sábado, 26 de setembro de 2015

PEDRO CARDOSO E ONDE SE ENCONTRAM O ARTISTA E A TELEVISÃO BRASILEIRA.

Podemos apontar alguma característica específica nas famílias? Com a urbanização, a globalização parece uma pergunta sem referência. Mas a verdade é que certas lideranças familiares projetam, numa sequência de descendentes, valores que se transmitem entre as gerações. Lembro da família Cardoso (de FHC) que tem papel na história desde o fim da Monarquia.

O pai do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, militar, era uma das lideranças destacadas do nacionalismo e foi deputado federal pelo PTB do Distrito Federal na legislatura de 1955. Aliás, FHC, embebedado pela USP, ufanou-se em superar a era Vargas.

Mas eu queria falar era do Pedro Cardoso, ator, figura de destaque no teatro e televisão, até bem pouco tempo fez o Agostinho na série da Globo chamada de Grande Família. Olhem só alguns trechos do que diz Pedro Cardoso numa entrevista para o UOL:

“O mundo ainda é moldado para atender ao interesse sexual masculino. Principalmente no mundo artístico. Acho que não há nada mais subserviente aos interesses econômicos, hoje em dia, que o mundo artístico. Acho que nós artistas esquecemos de muito tempo que nós somos do contra. Que nós temos que estar um pouco na contramão do interesse econômico”.

“Hollywood colocou os artistas perto dos ricos e essa atração por uma vida mais rica, com mais dinheiro, ela é muito complicada, no meu entender, para o artista. A pessoa que te paga nunca de paga para você dizer o que você quer. Paga para você dizer o que ela quer que você diga”.

“Mas chega um momento, às vezes, que é poderosa a divergência, nessa hora o artista é demitido. Ou ele vende a alma ao diabo e diz o que não está no coração dele... Eu acredito que a arte é simbólica. Que o gesto artístico não é uma reprodução da realidade. Até porque eu acho que a realidade não é reproduzida. Ela só é possível viver. Quando eu te conto algo que me aconteceu, já é uma narrativa. Já é uma coisa que tem uma linguagem ali. É inevitavelmente simbólica”.

“A atual administração da TV Globo, tanto a parte burocrática quanto a artística, está empenhada em projetos de autores e não de atores. O petróleo da comunicação social, em teledramaturgia, é o ator. É o ator que dá cara ao trabalho de todos. Isso confere ao ator um poder incomensurável. Eu penso que a empresa, e não só a Globo, inconscientemente nega o poder ao ator. Na organização de poder da empresa quem tem poder não são os atores. Os atores ficam esperando serem convidados. A Globo não é sensível a nenhum movimento feito pelo ator”.

“Eles não querem atores autores. E ele não precisa necessariamente escrever. O Antonio Fagundes e o Lima Duarte quando representam, a autoria da representação deles é tão poderosa que aquilo é uma autoria que o público reconhece. No momento atores assim não são bem vistos. Porque atores assim cobram caros. O mercado, no momento, não quer pagar autores. Ele prefere atores que já entraram no mercado tendo abdicado de antemão de sua autoria. Já entraram subservientes ao autor”.

“Os atores fazem qualquer coisa que lhes mandam. Têm pouca voz. Eu sou tido e havido como um sujeito que briga. Eu brigo pela minha autoria. Quando eu encontro um diretor que compreende que o que há entre mim e ele é apenas uma relação de função e não de hierarquia”.

“Eu acho que o saldo da Grande Família se deve em grande parte ao relaxamento das relações hierárquicas entre o Guel, o Claudio Paiva e o elenco. Porque a autoridade é inimiga da criação. O ambiente da criação é a liberdade”.

“Televisão no Brasil se dedicou a construir uma espécie de pais que não é verdadeiro. Eu acho que isso atrasa o amadurecimento político, emocional, do Brasil. Então eles negam o Brasil verdadeiro. Eu vou dar um exemplo: houve um tema sobre liberdade. A nossa máquina inconsciente rapidamente colocou uma questão de escravidão. Porque o problema da liberdade no Brasil está indissociavelmente ligado à escravidão. Este tema tratado com verdade é difícil para o Fantástico. Porque o Fantástico trata dos assuntos com uma falsa verdade. Até quando diz que uma coisa é verdade parece um entretimento, parece uma coisa bobinha, uma coisa engraçadinha. E eu faço uma coisa que é engraçada mesmo. Não uma coisa engraçadinha. ”

“Eu defendo a regionalização da programação. Eu acho um crime que o nordeste brasileiro não tenha uma teledramaturgia própria. Se for ruim para o negócio mudamos então o negócio. É ruim para esse negócio como está organizado hoje. Mas os artistas do Rio de Janeiro não vão poder ganhar tanto. Não vão ganhar tanto aqui, mas eu vou poder trabalhar lá. Vou ter mais liberdade. O mercado ficaria infinitamente maior, câmeras, contrarregra, todo mundo ia ter mais emprego. O dinheiro ia circular mais nas regiões. O Brasil ia perder este centralismo São Paulo e Rio de Janeiro”.


“O Brasil mudou muito mais do que a televisão brasileira mudou. A televisão brasileira ainda está igual à televisão do FH. Nós estamos já aqui no Brasil pós-Dilma, embora ela ainda esteja. E a gente tem que retratar este Brasil que mudou. Se a gente ficar fazendo a televisão que era da época do Fernando Henrique o público vai fazer outra coisa. ”

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