo da bacia do rio Orinoco, que produz até meio milhão de barris por dia. O consórcio russo concordou em pagar um bônus adiantado de US$ 1 bilhão e investir cerca de US$ 20 bilhões na produção e equipamento.

Chávez apontou para isso e outros acordos similares como mais uma razão para a Venezuela atualizar seus armamentos. "A presença de firmas russas, chinesas e espanholas dá à bacia do Orinoco uma nova conotação geopolítica em estabelecer os parâmetros de defesa e soberania", afirmou.

Durante seus encontros com o presidente russo Dimitri Medvedev e o primeiro ministro Vladimir Putin, Chávez anunciou que seu governo estenderia seu reconhecimento diplomático à Ossétia do Sul e Abkházia, que se separaram da Geórgia. Em agosto de 2008, o governo geórgico do presidente Mikheil Saakashvili lançou um ataque contra a Ossétia do Sul, provocando a intervenção russa contra a Geórgia e uma declaração unilateral de independência por ambos os territórios, com o apoio de Moscou.

Está claro que Moscou vê seus laços com Chávez como um meio de retaliação contra Washington pelo desenvolvimento militar nas fronteiras russas, e, em particular, contra suas tentativas de trazer a Geórgia e a Ucrânia para a órbita da OTAN.

No período imediatamente após a guerra do ano passado entre Rússia e Geórgia, conforme a OTAN tentava enviar navios para o Mar Negro, a Rússia enviou um grupo de batalha naval para a costa caribenha da Venezuela para realizar manobras conjuntas.

Putin fez referência aos objetivos geo-estratégicos de Moscou em pavimentar uma vinculação com a Venezuela, dizendo que o apoio de Chávez para a política da Rússia contribuía em "tornar as relações internacionais mais democráticas."

Além de Moscou, a viagem de 11 dias de Chávez o levou para o Irã, Bielorrússia, Turcomenistão, Líbia e Argélia.

No Irã, Chávez anunciou que a Venezuela começará a exportar 20.000 barris de gasolina por dia ao país no próximo mês. O Irã, que tem poucas capacidades de refino, depende de importações para 40% de sua gasolina, tornando-se vulnerável a sanções ocidentais. Além disso a PDVSA terá permissão para participar na exploração do campo iraniano de gás Pars do Sul 12, um dos maiores do mundo.

Washington denunciou o acordo Rússia-Venezuela, chamando-o de um "desafio sério" à estabilidade na região.

"O que eles querem comprar e o que eles estão comprando põe para trás todos os outros países da América do Sul," o porta-voz do Departamento de Estado Ian Kelly disse aos repórteres na segunda-feira. Ele completou que Washington se "preocupa com uma corrida armamentista na região."

Na realidade, uma corrida armamentista latino-americana está acontecendo a algum tempo, em grande parte catalisada pelas políticas intervencionistas de Washington e pelo impulso dos fabricantes bélicos dos EUA de arrancar lucros de vendas para as forças militares da região.

Segundo um estudo conduzido pelo Instituto Internacional de Estudos Estratégicos de Londres, os gastos militares na América Latina aumentaram 10 vezes entre 2003 e 2007, de US$ 4,7 bilhões para US$ 47,2 bilhões.

Em 2008, as vendas de armas na América Latina subiram novamente, 30% em relação ao ano anterior, chegando a US$ 51 bilhões. Enquanto os aumentos na taxa de gastos são dramáticos, o total para toda a América Latina é de aproximadamente 14 vezes menos que o orçamento militar dos EUA, que está próximo dos $700 bilhões.

A Venezuela não é a única a elevar seus gastos militares

Desde 2000, Washington despejou $6 bilhões em assistência militar na Colômbia, que além do Brasil, tem uma das maiores e mais bem armadas forças militares na América Latina. O país recentemente adquiriu 24 caças Kfir de Israel em uma escalada que disse ter o objetivo de contrapor as compras venezuelanas.

De acordo com a firma de análise militar Jane, a Venezuela gastou US$ 3,17 bilhões em suas forças armadas em 2008 — 1,1% de seu produto interno bruto — enquanto a Colômbia gastou US$12,3 bilhões — 5.7% de seu PIB.

Enquanto isso, o governo brasileiro está preparando um gasto de US$ 2,65 bilhões em 36 novos caças da França, que também fornecerá submarinos e helicópteros para as forças armadas brasileiras. Se antecipa que o acordo dos caças inclua a transferência de tecnologia, permitindo que a Embraer, a fabricante de aviões civis e militares firmada durante a ditadura militar, comece a produzir caças do próprio país. A Embraer e outras empresas brasileiras emergiram como exportadores de armas significativos, particularmente para os países menos desenvolvidos.

Significativamente, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva deu basicamente a mesma justificativa para a compra de caças que Chávez deu para seu acordo armamentista com Moscou, embora sem a retórica esquentada.

Lula argumentou que o avanço armamentista era necessário para defender os assim-chamados campos petrolíferos do pré-sal, na costa atlântica do Brasil.

"Deve sempre passar por nossas cabeças a ideia de que o petróleo tem sido o foco de muitas guerras e conflitos" Lula afirmou depois de discutir o acordo de armas com o presidente francês, Nicolas Sarkozy, na semana passada. "Não queremos a guerra ou o conflito. [As reservas petrolíferas do oceano] representam a possibilidade do Brasil se tornar, dentro de 15 ou 20 anos, uma das principais economias globais".

Embora Washington não tenha sido mencionada, claramente as guerras contemporâneas nas quais o "petróleo tem sido o foco" foram travadas pelas forças militares dos EUA como parte de um impulso de afirmação da hegemonia dos EUA sobre o Golfo Pérsico e a Bacia Cáspia.

A competição por vendas de armas, sobre as quais firmas americanas exerceram um verdadeiro monopólio na América Latina, é apenas parte do enfraquecimento de Washington na região, com a China e a Europa em particular rapidamente aumentando os investimentos e trocas à custa das corporações americanas.

No acordo de bases colombiano e nos planos para o reavivar da Quarta Frota dos EUA para patrulhar águas latino-americanas, é evidente que a elite dominante dos EUA está respondendo ao declínio de seu peso econômico — nessa região assim como em outras — com uma confiança crescente no poderio militar dos EUA.

Em seus acordos com Moscou, Chávez ecoa a política da Guerra Fria de muitos regimes nacionalistas de "esquerda", buscando assegurar o apoio de uma "superpotência" contra a outra. Nesse caso, porém, o regime capitalista mafioso de Moscou se provará um aliado bem mais frágil e menos confiável que a velha burocracia stalinista.

Quanto aos bilhões de dólares em novas armas, o impacto dentro da Venezuela será o de fortalecer o peso social e político das forças armadas do país, instrumento sobre o qual Washington tradicionalmente se baseou para implementar mudanças de regime contra-revolucionárias na região.

[traduzido por movimentonn.org]

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