quarta-feira, 1 de agosto de 2007
Enquanto isto em Matozinho...
<ZEZINHO E O CINEMATÓGRAFO HEREGE
Cidadezinha perdida no meio da caatinga , Sta. Genoveva do Mato-Dentro parecia uma ilha em meio àquele deserto. Era daquelas vilas onde Judas perdeu as botas e o vento fazia a curva para , num alívio, voltar à civilização. A pequena população vivia da colheita de frutos, da caça de pequenos roedores e da pesca ( quando o rio, milagrosamente , corria). A cidade mais próxima distava mais de 200 quilômetros e a estrada até ela era carroçável : intransponível no inverno e pista de Rally no verão. Em tempos mais auspiciosos, uma "Sopa" fazia a linha entre as duas cidades, semanalmente, sempre levando mais gente do que trazendo. Padre só se via em época de desobriga e juiz, como político, só aparecia nas eleições. Ali qualquer briga de vizinho era assunto de discussão para mais de uma semana na única praça da cidade, aquela que circundava a capelinha da milagrosa Sta. Genoveva.
Imaginem o alvoroço na cidade, quando uma perua adentrou a Rua principal, conclamando num alto-falante o pacato povo genovês, a assistir, a preços módicos, à projeção de uma película , à noite.Só depois se soube que o local da sessão já tinha sido combinado antecipadamente com o Cel. Filomeno, o homem mais abastado da cidade e detentor, estrategicamente, de um vasto oitão de casa, recém caiado. O Cel. , a troco de ingressos para ele e a família, resolvera ceder o telão , ou oitão, improvisado. A Kombi anunciara a sessão para logo de noitinha e o filme fora escandido com todas as letras : " O MILAGRE DE GENOVEVA". A novidade causou o maior reboliço naquele oco de mundo: não bastasse o avanço tecnológico de se Ter uma sessão de cinema naqueles confins , o filme prometia trazer a história da santa padroeira daquela Vila.
Mal anoiteceu e o povo começou a chegar para o gigantesco evento prometido, cada qual de posse da sua cadeira de Bodocó. O controle de pagantes era o mais difícil possível, já que não havia cordão de isolamento e a turba ia chegando em volumosos grupos. Zezinho do Cinematógrafo, corria de um lado para o outro, como louco :
--- Ei você já pagou ?
--- Você aí já tirou o ingresso ?
--- Como é , já acertou?
Em pouco já se tinha uma seleta platéia e Zezinho, arrastou de dentro da Kombi, uma máquina de projeção e vários rolos de filmes que acondicionou, num tamborete, perto da máquina. Esticou, então, um longo fio até o quintal da casa do Cel. Filomeno, e ligou na tomada que trazia a energia de um gerador a óleo que iluminava a cidade. Feita a conexão , a máquina cuspiu um cone luminoso que desenhava um enigmático quadrado no muro do coronel.
Zezinho ,então, conferindo, mais uma vez a platéia, em busca de possíveis penetras e dos xexeiros de praxe, anunciou o início do espetáculo. Adaptou o primeiro rolo do longa-metragem na parte superior do projetor e, tomando um porrete, deu duas pancadas no poste mais próximo. Era a senha! Imediatamente um menino com símia habilidade, trepou-se e afrouxou a lâmpada que pendia lá em cima, provendo a necessária escuridão para o início da sessão. De repente, o primeiro espanto : ali defronte a imagem mágica do milagre: pessoas andando e falando normalmente, numa cidade bonita e totalmente estranha: repleta de edifícios enormes, pontes e a onírica visão do mar. A platéia atônita e encantada , sequer seguia o enredo , a história do filme, despertava, apenas, periodicamente, quando terminava o rolo e Zezinho, maquinalmente, batia com o porrete no poste e o menino contratado subia e arrochava a lâmpada, o cinegrafista, então, agora no claro, trocava o rolo pelo subsequente e batia novamente no poste, para que o garoto subisse novamente e folgasse a lâmpada, trazendo de volta a penumbra necessária para a continuidade da sessão. Aquela estripulia do garoto iria se repetir por nove vezes, que era, em suma a quantidade de rolos para que se contasse todo o enredo.
Por volta do sexto rolo e 12º exercício de alpinismo do ajudante de projeção, a platéia teve o primeiro choque quando a Genoveva da estória, uma pacata mocinha vinda do interior, sapecou um beijo desses de desentalar engasgado com osso de peixe , na boca de um rapazinho que passava na rua. Começaram então a desconfiar que aquilo não era filme sacro coisíssima nenhuma, o que confirmaram na primeira cena de nudez da protagonista já no sétimo rolo. No oitavo, então, deu-se a tragédia: os cinéfilos perceberam que "A Casa da Luz Vermelha", onde Genoveva morava, não tinha nada a ver com o óleo do Santíssimo e que a ela era sim uma deslavada puta, cujo milagre (que dera nome ao filme) era tornar rijos os membros mais flácidos, antes do advento do viagra.O cinematógrafo parou de projetar já no primeiro tiro desferido pela honrada pistola da guarda nacional do Cel. Filomeno. O resto do massacre foi providenciado pelas densas cadeiras de Bodocó dos circunstantes que pulverizaram a Kombi , enquanto alguns ateavam fogo nos rolos desarvergonhados que tentaram denegrir a sacrossanta imagem da imaculada Santa Genoveva. Zezinho agora sem cinematógrafo, escapara por pouco, num pernas-prá-que-vos-quero inesquecível, enquanto pensava, com cara de Giovanno Bruno, na fogueira::
--- Como é duro ser pioneiro! É nisso que dar tentar trazer tecnologia para o cu do mundo!
J. Flávio
(Capiongo com a partida de Antonnioni e Bergman)
Tem gente que morre e fica! Quero morrer antes de ti, embora saiba que tu ficarás...Como Antonioni,Bergman,e o povo que desaparece da Terra, e vai fazer arte, noutras paradas!
ResponderExcluirFique capionga não! Vamos tomar PROSAC de todas as coisas que ficaram !