quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

1º de janeiro de 2009 pelo mundo...

Top-top, Raúl











Cuba tem festa discreta no 50º aniversário da revolução
Comemorações são marcadas por filas para comprar carne e para obter cidadania espanhola Lourival Sant'Anna, HAVANA O Estado de S.Paulo
Fustigados pelas dificuldades econômicas, agravadas pela passagem de três furacões este ano, os cubanos se preparam sobriamente para as celebrações do ano-novo e do 50º aniversário da revolução socialista. As duas maiores novidades são o aparecimento de carne bovina nos açougues estatais e a concessão de nacionalidade espanhola aos filhos e netos de exilados da ditadura franquista.O governo argentino fez a Cuba uma doação de carne, que foi moída e distribuída aos açougues. Como os demais produtos subsidiados, a venda da carne é marcada na caderneta da família. Cada pessoa tem direito a meio quilo, a 5,25 pesos (US$ 0,26).
Segundo os cubanos, há pelo menos duas décadas não se via carne de boi nos açougues estatais. Tradicionalmente, os cubanos comem pernil na ceia de fim de ano. Mas aqueles que ainda não tinham comprado sua cota de carne bovina faziam filas ontem nos açougues. "Ninguém sabe quando vai ter carne de novo", disse o funcionário de um açougue em Havana Velha. E a durabilidade da carne é ameaçada porque, segundo o açougueiro, em 60% dos açougues a câmara de refrigeração não funciona, por falta de manutenção do governo.
O açougueiro disse que ele mesmo consertou a do açougue em que trabalha, da marca americana Fresco, anterior à revolução. Para poupá-la, ele a mantém ligada apenas das 13h às 16h, quando o calor aperta, e durante a noite. Nos supermercados estatais de moeda forte, 1 quilo de carne é vendido a proibitivos 9,50 CUCs, ou US$ 11,87.Muito maior que a dos açougues foi a fila em frente ao consulado espanhol, depois da aprovação da Lei de Memória. O Ministério das Relações Exteriores da Espanha estima que 100 mil cubanos tenham direito à nacionalidade espanhola, por essa nova lei.
Cerca de 3 milhões de cubanos vivem no exterior, e são a principal fonte de divisas do país. Com exceção dessas pequenas alegrias, as celebrações são marcadas pelo tom circunspecto do discurso do presidente Raúl Castro no encerramento dos trabalhos do Parlamento, no sábado. Raúl, que dirige o país desde julho de 2006 - quando seu irmão, Fidel, ficou doente, foi formalizado no cargo em fevereiro, e anunciou mais rigor no cumprimento das leis.Os cubanos comuns interpretam a mensagem prevendo mais repressão à economia informal, que irriga os orçamentos domésticos com CUCs, a moeda forte, que equivale a US$ 1,25 e a 25 pesos. Só com CUCs podem comprar o que não encontram nos armazéns estatais de moeda nacional.
Raúl anunciou ainda a eliminação dos estímulos dados aos trabalhadores em moeda forte - entre 10 e 20 CUCs (US$ 8 e US$ 16) - que alguns deles recebem além dos salários, que giram entre 200 e 600 pesos (US$ 10 e US$ 30).
Por causa do prejuízo causado pelo furacão, de US$ 10 bilhões, ou 20% do PIB cubano, não haverá desfile militar nem festa para lembrar o aniversário da Revolução. A data será lembrada com um discurso de Raúl, no dia 1º, em Santiago de Cuba, a leste da ilha, na sacada da prefeitura da cidade, de onde seu irmão Fidel anunciou a vitória da revolução, em 1959.

CaririCult, que Diabos é Isso ? TIROTEIO ??

Essa eu nunca tinha visto...
Um verdadeiro Tiroteio de mensagens contrastantes.
Uns Pro e outros Contra Che Guevara!

Carácolis!
Saída pela direita...............................zing..........................................>

Abraços,

Armando, Zé Flávio e Che Guevara!

Dihelson Mendonça

Che - Um olhar da Igreja Católica



Che Guevara 40 anos







Fui convidado pela direção nacional do MST para participar das comemorações internacionais do 40º aniversário do assassinato do Che Guevara em Valle Grande e La Higuera, no interior de Santa Cruz de la Sierra (Bolívia). Pediram-me para ser um dos coordenadores do ato ecumênico celebrado em La Higuera, lugar em que o Che foi assassinado. Viajei do Brasil com quinze pessoas, das quais alguns militantes do MST, coordenados pelo amigo João Pedro Stédile, companheiro de tantos anos de luta e fiel continuador da causa humanitária do Che, alguns jornalistas, um simpático casal de políticos populares (João Capiberibe, ex-governador do Amapá e ex-senador e sua esposa Janete, deputada federal), uma família de cantores da região misionera do Rio Grande do Sul, um monge zen-budista, Dom Tomas Balduíno e eu. (Não digo aqui o nome de cada um dos participantes, não porque cada um não seja importante, mas porque não pedi permissão para citá-los. Sei que os irmãos, cujos nomes revelei, não se incomodam com isso). A viagem foi muito cansativa e a estrada de terra tem trechos perigosos nas quebradas dos Andes. Em uma altitude que chega a 2000 metros, o sinuoso caminho se cola às montanhas, tendo do seu lado e sem proteção, abismos muito profundos. Tudo isso valeu a pena pela emoção que foi percorrer a mesma “ruta do Che”, ver os lugares por onde ele passou, dar-se conta da sua coragem e sacrifício em percorrer a pé ou de jipe uma região ainda hoje quase impenetrável e muito isolada do mundo e, principalmente, deixar-se inundar pelo mesmo amor à humanidade que o mobilizou para aquela luta quase louca e suicida. 1. Na “ruta do Che”Vallegrande é uma cidade perdida no vale que realmente é mais do que grande (enorme). Açoitada pelos ventos frios que vem dos contrafortes dos Andes, a cidade foi fundada pelos espanhóis no começo do século XVII e até hoje se mantém isolada entre caminhos de terra que desanimam qualquer viajante menos afoito. La Higuera, pequeno povoado de cem habitantes, sessenta quilômetros adiante, no meio das montanhas, é testemunha do local do seu martírio e guarda o Grupo Escolar onde ele foi preso e executado sumariamente. Hoje, esta casa é um museu comunal. Pessoas do lugar vivem de forma tão precária e sem recursos como na época do Che. Pelo que parece, o local só vê pessoas de fora uma vez ao ano, em outubro, no aniversario da morte do Che. As pessoas do local vêem então neste momento uma possibilidade de ganhar algum trocado. Esta situação ambígua pode ser percebida por qualquer um que chegue a La Higuera. Vários dos moradores contam o que os turistas querem ouvir. Mas, não parecem convencidos. Como o Comandante podia imaginar que sua presença nestas montanhas isoladas e quase intransponíveis iria suscitar nas cidades grupos de resistência à ditadura boliviana e assim incendiar o mundo com a revolução da justiça? O Che foi ignorado pelo povo ao qual queria libertar e traído pelo partido comunista boliviano ao qual ele queria revitalizar. Ele e o seu grupo foram abandonados na montanha e entregues aos militares bolivianos que, assessorados por norte-americanos da CIA, prenderam todos e os mataram, alguns em combate e outros, como o próprio Che, em um assassinato frio. Estivemos juntos (o nosso grupo) no memorial construído pelos cubanos sobre o fosso onde jogaram o seu corpo (ao lado do pequeno aeroporto de Vallegrande). Ali contemplamos as fotos dos companheiros caídos e descemos até o fosso onde foi depositado os corpos dos seis guerrilheiros (entre os quais o Che) e fizemos uma oração ecumênica curta, sóbria e comovente. Depois, fomos ao hospital (funciona até hoje como hospital) para onde os militares levaram o cadáver. Ali fomos à velha lavanderia onde há o tanque sobre o qual colocaram o corpo para lavar e o deixaram exposto à população. O tanque de pedra está, hoje, todo cheio de pequenas inscrições e recados com nomes de pessoas que saúdam o Che ou pedem a graça de reviver seu espírito, como os antigos cristãos sempre fizeram em um túmulo de um santo mártir. Naquele silêncio religioso, chorei de emoção e de tristeza por sinais contraditórios que percebi.2. Uma confissão para mim dolorosaDescobri que a memória do Che aquece de esperança transformadora grupos de todo o mundo e serve de apelo a todos os que são tocados pela confiança no futuro da humanidade. Em La Higuera, vimos e reunimos dezenas de jovens que vieram de vários paises do continente latino-americano e da Europa para homenagear o comandante e dizer seu desejo de mudar o mundo. Entretanto, tudo isso parecia ainda muito frágil. Basta percorrer a região, como, mesmo muito rapidamente, nós o fizemos de micro-ônibus e parando em certos locais simbólicos, para perceber que a miséria e o abandono do povo continua igual ou pior. Os pobres estão mais pobres e os lavradores mais abandonados no campo vazio e sem perspectivas, ao menos aparentes. Cada vez que, em meio aquelas imensas montanhas de pedra e areia, avistávamos uma casinha de lavrador ou umas poucas vacas magérrimas pastando terra (não se vê capim), nos perguntávamos como alguém pode viver ali. Sobreviver de que? Como criar filhos, como ter o necessário indispensável à vida? A população de traços indígenas nos olha como estrangeiros que vêem alguma coisa que eles mesmos não vêem e não parecem crer. Por motivos de segurança do grupo e para não expor a vida do próprio povo, o Che não podia ter muitos contatos, nem criar laços com o povo do lugar. Até hoje, estes laços não parecem existir. Em Vallegrande e La Higuera, a memória do Che continua sendo um fato incômodo e pouco assimilado pelas pessoas. A mulher de La Higuera que aceitou dar um testemunho pessoal no ato ecumênico só falou do seu medo. “Na época eu vivia aqui, tinha 17 anos e vi quando trouxeram os guerrilheiros para cá e ouvi os tiros. Todos nós só tínhamos muito medo e queríamos fugir daqui. Só!”. Em Vallegrande, um jornalista amigo descobriu um único brasileiro na cidade. É pastor de uma Igreja pentecostal que veio do Brasil para converter os bolivianos ao Cristo. Pessoalmente, está bem de vida e quando lhe perguntam sobre o Che o julga um pecador iníquo que mereceu a condenação divina. Não é uma opinião isolada já que o prefeito da cidade pretendia impedir a reunião marcada por entidades internacionais e pela Fundação Che Guevara. Dizem que, no sábado, chegou a cortar a luz da cidade para esvaziar um encontro marcado dos amigos e admiradores do Che. Mesmo o povo pobre usa cartazes e recordações turísticas com a imagem do Che para ganhar dinheiro, mas poucos se identificam com a sua causa ou manifestam por ele qualquer admiração. A propaganda, até há pouco tempo, oficial lhes ensinou que ele era um estrangeiro que veio a Bolívia matar jovens bolivianos. Entretanto, devo confessar que, mesmo as organizações que, hoje, se referem à memória inspiradora do Che e se reuniram neste aniversário, não me pareceram primar pela justa articulação e pela clareza da comunicação com todos os companheiros e pessoas envolvidas na comemoração. Desde o começo, as informações me pareceram meio truncadas e até às vezes desencontradas. Isso me pareceu dificultar e até enfraquecer a dimensão profética da comemoração social e política ali ocorrida. Lamentei ter perdido muita coisa por não ter conseguido chegar em tempo e por falta desta articulação e informação mais correta. Posso estar enganado, mas senti como se nosso compromisso com a causa do Che não fosse ainda suficientemente forte e clara para nos tornar capazes de nos organizar melhor e de forma mais articulada. Tudo me pareceu (posso estar enganado) meio dispersivo e algumas coisas improvizadas. Com toda a admiração que tenho pelo presidente Evo Morales, não me parece justo que pelo fato dele ter antecipado sua vinda e seu discurso em Vallegrande, o encontro tenha sido esvaziado e, depois da fala do presidente, as pessoas tenham se dispersado. O que diria disso o Che? 3. Sinais de esperança nas canções de amorParece que o festival artístico, à noite do 08, em uma das praças principais de Vallegrande foi concorrido e coroado de êxito. Alguém me disse que o público calculado era mais de duas mil pessoas. Ali se apresentaram cantores/as de diversos países e o teor artístico era dos melhores. O Brasil foi muito bem representado pela apresentação da família Guedes, pai e filhos da região misionera do Rio Grande do Sul. Podemos dizer que a união com o povo que, segundo parece, o encontro de reflexão social e política não conseguiu manifestar tanto, o festival de canções pareceu ter alcançado. Houve momentos que pareciam profundamente comovedores. Esta noite de canções latino-americanas, expressões da resistência de nossos povos acabou servindo como uma espécie de vigília do ato ecumênico que os brasileiros coordenaram na manhã do 09 em La Higuera, em meio à viagem dura e arriscada pelas montanhas e vales da região. Naquela manhã, de certa forma, éramos poucas pessoas. Muitos dos companheiros já tinham passado por La Higuera nos dias anteriores e principalmente na véspera, dia imortalizado como data da queda do Che. O ato ecumênico começou diante da sua estátua, erguida no meio do povoado. Ali, nos apresentamos uns aos outros, pessoas de diversas origens e pertenças. Ali, renovamos nosso amor à Mãe Terra, nosso desejo de atualizar o compromisso do Che e doar a vida pela transformação do mundo. Fomos em caminhada até a frente do Museu Comunal, local que há 40 anos era um grupo escolar em cuja sala o Che foi assassinado. Ali, ajudados pela família de cantores brasileiros do sul e por outro companheiro do MST que canta muito bem, entoamos canções de esperança, relemos um trecho do diário do Che, recitamos um poema e até oramos em um momento de meditação budista. O companheiro monge zen-budista recordou a luta não violenta dos monges de Myammar pela libertação do seu povo e reafirmou a dimensão espiritual da luta pela transformação do mundo. O bispo anglicano falou que o Che foi evangélico não pela doutrina ou pela confissão de fé, mas pelo amor revolucionário com o qual deu sua vida. João Pedro Stédile expressou: o tiro que quis calar o Che não só não acabou com sua causa, mas, ao contrário, serviu para propagar sua mensagem de inconformidade com a injustiça e sua confiança revolucionária na libertação da humanidade. 3. A herança atual do CheHá 40 anos, o Che foi apresentado ao mundo como um guerrilheiro fracassado, pobre e despojado. Não poucas pessoas o compararam com o Cristo morto na cruz. De fato, não era apenas o seu rosto e sua figura massacrada pela repressão imperial que lembrava o Cristo. Foi o gesto de dar a vida pelo povo e a sensação de fracasso de sua causa. Hoje ainda, senti este sabor estranho de uma causa que continua viva mas, ao mesmo tempo, parecendo extremamente frágil e quase como se fosse irreal e sem força. Entretanto, como a cruz de Jesus, esta doação do Che tem um apelo de vida e de vitória que não podemos negar. Não pude ir à marcha intercontinental de povos indígenas que, nestes dias, se aproxima de La Paz e quer celebrar o aniversário de 12 de outubro (da chegada dos colonizadores na Abya Iala) com manifestações de uma nova organização dos povos indígenas. O Che deve ficar contente no céu por este fruto de sua luta. Ao voltar ao Brasil, escutei um companheiro que me disse rejeitar o Che porque ele seria símbolo de violência como força redentora da história. Considero esta posição falsa e expressão de um dogmatismo rígido, já que as condições históricas da época do Che eram diferentes das atuais. Hoje, a maioria dos que lutam pela mesma causa concorda que o método guerrilheiro e principalmente a luta foquista não servem como métodos atuais para a libertação. Entretanto, o direito da insurreição dos oprimidos e mesmo da luta armada como opção justa são reconhecidos em casos extremos pela própria tradição cristã e por documentos romanos. Ora, esta era a leitura da realidade que o Che fazia sobre a América Latina e o mundo dos anos 60. Comprometi-me comigo mesmo a aprofundar a dimensão espiritual da figura e da mensagem do Che Guevara. Estou convencido de que ele, em não se declarar religioso, foi mais espiritual do que se tivesse sido adepto de alguma religião. Sua dimensão evangélica se manifesta na universalidade de sua doação pela humanidade. Um poema do Che, que eu não conhecia, mostra isso. É uma oração que eu cito aqui, para concluir este meu testemunho, porque, nestes versos, o Che se inspira no Cristo pelo seu amor e doação pelos homens. O Che reverencia com seu amor até aquele que a tradição cristã considera o mau ladrão. O título é: “Poema para Cristo”. Diz assim: “Cristo, te amo. Não porque desceste de uma estrela, mas porque me revelaste que o homem tem lágrimas e angústias e chaves para abrir as portas fechadas da luz. Sim, tu me ensinaste que o homem é Deus, um pobre Deus crucificado como tu. E aquele que está à tua esquerda no Gólgota, o mau ladrão, também é um deus. Cristo, te amo”. (Che Guevara, Nandahuauzu, Bolívia, outubro de 1967). É este espírito que quero partilhar com vocês e no qual quero continuar minha missão e junto com vocês. Hasta la Victoria! Siempre! Como nos estimulava o Che a gritar e esperar.




