Pelé e Bidu
Conheci a vida em pessoa. Alcoolista a ponto de ter o álcool como um veneno que lhe subtrai o mundo e a vida. Por isso milita no AAA de sua cidade. Alto, magro, um gingado da raça, tão bom de bola na adolescência que recebeu o apelido de Pelé e até hoje o é.
Na altivez da vida. Aos setenta e dois anos terminando a terceira série do segundo grau. A razão? O que mais gosta na vida é o conhecimento. Agora tomando aos goles de teoria a mesma eletricidade que soluciona nos automóveis. E eis que a física que é sua prática e hoje a teoria escolar, está na razão da sua síntese. O quê expressa Pelé? Este que vos falo!
A síntese dialética entre fim e eternidade. De todos os conceitos o “fim” é o terminativo de todos os demais conceitos. Os conceitos expressam o mundo em movimento, se não como dinâmica própria seja como parte a contrapor-se (ou complemento) a outro conceito. Já o fim é a cessação do movimento.
Como Pelé, somos mortais, portanto chegados a um fim. Tomamos conceito de fim como absoluto. A bíblia o radicaliza como o fim dos tempos. Afinal é contundente que a antiguidade já tenha reconhecido que o tempo expressasse o movimento do mundo (ou, seja contundente que ainda continuemos com a antiguidade em nós).
Mas o fim de Pelé se encontra numa dinâmica exterior a ele, que se prolonga muito além do último Pelé que o mundo criar. Então: Pelé é a finitude que se estica neste momento na eternidade. O conhecimento é prova da eternidade. E digo com toda certeza apesar dos grandes quilômetros a nos separar neste momento.
E foi no compasso dos dias que tomei conhecimento da história amorosa de Bidu. Um cão pincher, com aqueles olhos saltados mas um contraponto de personalidade que lhe é comum pela raça. Bidu era amoroso. Nada nervoso. Latia para estranhos, mas não com todos aqueles tremores da raça.
Um dia apareceu uma gatinha, ainda na fase de crescimento, e resolveu adotar o nicho ecológico de Bidu. Ao invés de Bidu fazer a explosão da espécie quais os humanos caricaturam como cão e gato, ele cai de amores pela gatinha. Sei, os mais velhinhos que diziam gatinha logo pensam no acerto, mas convenhamos que a lei humana é: cão persegue gato.
E Bidu faz a corte, lambidas, patas abraçando, tentativas de contato físico. A gatinha se esquivava dos carinhos como podia, mas adotara além do nicho. Adotara Bidu. E Bidu sendo aceito, se desmanchava em tentativas. Todas cruzadas pela divisão das espécies, mas a zoologia não era a classificação dos dois.
Bidu fazia outra classificação: a do amor. Tomado de amores não se afastava nem para alimentar-se. Onde ela fosse, iria atrás. Onde estivesse também estaria. Onde se encontra lá está. Foi aí que o dono de Bidu, tomado de pena com a cena contraditória dizia:
- Bidu! Rapaz! Isso não vai dar certo. Bidu! Não vai dar certo!
Bidu nem aí para os conselhos. Se não fosse um cão enorme e de dentes afiados a destroçar a cabeça da gatinha, a história teria um tempo de Romeu no jardim e Julieta na sacada a se prolongar. E Bidu não largou sua amada no transcurso do seu último respirar.
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