terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Sobre a morbidez dos boleros

As pessoas fazem guerras. Usam das armas que doem tal e qual a química escrota dos judeus. E nos sorriem como se estivéssemos loucos e sem a razão de enlouquecermos numa noite úmida, de copos arremessados, de cigarros fumados pela metade, de quartos abafados e escuros. De mentiras sucessivas.

As pessoas fazem guerras. Sujas. E nos encaram numa tarde comum, de vento suave e toalhas recolhidas das janelas - enquanto crianças brincam na areia do parque – para nos dizer que estão no comando, enquanto nos privam da essência da vida. São essas pessoas que nos perguntam o porquê da lágrima no olho. O porquê da vontade de esmurrar paredes alheias. Nos questionam o real motivo de não nos ajoelharmos para pedir um perdão impossível. E se irritam quando mantemos a altivez no rosto, o mesmo e impassível jeitão de driblar as velhas dores.

Elas nos falam que escolhemos assim. Decerto, temos o poder radiante da escolha.

Resisto. Prefiro ver a luminosidade difusa do final da tarde cobrindo as paredes sujas dos prédios. Mantenho a escolha de ser alguém que, em dias fodidos, pode se elevar do chão e, mesmo chorando, dizer que o verso resiste. Que a vida resiste às velhas e idiotas certezas enfiadas pelo cu. Prefiro o ruído, o barulho, a ensurdecedora canção da vida – e elas não entendem e nos privam das coisas, nos atingem o estômago, enquanto confabulam com outras pessoas que só querem nos ver num take final com os joelhos colados ao chão.

A meu favor uma reza sem lógica. Incerta e sem a métrica necessária para ser aceito nas salas de jantar cheias de móveis ridículos e escuros. O mesmo lugar onde há pouco nos riam indulgentes, nos aceitando prum café rápido e nos calando a voz quando trovões desabavam bem em frente à janela. Nas noites quando a vontade mais certa era morrer, e ressurgir faiscando pelos olhos para fugir e levar alguém que herdou nosso olhar e nossa doce selvageria interior.

As coisas passam. Crianças irão crescer. Mulheres irão nos por em xeque. Pessoas irão nos lançar em fogueiras supostamente santas – ao redor dessas, os seus familiares em trajes formais irão brindar silenciosos nossa derrota, e vão torcer para que nossas almas sejam salvas, enquanto bocejam a certeza do dia seguinte, com as contas pagas e a mesma velocidade arrastada de mórbidos boleros.

Mas quem lhes disse que nossa alma precisa de salvação? Quem lhes disse que não temos mais a força necessária para atravessar essas tardes, onde tudo parece triste e nosso fim espreita as portas e janelas de nossas casas?

Foi uma escolha. Temos a opção da vida. Da intensa e infalível fortaleza que nos mantém de pé. Nossos castelos estão firmes. E se mantém festivos em seu interior.

Nenhum comentário:

Postar um comentário