Padre Marcelo Barros


É Beneditino, pernambucano, tendo trabalhado por 08 anos


com D. Dom Helder Câmara, autor de inúmeros livros. Hoje


mora em um Mosteiro em Goiás Velho onde o visitei em 2005.




"Che":Há quarenta anos morria o homem e nascia a farsa


"Não disparem. Sou Che. Valho mais vivo do que morto." Há quarenta anos, no dia 8 de outubro de 1967, essa frase foi gritada por um guerrilheiro maltrapilho e sujo metido em uma grota nos confins da Bolívia. Nunca mais foi lembrada. Seu esquecimento deve-se ao fato de que o pedido de misericórdia, o apelo desesperado pela própria vida e o reconhecimento sem disfarce da derrota não combinam com a aura mitológica criada em torno de tudo o que se refere à vida e à morte de Ernesto Guevara Lynch de la Serna, argentino de Rosário, o Che, que antes, para os companheiros, era apenas "el chancho", o porco, porque não gostava de banho e "tinha cheiro de rim fervido".

Essa é a realidade esquecida. No mito, sempre lembrado, ecoam as palavras ditas ao tenente boliviano Mário Terán, encarregado de sua execução, e que parecia hesitar em apertar o gatilho: "Você vai matar um homem". Essas, sim, servem de corolário perfeito a um guerreiro disposto ao sacrifício em nome de ideais que valem mais que a própria vida. Ambas as frases foram relatadas por várias testemunhas e meticulosamente anotadas pelo capitão Gary Prado Salmón, do Exército boliviano, responsável pela captura de Che. Provenientes das mesmas fontes, merecem, portanto, idêntica credibilidade. O esquecimento de uma frase e a perpetuação da outra resumem o sucesso da máquina de propaganda marxista na elaboração de seu maior e até então intocado mito. Che tem um apelo que beira a lenda entre os jovens dos cinco continentes. Como homem de carne e osso, com suas fraquezas, sua maníaca necessidade de matar pessoas, sua crença inabalável na violência política e a busca incessante da morte gloriosa, foi um ser desprezível. "Ele era adepto do totalitarismo até o último pêlo do corpo", escreveu sobre ele o jornalista francês Régis Debray, que por alguns meses conviveu com Che na Bolívia.
Por suas convicções ideológicas, Che tem seu lugar assegurado na mesma lata de lixo onde a história já arremessou há tempos outros teóricos e práticos do comunismo, como Lenin, Stalin, Trotsky, Mao e Fidel Castro. Entre a captura e a execução de Che na Bolívia, passaram-se 24 horas. Nesse período, o governo boliviano e os americanos da CIA que ajudaram na operação decidiram entre si o destino de Guevara. Execução sumária? Não para os padrões de Che. Centenas de homens que ele fuzilou em Cuba tiveram sua sorte selada em ritos sumários cujas deliberações muitas vezes não passavam de dez minutos.
VEJA conversou com historiadores, biógrafos, antigos companheiros de Che na guerrilha e no governo cubano na tentativa de entender como o rosto de um apologista da violência, voluntarioso e autoritário, foi parar no biquíni de Gisele Bündchen, no braço de Maradona, na barriga de Mike Tyson, em pôsteres e camisetas. Seu retrato clássico – feito pelo fotógrafo cubano Alberto Korda em 1960 – é a fotografia mais reproduzida de todos os tempos.
O mito é particularmente enganoso por se sustentar no avesso do que o homem foi, pensou e realizou durante sua existência. Incapaz de compreender a vida em uma sociedade aberta e sempre disposto a eliminar a tiros os adversários – mesmo os que vestiam a mesma farda que ele –, Che é, paradoxalmente, visto como um símbolo da luta pela liberdade. Guevara é responsável direto pela morte de 49 jovens inexperientes recrutas que faziam o serviço militar obrigatório na Bolívia. Eles foram mobilizados para defender a soberania de sua pátria e expulsar os invasores cubanos, sob cujo fogo pereceram.
Tendo ajudado a estabelecer um sistema de penúria em Cuba, Che agora é apresentado como um símbolo de justiça social. Politicamente dogmático, aferrado com unhas e dentes à rigidez do marxismo-leninismo em sua vertente mais totalitária, passa por livre-pensador.
O regime policialesco de Fidel Castro não permite que aqueles que conviveram com Che e permanecem em Cuba possam ir além da cinzenta ladainha oficial. Por isso, apesar do rancor que pode apimentar suas lembranças, os exilados cubanos são vozes de maior credibilidade. O movimento que derrubou o ditador Fulgencio Batista, em 1959, não foi uma ação de comunistas, como pretende Fidel Castro. Boa parte da liderança revolucionária e dos comandantes guerrilheiros tinha por objetivo a instauração da democracia em Cuba.
Mas foi surpreendida por um golpe comunista dentro da revolução. Acabaram presos, fuzilados ou deportados. Desde o início, Che representou a linha dura pró-soviética, ao lado do irmão de Fidel, Raul Castro. Na versão mitológica, Che era dono de um talento militar excepcional. Seus ex-companheiros, no entanto, lembram-se dele como um comandante imprudente, irascível, rápido em ordenar execuções e mais rápido ainda em liderar seus camaradas para a morte, em guerras sem futuro no Congo e na Bolívia.
Huber Matos, que lutou sob as ordens do argentino em Cuba, falou a VEJA sobre o fracasso de Che como comandante: "A luta foi difícil na primavera de 1958. A frente de comportamento mais desastroso foi a de Che. Mas isso não o afetou, porque era o favorito de Fidel, que nos impedia de discutir abertamente o trabalho pífio de seu protegido como guerrilheiro". Pouco depois do triunfo da guerrilha, ao perceber os primeiros sinais de tirania, Huber renunciou a seu posto no governo revolucionário e informou que voltaria a ser professor. Preso dois dias depois, passou vinte anos na cadeia. Vive hoje em Miami. À moda soviética, sua imagem foi removida das fotos feitas durante a entrada solene em Havana, em que aparecia ao lado de Fidel e Camilo Cienfuegos, outro comandante não comunista desaparecido em circunstâncias misteriosas nos primórdios da revolução.
Nomeado comandante da fortaleza La Cabaña, para onde eram levados presos políticos, Che Guevara a converteu em campo de extermínio. Nos seis meses sob seu comando, duas centenas de desafetos foram fuzilados, sendo que apenas uma minoria era formada por torturadores e outros agentes violentos do regime de Batista. A maioria era apenas gente incômoda.
Napoleon Vilaboa, membro do Movimento 26 de Julho e assessor de Che em La Cabaña, conta agora ter levado ao gabinete do chefe um detido chamado José Castaño, oficial de inteligência do Exército de Batista. Sobre Castaño não pesava nenhuma acusação que pudesse produzir uma sentença de morte. Fidel chegou a ligar para Che para depor a favor de Castaño. Tarde demais. Enquanto dava voltas em torno de sua mesa e da cadeira onde estava o militar, Che sacou a pistola 45 e o matou ali mesmo com balaços na cabeça.
Em outra ocasião, Che foi procurado por uma mãe desesperada, que implorou pela soltura do filho, um menino de 15 anos preso por pichar muros com inscrições contra Fidel. Um soldado informou a Che que o jovem seria fuzilado dali a alguns dias. O comandante, então, ordenou que fosse executado imediatamente, "para que a senhora não passasse pela angústia de uma espera mais longa".
Em seu diário da campanha em Sierra Maestra, Che antecipa o seu comportamento em La Cabaña. Ele descreve com naturalidade como executou Eutímio Guerra, um rebelde acusado de colaborar com os soldados de Batista: "Acabei com o problema dando-lhe um tiro com uma pistola calibre 32 no lado direito do crânio, com o orifício de saída no lobo temporal direito. Ele arquejou um pouco e estava morto. Seus bens agora me pertenciam". Em outro momento, Che decidiu executar dois guerrilheiros acusados de ser informantes de Batista. Ele disse: "Essa gente, como é colaboradora da ditadura, tem de ser castigada com a morte". Como não havia provas contra a dupla, os outros rebeldes presentes se opuseram à decisão de Che. Sem lhes dar ouvidos, ele executou os dois com a própria pistola. Essa frieza e a crueldade sumiram atrás da moldura romântica que lhe emprestaram, construída pelos mesmos ideólogos que atribuíram a ele a frase famosa – "Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás". Frase criada pela propaganda esquerdista.
Como o jovem aventureiro que excursionou de motocicleta pelas Américas se tornou um assassino cruel e maníaco? O jornalista americano Jon Lee Anderson, autor da mais completa biografia de Che, escreveu que ele era um fatalista – e esse fatalismo aguçou-se depois que se juntou aos guerrilheiros cubanos. "Para ele, a realidade era apenas uma questão de preto e branco. Despertava toda manhã com a perspectiva de matar ou morrer pela causa", afirma Anderson.
