quinta-feira, 9 de junho de 2011

Esquerda, direita e ideologia - José do Vale Pinheiro Feitosa

Para usar um termo da teoria dos conjuntos de Georg Cantor, matemático russo falecido em 1918, é comum se ouvir, inclusive entre nós aqui nos blogs que a questão de esquerda e direita em política é um conjunto vazio. Isso mesmo, não tem nenhum elemento.

Outra defesa é que a ideologia é um vício de espírito que tende a levar a pessoa para a irracionalidade. Isso representando que existe uma possibilidade de razão fora da ideologia em que a realidade do mundo, mesmo transformada pela compreensão individual, chegaria a uma espécie de denominador comum que seria a forma essencial de expressão da realidade.

Antes de andar nesta trilha peguemos uma variante do assunto. Não é incomum que perfis ideológicos conservadores usem destas afirmativas com a finalidade de negar o que entendem existir, mas precisam combater. Portanto a negação é a o outro, que, portanto, existe, mas precisa ser desnorteado com mágicas do não existir.

Retornando à trilha vamos encontrar a idéia (já estamos a falar da segunda afirmativa) de que o conjunto da separação política no mundo atual é vazio. Acontece que tal afirmativa é normal acontecer no calor das contradições políticas, no embates desta seara, já demonstrando que existem elementos no conjunto da política.

Em seguida é importante encontrar a matriz que cria os elementos do conjunto da separação política: esquerda e direita (claro que aí necessariamente surge um centro). A clivagem não poderia ser vazia, pois pertence a um conjunto maior: que são as classes sociais e o domínio de classes sobre a produção e distribuição econômica.

Para quem domina os meios econômicos, o discurso e o conjunto das idéias são no sentido de imobilizar movimentos, de conservar instituições, de manter o status quo social. Este é um perfil que não é xingamento, é historicamente marcado desde a revolução francesa e ainda hoje no parlamento americano.

A alternativa política aos conservadores (direita) é a ruptura do status quo e a redistribuição das riquezas produzidas, além, é claro, do controle dos meios de produção. A distribuição favorece as mudanças e, portanto ao progresso material e assim a um número maior de mudanças. Isso é a esquerda. A alternativa de centro é modular, reduzir a velocidade e os impactos do movimento. O centro não acredita em saltos qualitativos na história enquanto a direita e esquerda ambas sabem disso e têm a referência histórica das revoluções inglesa e americana, além, é claro, da revolução francesa.

A ideologia, em nome da qual tantas atrocidades foram e podem ser feitas, não implica em vícios de irracionalidade. Especialmente se as idéias estão sobre a forja da realidade. A realidade é transformadora das idéias. Todo projeto que se tenha uma vez posto em execução passa por obstáculos maiores ou menores para a sua realização e ao resolver os obstáculos, o projeto original já foi modificado.

Na verdade o que existe lá na origem dos dois primeiros parágrafos é o enrijecimento dos conceitos: esquerda e direita são clivagens da política e não um conjunto vazio e a ideologia tem duas dinâmicas possíveis: apresentar as idéias para a sociedade e submeter as idéias ao poder transformador da realidade.

Quanto mais as idéias ou teorias sobre realidade aceitarem a transformação pela realidade menos dogmáticas serão. Aí, sim, reside uma irracionalidade inerente: o dogma.


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