“Flores
Raras” (baseado em fatos reais) é a tal prova cabal de que nós, brasileiros, já
conseguimos, sim, produzir com extrema competência, filmes adultos, sérios e -
mais importante - de qualidade indiscutível.
Produzido
e dirigido pelo consagrado Luiz Carlos Barreto (em parceria com a esposa) e tendo
no papel principal uma Glória Pires madura e simplesmente exuberante, trata da intensa
e sofrida relação homossexual entre a arquiteta carioca Lota de Macedo Soares
(Glória Pires), uma das responsáveis pela construção do Aterro do Flamengo, no
Rio, e a poetisa americana Elisabeth Bishop.
É
que esta, buscando fugir do estresse do dia-a-dia de Nova Iorque, decide
aceitar o convite de uma contemporânea de faculdade (que se mudara para o
Brasil), para conhecer o Rio de Janeiro. Extremamente tímida, introvertida e
recatada, em aqui chegando se surpreende ao notar que a ex-colega “vivia” com uma
outra mulher, Lota Macedo.
Despachada,
autoritária e mandona, Lota Macedo não fazia nenhuma questão em esconder sua
atração por pessoas do mesmo sexo. E a paixão por Elisabeth foi instantânea,
como que a adivinhar que por detrás daquela timidez, introversão e recato
excessivos se escondia um autentico “vulcão”. E não deu outra: na primeira
saída a sós (por ela provocada) e num recanto paradisíaco (Teresópolis), um inesperado
beijo na boca e... deu-se a erupção, fiat lux.
Daí
pra frente a paixão só cresceu, ao ponto do ciúme da ex-amante ter que ser debelado
com a adoção de uma criança e a abertura definitiva e sem rodeios do jogo: sim,
a bola da vez, agora, era Elisabeth (que com ela passou a dividir a cama).
Viveram
intensamente a paixão e cresceram profissionalmente em suas respectivas
atividades (Elisabeth chegou a ganhar o concorrido prêmio Pulitzer, por um
poema que lá atrás houvera dedicado a Lota) até que deu-se a “fadiga do
material”: convidada para lecionar numa faculdade americana, Elisabeth resolve
aceitar, mesmo com a não concordância e o protesto veemente da companheira (que
chega a lhe oferecer mundos e fundos, tal o medo de perde-la).
Acostumada
a mandar, desmandar e jamais ser questionada, com a viagem da companheira à sua
revelia, Lota Macedo acusa o golpe: entra em um penoso processo depressivo,
alimentado pela saudade, daí o consumo excessivo de álcool. Suas cartas não têm
resposta, simplesmente porque a ex, que fora rejeitada, não as encaminha. A
degradação é visível e impressionante (que maquiador fabuloso).
Após
certo tempo, ao tomar conhecimento, por acaso, do estado crítico da ex,
Elisabeth (já com outra amante, uma aluna bem mais nova) se manda de lá pra cá,
a fim de socorrê-la; e aí, novamente juntas, as duas descobrem que “não dá mais
liga”, alguma coisa se perdera pelo caminho, o sonho acabara, esvaíra-se, escafedera-se.
Alfim,
por não admitir o fracasso, e visando livrar-se daquele calvário que já lhe
atormentara excessivamente, Lota Macedo põe fim à própria vida ao ingerir um generoso
coquetel de medicamentos com whisky. Mesmo condoída e consciente de ter sido responsável
por aquele ato extremo, Elisabeth volta para os braços da amante americana.
Resumindo:
independentemente dos preconceitos que decerto hão de surgir, um filme adulto,
sério e que merece ser visto com extremada atenção. E com um adendo: é
brasileiro, sim, com locação na sua maior parte em Teresópolis, contando com
uma atipicidade: os diálogos em inglês e legendado em português.
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