segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Toadinha de ano novo


(de Vinicius de Moraes, sobre um outro ano novo - 1964/1965)

E foi-se o ano – ano bissexto arrenegado! – ano ruim, ano safado, ano assim nunca se viu!

(...)

De qualquer modo resta o tomara-que-seja; resta o que a gente deseja, como diz o amigo Guima. E a esperança é uma mulher tão à mão, que é até ingratidão a gente não dar-lhe em cima. Por isso, amigos, que este ano recém-nato, ao contrário do transacto, lhes chegue de fraldas limpas; e vocês tenham um milhão de coisas boas e possam ver suas pessoas num espelho mais bonito.

Que vocês tenham mais Jobim e mais Caymmi; mais paixão e menos crime; mais Zé Kéti e Opinião. E Zicartola continue sua escola com essa branquinha pachola que se chama Nara Leão. Pois a verdade é que tudo se renova: bossa velha fica nova, o que eu acho muito bem. Só não renova quem já está com o pé na cova, quem não cria e não desova, quem não gosta de ninguém.

Que vocês tenham mais Drummond e mais Bandeira, e eles deixem de leseira e venham mais para a rua. E que Schmidt, em lugar de dar palpite, venda com mais apetite no Disco da velha Lua.

Que João Gilberto continue longe e perto, cantando pelo deserto seu canto de solidão. Canto que vende para a causa brasileira muito mais que o Bemoreira, o Rei da Voz e o Dragão. Que a linda Astrud nos mande mais amiúde, de Nova York ou Hollywood, os ecos de sua voz; voz que faz mais por nossos pobres Cr$ do que os trustes estrangeiros que proliferam entre nós.

(...)

Que nasçam poemas, nasçam canções, nasçam filhos; e se terminem os exílios e se exerça mais perdão. E brotem flores das dragonas militares e não mais se assustem os lares com esses tiros de canhão. Que todos se unam, se protejam, apertem os cintos; se reúnam nos recintos com esperança brasileira. E que se dê de comer a quem não come, porque o povo passa fome: e a Fome é má conselheira...

(...)

E finalmente que eu, pequeno mas decente, siga sempre para a frente com meu amor ao meu lado. E ela me dê no mais próximo presente, o presente de um futuro sem as dores do passado.






Repentes...Última Madrugada !







Madrugada que chora
nuvens aliviadas
lua ausente

Viajo no sonho...
Rio dos meus endereços!

Ressonam teus sinais...
stand by!


Namoro da alma
numa carne viva
pra que transcendência?
Um encontro é lenda
mas se faz carente
quando a noite é paz!

O céu ligou todos os sons
música estronda...
efeitos faiscantes
marcam esse momento!

Beijo teu mistério,
e furtivamente...
Aquieto o meu desejo!

Voltou a inquietação...
Meu amor se declara...
É paz ou guerra!
E o passado some
misturado em tantos
que eu já não espero
Agora és tu...
presente no futuro,
apronto esse tormento,
em ventos mensageiros
Chegas em perfume
da pele imaginada
esboço enluarado
de obscuro êxtase!
Ópios que penetram...
Sem perda de tempo
te concedo a chave
dessa nova casa!

Ele é louco
maravilhosamente louco!
Lobo e claro
como as manhãs de dezembro
Caminha para mim
num passinho lento
chega descansado
mas com fome intensa...
E nesse entrelaçado
de tantos segredos
Eu procuro em versos
matar seu desejo!

Tudo ameaça nascer
Tudo chegou outra vez
Explode como bomba,
no contentamento!

Ainda pode ser
E pode também não ser...
O verbo desconjugado
Alínea eu e você!

Beijo a boca
que fala pelos dedos
Beijo esse corpo
com muito desvelo
E nesse engate
de sentido fálico
A poesia é sexo...
Verso...Eu te desejo!