Ernesto Guevara Lynch de la Serna nasceu em 14 de maio de 1928, em uma família de esquerdistas ricos na Argentina. Sofreu de asma a vida inteira. Antes de se formar em medicina, profissão que nunca exerceu de fato, viajou pela América do Sul durante oito meses. Depois de terminada a faculdade, saiu da Argentina para nunca mais voltar. Encontrou-se com Fidel Castro no México, em 1955, onde aprendeu técnicas de guerrilha. No ano seguinte, participou do desembarque em Cuba do pequeno contingente de revolucionários. Depois de dois anos de combates na Sierra Maestra, Fidel tomou o poder em Havana.
Che ocupou-se primeiro dos fuzilamentos e, depois, da economia, assunto do qual nada entendia. José Illan, que foi vice-ministro de Finanças antes de fugir de Cuba, contou a VEJA que o argentino "desprezava os técnicos e tratava a nós, os jovens cubanos, com prepotência". No comando do Banco Central e depois do Ministério da Indústria, Che começou a nacionalizar a indústria e foi o principal defensor do controle estatal das fábricas. "Che era um utópico que acreditava que as coisas podiam ser feitas usando-se apenas a força de vontade", diz o historiador Pedro Corzo, do Instituto da Memória Histórica Cubana, em Miami. Como resultado de sua "força de vontade", a produção agrícola caiu pela metade e a indústria açucareira, o principal produto de exportação de Cuba, entrou em colapso. Em 1963, em estado de penúria, a ilha passou a viver da mesada enviada pela então União Soviética.
Não havia mais o que Che pudesse fazer em Cuba. Era ministro da Indústria, mas divergia de Fidel em questões relativas ao desenvolvimento econômico. De maneira simplista, ele acreditava que incentivos morais tinham maiores probabilidades de estimular o trabalho. Che também se tornou crítico feroz da União Soviética, da qual o regime cubano dependia para sobreviver. Não por discordar do Kremlin, mas porque julgava os soviéticos tímidos na promoção da revolução armada no Terceiro Mundo. Para se livrar dele, Fidel o mandou como delegado à Assembléia-Geral das Nações Unidas em 1964. No ano seguinte, Che foi secretamente combater no Congo, à frente de soldados cubanos. Ali, paralisado por incompreensíveis rivalidades tribais, derrotado no campo de batalha e abatido pela diarréia, Che propôs a seus comandados lutar até a morte. Mas foi demovido do propósito pela soldadesca, que não aceitou o sacrifício numa guerra sem sentido.
Daí em diante o argentino tornou-se uma figura patética.
Em Havana, Fidel divulgara a carta em que ele renunciava à cidadania cubana e anunciava sua disposição de levar a guerra revolucionária a outras plagas. Pego de surpresa pela leitura prematura do documento, Che ficou no limbo, sem ter para onde voltar. "Sua vida foi uma seqüência de fracassos", disse a VEJA o historiador cubano Jaime Suchlicki, da Universidade de Miami. "Como médico, nunca exerceu a profissão. Como ministro e embaixador, não conseguiu o que queria. Como guerrilheiro, foi eficiente apenas em matar por causas sem futuro." Na falta de opções, Che escolheu a Bolívia para sua nova aventura guerrilheira.
Ele lutaria em território montanhoso e inóspito, imerso na selva, sem falar o dialeto indígena dos camponeses bolivianos. O plano original era adentrar, pela fronteira, a província argentina de Salta. Mas um contigente exploratório foi aniquilado rapidamente pelo exército daquele país. A missão boliviana era, de todos os pontos de vista, suicida. Ainda assim, Fidel a apoiou, a ponto de designar alguns soldados de seu exército para o destacamento guerrilheiro. O ditador cubano também equipou e financiou a expedição, com a qual manteve contato até que seu fracasso se tornou evidente.
Além da falta de apoio do povo boliviano, que tratou os cubanos chefiados por Che como um bando de salteadores, a expedição fracassou também pela traição do Partido Comunista Boliviano. VEJA perguntou a um de seus mais altos dirigentes dos anos 60, Juan Coronel Quiroga: "O PCB traiu Che Guevara?". Resposta de Quiroga: "Sim". A explicação? "Nosso partido era afinado com Moscou, onde a estratégia de abrir focos de guerrilha como a de Che estava há muito desacreditada." Quiroga era amigo pessoal do então ministro da Defesa da Bolívia e conseguiu que as mãos do cadáver de Che Guevara fossem decepadas, mantidas em formol e entregues a ele. "Por anos guardei as mãos de Che debaixo da minha cama em um grande pote de vidro. Um dia meu filho deparou com aquilo e quase entrou em pânico", conta Quiroga. Anos mais tarde, coube a Quiroga a missão de entregar o lúgubre pote com as mãos de Guevara à Embaixada de Cuba em Moscou.
A morte de Che foi central para a estabilização do regime cubano nos anos 60, de acordo com o polonês naturalizado americano Tad Szulc, na sua celebrada biografia de Fidel. O fim do guerrilheiro argentino ajudou o ditador a pacificar suas relações com Moscou e ainda lhe forneceu um ícone de aceitação mais ampla que a própria revolução. O esforço de construção do mito foi facilitado por vários fatores. Quando morreu, Che era uma celebridade internacional. Boa-pinta, saía ótimo nas fotografias. A foto do pôster que enfeita quartos de milhões de jovens foi tirada num funeral em Havana, ao qual compareceram o filósofo francês Jean-Paul Sartre – que exaltou Che como "o mais completo ser humano de nossa era" – e sua mulher, a escritora Simone de Beauvoir. A foto de 1960 só ganhou divulgação mundial sete anos depois, nas páginas da revista Paris Match. Dois meses mais tarde, Che foi morto na selva boliviana e Fidel fez um comício à frente de uma enorme reprodução da imagem, que preenchia toda a fachada de um prédio público cubano. Nascia o pôster.
Três fatos ajudaram a consolidar o mito. O primeiro foi a morte prematura de Che, que eternizou sua imagem jovem. Aos 39 anos, ele estava longe de ser um adolescente quando foi abatido, mas a pinta de galã lhe garantia um aspecto juvenil. O fim precoce também o salvou de ser associado à agonia do comunismo. A decadência física e política de Fidel Castro, desmoralizado pela responsabilidade no isolamento e no atraso econômico que afligem o povo cubano, dá uma idéia do que poderia ter acontecido com Che, que era apenas dois anos mais jovem que o ditador.
O segundo fato foi a ajuda involuntária de seus algozes. Preocupados em reunir provas convincentes de que o guerrilheiro célebre estava morto, os militares bolivianos mandaram lavar o corpo e aparar e pentear sua barba e seu cabelo. Também resolveram trocar sua roupa imunda. Tudo isso para poder tirar fotos em que ele fosse facilmente identificado. O resultado é um retrato com espantosa semelhança com as pinturas barrocas do Cristo morto de expressão beatificada. A terceira contribuição recebida pelos esquerdistas na construção do mito veio do contexto histórico. Che morreu às vésperas dos grandes protestos em defesa dos direitos civis, da agitação dos movimentos estudantis e da revolução de costumes da contracultura – turbulências que marcaram o ano de 1968. Era um personagem perfeito para ser símbolo da juventude de então, que se definia pela "determinação exacerbada e narcisista de conseguir tudo aqui e agora", como escreveu o mexicano Jorge Castañeda, em sua biografia de Che. A história, no entanto, mostra que o homem era muito diferente do mito. Mas quem resiste? Neste mês, nos Estados Unidos, o cubano Gustavo Villoldo, chefe da equipe da CIA que participou da captura do guerrilheiro, vai leiloar uma mecha de cabelo de Che.
Se houve um ganhador da Guerra Fria, foi Che Guevara. Ele morreu e foi santificado antes que seu narcisismo suicida e os crimes que decorreram dele pudessem ser julgados com distanciamento, sob uma luz mais civilizada, que faria aflorar sua brutalidade com nitidez. Pobre Fidel Castro. Enquanto Che foi cristalizado na foto hipnótica de Alberto Korda, ele próprio, o supremo comandante, aparece cada dia mais roto, macilento, caduco, enquanto se desmancha lentamente dentro de um ridículo agasalho esportivo diante das lentes das câmeras da televisão estatal cubana.
O método de luta política que Guevara adotou já era errado em seu tempo. No rastro de suas concepções de revolução pela revolução, a América Latina foi lançada em um banho de sangue e uma onda de destruição ainda não inteiramente avaliada e, pior, não totalmente assentada. O mito em torno de Che constitui-se numa muralha que impediu até agora a correta observação de alguns dos mais desastrosos eventos da história contemporânea das Américas. Está passando da hora de essa muralha cair.

