terça-feira, 15 de agosto de 2017

A hoje "VELHA SENHORA" - José Nílton Mariano Saraiva

Aliando discrição, simplicidade e até traços de uma certa nobreza (por mais que paradoxal), ao vir ao mundo ela já conseguira o que parecia impensável: a unanimidade, sobre sua beleza e suas formas perfeitas, suas graciosas curvas e até sua postura um tanto quanto aristocrática (para os padrões então vigentes), responsáveis por sua caracterização como uma “gracinha”, autêntica “jóia”, detentora de um charme indescritível, um verdadeiro presente dos deuses.

Embevecidos e orgulhosos, os cratenses sentíamos imensa satisfação em mostrá-la aos que aqui aportavam, em visitá-la periodicamente ou, simplesmente, em transitar à sua frente ou arredores, admirando-a e inflando o nosso ego com o que as pessoas dela comentavam; e, se distantes nos encontrávamos do torrão natal por algum motivo, não cansávamos de citá-la em conversas informais, ou mesmo recomendá-la aos que pretendiam visitar a cidade do Crato.

E assim sua fama cresceu, atravessou fronteira, espraiou-se rincões afora. O astral era tamanho e a curiosidade tanta, que todos nutriam o desejo interior de algum dia conhecê-la, mesmo que por um fugidio e único momento, para simplesmente comprovar tudo o que dela diziam. E vindo, e vendo-a, saiam satisfeitos, radiantes, solidários, a difundi-la mais a mais por outras plagas. Era, realmente, de uma beleza ímpar, diferente... avançada para os padrões da época.

Com o passar do tempo, entretanto, dada à inexorabilidade do ciclo normal da natureza, naturalmente a jovem cresceu, adolesceu, virou adulta, transmutou-se e viu processar-se o arrefecimento de ânimo, o rareamento das manifestações de simpatia; a chegada da rotina, enfim, acabou com o seu encanto e tornou-a “normal”.

Além do que, por falta de carinho, cuidados e incentivos, seu aspecto físico compreensivelmente decaiu a olhos vistos, enquanto outras beldades, turbinadas por energéticos e vitaminas, que a ela passaram a ser negadas, apareceram ao longo do caminho, tomando-lhe o lugar e adeptos, deixando-a no ostracismo e na saudade.

Os que dela deveriam zelar e cuidar, simplesmente a abandonaram criminosamente, deixando-a por muito tempo ao relento, exposta ao sol, chuvas e trovoadas, enquanto seu “habitat natural” foi indiscriminadamente invadido e ocupado por companhias nada recomendáveis, sufocando-a sem dó nem piedade.

Hoje, sua imagem é de dar pena e dó e dela até nos envergonhamos: superada, decadente, isolada, decrépita, acanhada, sitiada, evitada pelos antigos admiradores e também pelas novas gerações, abandonada pelo poder público que tinha obrigação de cuidá-la, ela é o retrato preciso, emblemático e pujante daquilo em que transformaram o Crato ao longo desses últimos 40 anos: uma cidade cidade-fantasma, cidade-dormitório, sem perspectivas, sem futuro, sem nada, e a reboque de migalhas governamentais.

Quem te viu e quem te vê, RODOVIÁRIA DO CRATO !!!

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