Uma das gerações mais ricas culturalmente do Cariri foi
aquela que envolveu entre outros o Rosemberg Cariry, o Luiz Carlos Salatiel, Zé
Flávio, o Jackson Bantim, apenas para localizar esta geração pois a lista de
nomes de igual peso não é pequena. Inclusive o Ronaldo Brito e o artista
Plástico Bruno Pedrosa, um pouco antes, também se incluem nesta riqueza.
Riqueza em quê? No soerguimento e na releitura quase mítica
(próximo ao místico) da cultura do interior nordestino. Aquele com base
econômica na pecuária, na agricultura de sobrevivência e no algodão (o “ouro
branco”). A cultura que arrastava consigo um catolicismo quase primitivo junto
com elementos indígenas. Aliás a proliferação de “pastores neo e pentecostais” não
é outra coisa que não a mesma base não institucional da religião popular,
embora muito vista como mera exploração como era visto o catolicismo popular nordestino.
Valores icônicos dessa geração: a família patriarcal e da fazenda
sertaneja, os poetas populares (Patativa, Zé de Matos), as danças de raiz
(reizados, coco etc.), beatos e a dinâmica religiosa acumulada em Juazeiro, o
cangaço e a música popular nordestina. Isso incluindo mitos, músicas e textos que
pessoas com o nível de educação desta geração tão bem soube levantar. Incluindo
aí a história regional do interior nordestino (não praiano e não cana de
açúcar).
Mas eles tiveram uma grande vantagem comparativamente aos
tradicionalistas que realizaram grandes pesquisas sobre o passado do interior
nordestino. Aqueles seguiam a esteira ideológica dos Instituto de Geografia e
História, em seu tradicionalismo se tornaram, assim, conversadores com
tendência ao refúgio no passado. Já a geração que cito deu novo significado à
história interiorana nos termos da modernidade. Da transformação de natureza
crítica, significando refazer um campo mítico que substancie o deserto pragmático
burguês com sua individualidade consumista.
O Luiz Carlos Maciel mantém um blog (ou mantinha acho que
chamava-se Cariri Encantado) como evidência do que digo. De vez em quando ele e
o Carlos Rafael dão significado territorial ao “movimento” desta geração (esqueci
o nome exato). A filmografia do Rosemberg é uma prova eloquente do que digo. Os
livros do Zé Flávio. Os espetáculos de teatro anunciados pelos blogs
representam este momentum da nossa cultura.
Agora ao título não é? Isso encontrei no livro “Benjamin
Abrahão Entre Anjos e Cangaceiros” de Frederico Pernambucano de Mello. As
filmagens feitas por Benjamim não teriam sido financiadas apenas pela Aba Film,
mas pelo esforço do governo Nazista Alemão em sua aproximação com a América
Latina. E esse esforço traduzido pela empresa alemã Bayern fabricante da famosa
Aspirina.
Lembram do filme Cinema, Aspirina e Urubus? Acho que de cineastas
pernambucanos. Ele mostrava exatamente o esforço da Bayern em divulgar seu
principal produto com uma camionete nos anos 30 pelas estradas precárias do
sertão, levando filmes e um projetor de cinema que ia de pequena em pequena
cidade carregando nela um pequeno gerador movido pela camionete.
De modo que a proeza de Benjamin Abrahão ao filmar e
fotografar Lampião teria sido financiada, também, pela Bayern. Inclusive todo o
equipamento cinematográfico e fotográfico era da Zeiss alemã. As provas de
Frederico são imagens de Lampião apontando para um cartaz de propaganda da
Aspirina de falando palavras e outra imagem dele distribuindo sachês de
aspirina para o seu bando.
Não quero com isso apenas dizer que a pesquisa histórica do
interior nordestino, empreendida pelos tradicionalista, ressaltando grandes
figuras patriarcais e da igreja católica, não tenham grande importância para
nosso autoconhecimento. O que pretendo apenas é apresentar que mesmo Lampião já
não era aquele cangaceiro medieval que tantos pintam. Assim como a geração que
soube dialogar com a história entre o passado e o presente.
Mesmo quando o diálogo desta geração, numa ou noutra obra,
por vezes se congele de modo não dialético, a verdade é que esta geração deu
movimento e criou uma ponte icônica que nos valoriza frente ao “estrangeiro”.
Aliás, lembro muito bem do cronista e poeta Airton Monte espinafrando na sua
coluna em jornal de Fortaleza o tratamento “mítico” dado a Patativa do Assaré
(conheci muito bem a vaidade de Airton e isso pode ter sido a manifestação de
algum ciúme com Rosemberg que passou a influir na Capital). Em que pese que a
poesia é um coletivo além de Patativa, o que se passava com Airton era um certo
mal-estar com os valores do sertão em relação ao suposto universalismo do
litoral.
Ou seja, a velha luta
entre Franco Rabelo (Litoral) e o Padre Cícero (Sertão). O que o pessoal da
cultura litorânea nunca compreendeu é que o lugar no mundo atual é aquele da
recriação do nosso próprio mundo. Por isso meu abraço a esta geração do mundo
caririense.
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