(Veja, 07-10-2007)

O Rei Che Guevara


A vigorosa atualidade das idéias de Che Guevara, 41 anos depois...


Por Beto Almeida [Sexta-Feira, 10 de Outubro de 2008 às 11:43hs]


Há 41 anos, num 8 de outubro como hoje, a humanidade recebia a notícia da covarde execução de Ernesto Guevara por um agente da CIA na Bolívia, horas após ter sido aprisionado por uma patrulha do exército boliviano controlado pelo exército dos EUA. A troca rápida de telefonemas entre os comandos militares de La Paz e Washington deixou antever a pressa em eliminar a presa, antes que todo um mundo de manifestações gigantescas se levantassem mundo afora para exigir a libertação de Che. Já era prova do temor às suas idéias, ao seu exemplo, à sua função na história.
Hoje, toneladas de papel continuam sendo escritas sobre ele, o debate segue com vigor. O aparato ideológico capitalista é obrigado a dar continuidade ao trabalho de demolição da imagem histórica de Che, comprovando, contra a sua vontade, que seu exemplo e suas idéias seguem amedrontando os donos do capital e do poder. Os publicitários capitalistas apenas superam-se na capacidade de insultos e ofensas à personalidade do Che, revelando, involuntariamente, sua incapacidade de apagar da história este personagem, que, ao contrário, se agiganta. Especialmente agora quando os fantasmas de uma nova crise do capitalismo especulativo baseado em moeda falsa desequilibra a mais potente economia capitalista do mundo, ramificando a crise por todos os lados, dada a extraordinária dependência que a economia mundial construiu em torno de alguns destes pólos capitalistas, hoje em crise. O fantasma de Che tira o sono dos capitalistas, ele mesmo que deu continuidade à abordagem teórica de Marx e Lênin sobre a inevitabilidade da crise do sistema do capital, e, ao mesmo tempo, também desenvolveu importantes aspectos da crítica que Trotsky fazia à burocratização da União Soviética, que, tal como fanáticos religiosos, muitos partidos comunistas, entre eles um que traiu criminosamente ao Che, o boliviano, classificavam incorretamente como socialismo. A previsão de Trotsky, feita lá em 1936, de que a URSS se desmoronaria não pela invasão militar externa, mas pela não realização da revolução política interna que retomasse a democracia soviética vivida em plenitude nos sete primeiros anos revolucionários, - a única forma de democracia livre da tirania do capital - só veio a ser cumprida, dramaticamente, em 1990, com a sua dissolução. Quarenta anos depois, as críticas de Che àquela estrutura burocratizada, distante dos ideais socialistas, degenerada na sua forma de funcionamento interno, também adquirem vigor e atualidade, como a crítica de Trotsky; para desespero dos catálogos publicitários a soldo do capital, como a Revista Veja aqui no Brasil. Estes, diante da monumental comprovação de toda uma análise histórica e um desenvolvimento teórico magistral rigorosamente confirmado pelos acontecimentos, contra-atacam apenas com falsificações históricas e insultos, chegando a ponto de usar como “argumento” contra Che....... “que ele cheirava mal”, numa confissão de sua desqualificada estatura intelectual. Esta crítica de Che à economia soviética burocratizada ganhou ampla divulgação recentemente - 40 anos depois de elaborada - por meio da publicação do indispensável livro “Apontamentos críticos à economia política”, infelizmente, ainda não publicado no Brasil até hoje, desafiando o mundo editorial e em particular aos partidos de esquerda, inclusive alguns que elogiam religiosamente a Che, mas não o publicam. Por quê? De sua personalidade enriquecida pela inteligência, pelo estudo persistente, pela bravura desprendida e infinita e pela ética revolucionária haveria muito sobre o que escrever, estudar, aprender, desenvolver, e , sobretudo, aplicar dialeticamente para as contradições da luta de classes atual. Mas, num artigo limitado no espaço e no tempo, mencionemos apenas algumas destas características que confirmam aquela vigorosa atualidade reivindicada ao início: o Che comunicador revolucionário, o Che médico-revolucionário e o Che ministro-revolucionário. O comunicador Che Guevara Uma das facetas desta extraordinária personalidade é o jornalista Che Guevara. Não é o caso de detalhar aqui sobre suas atividades como fotojornalista e seus escritos denunciando as injustiças das veias hemorragicamente abertas da América Latina antes mesmo de vincular-se ao movimento revolucionário cubano no México, após escapar da invasão ianque à Guatemala rebelde do coronel Jacob Arbenz;. Mas, o organizador revolucionário também na área da comunicação logo se expressou quando, ainda durante os combates em Sierra Maestra, Che organizou a fundação de um periódico, cuja impressão foi possível em gráfica montada com equipamentos levados a lombo de burro e em várias viagens clandestinas para o quartel-general da guerrilha comandada por Fidel. Logo depois, um passo ainda mais audaz: a fundação da Rádio Rebelde, também em território liberado de Sierra Maestra. Os transmissores foram igualmente para lá conduzidos em lombo de burro e as emissões puderam ser captadas por rádios venezuelanas que, por sua vez, retransmitiam muitas dessas alocuções de Fidel e de Che, possíveis de serem captadas por rádios da Argentina. A Revolução Cubana começava a construir seu sistema de comunicação social revolucionário. A Rádio Rebelde desceu da Sierra Maestra na ponta do fuzil e existe atualmente, continua coerentemente fazendo jornalismo revolucionário. Após a tomada do poder, Che continuou tomando iniciativas como comunicador, era extraordinariamente consciente da imperiosa necessidade de travar a batalha das idéias contra o dilúvio de manipulação e mentiras que até hoje se lançam contra Cuba Socialista. Baseado numa iniciativa de um seu conterrâneo, o general Juan Domingos Perón, outro dirigente igualmente atento para a necessidade de enfrentar o sistema imperialista de desinformação, razão pela qual criou na Argentina uma Agência Latina de Notícias, Che Guevara foi um dos principais responsáveis pela criação da Agência Prensa Latina, ainda hoje desempenhando imprescindível papel nesta luta de classes ideológica e informativa, especialmente revelando as maquinações do terrorismo midiático incessante contra Cuba e contra todos os governos e povos que adotam posições de transformação social , soberania e independência ante o império.. Che, sempre organizador, foi ainda o criador da Verde Olivo, revista das Forças Armadas Revolucionárias de Cuba, no que se revela a importância da questão militar e da nova função revolucionária atribuída aos militares. Um detalhe: na sua primeira edição, a Verde Olivo trazia na capa o próprio Che. Informado, enfureceu-se, foi até a gráfica e determinou a inutilização de todas aquelas capas e a reimpressão de outra capa, sem qualquer possibilidade de que se alguém insinuasse culto à personalidade. Hoje, seguindo o rastro de iniciativas organizativas revolucionárias de Che no campo da comunicação libertadora e confirmando a atualidade de seu pensamento em torno de uma informação anti-hegemônica temos a Telesur. A emissora televisiva multi-estatal demonstra a possibilidade de integração e cooperação em várias áreas, inclusive na informação e na cultura, e vai consolidando-se a passos largos permitindo que se tenha nas telas o protagonismo dos povos do sul, divulgando amplamente o processo de transformação da Bolívia, no Equador, Nicarágua, Venezuela, nacionalizando suas riquezas, derrotando o analfabetismo, realizando a integração social e energética, comunicando aos quatro ventos que a ALBA é uma realidade. Nas telas de Telesur pela primeira vez se mostrou o bombardeio da direita contra a Casa Rosada em 1955, se contou a verdadeira história do que foi o processo de transformação social na era peronista, assim como se contam histórias dos processos revolucionários dirigidos por Pancho Villa e Zapata, retira do ostracismo com toda força a personalidade de Eliecer Gaitan, se divulgam os filmes latino-americanos, inacessíveis nas telas gringas e colonizadas. Trata-se de vigorosa atualidade do pensamento de Che. Que deveria servir de reflexão e estímulo, por exemplo, ao PT que, até hoje, com vários anos de governo, ainda não tem imprensa própria de circulação nacional, embora prometida na última eleição de sua direção nacional. Medicina e revolução O Che médico já atendia aos camponeses nas zonas liberadas de Sierra Maestra. A consulta gratuita era acompanhada de fervorosa e apaixonada argumentação em defesa da revolução cubana, na qual, também se explicava o peso das condições sócio-econômicas na causa e determinação das enfermidades. A tal ponto que um menino camponês que observava atentamente as consultas de Che disse a sua mãe: não leve a sério este médico, ele diz para todos que a culpa dos problemas é do capitalismo.... Seguindo aquele exemplo do médico revolucionário, milhares de médicos cubanos estão espalhados hoje por 77 países dos vários continentes prestando serviço médico solidário, levando o exemplo revolucionário humanista do povo cubano, alcançando as zonas mais inóspitas, nas quais a medicina capitalista não chega, demonstrando assim todo o seu desprezo pelas camadas mais pobres da população. Para ilustrar a presença do exemplo do médico Che no profissionalismo solidário dos médicos de Cuba, conto que em visita recente ao Timor Leste, rigorosamente do outro lado do mundo, deparei-me com a presença de 350 médicos cubanos. Inclusive, foram os médicos cubanos os que ofereceram os primeiros socorros ao presidente timorense Ramos-Horta, vítima de atentado terrorista em fevereiro deste ano, episódio ainda envolto em dramáticas interrogações, sobretudo a partir das inevitáveis ramificações que pode ter com a imensa e cobiçada riqueza petroleira que aquela jovem nação oceânica é possuidora. O presidente Ramos-Horta me contou que quando se anunciou a chegada dos 350 médicos cubanos àquela ilha, o embaixador dos EUA ali não teve vergonha em manifestar sua insatisfação, pressionando para que os cubanos não fossem aceitos. Em resposta, Ramos-Horta perguntou ao embaixador quando médicos dos EUA atuavam no Timor. Diante da resposta “nenhum” - reveladora do mais alto grau de desprezo social - Ramos-Horta lhe disse: Cuba nos oferece uma ajuda desinteressada, além de oferecer bolsas para 600 timorenses estudarem medicina na Escola Latino-Americana de Medicina. Gratuitamente., tal como estudam lá aproximadamente 500 jovens pobres norte-americanos, em sua maioria negros, oriundos dos bairros proletários do Harlem e do Brooklin. Um deles me contou que se tivesse ficado nos EUA jamais teria a possibilidade de tornar-se um médico, e que, muito provavelmente, estaria com vínculos ao tráfico de drogas, como muitos de seus amigos que lá ficaram.... Esta vigorosa atualidade do pensamento de Che, encarnado em política do Estado Socialista de Cuba, é uma consciência que se espalha pelo mundo, fruto da generosidade de uma revolução que, apesar dos limitados recursos de que dispõe, faz da partilha de seus recursos humanos com outros povos uma razão de estado, uma ética de nação, transformando em realidade concreta um pensamento infinitas vezes repetido pelo próprio Guevara: tremeremos de indignação por qualquer ser humano oprimido, onde quer que ele esteja. Materializando este pensamento revolucionário, Cuba desenvolveu um método de alfabetização para indígenas da Nova Zelândia, e outro, para ser operado por meio do rádio, para alfabetizar em dialeto creolo, que nem escrita possui, ponderáveis parcelas da população da Haiti. Isto desenvolvido por pedagogos de uma Ilha que já vendeu o analfabetismo há décadas !!!. Estão vivas ou não as idéias de Che? O Ministro revolucionário e visionário Os 350 mil homens e mulheres cubanos que foram a Angola para lutar em defesa do bravo povo de Agostinho Neto, agredido pelo exército nazista do apartheid sul-africano, era um prolongamento lógico e inevitável do pensamento internacionalista de Che Guevara, alma da consciência internacionalista proletário do povo cubano e uma decisão de estado, comandada diretamente por Fidel Castro. Como disse Mandela, foi na Batalha de Cuito Cuanavale, no sul de Angola, em 1988, “o começo do fim do apartheid”, abrindo uma nova era para o sul do continente africano, cujo mapa político registra governos progressistas e antiimperialistas que desenvolvem a cooperação para enfrentar a herança nefasta do colonialismo. O internacionalismo proletário, a solidariedade internacionalista, são políticas do estado socialista cubano, em cuja fase inicial tinha um Che como ministro, infatigável na luta contra a falta de especialistas, agravada pela fuga de cérebros, o terrorismo lançado contra Cuba, as limitações tecnológicas, a herança colonial e, a seguir, o bloqueio. Ali estava um exemplo vivo de administrador socialista, sempre incorporando a participação coletiva, considerando respeitosamente a diferença de opiniões, mas, intransigente na defesa da estatização, do monopólio do comércio exterior, da planificação estatal. Não é que Che fosse um romântico que desprezasse o poder, ao contrário, desprezava sim o poder pessoal, era atento as perigos profissionais do poder, mas era, sobretudo, um intransigente construtor do poder proletário, lutou incansavelmente pela tomada do poder das mãos dos capitalistas, pela destruição de todo poder do capital. Todos estes exemplos estão cada vez mais vivos na história revolucionária mundial e encontram ressonância em muitos lados, como por exemplo nas diretrizes adotadas pela Revolução Bolivariana , comandada por Chávez, uma delas na preocupação pela diversificação produtiva, pela industrialização, pela crescente intervenção do estado, pelo desenvolvimento de laços de cooperação estratégica com países que afirmem a integração latino-americana, com o sentido de reduzir a dependência da economia capitalista mundial, hoje afetada por uma crise ainda sem controle. Estes foram temas tratados à exaustão pelo Ministro da Indústria Che Guevara. E agora, diante desta crise financeira capitalista, da falência sucessiva de bancos, da nacionalização de bancos que se procedeu, por exemplo, na Inglaterra, não vemos mais do que outra vez confirmar a vigência das idéias de Che Guevara, intransigente defensor da estatização, da economia real produtiva, crítico severo e mordaz dos arranjos criados pelos países imperialistas para seguir com sua rapina e sua acumulação usurpadora, em nome de uma financeirização virtual e artificial, às custas da economia produtiva e dos que produzem, os trabalhadores, sempre atirados nos abismos mais profundos da miséria e da opressão. O Che ministro era também exemplo de criatividade: fundou o Instituto de Investigações dos Derivados da Cana-de-açúcar, e , no discurso no dia inauguração fêz uma previsão visionária que além de indicar sua insaciável curiosidade científica e tecnológica, encontra hoje ampla confirmação. Disse o Che: chegará o dia em que o açúcar será apenas um dos derivados da cana e não o mais importante. Atualmente, da cana já é possível produzir medicamentos, o etanol, a álcool-química , com seus plásticos biodegradáveis e fertilizantes orgânicos que tornarão possível a libertação da agrcultura de petro-dependência atual, cara, insustentável ambientalmente e também para a saúde dos povos. Relativizando a importância do açúcar ao longo do tempo, inclusive em razão de seus complexos vínculos com um sistema de comércio internacional no qual Cuba não tinha e ainda não tem controle dos preços, Che nada mais fêz que antecipar-se a uma situação que de fato tornou-se realidade. Hoje Cuba desmantelou praticamente metade de sua produção açucareira e, segundo informa o Granma, dá início à implantação de 11 centros de produção de etanol em território venezuelano, num projeto binacional que confirma, uma vez mais, a importância das iniciativas em curso para a integração latino-americana. Combinada com a cooperação agrícola em curso entre Brasil, Venezuela, e Cuba, iniciativas como esta, impulsionadora do desenvolvimento de energia renovável num mundo com restrição de energia fóssil, viabilizam novas opções produtivas, colaborando com esforço já em curso para a transformação da agricultura dos dois países, e, fundamentalmente, revelando , novamente, a vigorosa atualidade das idéias de Che Guevara.


