quarta-feira, 24 de junho de 2009

URCA: discurso e debate sobre a relação da economia com a ecologia, a respeito da possibilidade de exploração de hidrocarbonetos no Cariri

Por - Reno Feitosa Gondin
Coordenador do Curso de Direito da URCA

Nesta última sexta-feira (19/06) deflagrou-se no salão de atos da URCA (no Crato), durante a palestra sobre o ‘Os Projetos de Desenvolvimento do Brasil – Energia e Petróleo no Cariri’, um dos mais meritórios debates a serem travados doravante na região do Cariri, e que insere o contexto regional na problemática globalizada, sem, contudo, desqualificá-la em favor de argumentos idealistas totalitários, de parte a parte (‘mezzo a mezzo’).

Desde então, com a intervenção do qualificado público ali presente, levou-se em conta o início da inserção do Cariri (a partir da URCA – onde se deu o debate) num dos mais importantes contextos temáticos da sociedade globalizada da atualidade, e cujo vértice se assenta no ainda cientificamente indeterminado conceito de ‘desenvolvimento sustentável’; no problema da oposição ‘economia-ecologia’ e na possível conversão do debate acadêmico em discurso mitológico.

Na síntese do que se discutiu, as posições ecologistas giraram em torno da necessidade de proteção do manancial aqüífero da região, e as posturas desenvolvimentistas na possibilidade de soerguimento da economia regional em favor da redução dos problemas socioeconômicos pelos quais se passa. Com efeito, posta a oposição, ambas as perspectivas se mostraram deficitárias nos elementos subjacentes do discurso e, portanto, na sua validade, em face dos três motivos acima identificados.

Em primeiro lugar, a oposição ecologistas se desenvolveu no contexto de um debate anacrônico, tipicamente escolástico medieval, ao impugnar, de súbito, as possibilidades de exploração petrolífera no Cariri. Desta feita, ao se ignorar que a primeira fase do projeto é a realização de estudos geológicos para a verificação da possibilidade petrolífera, findou-se por olvidar, de modo inadvertido, que em qualquer resultado probabilístico de sucesso do empreendimento, já se estará garantindo o sucesso na aquisição ou aprimoramento do conhecimento a respeito dos elementos e níveis do solo caririense. Essa postura destoa de modo inexorável com a ambiência do debate, haja vista o espaço acadêmico, e ademais, a partir da negação da ambiência e sua instituição, desqualifica o próprio discurso, o sujeito que o profere e a sua incapacidade de aquisição da validade que pretende.

Portanto, essa oposição inopinada resultou no encaminhamento da questão para o conflito escolástico superado na idade moderna pela formação do seu ‘paradigma epistemológico’, desde a necessidade galileana de experimentar ao procedimento dubitável cartesiano, de forma que nada deve conter o conhecimento, quanto menos uma hipótese apriorística desta monta.

No segundo aspecto, subjacente a ambos os pontos de vista levantados, mas em decorrência da primeira questão acima esposada, reside no predicado da própria relação de oposição, contaminando-os indistintamente. Admitida a relação de oposição entre economia e ecologia, deve-se ter em conta que esse liame não é lógico-formal, de modo que se opte por um extremo em detrimento do outro. Pressupondo a ambiência histórica do presente como critério de sincronicidade, não se pode escolher pela economia ou pela ecologia de modo exclusivista, decorrendo então a necessidade de consciência da impossibilidade de resposta conclusiva sobre a contradição em análise, portanto, nem o discurso ecologista nem o desenvolvimentista ex radice, são capazes de adquirir legitimação perante a sociedade atual. Não se apresentam condizente à dignidade e à consciência da Região, nem um Cariri ‘verde e pobre’, nem um Cariri ‘rico e cinza’.

Decorre desse contexto ainda que ambos os opositores partem de pré-concepções discursivas ‘sistemáticas’, ‘razão-de-ser’ apriorístico mas também de se mostrar aporético, já que não se trata de uma relação lógico-formal, mas sim de ‘contradição dialética’. Ora, uma vez que economia e ecologia não podem se anular, impondo-se a convivência e a concorrência da oposição na formação de uma resposta satisfatória à questão, qualquer discurso a respeito da possibilidade de exploração de petróleo na região do Cariri precisa pressupor no seio da sua estrutura o caráter de negação da negação, ao modo dialético. Portanto, aqui no Cariri, respeitando ademais o presente processo de formação da sua ‘visão-de-mundo’ autêntica, economia e ecologia devem completar-se na sua própria contradição, convivendo e formando os mesmos juízos hipotéticos a respeito da sua realidade.

Em síntese, os discursos levantados naquela noite sobre esses elementos não pecaram apenas na sua estrutura lógica, mas também no seu ‘modo-de-ser’ sistemático. Ora, do conflito entre a necessidade de preservação do manancial aqüífero e a possibilidade de exploração de petróleo, nenhuma solução sistemática pode ser tomada nesse momento iniciático da discussão. As soluções haverão de ser apontadas ao modo problemático (tópica), devendo-se avaliar cada caso singularmente, haja vista que envolve e depende, dentre outros elementos indeterminados, do avanço tecnológico que, num juízo hipotético, poderá permitir uma possível exploração de petróleo no entremeio do manancial aqüífero.

Subjaz no resultado do debate travado naquela noite do dia 19 último, o drama hodierno da possibilidade de reconciliação do homem com a natureza, da economia com a ecologia, e é magnificente que a região do Cariri esteja inserida nesse contexto, notadamente quando as condições para a formação de uma solução, autêntica e autóctone, estão postas na academia regional exortada a partir daquela noite na URCA, para exercer o seu papel institucional.

Por último, já no final do debate, emergiu, de súbito, um inconsistente murmúrio de pessimismo por parte do discurso ecologista, que deveria ter sido mais prudente. Toda atividade econômica pressupõe a assunção de um risco e, embora a prudência recomende a verificação de que as atividades econômicas da atualidade exijam a ocorrência de riscos colossais, muitas vezes irreversíveis, o pessimismo não pode convolar o próprio discurso ecológico numa mitologia. O que se viu ao final daquele debate foi o pessimismo como discurso mitológico, fundado na obliteração da reflexão em face do terror gerado pelos riscos que se apresentam ao tamanho do desafio. Ao estilo de Vico, o ecologismo deve ter consciência da origem ab terrorem do discurso mitológico.

Como considerações finais desta breve análise do debate naquela oportunidade, deve-se compreender que a questão está posta para a região do Cariri, e que a Academia tem um papel fundamental no desdobramento do problema proposto e da sua solução, que não existe desenvolvimento sem risco, e que ambos os discursos (ecológico e econômico) necessitam tomar consciência das suas implicações e importância.

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