quinta-feira, 8 de março de 2012

Anni Settanta - José do Vale Pinheiro Feitosa

Não existe outra fórmula de testar coisas que podem ser apenas de nossa história pessoal ou da história geral da humanidade, que não aquela pela qual nos fazemos denominador comum. Quando o mundo se divide por nós ou quando invertemos a fração e nos dividimos pelo mundo. E vou usar esta canção que fez muito sucesso no Festival de San Remo em 1970. Ricchi e Poveri, um vocal formado por duas moças e dois rapazes, cantou Che sará.

Aí estou na última noite da minha vida na cidade interiorana em que nasci. Poucos conterrâneos sabem que nasci e me criei num sítio, nunca morei na cidade. Saí da zona rural diretamente para a capital do estado. E nesta noite simbólica, uns seis primos e mais alguns amigos, passamos no quintal de casa, sob pés de cajarana tocando violão e tomando algumas doses. Ali todos se despediam de um estilo de vida, de um mundo simples e uma era prestes a ser ultrapassada.

Por isso quando relembro a chegada à capital a tenho como a emergência de uma nova era. E por certo não foi apenas um rito de transição entre a adolescência e a vida adulta. Eram os anos dos grandes festivais de música aqui e em todos os países. Elvis, The Beatles entre tantos que chegaram ao primeiro plano formaram o grande palco desta transição, o grande e simbólico palco de uma nova era.

Do mercado global, das comunicações de massa, de uma linguagem cultural urbana e ao mesmo tempo universal. No Festival de San Remo o grupo vocal com o Che Sará dizia: Paese mio che stai sulla collina / disteso come un vecchio addormentato / la noia l'abbandono / niente son la tua malattia / paese mio ti lascio e vado via / che sarà che sarà che sarà / che sarà della mia vita chi lo sa / so far tutto o forse niente / da domani si vedrà / e sarà sarà quel che sara.

Abandonam seu lugar sobre uma colina. Lugar velho e adormecido. Abandonam o tédio e se deixam ir. E vão em frente. O que será da minha vida? O que será eu não sei, se faço tudo ou nada, amanhã se verá! O que será? O que será? Eis aí o nosso denominador comum: aqueles festivais eram a linguagem universal da última e grande migração em busca do palco geral da globalização. A diferença naquele momento é que havia um show via satélite ou vídeos reproduzindo para toda a humanidade o momento de ruptura de eras.

Na verdade a perda de um tempo e o achado de outro nunca foi uma sensação solitária. O disco, os grandes shows, os estádios lotados para assistir aos Beatles e a grande estrutura da produção mundial de tournées eram os ensaios do que seria o futuro e hoje o é. Agora mais banalizado, sem aquele olhar de esperança ou perplexidade, apenas um tédio que lentamente baixa nas câmaras solitárias cuja janela única de saída é a tela de computadores ou a televisão. Ambas se tornando cada vez mais a mesma coisa.

A propósito: o nome do vocal é Ricos e Pobres.

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