(Originalmente publicado na agência Brasil de Fato)

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Avô Avoado


Não sei a que atribuir aquela confiança cega que de repente se me depositaram. Pode ter sido estas mechas brancas que teimam em me tingir a barba, ao quebrar o cabo da desesperança dos cinqüenta. Ou as rugas que me vão mapeando o rosto, como troféus de muitas batalhas empreendidas e poucas ganhas. Talvez, até, este ar um pouco distante de quem procura o que não pode encontrar , de quem teme a estrada curta e imprevisível que se abre , morosamente, adiante. A placidez ,apenas aparente, dos desiludidos e desencantados.O certo é que a garotinha de uns cinco anos, interpelou-me enquanto fazia do encosto do bureau da sala de espera, um escorregador. Rostinho redondo, bochechinas salientes e olhos vivíssimos que saltavam da moldura de um cabelinho negro, curto e liso, cortado em pastinha. Fitou-me decidida ao me ver passar, exausto, depois de um longo dia de trabalho. Parou as atividades no playground em que transformara a sala de consultório e me chamou, como se fôssemos velhos e inseparáveis conhecidos:
--- Hei ! Hei ! Vem cá !
Mergulhado em preocupações mil, aquele fiapo de voz tocou meu coração, como se fora “A Primavera” de Vivaldi. A alegria e felicidade puras que brotavam como água cristalina da fonte da inocência. Aproximei-me desarmado como que tocado pela varinha de condão da fada madrinha. Desobedecer a um chamado destes, quem há-de ? Agachei-me um pouco, em reverência e , obedientemente, lhe fiz continência :
--- Olá ! Como você está?
A menininha sorriu-me , angelicalmente e me fez um convite totalmente inusitado:
--- O Senhor não quer ser meu avô, não ?
Hesitei, um tanto, ante um pedido tão carinhoso e estranhamente tão inesperado. Temendo ser pouco convincente, disse com voz titubeante que queria sim, que gostaria muito. A menininha pareceu contente e , por fim, explicou a necessidade da substituição necessária:
--- É que meu avô morreu e eu tou sem avô, ó !?
Já me recobrando da surpresa e buscando entender os ínvios caminhos do coração infantil, fui mais enfático. Conversei mais e disse que a partir daquela hora ela tinha um novo avô. A garotinha parece que havia encontrado uma Barbie perdida. Abraçou-me e voltou ao seu escorregador que , afinal, ninguém é de ferro.
Saí dali encantado com o convite. Afinal, hoje , avô é artigo de luxo. Com os jovens libertos e sem amarras, nascem filhos temporões que terminam por enfeitar a vida já um pouco ressequida de tantos avós. Não bastasse isto, com a doideira da vida moderna, com pais e mães numa corrida desenfreada em busca da sobrevivência,quem convive com os pirralhos ? Os avós ! Aí a convivência mostra-se sempre de mão dupla: eu te dou a segurança, a experiência e vocês me fornecem um pouquinho da preciosa seiva da vida. Nós lhes aplacamos os temores da floresta e vocês nos mostram onde ainda existem frutos deliciosos e sazonados. O avô é o pai domesticado: sem o grito, sem a palmatória, sem a cara emburrada. Tendo a visão privilegiada do rio da vida, ele entende que os acidentes são inevitáveis, que as águas muitas vezes se tornam turvas, que o fluxo vezes se mostra calmo, vezes tormentoso para quaisquer navegantes de primeira viagem. O tempo dá ao avô a prerrogativa da tolerância , com a pena pronta para a Hábeas Corpus , a alvará de soltura, a carta de alforria.
Despedi-me sob o peso da imensa responsabilidade que me acabava de ser conferida. Ser avô independe, geralmente, da nossa vontade e os netos, infelizmente, não têm o sagrado direito da escolha. Pois bem, a minha missão fazia-se bem mais árdua: a partir daquela data, a garotinha me havia eleito Avô Adotivo. Ela, mais que ninguém, demonstrava, claramente, a falta que lhe fazia aquela perda prematura. Sem maiores credenciais devo fazer tudo para não decepcioná-la. Mesmo sem estar perto, sem conhecer seus pais , sem sequer saber onde ela mora ; me acho no dever de fazer tudo ao meu alcance com o intuito de ela entender que a vida é apenas mais um capítulo de um Conto de Fadas. Apesar das bruxas, das maças envenenadas e das madrastas, sempre é possível encontrar um príncipe em cada esquina da existência e fazê-lo calçar o nosso sonho no sapatinho de cristal das nossas esperanças.
Antes de sair ainda ouvi a vozinha doce da minha neta mais nova :
--- Tchau, Vôiinho !


