sábado, 28 de julho de 2012

Do Berro para o CaririCult, a História do Rock Cariri contada pelo Michel Macedo da Glory Fate e Hey Bulldogo´ria d

A História do Rock no Cariri (capítulo 'dos anos 80 a 2002')

Arquivo Cariri # 19 | Do papel # 10

Neste 13 de julho, Dia Mundial do Rock, resolvemos resgatar uma história escrita há 10 anos. Em 2002, a Revista Geral publicou um texto de Michel Macedo — atualmente professor do Curso de Letras da URCA e integrante das bandas Glory Fate e Rei Bulldog — contando a História do Rock no Cariri cearense. Na época, a Revista dividiu o texto em três partes, nas edições 09, 10 e 11.

Hoje, 10 anos após a impressão do relato, resolvemos (re)lançá-lo no nosso blog. Além de servir como um registro da história do movimento roqueiro na região, sua (re)publicação também serve para informar da volta da Revista Geral, que brevemente lançará nova edição impressa. E O Berro e o Geral neste momento reforçam uma parceria que remete ao início dos anos 2000, quando as equipes das duas publicações se juntavam na organização de eventos, como o Rock Pop Cariri (no Navegarte).

Este texto de Michel é o primeiro da Revista Geral que será reproduzido pelo Blog, mas em breve teremos outros conteúdos, tanto antigos como os que sairão na nova edição.

E sem mais delongas, vamos à História do Rock no Cariri. Apenas lembramos que a matéria foi escrita em 2002 e que, obviamente, de lá pra cá muita água já rolou (mas esses últimos 10 anos serão assunto pra outro momento). Clique nas imagens para ampliá-las.
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A História do Rock no Cariri
por Michel Macedo

Parte 1 (Geral, ano 3, n.9 - Fev/Mar de 2002)

A história do rock no Cariri é algo que não foi muito bem documentado. Talvez haja algumas lacunas que não serão exatamente explicadas neste texto, mas essa é, particularmente, a história que eu vivi e vi meus amigos viverem.

As primeiras grandes bandas que vieram ao Brasil foram o Van Halen e o Kiss, daí, em 1985 aconteceu o primeiro Rock in Rio (o de verdade). Em Juazeiro do Norte havia um calçadão na Rua Santa Luzia, entre a Padre Cícero e a São Pedro. Lá, nos fins de semana se reuniam os jovens mais enturmados cansados de dar voltas na Praça Padre Cícero.

Aos domingos bandas de baile animavam as noites com aquele hard rock dos anos 80. Havia também o Bar de Téo, cheio de pôsteres nas paredes, onde a juventude mais “maluca” se reunia para beber e ouvir rock. Naquela época o que havia de mais pesado era o Kiss, Van Halen, Europe e o guitarrista da vez era o Peter Frampton.

Uns dois anos depois o calçadão foi desfeito e todos ficaram órfãos. Nesta época surgiu a loja Et Cetera, uma verdadeira escola para os pretendentes a rockeiros da época (como eu), que nos fazia deixar de lanchar no colégio para comprar sonhos gravados em vinil.

Por volta de 1986/1987 surgiu a primeira banda de rock, pelo menos que eu tenha conhecimento, a Pombos Urbanos, formada por jovens de Juazeiro e Crato. Era também época de final de ditadura militar, o movimento estudantil ainda era muito forte, os universitários buscavam alguma razão de viver. E isso se manifestava nos shows promovidos no auditório da [Rádio] Educadora, em frente à URCA (Campus do Pimenta), onde a Pombos Urbanos enlouquecia a noite.

A Pombos Urbanos mudou de nome para Fator RH, nome que lhes deu fama, e depois para Lerfa Um (com o qual gravaram a primeira fita demo de rock do interior do Ceará). Apesar de cantarem em português, fizeram com que o movimento crescesse muito no Crato, que chegou a ter uma enorme tribo de headbangers (como eram conhecidos os adeptos do heavy metal, os batedores de cabeça: camisa preta, cabelo grande e as famosas botas Comander). Nesta época também aconteciam festas monumentais apenas com som mecânico, nas casas de alguém da turma que os pais viajassem.

Era um movimento jovem que crescia muito rápido na época. Uma época em que não havia ainda a MTV e os vídeos cassetes ainda eram escassos, todas as informações e discos novos eram trazidos por alguém que viajasse para alguma capital.

