quarta-feira, 7 de maio de 2008


A NEGAÇÃO DOS RENEGADOS

Os travestis que investiram no futuro de Ronaldo Fenômeno deram de ré. Negaram o sexo burlesco. Negaram a transgressão torpe das drogas. Traíram a confiança de parte significativa da imprensa, que, abandonada, reclama sorrateiramente seus direitos ao pé do altar. Parte do folhetim foi rasgada em público, numa delegacia obscura, sem cerimônia ou aparatos teológicos da consumação do pecado, mas com doses ambíguas de arrependimento. A ambigüidade é propriedade deles, mas não o livre arbítrio de retornar dos infernos, feito um Dante taciturno. Eles não podiam fazer isso, eles não tinham o direito de dizimar o escárnio público de uma celebridade tão doce, tão inocente, tão sem classe e tradição como é Ronaldo, o Fenômeno.

E agora? Como é que fica o direito sagrado dos moralistas execrarem os decadentes da carne? O que fazer com as peças de acusação dos advogados idôneos que freqüentam ambientes chiques e são limpos em seus atos corruptos, mas que morrem de inveja de Ronaldo, que não estudou e nunca comprou uma monografia sequer para se formar, mas que ganha absurdamente mais do que qualquer profissional liberal? Agora os professores não poderão mais usar o caso em sala de aula, apontando com seus dedos rígidos de socialismos mumificados as anomalias e monstruosidades do capitalismo selvagem. Momentaneamente eles tiveram as camisinhas furadas em pleno vôo de procriação dos mitos deterministas. Os políticos mais desatentos acabaram anulando o conselho aos asseclas de que o crime compensa. De fato, esse arrependimento não era esperado, é para isso que servem os laranjas. Com o recuo dos travestis, que é um fenômeno para trás, foram desfeitos os planos futuros da justiça brasileira em fazer um bazar com as peças íntimas dos quatro - sem trocadilhos - usadas na ocasião do delito, tal qual fizeram com as cuecas do narcotraficante boliviano. O ato impensado dos travestis causou comoção até entre os cretinos que operam tanto para a vergonha e derrota dos outros acontecerem de forma escandalosa. Os médicos de quinta categoria, formados nas espeluncas educacionais do Brasil privatizado, coitados, não poderão mais exibir o perfil ninfomaníaco de Ronaldo, perfeitamente diagnosticado à distância, on line, através de lap tops poderosos e irracionais. É o caos da moral pública. É o fedor inconfundível da impunidade. Estamos sós, paralisados sob as patas dos cavalos dos cavaleiros do apocalipse. Agora, eles, os travestis, que sempre foram transgressores da natureza e da moral, devem ir para a cadeia, por não assumirem o papel de carrascos da escória.

Depois dessa atitude inescrupulosa dos travestis de reconhecerem a mentira e o dolo, os comerciais dos programas do horário nobre da vedete tv brasileira ganharam outro contorno, ficaram mais longos, chatos, sem a inteligência sagaz de vender a quem não quer comprar. Assim, com a verdade vindo à tona, a ternura asmática dos delatores será desbaratada. Assim a poesia lírica, confessional, dos poetas fajutos que decoram os nichos alternativos com seus semblantes enfumaçados perderá o clamor canastrão desse insofismável apelo existencial. Assim a fúria dos bêbados que batem em suas mulheres será multiplicada. Assim a canalhice dos chefes das grandes empresas será contaminada pela injúria dos drogados engravatados que combatem o crime organizado. Assim as prostitutas vencem e o cabaré nacional corre o sério risco de ser bem administrado.

Marcos Leonel

5 comentários:

  1. "A verdade vindo à tona"? Isso é uma ironia? O texto é um manifesto em defesa da inocência de Ronaldo?
    A imprensa não tem capacidade de questionar o "desmentido" dos travestis?
    O problema não é Ronaldo gostar de sair com travestis e sim ele não ter coragem de assumir essa sua preferência.O resto é delírio paranóico.

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  2. ronaldo e os travestis são apenas pretextos, o texto em si ironiza o falso moralismo, não tem defesa nenhuma de inocência nenhuma, nem minha e nem sua, essa é a falência metafórica dos próprios princípios éticos de uma sociedade que pára em busca de fofocas. O delírio paranóico é a falta de discernimento da realidade, é a falta de referenciais em meio a tanta banalidades.

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  3. A ambigüidade do texto (poético? referencial?)deixa margem à várias
    leituras. A sociedade das celebridades/fofocas é realmente triste e pobre, concordo com você e com a torcida do Ferroviário. E Ronaldinho que vá pra... onde ele quiser.
    um abraço.

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  4. Maurício a intenção é essa mesma, dar margem a várias leituras, o que eu disse no meu comentário anterior é apenas o que eu tive a intenção de escrever e delirar, na realidade essa é uma crônica sobre um fato pitoresco, sem intenção de explicar nada.
    Agradeço a sua atenção, seus comentários sempre serão bem vindos, quer você concorde ou não com o texto.
    abraços

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  5. A bronca foi a grana, os viados queriam cinquenta paus, o cara só tinha três nas mãos, paciência. kkkk.

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