J. Flávio Vieira

Meio século da ditadura da dinastia Castro

Che Guevara: uma máquina fria de matar

A fama de assassino de Che não começa em La Cabana: inicia-se na Sierra Maestra, onde ele fuzilou dezenas de cidadãos, considerados desafetos dele

Mesquinho, rancoroso, arrogante, tirânico, vingativo, ardiloso, maquiavélico, violento, fanático, sanguinário. Estas são as lembranças de alguns dos companheiros mais próximos de guerrilha atribuídos a Che Guevara e que foram traídos por ele. Che é outro mito criado pela revolução cubana e que é propaganda de grife dos comunistas latino-americanos e do mundo em geral.
É uma espécie de culto religioso. O retrato de Korda, quase o idolatrando como uma espécie de Cristo revolucionário não combina com a realidade do que foi Che Guevara: um paladino da violência ilimitada, do radicalismo primário, do terror em massa da população. Nas palavras de Régis Debray, “partidário de um autoritarismo implacável”, era notório admirador de Lênin, Stálin e, posteriormente, Mao Tse Tung.
Em uma carta de 1957 a um amigo, dizia: “Pertenço, pela minha formação ideológica, àqueles que acreditam que a solução dos problemas desse mundo se encontra por detrás da cortina de ferro”(...). Ou seja, Che Guevara era apologético do regime soviético, que esmagava os ventos de liberdade política com os tanques soviéticos na Hungria e em outros lugares do Leste Europeu.
A fama de assassino de Che não começa em La Cabana: inicia-se na Sierra Maestra, onde ele fuzilou dezenas de cidadãos, considerados desafetos dele. Um caso em particular até hoje é controverso: um camponês chamado Eumidio Guerra, que lutava com os guerrilheiros em Sierra Maestra, tornou-se suspeito de ser espião de Batista. Todavia, uma boa parte dos companheiros de guerrilha não tinha certeza do caso e achavam que o indivíduo era inocente. Discordando de todo o resto, Che executou sumariamente o camponês. E ainda disse: “em caso de dúvida, matem”. Outros crimes também são atribuídos a Che: o de que ele também teria matado pessoalmente um de seus comandados que havia roubado um prato de comida.
A maneira como Che tratava tanto seus subordinados, como seus inimigos era mal vista por muitos guerrilheiros da campanha, entre os quais, Jesus Carreras e Huber Matos. Quando ele tomou a cidade de Santa Clara, abriu novos pelotões de fuzilamentos sumários de soldados e oficiais capturados na cidade.Em janeiro de 1959, Che Guevara foi escolhido como promotor geral da “comissão depuradora” de crimes do regime de Batista, na fortaleza de La Cabaña.
Na prática, porém, o que se viu foi um verdadeiro expurgo do exército e da guarda de Cuba, prendendo e fuzilando aleatoriamente por vingança supostos desafetos. Entre a maioria dos indivíduos fuzilados em La Cabana não havia nenhuma prova de que fossem torturadores ou assassinos do exército de Batista. Na verdade, o critério de julgamento sumário de Che e mesmo a avaliação dos réus tinham como única culpa o simples fato de alguém ter pertencido ao exército cubano antes de 1959 ou, no mínimo, mostrar qualquer sinal de dissidência ao processo revolucionário em pauta.
Essa sina de assassino não poupou posteriormente, nem mesmo os antigos amigos de farda que discordavam da revolução comunista que grassava em Cuba. Dois casos são escandalosos, dentre muitos: o primeiro, foi a execução do tenente Castaño, membro do serviço de inteligência do exército cubano. Preso, o oficial foi executado sem ter cometido crime algum. Outro caso foi de um jovem adolescente que pichou um muro com críticas a Fidel Castro. Uma mulher procurou Guevara pedindo que libertasse o rapaz, porque em alguns dias, ele seria executado. O guerrilheiro simplesmente abreviou a situação: mandou executar sumariamente o rapaz e ainda disse que queria poupar a mulher da espera de tanto sofrimento.
Essa sina de assassino não poupou posteriormente, nem mesmo os antigos amigos de farda que discordavam da revolução comunista que grassava em Cuba. Os expurgos contra o exército e a sociedade civil, atingiram até os velhos camaradas de Sierra Maestra, a maioria presa, exilada ou fuzilada. Atribui-se a Che a criação de campos de concentração de prisioneiros políticos, imitação típica dos campos de reeducação ideológicos chineses e vietnamitas. Milhares de pessoas foram presas e torturadas nestes campos.
Como ministro da economia de Cuba, mostrou-se inepto: subjugando a economia às suas utopias desastrosas, conseguiu arruinar as finanças do país e quebrar o Banco Nacional de Cuba. Para buscar eficiência, impôs à população um regime de trabalhos compulsórios, inclusive, abolindo o domingo para descanso. Qualquer negativa a esse tipo de ação arbitrária poderia causar a infeliz a pecha de contra-revolucionário e ser preso ou morto. Sedento de violência, vai para a África e apóia Laurent Kabila, um homem que anos depois, causou verdadeiros massacres no Zaire e rebatizou o pobre país como República Democrática do Congo, sem antes impor uma sanguinária ditadura. Ao arriscar um foco de guerrilha na Bolívia, é capturado pelo exército boliviano e assassinado, em 1967.

Um outro olhar.


Soy loco por ti

Por Glauco Faria, Colaborou Marília Melhado



Um verdadeiro paraíso. Ali gente como Al Capone, Lucky Luciano, Frank Costello e outros grandes nomes da máfia norte-americana eram os donos dos maiores cassinos e hotéis, onde músicos do porte de Frank Sinatra e Nat King Cole se apresentavam com certa regularidade. A polícia e as autoridades do local eram dóceis e respeitosas com seus “beneméritos”, não atrapalhando os negócios que envolviam bebidas, drogas e prostituição. Enquanto isso, a maior parte da população vivia em condições semifeudais, tentando tirar seu sustento da monocultura de cana-de-açúcar.

