quinta-feira, 13 de maio de 2010

costumeiramente

Continuo escrevendo.
Cabisbaixo.
Os óculos caindo.

Continuo pensando em qual amiga tecla
meter o dedo.

Ouço sons a misturarem-se
com as batidas do meu peito
e com os bocejos das vísceras.

Tudo muito abafado.
Só mesmo meus ouvidos:
sagazes meninos.

Continuo escrevendo o que me vem à mente,
antes, porém, coço as sobrancelhas.

Sinto tanto prazer em coçar as sobrancelhas.
Sinto vontade de morrer coçando as sobrancelhas.

Os sinais das amigas teclas (surdas)
exercem sobre meu silêncio
um domínio prático
como olhar para a xícara
e imaginar daqui a pouco
formiguinhas.

Continuo escrevendo com outro tipo de respiração.
Puxo do fundo do abismo das cavidades do meu corpo.

É uma respiração meio torta
que enrola para sair pelas narinas.

Neste momento minhas narinas de bisão.
Um bisão lorde com os olhos também caindo.

Mas as narinas bufam orvalho sobre os farelos
de pão e bolachas e bolo.

Debaixo do teclado é um canto encantado
da mesma forma debaixo da geladeira.

Pode-se achar uma aliança perdida
ou um brinco supostamente empenhado.

Continuo com os olhos de esquilo.
Qualquer roedor serve.

Desde que roa meus pulsos.
Que roa rápido.

Tu não sabes em que homem formidável
estou todos os dias me transformando.

Ladrão de paredes.
Tu não viste mas no teu quarto estive.
Roubei todas as quatro paredes.

Farei um harém de paredes.
Passarei um longo tempo
descobrindo segredos
e escrevendo.

Continuo escrevendo
com narinas de bisão.
Olhos de roedor.

Digamos, então:
uma alma dispersa.

Funciona assim,
e tu não imaginas
em que homem maravilhoso
a cada dia que passa me transformo.

Um ladrão de travesseiros.
O teu sumiu?

Não me faças sorrir.
Tu estavas dormindo.

Foi como roubar uma graminha
das costas de uma lagarta.

Assim, rapidinho
e sem doer nada.

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