sexta-feira, 3 de abril de 2009

O soviete do G-20?

Existem frases que parecem presídio. São feitas para aprisionar, como esta atribuída a Winston Churchill (político direitista inglês): a democracia é o pior dos regimes, à exceção de todos os outros. Aliás, o inglês era tido por suas frases de efeito, muito bem forjadas para uso na Câmara dos Lordes. O efeito era tão somente para calar os adversários intramuros, mas claro não calava a barriga dos operários nas ruas. E, portanto, a frase precisa migrar dos chistes acompanhados de chá para o picles do dia-a-dia do mundo real. Eis que a democracia de Churchill é esta mesma do mundo liberal, do livre comércio, do livre acúmulo e dos fluxos através dos tempos pela única racionalidade do “agente” econômico.

Ontem o G-20 não se transformou numa espécie de soviete revolucionando o capitalismo. Mas de qualquer modo expôs grandes contradições dele, especialmente em alguns itens: a) o ganho desenfreado dos executivos das grandes empresas; b) o manto “suíço” para esconder o excesso legal e ilegal de acúmulo de capitais; c) o laissez-faire do sistema financeiro mundial; d) a liberdade neoliberal da especulação através de fundos financeiros e por isso mesmo denominados fundos altamente especulativos; e) proteção de seus negócios enquanto queria-se a porteira aberta do concorrente; f) suspeição de uso estratégico das instituições financeiras multilaterais para uso dos países centrais.

O capitalismo começou a ser reformulado, neste ano de 2009, através da “racionalidade” dos agentes políticos. Se alguém nasceu dos anos 80 para cá, está terminando sua pós-graduação em algum assunto de economia, comece a reformular seus “paradigmas” como se diz na academia. Se for desta geração e vive lendo os manuais, blogs e textos do neoliberalismo leia outras fontes. Na verdade considere que a “irracionalidade” da desregulação ampla, geral e irrestrita, se encontra na matriz desta reforma, sob a ação de uma crise especial do capitalismo. Considere que tudo isso ainda se encontra em suspenso e que na verdade muito ainda se desconhece dos cenários da economia mundial no futuro próximo.

Para referência. O capitalismo atingiu praticamente toda a extensão da cultura mundial: desde a cova em que se deposita o milho até um quadro de Leonardo da Vinci recém descoberto no sul da Itália. A complexidade desta arquitetura global é de tal monta que o capitalismo já é quase um organismo vivo, que depende constantemente de oxigênio, água e alimentos. Por isso mesmo não é incomum que forças livres no seu interior tendam a ser fagocitadas e que o acúmulo de neoplasias geram tumores que enfraquecem o organismo. É nesta natureza quase orgânica que o capitalismo se expõe como algo de tempo: nasce, cresce e morre.

Retornando à frase do Churchill. De fato o político, até pela fé política, errou redondamente. Como poderia se tornar uma democracia um regime de donos. Nunca seria uma democracia na acepção da matriz da palavra um regime de oligarcas, com meia dúzia controlando os órgãos vitais do regime. O primeiro delas é a absurda concentração de renda em menos de 5% da população mundial que passou a dirigir todo o planeta globalizado. Um pequeno grupo de onipotentes, oniscientes que funcionava como o coração do regime: irrigando certas áreas e desabastecendo outras. Desviaram toda a produção científica para a agenda dos seus negócios, toda a produção cultural para os lucros como parâmetro único, subsidiaram os amigáveis de sempre e condenaram os inimigos históricos. É esta matriz antidemocrática que ainda sobrevive apesar do G-20, mas não das ruas em que o pau come e governos cairão.

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