Se fosse assim apenas um traço de juventude a história não se moveria. Os mitos seriam os mesmo e dos céus, assim como das dobras do relevo, nenhuma nova divindade sugeriria. Não se entristeçam, velhos companheiros, seus mitos são inigualáveis. Não há motivos, juventude amiga, para que teus mitos, distintos e próprios, também não prevaleçam. A criação dos nossos mitos cursa como é o movimento geral de todas as coisas conhecidas, desconhecidas e por conhecer.
Como a Praça Siqueira Campos. Um mito eterno gerado numa determinada era do século XX. Quando eles usavam chapéus e terno de linho branco, bigodes finos com Clark Gable ou Robert Taylor. Elas com as saias plissadas e rodadas, blusas de tecido fino, cabelos arrumados em ondas, trunfas ou repartidos ao meio. Falo de uma geração após as melindrosas, falo delas como Ava Garden, Susan Hayworth. As palmeiras e pés de benjamins lá já haviam nascido e o Cine Cassino apresentava os cartazes da noite.
A praça era parada de crianças ao dia, trânsito no centro da cidade, mas na noite é que se realizava como mito. Um mito de adultos e jovens. As crianças não pertenciam às luzes artificiais das sombras noturnas. O mito só lhes seria revelado anos após. Quando toda a homeostasia de seu corpo já não fosse a mesma com a qual nascera. A praça só apresentaria seus mistérios luminosos quando todas as relações de espaço, tempo e iniciativa adquirissem novos significados e impostos significantes.
Só quando as canções românticas reverberaram como primavera, e não mais como aquelas desventuras incompreensíveis, a praça Siqueira Campos passou a ter outra constelação de assentimentos. Antes tivera que se aprovar na Admissão ao Ginásio e no seu segundo ano, como um rito de passagem subir seu degrau de meio fio da rua como se pela primeira. Tudo tão diferente daquelas atravessadas rápidas entre a porta do cinema e a porta do veículo até a casa. Naquela noite entronizou-se no salão jamais pensado, mas de algum tempo atrás já sentido.
O mito da Siqueira Campos lhe veio como tudo que é na vida, com a matéria com a qual a própria se faz. Tereza Abath. Colega da minha irmã, menina com a qual brincara e me igualara nos quantus de todas as crianças. Então por trás do que era o mesmo já era uma outra coisa, tão diferente como o é o céu e a terra, o fogo e a água. O primeiro efeito do mito foi pregar meu olhar no dela e desta liga descarregar relâmpagos e trovoadas de corpo abaixo e do chão até a cabeça tonta e desorientada.
As meninas giravam e os rapazes esperavam. A eles a iniciativa de formular um discurso de convencimento e fazer com que elas parassem de girar no ângulo ancho da praça e viesse para o estreito do rodopio a dois. Como lamentei jamais ter formulado aquele discurso, mas sei que ela e o tempo perdoam os noviços dos mitos vivos. Mas não lamentei a quantidade de vezes que desviei, desnecessariamente, o percurso da camionete pela Pedro II só para passar na frente das janelas, mesmo que fechadas, de Suely.
A Praça Siqueira é um mito que impõe. Não se tem vantagem ou desvantagem por tal. Apenas acontece.
Amigo Zé do Vale,
ResponderExcluirTomei a liberdade de "surrupiar" seu fabuloso texto sobre a praça Siqueira Campos, para postar lá no Blog do Crato, a fim de que mesmo o "povão" no boteco possa Lê-lo e apreciá-lo. Na esperança que o amigo, autor, não se incomode.
Um grande abraço,
Dihelson Mendonça
Dihelson: somos um coletivo em que nosso coemço e fim não tem limites.
ResponderExcluirAbraços
grande texto
ResponderExcluirbelas memórias
abraço
Entrei no túnel do passado , que o Cariricult construiu. É uma brincadeira deliciosa !
ResponderExcluirAs pessoas passam , os carros viram sucata , e a praça fica !
Parabéns pelo texto !
A gente fica querendo mais ...
Abraços.