Esse lugar era Cuba, nos anos 1940. Território livre para o crime organizado e os interesses de investidores norte-americanos. Boa parte deles com intenções pouco nobres. O filósofo Jean Paul Sartre, no livro Furacão sobre Cuba, lançado em 1960, dava uma descrição das condições de vida do povo cubano no período pré-Revolução. “Viviam com quatro meses de salários miseráveis, e oito meses sem trabalho, os homens se endividavam, ora no armazém da localidade, ora com seu empregador. Mais tarde, seu pagamento antecipado já havia sido devorado por tais empréstimos a juros.” O contraste entre essa realidade e a Cuba de hoje talvez possa explicar um pouco não só a intransigente defesa da Revolução feita pelas pessoas mais velhas no país, como a paixão que o sistema da ilha desperta em militantes de esquerda em todo o mundo, inclusive no Brasil. Mas, ao contrário do que alguns tentam fazer crer, não é uma paixão cega, baseada simplesmente na simpatia ou no carisma de um líder como Fidel Castro, e sim calcada em conquistas e avanços que fazem da experiência cubana um evento único no mundo. O religioso Frei Betto é um dos entusiastas do regime. Já foi diversas vezes à ilha e, quando essa reportagem estava sendo produzida, se preparava para ir novamente a Cuba. Ele conta como conheceu o presidente cubano, naquela ocasião, junto com outro líder. “Encontrei Fidel pela primeira vez em Manágua, em 19 de julho de 1980, por ocasião do primeiro aniversário da Revolução Sandinista. Em companhia de Lula, conversei toda uma noite com ele. Confirmou-me a impressão de um homem carismático, inteligente, dotado de firmes convicções ideológicas e casado com a Revolução. Complacente e compassivo é ainda hoje Fidel, onde o coração parece predominar sobre a razão”, relata. “Cuba é o único país da América Latina em que ninguém nasce condenado à morte precoce, graças ao fato de toda a população ter assegurada cesta básica e educação e saúde gratuitas. Há um cartaz no caminho do aeroporto de Havana para o centro da cidade que diz tudo: ‘Esta noite 200 milhões de crianças dormirão nas ruas do mundo. Nenhuma delas é cubana’”, ressalta.
A educadora Elza Lobo foi diversas vezes a Cuba e tem uma relação de afeto com o país. Começou a acompanhar o cotidiano da ilha desde o assalto ao quartel de Moncada, em 1956, e vislumbrou uma mudança que viria a se concretizar em 1959, com a vitória dos revolucionários no início de janeiro. A partir daí, muitos se inspiraram nas primeiras medidas tomadas pelo novo governo. “Quando militava no movimento estudantil vi, por exemplo, o Vilanova Artigas organizou um grupo de estudantes de Arquitetura em 1960 para um projeto de construção de moradias populares em Cuba”, recorda. Mas o fato que iria conquistar a simpatia de Elza seria a campanha nacional de alfabetização implementada em 1960. Em 1958, segundo dados oficiais, 23,6% da população era analfabeta. Já em 1961, Fidel Castro declara em uma conferência na Organização das Nações Unidas (ONU) que Cuba era um território livre de analfabetismo, servindo de modelo para outras experiências. “Resolvemos fazer um plano nacional de alfabetização no Brasil, com o envolvimento de estudantes a exemplo do que havia ocorrido em Cuba, mas utilizando o método Paulo Freire. O Ministério da Educação, a União Nacional dos Estudantes e as Uniões Estaduais dos Estudantes estavam elaborando esse projeto, que foi abortado com o golpe de 1964.”
Lúcio Manfredo Lisboa tinha 13 anos quando o ditador Fulgencio Batista foi derrubado. O fato foi muito importante para ele. “Isso marcou muito minha juventude”, lembra. Mesmo depois de formado em Engenharia Química, o desenrolar da Revolução Cubana o acompanhava. Em 1985, finalmente conseguiu realizar seu sonho de conhecer o país. “Tive a oportunidade de acompanhar uma delegação da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) para um evento sobre meio ambiente. Desde então, fui para lá 11 vezes”, conta.
“Ali, me despertei para o país, para as conquistas sociais que haviam sido obtidas. Além disso, com o tempo estabeleci amizade com muitas famílias cubanas, independentemente de ideologia. Minha ligação com o país não é apenas ideológica, mas emocional e cultural”, confessa Lúcio, que assegura que o país é o “mais culto da América Latina”. “A Revolução investe muito nisso, principalmente após o advento da globalização. Eles acreditam que um povo com cultura resiste mais aos valores de fora e por isso investem pesadamente nesse aspecto.”
Se a cultura é um dado que impressiona, decerto está longe de ser o único. A avançada medicina, por exemplo, hoje é uma das principais fontes de receita do país. Cuba se tornou o primeiro país a desenvolver, na década de 1990, a vacina contra a meningite B, o que resultou em um significativo aumento de suas exportações. Fenômeno semelhante aconteceu em relação à hepatite B, cuja vacina é fornecida atualmente para 30 países. Nada incomum para Cuba, que possui a maior proporção mundial de médicos por habitantes, com um profissional para cada 172 cubanos.
Mas, embora o país tenha investido, principalmente nos últimos anos, em biotecnologia, o forte do sistema de saúde cubano é a medicina preventiva. Adriano Biava, economista, conheceu o país em 1996 e mantém encontros periódicos com acadêmicos de sua área em Cuba. Ele cita um exemplo que elucida a orientação da política de saúde do país. “Quando teve início a crise econômica em função da extinção da União Soviética, alguns itens alimentícios, como azeite, por exemplo, começaram a faltar em Cuba”, recorda. “Como conseqüência, o consumo de car ne de porco e da gordura do animal aumentou, resultando em elevação da obesidade e dos índices de colesterol da população. Por conta disso, o governo elaborou um plano nacional para aumentar a produção de legumes e auxiliar na mudança de hábitos alimentares das pessoas, evitando doenças futuras.”
A excelência na área atrai estudantes de diversos países, inclusive os do Brasil. A brasileira Talita Aparecida Tomé da Cruz, de Itapevi, na Grande São Paulo, é uma das cem estudantes de baixa renda selecionados pela Embaixada de Cuba para cursar Medicina com uma bolsa que garante ainda moradia e alimentação. “Eles perguntam o que você conhece de Cuba e por que escolheu Medicina”, conta Talita à reportagem do jornal Visão Oeste. “Sinto-me privilegiada, muitas pessoas tentaram e não conseguiram.” A queda do comunismo no Leste Europeu e o fim da União Soviética foram um duro golpe na economia cubana. Para se ter uma idéia, entre 1989 e 1993, o Produto Interno Bruto (PIB) caiu 34%, as exportações se reduziram em 66% e os investimentos desabaram 80%. Desde então, Cuba tem adaptado seu sistema econômico para a realidade da globalização. “Para atrair capitais que pudessem ajudar no desenvolvimento econômico, Cuba modificou suas leis relativas ao investimento estrangeiro da ilha. O capital é bem-vindo, desde que na forma de joint venture com o Estado”, esclarece Arthur Amorim no livro Y Ahora Fidel? (Editora Conex). “Hoje já existe operando em Cuba pouco mais de 400 joints, com investimentos que passam da casa dos US$ 3 bilhões. Essa cifra pode não parecer grande, mas para o tamanho da ilha é muito significativo”, garante o autor. Ainda para suprir a falta de divisas, o governo direcionou seus esforços no turismo, um mercado bastante competitivo, ainda mais se tratando do Caribe, região com diversas ilhas paradisíacas. Mesmo assim, Cuba foi bem-sucedida. Nos últimos dez anos, a atividade tem crescido a uma média de 15% ao ano sendo que, dos 300 mil turistas que o país recebia em 1990, atingiu-se a marca de 2 milhões em 2004. A contribuição do turismo na balança de pagamentos cresceu de 4% para 43% em 2000. Para isso, a planificação estatal foi fundamental. “Em cada hotel que a Meliá constrói é feita uma sociedade na qual Cuba fica com 51% do empreendimento. A Meliá entra com o investimento e a tecnologia, constrói o hotel e treina o pessoal. Cuba entra com o terreno e com a infra-estrutura, estradas de acesso a uma nova praia, saneamento, eletrificação, o que for preciso. Os funcionários são todos cubanos, com uma ou duas exceções, e o Estado se encarrega do pagamento de todos os salários. Não há taxas para o empreendimento. Também não há impostos, os sócios dividem os resultados meio a meio”, analisa Amorim.
Para boa parte dos estudiosos, o modelo cubano se parece muito mais com o que esta sendo feito hoje na China e no Vietnã. “Um processo de reformas gradual, com abertura ao capital, mas sem perder o controle do Estado. É um modelo que está sendo chamado de economia socialista de mercado”, explica o autor.

Classes Se por um lado, a ênfase no turismo é responsável por parte da recuperação econômica de Cuba no período que se segue após a queda do Muro de Berlim, de outro, cria também uma espécie de casta. Aqueles que vivem da atividade, recebem em moeda norte-americana, um diferencial em relação aos demais. “Quem lida com turismo tem uma condição melhor do que um professor com PhD, porque só eles ganham em dólar”, conta Nelson Medeiros de Oliveira Neto, que fez intercâmbio no país.
Fabio Soprani, que participou da Brigada de Solidariedade a Cuba em 2003, reconhece que há uma certa diferenciação entre aqueles que trabalham com turismo e os demais, assim como também em relação àqueles que estão ligados à máquina estatal. Ainda assim, minimiza a questão. “Em Cuba, há uma divisão entre a burocracia estatal e a população, só que, diferentemente da extinta União Soviética, não se criou uma classe burocrática lá. O Estado não privilegia os políticos, o cidadão recebe o mesmo do que ganhava antes de trabalhar ali”, afirma.
“Durante a crise econômica no país, começaram problemas sérios de corrupção, não no primeiro, mas no quarto, quinto escalões. Hoje, há uma grande campanha contra a corrupção”, relata Lúcio Manfredo Lisboa. No perío¬do de recuperação econômica, a classe burocrática pagou seu preço, já que 15 ministérios foram fechados.
Outro ponto polêmico quando se fala de Cuba é a questão do sistema político. Se não é semelhante à democracia representativa clássica, para muitos o regime também não pode ser classificado como uma ditadura, até porque os cubanos votam. Clara Charf, que viveu durante nove anos exilada em Cuba (ver box), chegou a presenciar algumas reuniões para indicar candidatos à Assembléia Municipal do Poder Popular. “Era um processo muito interessante. Os moradores do bairro se reuniam, às vezes na rua mesmo, e indicavam os candidatos. Depois, nos lugares de muita visibilidade, ficavam cartazes com as fotos e os nomes deles, todos com espaço igual”, explica Clara. Outro aspecto a se destacar é que, a cada quatro meses, o delegado municipal (equivalente a um vereador daqui) tem que prestar contas a seus eleitores que, se estiverem insatisfeitos, podem tomar medidas para cassar seu mandato.
“A questão do partido único é um tema complicado. Não sei se é um erro, mas do ponto de vista da construção de alternativas de Estado popular é um tema que tem que ser debatido”, reconhece o coordenador do MST João Paulo Rodrigues, ressaltando, porém, os acertos do regime.
“Os que hoje acusam Cuba de não manter um regime democrático, geralmente não têm a menor idéia das experiências da ilha com a democracia”, explica Arthur Amorim. O cantor e compositor Chico Buarque, em entrevista dada ao jornalista Fernando de Barros e Silva, da Folha de S. Paulo em dezembro de 2004, também falou a respeito. “Quanto a fuzilamentos ou a prisão de dissidentes políticos, fico contrariado, porque não gosto e não concordo com isso. A questão é muito delicada. Eu gostaria que Cuba fosse um país democrático. Agora, eu gostaria de uma maneira,e o Bush de outra. Cuba poderia ser hoje o Haiti. Cuba não é. É claro que me desagrada a idéia de um partido único, de liberdades vigiadas, mas existe ao mesmo tempo a necessidade de um controle para manter os valores da Revolução, que a meu ver são louváveis.” F

O rato que ruge
Apesar de ter apenas 110.992 km² e pouco mais de 11 milhões de habitantes, a pequena Cuba é uma verdadeira pedra no sapato do gigante Estados Unidos. Na prática, a relação entre os dois há tempos é conflituososa, tendo se tornado crítica após a Revolução. Os EUA cortaram relações diplomáticas com Cuba em janeiro de 1961 e, três meses depois, 1.500 homens treinados pela Agência Central de Inteligência norte-americana (CIA) invadiram a baía dos Porcos, operação fracassada que terminou com o saldo de centenas de norte-americanos presos.
“[A invasão] só serviu para consolidar, e até mesmo justificar, a posição de Fidel. Perante os olhos do mundo ele tornou-se o líder com coragem para enfrentar a grande potência dominadora. O Davi que ousava contrapor-se a Golias”, explica Arthur Amorim. A partir daí, cada medida norte-americana contra Cuba era respondida à altura pelo governo caribenho. “Quando os Estados Unidos cortam o fornecimento de petróleo, Fidel passa a comprar o produto da Rússia. Quando a Texaco e outras empresas petrolíferas da Ilha se recusam a refinar o petróleo comunista, Fidel desapropria as refinarias. Quando Kennedy suspende a importação do açúcar cubano, cortando quase toda a receita financeira de Cuba, Fidel desapropria 36 engenhos e usinas, todos eles americanos. Quando as centrais de energia elétrica e de telefonia param seus trabalhos, Fidel decreta sua imediata estatização. E assim foi, de medida em medida, sempre uma reação igual e contrária. Com o passar do tempo, ficou impossível saber o que era causa, o que era efeito”, conta.
“Para eles, os terroristas islâmicos são inimigos da liberdade, mas os que atacam Cuba são ‘lutadores’ da liberdade. Os EUA acham que existem terroristas bons e terroristas maus...”, ironiza o vice-cônsul cubano em São Paulo Bladimir Martinez Ruiz. Ele conta que, além do bloqueio econômico, diversas outras medidas foram tomadas pelos norte-americanos para prejudicar seu país. “Qualquer navio que entra em Cuba não pode ingressar nos EUA por seis meses. Empresários que negociam conosco não recebem visto para entrar em território estadunidense.”
Os ataques norte-americanos não conseguiram derrubar o regime cubano, mas sem dúvida tornam a situação econômica do país bastante complicada, servindo, inclusive, como justificativa para a falta de flexibilização no sistema político. “A Revolução Cubana pode e deve ser melhorada em muitos aspectos, mas primeiro é preciso que se suspenda o bloqueio criminoso imposto pelo governo dos EUA e as agressões imperialistas”, clama Frei Betto.