Os vários jeitos de dizer

Emerson Monteiro

Há dias não escrevo, no propósito de vascular o sótão do juízo e organizar de volta o ambiente, com isso querendo esfriar as caldeiras, na temporada boa do final de ano. Quando isto ocorre, ato contínuo, vê-se disposto a produzir qualquer coisa que una consciências, intenção de quem escreve por puro prazer.
Ainda assim, nesta busca de encontrar meios de retornar à escrita, catar as imposições do pensamento, e gerar, cá fora, alguma coisa que mereça a caligrafia das palavras, ainda assim, por vezes, os gestos permanecem restritos, numa proporção inferior ao desejo, face aos caprichos ditatoriais da forma.
Na verdade, afloram temas, a exemplo dos protestos virtuais à realidade contundente, onde o superego indica alternativas no que diz respeito ao trânsito das cidades; às políticas mercadológicas, que favorecem mais as elites, no jogo eleitoral insuficiente; à destruição gradativa da Amazônia, culpa de governos sucessivos, ferida de morte neste régio presente da natureza; às limitações usuais da personalidade humana como um todo; etc.; etc.
Resultado: escrever implica, grosso modo, no risco de ficar falando sozinho, em mundo que determina chamados múltiplos e possibilidades eletrônicas. Jornais amarelam rápido. Livros dormem em tudo que é canto de sala, preguiçosos, manhosos e antigos, viciados com a situação em que se transformaram as sociedades letradas desses dias.
O rádio, sim, e não esqueceria este veículo quente, trem-bala da comunicação de massa. Nele as palavras passam, mas os conceitos permanecem. Escutar, mergulhar pelas cavernas da memória através dos canais do ouvido...
Observo, sem um planejamento prévio, que, após décadas de textos publicados, retorno aos inícios da caminhada pelas letras, no ano de 1965, época em que, ao lado de Antônio Vicelmo, redigia para a Rádio Araripe. Cabia, a mim, produzir a parte internacional de jornal das 21h, de sua responsabilidade, talvez na primeira função radiofônica do consagrado noticiarista caririense.
No passo seguinte, Armando Rafael me solicitou que escrevesse crônicas para aquela emissora cratense, motivando descobrisse o potencial da opinião como necessidade urgente da cidadania em qualquer instância.
A importância do ato de dizer esbarra, com freqüência, nos veículos de que dispõe cada comunidade. Existem núcleos que dão prioridade a outros recursos da comunicação. Muitos escolhem a oralidade pura e simples, na fala que circula os baixios da informalidade, sem reclamar papel, câmeras ou microfone. São as sociedades ditas primitivas quanto aos sistemas de propagar a história e sua conceituação, sem reclamar profundidade documental, ou gravações magnéticas.
Aceitemos, contudo, agora, apenas isto em termos de avaliação dos modos de comunicar, porquanto o rádio trabalha sob o império do tempo e requer, por isso, limite rígido de quem dele se utiliza.
Na oportunidade, quero desejar um ano de prosperidade e boas realizações a todos os que nos ouvem neste momento.

sábado, 29 de dezembro de 2007

A voz do Pastor

Antes que me separe da esposa
separo-me eu desse ano anador.
Terça-feira febre terçã.
Quem me vir chorando
saiba que tirei enfim o cisco.
Meu olho direito vaza,
meu olho esquerdo contempla
tanto vazio tanto vazio vazante.

Tolices crepusculares

Darei um jeito
nesse fantasma medíocre
Sempre me sufocando
nos momentos de pura sobriedade.
Darei um jeito agora:
Teclas pretas,
letras brancas,
som furtivo
de quem rouba o silêncio
pelos dedos.
Antes bico da lapiseira,
hoje o computador da irmã.
E vou escrevendo.

Último Sábado

Adentra e sai ano
permaneço trocando confetes
com as paredes e o vazio.
Minha árvore haste de bambu
vai e retorna com o vento.
Meu corpo casulo enrugado
cansou-se de resguardar a alma covarde.
Estrangulo todos os dias meu coração.
Puxo a ferro o resto de humanidade.
Fim de ano, fim de dia, fim de tarde.
À noite, subo ao telhado.