Com o passar do tempo, novos ex-meninos, agora rapazes, já começavam a sonhar com sua própria banda, influenciados pelos shows do Fator RH e também pela mídia, o hard rock americano e bandas como Legião Urbana, Barão Vermelho e Camisa de Vênus eram o som do momento.

Tudo isso seria revelado no primeiro grande festival de rock que aconteceu no Crato, organizado pelos estudantes de Letras da URCA, o URCASTOCK, que será dissecado na próxima edição.


Parte 2 (Geral, ano 3, n.10 - Jun/Jul de 2002)

O ano agora era 1990. Nova década. Naqueles tempos havia o Festival Estudantil da Canção, no Crato, e as então famosas “feiras de ciências” dos colégios em Juazeiro. Nesta época surgiu a banda Eutanásia, que tocava covers do que havia de melhor no rock pop nacional da época. Esta banda brilhou em várias “feiras de ciências”, em particular as do Colégio Salesiano, em seus tempos áureos.

A década de 90 foi muito boa em termos de divulgação do rock, já havia a MTV por aqui (nas parabólicas) e o mundo do rock ficou menor. Várias bandas iam surgindo e daí veio a ideia do primeiro festival unicamente de rock na região, encabeçado pelo então Centro Acadêmico de Letras da Universidade Regional do Cariri - URCA. Houve, na época, um certo temor se tudo daria certo, mas o I URCASTOCK FESTIVAL foi um sucesso absoluto, dois dias de shows, contando com 9 bandas, das quais vinagaram a Shadows (punk rock, covers do Ramones e Sex Pistols), Calliope (rock'n'roll & heavy metal ?!?!?!), Lynx (rock pop e baladas hard rock) e Náusea (hardcore).

Este festival abriu muitas portas para o movimento que tomava ares de profissionalismo. Houve ainda uma segunda versão deste festival, mas foi muito descaracterizada, em outro local e sem o glamour do primeiro. Estas quatro bandas ainda fizeram várias outras apresentações em Festas de Barbalha, Exposição do Crato, Arte na Praça em Juazeiro e barzinhos.

No segundo semestre de 1992 o heavy metal crescia muito em todo o Brasil, surgindo então a StormBringer (foto ao lado), a primeira banda realmente com intenções de rock pesado, com composições próprias e covers de bandas como Iron Maiden, Judas Priest, Helloween, Viper, etc. A StormBringer reinou absoluta até 1994, tocando em Exposições do Crato, Festas de Barbalha e até em outras cidades, como Iguatu e Milagres. Outro bom momento foi a comemoração dos 10 anos de Xá de Flor (tradicional bar no Crato que era encontro do pessoal cabeça e bicho-grilos de plantão), foram 3 dias de shows, com a participação do Fator RH, StormBringer, Leninha e muitos outros.

Também aparecia a primeira loja exclusivamente Rock da região, a Porão Discos, que muito contribuiu para o crescimento do cenário de bandas, fãs e shows na região. Nessa época, Juazeiro do Norte até entrou na lista dos grandes centros de heavy metal do Nordeste, e até do Brasil, aconteceram vários shows considerados grandes para o porte da cidade, várias bandas de Fortaleza tocaram aqui, como as finadas Beowulf, Darkside, G.S. Truds, Tribunos da Plebe, Hefestus e, as ainda na ativa, Insanity e Obskure. Também tocaram o Restless (de Brasília) e o Krisiun e Nervochaos (São Paulo) — lembrando que o Krisiun é hoje uma das grandes bandas do Brasil, fazendo bastante sucesso na Europa.

Era uma época animada, quando havia uma grande galera unida que não media esforços para ir aos shows e dar apoio às bandas, houvesse chuva ou sol, todos estavam lá para gritar e agitar durante todo o show, que acontecia em locais de fácil acesso — como a Iguatemi — ou mesmo lugares obscuros — como uma tal de Brasília Casa de Shows ou mesmo o antigo Jackson, bairro Pio XII [em Juazeiro].

Em 1994 a StormBringer praticamente acabou e virou duas bandas (a outra era a Rising Hammer), voltando em 1996 com nova formação. O movimento do rock, agora mais punk e heavy metal, era dos melhores ainda, com novas bandas, como Traumatismo Craniano (que foi a primeira banda pesada a gravar fita demo na região), Mesocrânio, Chemichal Death, Fuzor (eu espero não estar esquecendo ninguém, pelo menos ninguém que mereça destaque).

