quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Desculpe, Marina, mas eu tô de mal...

              
J. FLÁVIO VIEIRA

                                               Tinha-me prometido, nestes tempos eleitoreiros, em que todos os ânimos ficam exacerbados ao extremo,  não meter minha colher de pau nesta papa fervente. Até mesmo porque todos sabem, de cor e salteado, minhas posições políticas e sempre parecerá que, catapultado por elas, não terei o equilíbrio suficiente para discernir o milho da pipoca e acabarei puxando a brasa para meu piau. Como sei  que sempre, seja quem for, partirá de suas próprias convicções , para tentar entender e interpretar os cenários que se vão configurando, não tenho pruridos e resolvi entrar no jogo. Resistir quem há-de?
                                               Nas últimas semanas, então, com o prematuro desaparecimento do Eduardo Campos e a entrada de Marina Silva, numa partida até então morna e sem maiores atrações, a Maratona ganhou múltiplos atrativos. As pesquisas têm mostrado um aumento significativo nas intenções de votos da candidata do PSB  que tem ameaçado a reeleição da presidente Dilma e praticamente aniquilou a escalada titubeante de Aécio Neves , demonstrando a curva em descendente do outrora fogoso PSDB, hoje uma espécie em vias de extinção. O clima no país, com mudanças tão rápidas no tabuleiro de xadrez, é de perplexidade. A Direitona ,que apostava as cartas todas em Aécio, de repente, descobriu que tudo era um blefe e, rápido, lançou os trunfos  na canastra de Marina, atitude que já vem sendo tomada, inclusive,  por vários membros do próprio PSDB. O grande problema é que , relutantes, não acreditam nos posicionamentos também relutantes e mais filosóficos que pragmáticos de Marina. Sabem da sua história, da sua militância sempre mais à  esquerda, inclusive como Ministra de Lula e andam mais desconfiados que cachorros em Noite de São João. Mas que opções outras teriam ? Os Petistas, por outro lado, andam tontos com a súbita mudança de cenário. De repente, a avalanche há apenas quarenta dias do primeiro turno e os necessários correções e ajustes que precisarão ser feitos de forma emergencial no curso da campanha.
                                               Por que Marina parece tão palatável para a população ? Primeiro é importante lembrar que ela encarna, um pouco, aquela saga de Lula : uma pobre, da pobre região Norte, alfabetizada apenas aos 12 anos, crescida dentro das Lutas Sociais e que sonha em um dia ser a maior mandatária do país e corrigir todas as distorções e deformidades que tão bem conhece pois viveu-as toda na própria pele. Depois, Marina surge como uma alternativa viável à alternância de poder, à polarização de mais de vinte anos, com os desgastes esperados,  PT-PSDB. Além de tudo, Marina Silva transparece além de simplicidade, honradez: sua história política tem poucas máculas até mesmo porque não exerceu muitos cargos executivos. Além de humilde, despojada, transpira dignidade, eu compraria, de olhos fechados um carro dela e ficaria feliz se fosse minha vizinha.
                                               A Candidatura do PSB, no entanto, carrega consigo dubiedades sérias , arestas difíceis de se apararem. O Programa de Governo, por exemplo, prega a Disseminação dos Conselhos Sociais, alternativa já em franco desenvolvimento na Saúde, na Educação, na Cultura, na Justiça, desde a Constituição de 1989. A Direita, no entanto, torce o nariz, acreditando que é uma tentativa  de venezuelizar ou cubanizar o Brasil. Por outro lado, reza bônus salariais para professores e funcionários públicos por desempenho, uma iniciativa francamente neoliberal, chamada de Meritocracia e que dá engulhos na Esquerda. Deseja ainda priorizar o Agronegócio, com preservação do Meio Ambiente algo parecido com fazer o omelete sem quebrar os ovos. Pretende por sua vez reduzir o consumo de combustíveis fósseis e incrementar a Energia Solar e a produção do Álcool,  sem dizer claramente o que fará com a Petrobrás e com a Energia Hidroelétrica. Propõe ainda uma Reforma Tributária, necessária mas dificílima de se articular por conta dos díspares interesses da União, dos Estados e Municípios. Quer ainda aumentar em R$ 40 bilhões as verbas destinadas à Saúde, atitude louvável, mas sem muito lastro : de onde virão os recursos ? Por outro lado,  titubeia em questões já superadas pela Sociedade, que nos remete à idade das trevas,  por mero viés religioso,  como o Casamento Gay já resolvido pela justiça e pela jurisprudência e a pesquisa com células tronco-embrionárias. Marina Silva , como cidadã, tem todo o direito de escolher e exercer a religião que lhe aprouver, o presidente do Brasil, no entanto, tem que ser necessariamente laico como determina a nossa Constituição.
                                               O mais sério, no entanto, é que se eleita, com a pequena bancada que possui o PSB, haverá a imperiosa necessidade de arrematar apoio nos partidos do Congresso. Sem suporte amplo, não se governa, lembrem de Jânio e de Collor. Apoio, significa, necessariamente, cargos que serão rateados pelos muitos partidos da base de sustentação. O governo, assim, não será do PSB, mas  de coalizão. As velhas raposas de sempre voltarão famintas ao galinheiro. O leitor me dirá, qual o problema ? Os outros não fizeram igual : O PSDB e o PT ? Claro, isso , inclusive faz parte do jogo democrático, pode ser até uma deformidade da Democracia, mas está nas regras estabelecidas. A grande questão é que o discurso de Marina fala numa “Nova Política” que vem para sepultar a “ Velha Política”. Essa “Nova Política” é indefinível, ninguém até hoje soube de que se trata, quais as novas regras e os novos instrumentos.  Que diabos de “Nova Política “ é  essa que utiliza os mesmos métodos arcaicos da anterior?
                                               Boas intenções, infelizmente, não bastam. Os bordéis, os cemitérios, as câmaras estão cheinhas de bem intencionados. Marina carrega consigo aquela carinha messiânica de beata, de irmã de caridade e promete milagres e curas miraculosas como tantos de seus pares. A mim, não basta. Já cansei de pseudo-Messias e bezerros de ouro. Sua ambiguidade crônica, tergiversando, sempre, nas questões mais importantes, me remetem àquele soldado americano da Guerra da Secessão. Temendo ser atingido,  resolveu vestir-se com a camisa do exército confederado do Sul  e a calça do exército do Norte. Imaginava que assim estaria salvo no conflito. Na batalha o que aconteceu foi que os soldados do Norte atiraram na parte de cima   e os recrutas do Sul na parte de baixo . Virar tábua de pirulito é o destino político dos hesitantes. O campo de batalha está pronto e os soldados a postos.

Crato, 03/09/14

Um comentário:


  1. Parabéns, Zé Flávio.
    De uma clareza ímpar seu questionamento sobre o que seria a "nova política" da "velha" Marina.

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