segunda-feira, 8 de junho de 2009

Por Que Gritamos?

Por Que Gritamos?

Meditando a Palavra Vera Cristina Weissheimer

Certa tarde, caminhando pelo bairro onde moro, com tristeza fui me despedindo das casas antigas que estão sendo demolidas e transformadas em escombros para dar lugar a prédios enormes. Nesses modernos edifícios já não haverá mais espaço para jardins com romãs, jabuticabeiras e trepadeiras floridas emoldurando o portão de entrada. Haverá um canteiro de grama e, se não for artificial, será proibido pisar. Que graça tem, não pisar na grama e não poder sentir aquelas cócegas no pé?

Parei em um pequeno café para tomar um capuccino e percebi que havia uma criança gritando com a mãe, que por sua vez gritava ainda mais alto com um adolescente, pelo que pude perceber era o filho mais velho que, ao chegar no carro, gritou com o pai.



Mas minha alma se aquietou quando ao meu lado sentou um casal de idosos que falavam baixinho e devagar, bebericavam sem pressa se deliciando com a espuma do café cremoso que só tem naquela esquina. Depois, reparei num casal jovem cujas palavras eram sussurros no ouvido um do outro.



Porque gritamos tanto uns com os outros se podemos falar, assim, devagar e com tanto carinho? Gritamos quando estamos aborrecidos. Gritamos porque perdemos a calma ou quando já não sabemos mais o que dizer. Mas por que gritar quando a outra pessoa está ali ao nosso lado?

O fato é que, quando duas pessoas estão magoadas, seus corações se afastam demais. Para cobrir esta distância precisam gritar para poderem escutar-se mutuamente. Quanto maior o aborrecimento ou a mágoa mais alto temos que gritar para ouvir um ao outro.



Por outro lado, quando amamos não gritamos. Falamos baixinho. E por quê? Porque nossos corações estão muito mais perto. Às vezes estamos tão próximos do coração do outro, que nem precisamos falar, somente sussurramos. E, quando o amor é mais intenso, não necessitamos sequer sussurrar, apenas um olhar basta. Os corações passam a se entender.

Antes de um problema ser grande ele é ainda um probleminha. Como poetiza Paulo Liminski: "Os problemas têm família grande, e aos domingos saem todos a passear. O problema, sua senhora e outros pequenos probleminhas."



Os problemas começam a se multiplicar quando as pessoas não conseguem mais conversar, quando já não tem mais o que dizer um ao outro. Então, se machucam até seus corações se afastarem tanto, mas tanto, que chegará o dia em que a distância será tamanha que não mais haverá possibilidade de voltar, por que no meio caminho haverá uma ponte quebrada.

Gostaríamos de ver nossos problemas resolvidos por decreto. Definitivamente não há decreto que resolva o que o coração quebrou. Às vezes há um retorno nessa estrada em que ambos sabotaram a ponte que os unia, acreditavam que estariam sabotando para o outro e, na verdade ambos ficaram parados em lados opostos do abismo enquanto empurravam a ponte ribanceira a baixo. Perdoar é reconstruir essa ponte. Talvez em outro lugar e de outra forma. Não conseguir perdoar é quebrar definitivamente a ponte sobre a qual se pode passar para reencontrar o outro. E, como diz, Jacques Derrida: "Só existe perdão, se existe, onde existe o imperdoável."



Reconstruir a ponte é resgatar o futuro. Porque o perdão ao acontecer é capaz de remover o peso morto do passado e devolver a vida. Muitas das vezes, antes de tentarmos começar qualquer construção de ponte em direção ao outro é preciso desobstruir os próprios ouvidos para novamente conseguir ouvir sem que o outro tenha que gritar. E diminuir os decibéis da própria voz para que o outro tenha vontade de desobstruir os seus.

Restaurar algumas pontes em nós mesmos – perdoar a si mesmo – ajuda a descobrir quem realmente somos e o que queremos. Os machucados que causamos a nós mesmos precisam ser perdoados para conseguirmos continuar nossa caminhada em busca do material para a restauração de outras pontes.


DEYSE ARAGÃO DE RANGEL MOREIRA

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