Manuel Bandeira
Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Estrondos de bombas luzes de Bengala
Vozes, cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.
No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam, errantes
Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?
— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.
*
Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci
Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?
— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.
Texto extraído do livro "Antologia Poética
- Manuel Bandeira", Editora Nova Fronteira
– Rio de Janeiro, 2001, pág. 81.
Tinha esse poema no meu livro de português da sétima série. Na época me parecia tão bobo e sem sentido. Anos depois eu o reencontro, assim tão cheio de sentido e de dor. Tudo passa sobre a terra.
ResponderExcluirNunca lemos o mesmo poema. Sempre é um outro que nos surge aos olhos na próxima leitura. Aos poucos o Profundamente de Manuel vai fazendo sentido quando começam a faltar personagens importantes no nosso livro de chamada.
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