Antes da conversa
começar uma lembrança de um fato passado: alguém aí no Crato, agastado por
minhas críticas políticas, andou espalhando que eu fora figura importante na
saúde do PSDB e depois, por oportunismo, me aliara à oposição vitoriosa. Foram
notas dissimuladas nos blogs da região, cuja verdadeira versão assim como a
fonte do boato eu apenas soube por um e-mail revelador. Eu nunca fui nem do
PMDB dos tempos áureos de cuja costela saiu o PSDB mas ocupei cargos de
confiança em diversos governos, desde Sarney, passando por Brizola no Rio,
depois com Jatene nos governos Collor e no primeiro Fernando Henrique. E foi aí
no governo FHC que andei numa aeronave da FAB.
Vi o amanhecer de
Brasília na Base Aérea esperando um avião do modelo Avro, um velho turbo-hélice
que vinha da Base Aérea do Galeão. Destino: Marabá no Pará. Quatro horas de voo
até pousar. Além de quadros de vários ministérios do governo FHC, ia um
batalhão de repórteres.
Cinegrafistas,
repórteres de televisão, gente do rádio, jornais e revistas. Viajava com uma
quantidade imensa de rostos conhecidos da televisão. Todo mundo pago pelo
governo, numa aeronave da FAB. E sim, todas as grandes cadeias de jornalismo,
com a Globo à frente, Bandeirantes, SBT e outras mais além da revista Veja,
Isto É os principais jornais de Brasília, São Paulo e Rio. E, claro, grandes
rádios.
Eu fora enviado pelo
Ministério da Saúde sem saber exatamente qual era a missão. Mas como tinha
delegação para analisar qualquer demanda estava tranquilo naquele ambiente
ambíguo e impreciso. Por volta de uma hora estávamos todos, autoridades e
imprensa hospedados nos mesmos hotéis e à noite em rodas comuns.
Eu tinha um amigo entre
os quadros do governo, a missão era do Ministério da Reforma Agrária e este
amigo era assessor direto do Raul Jugmann, então ministro e hoje destacado quadro do PPS
do Roberto Freire. No dia seguinte o ministro chegou num jatinho da FAB e fomos
em duas aeronaves, a elite no jatinho e o rebotalho no turbo hélice até São
João do Araguaia.
Logo após o pouso foi
toda a excursão até um assentamento de agricultores e ali vimos a “maravilha da
obra de reforma agrária” do governo FHC. Tudo funcionava. Raul Jugmann mostrava
força, uma esquadra de representantes de todos os ministérios estava ali para
salvar os trabalhadores sem terra.
Depois foi um banquete
com os peixes da Amazônia, carnes de gado à vontade e a presença de todos os
prefeitos da região e o Raul juntando força contra alguém ou algo. Foi um
discurso de união para organizar a reação. Que era previsível mas não dito às
claras.
No dia seguinte, em
Marabá, após o café da manhã eis a cereja do bolo. Num auditório do INCRA Raul
reuniu-se com representantes do MST e na presença de toda a imprensa que
viajava às expensas do governo, armou a arapuca para expor as reinvindicações
dos trabalhadores com mero sectarismo.
Olhe que aquela manobra
ocorreu após aquele massacre de Eldorado dos Carajás executado pelo polícia do
Pará então governado por um político do PSDB. Logo depois Raul com seus
assessores subiram no jatinho e rumaram para Brasília e nós almoçamos para
começar a longa e demorada viagem de volta naquele turbo-hélice dos anos
sessenta. Chegamos a Brasília por volta de onze horas.
O pessoal da imprensa
ainda tinha energia para piadas e brincadeiras, mas sinceramente tive pena de
todos nós a serviço de uma causa anti-democrática que era desmoralizar um
legítimo anseio por inclusão econômica da gente do campo e que os governos vêm
apenas como baderneiros. E que o agrobusinesse tem horror como tem às reservas
indígenas. Como as empreiteiras têm dos terrenos que poderiam se tornar parques
para o lazer nas cidades tensas e atulhadas.
Do mesmo modo que ventríloquos
nas redes sociais movem suas mandíbulas pelos mesmos cordões que fazem parte dos
voos da FAB.
Nenhum comentário:
Postar um comentário