quinta-feira, 21 de agosto de 2008

DIVINDADE

Pense em algo onipotente, onipresente e onisciente. A fonte de todas as coisas. Aquilo que tanto se encontra no virtuoso quanto no canalha. A vontade que a alguns oferece tanto e a muitos tão pouco. Que aos desvalidos oferece esperança e aos escolhidos premia. Que mesmo na mais profunda solidão é companhia farta. Que ao poder legitima, ao infeliz regra, ao furto pune. Algo que cria, reproduz e torna perene a vulnerabilidade dos objetos em face do tempo e dos acidentes do espaço. Que pelo simples fato de se concentrar distribui ordem em escala, dada a possibilidade das desavenças por ambição. Algo que é o verbo, posto que a fonte de todos os movimentos e o pulso que expressa qualquer vontade. Aquilo que não é indiferente a nada e nada do que é humano se exprime fora dele. A força que aos homens e ás mulheres oferece os nacos do presente e, também, os diagramas de cartas de baralha ao futuro. Que a alguns lhes faz sacerdócio, a tantos cordeiro, ao cosmo órbitas de obediência. No final desta longa jornada, encontrarás a ele. Somente o único e indivisível.

Está claro. Tudo explicado. Sem dúvidas. Uma baga de canapu da planta que se desenvolveu junto á cerca de arame farpado. A trepadeira de melão-de-são-caetano, que tramou sobre o velho jirau do oitão da cozinha e expõe suas bagas enrugadas e alaranjadas, que se abrem como cápsulas comestíveis, enquanto expõe suas sementes vermelhas. O fruto rijo, negro e cilíndrico do jatobá e sua polpa farinácea e doce. O carrapicho que se agarra aos membros locomotores para que muito longe de sua nascença se torne a matriz de um outro igual. As pegadas de um animal descuidado, impressas no esterco ainda verde do curral. O espelho que mostra a borda do cacimbão desde o fundo sombrio que se enfurna de chão adentro até o lençol freático das águas subterrâneas. O carretel que pia seus metais desprovidos de graxa enquanto a lata sobe cheia em busca das células ressequidas que se manifesta como ameaça de sede.

Aquilo em que todas coisas cabem você sabe. É uma série de inteiros que se dividem em centos, que a tudo oferece valor de troca, mas é ele mesmo o verbo que universaliza a transação. A todos os contatos intermedeia. Em todas as línguas se manifesta, em cada lugar circula. Que formam reservas descomunais e esvai todas as vontades quando se ausenta. Que ao trabalhador notifica, ao feitor transmite ao senhor lhe faz devedor. Por ele as guerras começam, se sustentam e se acabam. Nele os corpos das crianças famintas, os canos de fogo do chumbo veloz dos adolescentes traficantes. Tanto a um ícone automobilística oferece quanto este se torna as grades que desgraçam a paz insustentável dos sinais fechados do trânsito. A maior idolatria, a mais universal, aquilo que se move por si mesma é sem dúvida o dinheiro. A moeda é o centro das intenções humanas e dos homens se libertou e a eles aprisiona. E aprisiona em classes e castas.

Um comentário:

  1. Um texto teosófico e teológico. Um soco , na cara do fraco; um sino , acordando a incompreensão do todo ...Caos repetitivo ... E nós , porque não saimos desse círculo ?
    Tua mente é ensolarada; teu coração as vezes ,me parece triste ... Se chegaste aqui, tens onipresença... Tuas falas teem onisciência ! Pensar e caminhar - teu ensinamento !
    A estrada não tem fim... mas tem limites !

    - Não preciso correr , mas tenho pressa !

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