domingo, 30 de novembro de 2014

Cheiro Mineiro de Flor - José do Vale Pinheiro Feitosa




A corrida para as cidades foi de repente. A porta se escancarou e deixou a casa abandonada. Uma flor murcha. A lagartixa nas brechas do reboco. O borralho ainda quente da última panela que alimentou aqueles que fugiram no rumo das cidades nem bem o meio dia chegara.

E ficaram ali mesmo pela periferia das cidades. Não havia lugar nas casas de ruas calçadas, água servida, luz nos postes e passeio montado. Ali mesmo entre um papelão, uma folha de zinco, uma tábua por arranjo. Um teto que filtrava estrelas assim como borbotava as chuvas geladas que inflamavam os pulmões.

Não se teve nem tempo de pensar antes sobre os passos da corrida. Um saiu, depois outro, mais acolá alguém, um a um os botões foram afrouxando, depois preso a uma única perna de linha e finalmente caindo de suas casas. E a camisa da vida desabotoada deixou uma sensação tão grande de desamparo a mover as pernas sem que os braços entendessem o motivo.

Se tivesse uma noite mais, talvez o canto soturno do bacurau lembrasse que por vezes a pouca luz é mais propícia que o lume do meio dia. Mas os becos enlameados, os monturos de lixo, o fedor entranhado das valas por onde as ratazanas pulam de uma margem a outra, são o fim da corrida.

E só restou uma viola a lembrar aquele cheiro mineiro de ser. Aquelas cores inteiras de ver. Aquelas melodias maneiras de se encantar. Aquele jeito de lembrar o lugar de onde se veio. O veio soterrado por estas camadas urbanas de ser.


Este cheiro mineiro de serra. O beija flor. Este cheiro mineiro de flor. 

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