terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Mais "humano", menos "animal" - José Nilton Mariano Saraiva

Outro dia, frente à telinha, tivemos que acionar o controle remoto por diversas vezes na tentativa de certificação de que não houvéramos sintonizado, por engano, algum desses canais pornográficos da vida (e que, deixando a hipocrisia de lado, alguns assistem na calada da noite, com um olho na TV e outro na porta do corredor, de onde a qualquer momento poderão “emergir”, tal quais fantasmas indesejáveis, esposa e filhos). É que, ali à nossa frente, as imagens, ao vivo e a cores, mostravam homens e mulheres que, muito embora impecavelmente vestidos, estranhamente se agrediam com uma virulência inenarrável (quase que chegando às vias dos fatos), se digladiavam numa verborragia desrespeitosa e imoral, se acusavam mutuamente de ladrão, corrupto, coronel de merda, bandido e outras coisas mais, e nos deixavam, enfim, a nítida impressão da possibilidade de ocorrência, a qualquer momento, em pleno nobre recinto, de alguma sessão de bang-bang explícito, algum duelo de ferrenhos e mortais inimigos (como já aconteceu no passado).
Mas, não, não houvera engano da nossa parte: desprovidos de máscaras ou fantasias, mostrando-se de cara nua e como realmente agem quando seus escusos interesses são questionados, no recinto e tribuna do Senado Federal nossos ilustres e nobres parlamentares se engalfinhavam num pugilato verbal explícito, numa baixaria sem tamanho, num espetáculo dantesco e surreal. E o pior é que, em atendimento a uma esdrúxula determinação regimental, empregavam, usavam e abusavam da outrora distinta e nobre, mas hoje desgastada e falida expressão “sua excelência” ao dirigirem-se um ao outro. Assim, valendo-se de frases do tipo “Sua Excelência é um corrupto”,
“Ladrão é Vossa Excelência”, ou ainda "Sua Excelência é um coronel de merda", nossos ilustres representantes ofereciam aos usuários da TV Senado um espetáculo nojento, degradante, hipócrita e abominável (e essa é só uma das razões pela qual a classe política brasileira enfrenta o descrédito atual).
E então, na solidão do quarto, ante tanta sem-vergonhice, safadeza e hipocrisia, nos pomos a refletir com os nossos estimados botões: embora não possamos deixar de prescindir, reconhecer e realçar, com louvor, a colaboração absolutamente necessária e inestimável de pessoas que, por uma ou outra razão, não tiveram a condição, oportunidade ou privilégio de obter um “canudo” universitário, mas que têm, sim, e de sobra, conhecimento, competência e discernimento para externar suas expressões e conceitos sobre os mais diversos temas, uma particularidade que caracteriza o nosso blog e o faz respeitado perante gregos e troianos é o ecletismo, a diversidade, a miscelânea cultural dos seus integrantes.
Autêntico “Instituto Butantã” (onde, para quem não sabe, só tem cobras criadas, humanas e naturais), nosso blog conta em seus quadros com uma série longa e interminável de “doutores” e “excelências”. É “doutor” que não acaba mais, “doutor” que dá no meio da canela, “doutor” até dizer chega, “doutor” até encher as tampas. São advogados, médicos, filósofos, poetas, economistas, historiadores, músicos, psicólogos, jornalistas, odontólogos, pedagogos, engenheiros, paleontólogos e por aí vai. Poderíamos, até, conjecturar que o nosso blog representa uma plêiade ou repositório de “notáveis”.
Mas, paradoxalmente, aqui é onde se esconde o perigo: como fazemos parte de uma mesma comunidade virtual, de um mesmo e privilegiado espaço, de um mesmo e imprescindível veículo de comunicação, seria sacal, desnecessário ou despropositado se, de repente, por soberba ou “orgulho besta”, começássemos a nos tratar de doutor pra cá, doutor pra lá, doutor fulano, doutor sicrano e tal, embora seja compreensível que os que labutaram heroicamente durante quatro, cinco ou seis anos em uma faculdade (fora a pós-graduação e a especialização) tenham obtido, de fato e de direito, a prerrogativa de assim serem reconhecidos e tratados. Não se há de lhes tirar o mérito, muito antes pelo contrário.
Ainda assim, objetivando quebrar arestas, estimular o surgimento de novos adeptos e debelar a timidez de alguns, enriquecendo consequentemente mais e mais este espaço, tomamos a liberdade de sugerir que, pelo menos aqui entre nós, mandemos às favas tal formalidade, cessemos os excessos de mesuras, extingamos o rigor nomenclatural, anulemos o preciosismo, revoguemos “in totum” títulos, graduações e pós e tratemo-nos – por que, não ??? - simplesmente por Zé, Socorro, Raimundo, Maria, Expedito, Liduina e por aí vai.
Entendemos que, em assim procedendo, o nosso blog pelo menos mostrar-se-á mais “humano”, menos “animal”, pois não ???
Além do que (e pra não fugir do “papo inicial”), em sã consciência ninguém aqui almeja que este nosso querido e dileto espaço seja comparado - nem de longe – ao “glorioso” Senado Federal da República, não é verdade ???

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