quarta-feira, 7 de julho de 2010

As Palavras

Por mais que eu ame o silêncio
as palavras amo imensamente.
Sinto o atrito dos fonemas
esculpidos pelo vácuo.
Vejo a sombra raivosa
de algumas sílabas
deixadas para trás.
As palavras são criaturas
vingativas e gentis
quando querem.
Boa parte do tempo
não querem compromisso.
Saem e entram no meu estômago
com a mesma veemência do cafezinho.
E nem sempre o cafezinho está quente
e nem sempre labaredas as palavras.
Às vezes as palavras são cubos de gelo
dentro de um copo de vidro.
Amo tanto (meu deus)
como amo enlouquecido as palavras.
Sobretudo sem argumentações estéticas.
As palavras são crianças e idosos
em um mesmo estágio de vida.
Acompanham apenas os meus dedos
como se estes fossem cajados
nunca muletas.
As palavras não servem
para suportar o peso de uma derrota.
As palavras não parecem com travesseiros.
Pedras. As palavras são pedras ovais. Lisas.
De acordo com a posição do sol
até refletem encanto.
Quando chove não perdem o encanto.
As palavras têm mais encanto
que a minha antiga moeda encantada.
Tudo visível ou extraordinário
as palavras são testemunhas.
Acompanham meu espanto.
Meu sorriso. Minhas lágrimas.
Não se apiedam nem se glorificam
com o que escrevo.
Pois as palavras não sabem ler.
Prostram-se em um canto do quarto
e se norteiam pelo barulho das teclas.
Não leem. Apenas distinguem
o que é verídico do espetacular.
Dentro do caixão (elas sabem disso)
conviverei melhor com elas.
Estaremos todos unidos
pela escuridão do teto de madeira.
Não quero ser cremado.
As palavras não gostam
de ser reduzidas a cinzas.
As palavras sonham
em virar adubo de minhocas.
Eu também.

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