Querer-se livre é também querer livres os outros.
No finalzinho deste mês de março, há
um aniversário que não tem convidados e nem merece comemoração. Meio século do início da Ditadura Militar no
Brasil ! Faço parte de uma geração profundamente marcada pelo peso daqueles tempos
de chumbo. Estudantes e Sindicalistas caçados nas cidades e nos campos, como se fossem
animais selvagens. Tortura instalada, oficialmente, como instrumento de coerção
e obtenção de informações. Congresso fechado, eleições suspensas. Só existia
uma verdade única e indiscutível : aquela cuspida pelos coturnos dos governantes.
A censura se infiltrou em todas as formas de Arte e em todos os meios de
comunicação. Dedos-duros espalharam-se
por todos os recantos : escolas, universidades, trabalhos, ruas e qualquer
atitude considerada suspeita era motivo para denúncia, prisão e tortura. Mofava-se no cárcere sem
sequer saber de que se era acusado. Como
se costumava dizer na época , a partir de duas pessoas juntas, consideravam Concentração e se
sobrepassasse três : Passeata. Este período de choro e ranger de dentes durou
a eternidade de vinte e um anos. Mais de dois mil brasileiros, simplesmente,
morreram ou desapareceram como por encanto. Milhares foram detidos e torturados.
As
novas gerações que, felizmente, não tiveram que sobreviver entre as sombras,
não têm uma idéia cristalina dos tempos libertários que ora desfrutamos. Tudo
parece simples, natural, perfeitamente corriqueiro. Colhemos os frutos da
árvore da liberdade , sem nem perguntar quem plantou a semente, quem combateu
as pragas e quem regou a plantinha. Sua seiva nutriu-se do sangue que escorria dos
paus-de-arara e dos gritos sufocados nos porões dos DOI-CODI. Tive amigos
mortos e muitos presos neste período ,
lutavam por um mundo melhor para seus filhos e descendentes.
Para
nosso espanto, recentemente, alguns saudosistas destes tempos que ainda tentamos esquecer, tentaram reviver a famosa “Marcha
pela Família, com Deus e pela Liberdade” , acontecida em 19 de Março de 1964.
Esta Marcha criou o clima propício para o Golpe Militar que , desfazendo
completamente seu lema : destruiu famílias, ceifou a liberdade e se afastou de
Deus. Quatro gatos pingados, agora, em vários pontos do país ( no Ibirapuera
reuniram-se apenas seis pessoas e em Recife, sete) mostraram-se órfãos daqueles
tempos de exceção. Estamos em pleno exercício de uma ampla Democracia e, isto,
certamente, deixa com pruridos em alguns poucos que se beneficiaram das sombras
e do chumbo. Acostumados às regiões abissais , o brilho do sol lhes cega e
entontece. São pessoas que , dia a dia, se põem contra uma pretensa ditadura
cubana e venezuelana, mas que sonham ,quase orgasticamente, com o retorno do reino da chibata e do pau-de-arara
para o país.
O
Brasil , nestes trinta anos de Redemocratização, desenvolveu-se como nunca na sua história.
Temos um país forte no cenário internacional, mantemo-nos estáveis economicamente,
mesmo ante toda a crise do Capitalismo Mundial e minoramos chagas históricas
como Baixo Salário, Distribuição de Renda, Desemprego, Casa Própria, Analfabetismo,
Desnutrição e Mortalidade Infantis. Os desafios, claro, ainda são enormes, numa
Nação sugada por quase quatro séculos de Colonialismo. O caminho, porém,
difícil e tortuoso, já temos traçado e ele é todo pavimentado com os ladrilhos
da Liberdade e da Democracia.
Crato,
28/03/14
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