Revista Fórum

1º de janeiro de 2009



Meio século da mais antiga e sanguinária
ditadura do continente americano



O Gulag de Fidel



Dedicado aos dois pugilistas cubanos que, nos últimos
Jogos Pan-americanos, pediram asilo ao Brasil – mas
foram covardemente devolvidos à ditadura da dinastia
Castro pelo atual governo brasileiro – e aos milhares de
presos políticos que padecem,neste momento,
nas masmorras do sanguinário regime

O genocídio físico e espiritual de um povo diante da indiferença, quando não da cumplicidade, de muitos dirigentes ocidentais

O dia 1o de janeiro de 2009 assinala o 50º aniversário do nefasto regime comunista de Cuba, a ilha-cárcere do Caribe. Quando Castro tomou o poder, em 1959, Cuba era uma ilha caribenha governada por um ditador e com a economia movida pelos dólares do turismo, do mercado negro, da prostituição e da exportação de cana-de-açúcar. Meio século depois, Cuba continua sendo uma ilha caribenha governada por um ditador e com a economia movida pelos dólares do turismo, do mercado negro, da prostituição e da cana.
O saldo da revolução cubana não podia ser mais desolador: 15 mil fuzilados no "paredón". Mais de 1 milhão de cubanos exilados nos Estados Unidos, no que é considerada a maior diáspora dos tempos modernos. 400 mil cubanos passaram pelos cárceres e campos de concentração como prisioneiros políticos. Dezenas de milhares afogados no mar ao tentar fugir do comunismo em direção a Florida-EUA. . Em Miami em fevereiro, foi inaugurado por exilados cubanos, um Memorial para 30 mil vítimas da ditadura de Fidel Castro. Tem mais: Cuba detém os mais altos índices de suicídios e abortos do Hemisfério. Miséria material, devido à ineficiência do regime socialista. Não existe liberdade de imprensa. Para se deslocar para outra cidade com mais de 10 Km o cubano tem de obter um visto da polícia dos irmãos Castros.
Durante décadas, Fidel Castro patrocinou – com dinheiro da União Soviética – a exportação do modelo da fracassada e sangrenta revolução cubana para a América Latina e África, que, aliás, redundou em grande fracasso...
Economicamente, o saldo da ditadura cubano também é negativo. Sob outra ditadura, a de Fulgencio Batista, Cuba era conhecida como "o bordel dos Estados Unidos", por causa dos cassinos e das prostitutas. A economia do país vivia disso e da monocultura da cana-de-açúcar. A Cuba de Batista detinha o quarto maior produto interno bruto da América Latina. No último dado disponível, de 1998, Cuba havia caído para o 15° lugar. Apesar do pesado subsídio da União Soviética, que chegou ao auge a 8 bilhões de dólares por ano, Fidel falhou em criar uma economia tutelada pelo Estado.

Tênues lembranças - Para Teresa Abath



Crato ,1958
Eu tinha exatamente sete anos.Por razões familiares , mudamos por uns meses para um pedaço de rua , extensão da nossa Praça da Sé.
Uma pequena vila de casas , a residência dos Teles (Zé Flávio) , a minha morada, e o Colégio Pio X( antes da construção da sua sede oficial ).
Se fechar os olhos , sinto os cheiros das flores dos jardins : jasmim, dama da noite, lírio...Casa de Dr. Eldon Cariri, Dona Edistia Abath, Sr. Antonio Siebra e Dona Nailê Felício.
Nas calçadas , a gurizada, de olhos e sonhos no Carrocel Maia.
Convivi com as meninas mais novas de Dona Edistia. As mais velhas( hoje , todas da minha idade) : Neide, Distinha e Teresa.
Neide era de uma beleza esplendorosa. Beleza greco-romana. Loira natural , pele clara, traços belos e delicados. Lembro que ganhou um concurso , como a Rainha de todos os Colégios da cidade. Competira pelo Colégio Sta Tereza de Jesus , vestida de espanhola : Arrasou!
O segundo lugar ficou com Edite Alencar ( belíssima também) , em trajes de romana , representou o Colégio Estadual , e a terceira , Teresa Moreira Aragão ( minha prima ) , respondeu pelo Colégio Madre Ana Couto , a La Carmen Miranda.
Todas muito belas e glamurosas.
Teresa , era clarinha , cabelos claros , usava óculos , e tinha cara de menina intelectual.
O tempo passou...Ficou o cheiro de jasmim, guardando esta lembrança para mim.
Fiquei longe do Crato por 25 longos anos. Um rigoroso inverno , alternado de todas as estações. Vivi, fui feliz !
Outro dia, numa lembrança sentimental , José do Vale fez uma alusão à Teresa Abaht. Claude repetiu o carinho... Tenho um primo que a chama de amiga (Francisco Montoril).
E aí, resolvi rasgar o véu da invisibilidade , e dizer para Teresa , que ela é da nossa tribo ... dos Cariris ! Do povo que mesmo distante , nunca saiu.
Afora essas referências , como se não bastassem , o melhor amigo do meu avô paterno ,Alfredo Moreira Maia era o Sr. Teophisto Abath.
Complementando as minhas lembranças :
O desfile/apresentação das rainhas dos Colégios foi no palco da Rádio Educadora. O auditório esteve lotado.
Dihelson nem Pachelly eram nascidos...Porisso não registraram o fato.
Quem sabe Edilson Saraiva ?
Naqueles tempos os brinquedos em voga era o " bambolê" e o pula-corda.
Não existiam sandálias japonesas. A gente usava a "pisa-na-filô", e adornávamos os cabelos com "gigoletes" cheios de florzinhas , aplicadas.
A música de sucesso era uma canção ou canções de Anísio Silva e Nelson Gonçalves , como "O Sol" , "Quero beijar-te as mãos", "Revendo agora o meu Jardim"...
De olhos abertos, e todos os sentidos despertos , as lembranças continuam fluindo...Ainda bem que , no nosso presente existe a poesia , a música, todas as artes , e a nossa contínua construção como seres humanos , que buscam iluminação !
Imaginem se Anísio e Nelson eram bregas...Nada disso !
Enquanto aprendíamos a cantá-los, nas amplificadoras da vida , ouvíamos também clássicos como "O Guarani", "Lenda do Beijo", "Canção do Moulin Rouge" ...
Acho que de cada rosto do Crato tenho uma mémória saudosa, olorosa, musical...
Partilhá-las com vocês , muito me alegra !
O povo diz que tenho memória de elefante...
Será ?
- Eu tenho belas e tênues lembranças !

Uivo e café da manhã

O sol rasga minhas velhas cortinas. A janela ferve, junto com as paredes – ainda limpas e austeras. Existe um sonho do outro lado do mundo sendo. Existe um amor injustificável. E os vulcões, os vulcões.

O céu acima de mim. Compactuando com mais esse vacilo – um riso negligente pras coisas do mundo; é manhã, tudo arde em comunhão; nobreza instaurada em minha morada. Muros, semáforos, outdoors e esperanças não mais me interessam. Meus dedos apontam prum ponto inexistente. O cinza dos dias cede a uma triunfante confusão de cores. Todas inomináveis. Eu as invento. A alma calibrada pra coisas do tipo. O incerto, um livro do Ginsberg: tudo uma coisa só.

Quem paga a conta somos nós



Você – que me lê – já teve curiosidade de saber quanto sai do dinheiro do imposto que a população paga para sustentar um presidente da República?
Pois o imposto que você paga também é destinado a esta finalidade. E, falando em impostos, não adianta chiar que não temos segurança, que a educação e a saúde pública ofertadas são de péssima qualidade, etc. Não. O imposto é enfiado de goela abaixo. Compulsoriamente.
Mas, não era disso que eu queria falar. Você sabe quanto custa para a população a manutenção dos Palácios da Alvorada e Palácio do Planalto (e a partir de fevereiro do CCBB – Centro Cultural Banco do Brasil – e do Palácio do Buriti, nos quais o presidente Lula vai despachar em face da “ligeira reforma” do Palácio do Planalto, que vai custar R$ 88 milhões e só ficará pronto em abril de 2010)?
E sabe quanto custa a manutenção do avião presidencial – o AeroLula – adquirido por R$ 56 milhões, mas já recentemente reformado. Uma curiosidade: Entre tantos itens instalaram, no AeroLula, um bar para servir “caipirinhas” que custou 300 mil reais...
Mas, voltemos ao custo da Família Presidencial. Dados fornecidos pela Organização das Nações Unidas e pelo Unesco mostram que os gastos com a manutenção do presidente da república, no Brasil, custam cerca de U$ 12,00 (doze dólares) a cada um dos 180 milhões de brasileiros.
Isto é pouco ou muito?
Comparemos com outros países. A monarquia norueguesa custa U$ 1,58 (um dólar e cinqüenta e oito centavos) a cada súdito daquele país. Com ligeiras oscilações é isso que custa a cada espanhol, sueco, japonês, belga ou holandês para manter a Família Real naquelas nações. No Mônaco e Liechtenstein, a despesa para cada súdito é de 1 dólar/ano. A monarquia mais cara do mundo é a inglesa.Custa U$ 1,82 a cada inglês. Entretanto, atraídos pela tradição da realeza os turistas deixam por ano, na Inglaterra, trezentos milhões de dólares.
Mas voltemos ao Brasil. Você sabe que os cofres do governo sustentam algumas mordomias para os ex-presidentes Sarney, Collor, Itamar e FHC? Eles custam – cada um, é bom que fique claro – 64 mil reais por mês. Isto porque cada ex-presidente do Brasil tem direito aos serviços de quatro servidores para atividades de segurança e apoio pessoal, a dois veículos de luxo com motoristas e ao assessoramento de mais dois servidores.
Ô pais rico este nosso Brasil!
PS – Antes que m’esqueça: você sabe quanto custa uma eleição presidencial aos cofres públicos? Segundo o jornal “Estado de S.Paulo”, a cada quatro anos são torrados 1 bilhão e 200 mil reis para colocarmos um novo presidente no Palácio do Planalto. Mas,note bem, aí não estão incluídas as doações para as campanhas, com os inevitáveis “Caixa Dois”, nos quais o publicitário Duda Mendonça é PHD.