Já por volta de 1997 surgia por aqui uma febre importada dos Estados Unidos chamada Nirvana, que influenciou todo um movimento, as antigas bandas punk estilo Ramones e Sex Pistols cederam ao grunge vindo de Seattle. Vale destacar bandas como a Hidrophobia (que inclusive gravou uma fita demo que hoje é tida como raridade) e a Neurize, ainda na ativa.

No próximo e último capítulo falaremos da evolução das bandas, dos trabalhos gravados, da atual cena rocker da região e do que o futuro talvez nos espera.


Parte 3 - Última, mas não a final (Geral, ano 3, n.11 - Set/Out de 2002)

Antes de começar, gostaria de agradecer os e-mails que me refrescaram a memória, afinal errar é humano, ainda mais pra um já dinossauro do rock como eu, todo enrugado e com poucos neurônios devido a tantas Exposições do Crato mal dormidas.

Esqueci, no capítulo anterior, de mencionar 3 bandas que tiveram grande influência: a Prisma 777, que durou pouco mas viveu intensamente, participando de vários shows, inclusive abrindo shows importantes como o do Darkside (Fortaleza); a The Brothers, que tocava rock nacional, depois virou cover do (argh!) Legião Urbana e hoje toca jovem guarda com o nome de Banda Arquivo; e também a Fator X, que tocava músicas próprias e tinha Adriano como vocalista, com sua performance peculiar vestido de Edward Mãos de Tesoura misturado com Peter Gabriel, só vendo pra crer.

Agora era final da década de 90, a febre do Nirvana ainda dominava o mundo, a StormBringer mudava de nome para Glory Fate; os meninos do Dr. Raiz já começavam a ensaiar, com o nome de UTI, tocando covers do Ramones; o Death e o Black Metal também já chegavam ao Juazeiro; várias bandas surgiam a cada dia, outras acabavam, tudo fervia movido a rock. Dessa época só sobreviveram os mais teimosos. Também surgiam bandas de outras localidades, como o Sétimo Selo, de Mauriti, que chegou a gravar um CD. No Crato, um maluco de Curitiba montava um bar destinado ao rock, o Saint's, depois chamado Darkside, onde a galera se reunia nos fins de semana pra curtir a night. Foi lá que o Dr. Raiz fez seu primeiro show, num palco minúsculo, no quintalzinho do bar.

Também no Crato, tínhamos ótimas Exposições, com a consagração total da barraca Los Zetas — a única diferente —, e havia um espaço para os artistas da terra. Essa época marcou muito as bandas pela busca do profissionalismo, vendo que os shows estavam meio parados aqui, muitos gravaram demo tapes que tiveram boa aceitação em nível nacional e até internacional: a StormBringer gravou duas demo tapes, em seguida o CD, já com o nome Glory Fate e se mandou Nordeste afora, tocando em cidades como Recife, Fortaleza, São Luís e João Pessoa. Surgiram também grandes bandas como a Mesocrânio (death metal) que teve boa repercussão com seu CD demo, e a Malebouge (black metal), que também gravou uma demo, ambas também foram ver o mar e tiveram ótima aceitação em nossa capital. Outros deixaram a cidade em busca de novas oportunidades, como o famoso Junior Grunge, que foi para São Paulo e de lá trouxe sua banda Insânia para a cidade.

Já no ano 2000 surgiu o Navegarte, no Crato, marcando outra época mágica e efêmera. Lá, quinzenalmente, aos domingos, sob a responsabilidade do Geral e do Berro aconteciam verdadeiras tertúlias (encontros de amigos), ao som de bandas como a Glory Fate, Post Scriptum, Dona Persona, Maria Doida, Sétimo Selo e outras, a galera se divertia bastante.

Hoje podemos dizer que o rock veio para ficar em nossa(s) cidade(s), as bandas já estão mais estruturadas, já existem estúdios para ensaios, e os jovens se encontram nesta forma de linguagem tão peculiar que nunca vai envelhecer, sobrevivendo às raízes das ervas daninhas (nada a ver com o Dr. Raiz, e sim com essa moda do forró pé no saco) e aos modismos em geral, podemos gritar a uma só voz, duas frases eternas:

Long Live Rock'n'Roll!!!
& Heavy Metal is the Law!!!

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