Esperas



Nas esperas
Tem mais amanhecer
do que anoitecer...
Nas esperas prolongadas
a sucessão das horas
contam dias,
contam anos,
e param na eternidade!

A espera é vazia ou apipocada...
Com clássicos do cinema,
um samba de Chico,
cigarros e líquidos...
Esperas nutrem o aprendiz!
A grande espera
é amorosa

As pequenas esperas
são vaidosas!
Outras são ilusórias...
inesperadas...
Impactam a alma!
Existem esperas
piedosas,chorosas...
dolentes, gementes...
O alívio é sempre a morte...
ou a saudade eterna!
Amanhece, entardece
o sono e o sonho...
enquanto a pele envelhece!
Espera do encomendado
espera do que virá
espera do que não chega
espera por esperar!
Mortes e nascimentos
festas e casamentos
atraso no entendimento
pressa no esquecimento!

Parar de esperar
é a paz infinita...
É morrer de esperar!
A janela da minha espera
é sempre especial...

Saudade... de vez em quando
A falta...de quando em quando
Alegres encontros?
de vez, em vez!






sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

QUE NO ANO NOVO NOS RENOVEMOS


Hoje Ignácio Cano, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, publica um artigo com o título: Sob a máscara da tortura. É um texto revelador e gostaria que muita gente lesse. É pedagógico, trata da evolução da civilização em que as pessoas, todas elas sem qualquer exceção, pertencem a uma sociedade comum a todos. E o tema do texto é dos Direitos Humanos ainda objeto de muitas incompreensões e necessitado de que as pessoas aprendam a localizá-los na razão comum de suas vidas. Se assim não fosse, se não houvesse evolução muita tradição que se vê com simpático distanciamento no tempo ainda estaria aí como verdade anacrônica nos nossos dias.

Dificilmente um cidadão de boa formação ética e moral concordaria com a letra deste samba gravado pelo nosso querido Moreira da Silva: Na subida do morro me contaram, que você bateu na minha nega, isso não é direito bater numa mulher que não é sua, deixou a nega quase nua.......Mas nunca abusou de uma mulher que fosse de uma amigo. A mulher era um objeto dos homens e uma vez possuída poderia ser naturalmente surrada pelos maridos. Ou seja, se assim não fosse, a sociedade brasileira não teria a Lei Maria da Penha. Agora tem e necessita que a lei saia da ação do Estado e penetre a vida comum dos cidadãos para que nenhuma mulher seja objeto da crueldade do seu marido.

Quantas vezes não desesperamos ao ouvir os argumentos contra os Direitos Humanos só por que o conhecemos e já estamos devidamente formados para aceitá-los. Mas é preciso compreender que muita gente no nosso país ainda não os compreende e os nossos meios de comunicações estão cheios destes defeitos de entendimento. Por isso achei por bem fazer um resumo dos ensinamentos do professor nesta postagem.

O primeiro defeito é que os defensores dos Direitos Humanos são sempre confundidos como os defensores dos direitos dos bandidos de cometer crimes. E assim o professor responde: "A noção de direitos humanos nasce como uma tentativa de evitar os abusos cometidos pelo Estado. Se uma pessoa comete um crime contra outra, o Estado moderno dispõe, a princípio, de meios para puni-lo. Entretanto quem defenderá o cidadão dos atropelos do próprio Estado que o deveria proteger?". Ou seja, para o bandido já existem as leis criminais, mas os direitos humanos têm outro enfoque e contexto. Como define Ignácio: "direitos humanos centrados, basicamente, nos abusos cometidos por agentes do Estado. Por isso, a execução de um suspeito por um policial constitui violação aos direitos humanos, enquanto a morte de um policial por um criminoso, mesmo que seja igualmente execrável, não é."

Então o professor esclarece que os direitos humanos se voltam para todos, inclusive para bandidos ou pessoas que tenham cometido ilícitos de qualquer natureza(inclusive os agentes do Estado como policiais). Diz que em qualquer circunstância a justiça já tem as regras de punição definidas e não necessita que o ódio de qualquer agente do Estado ultrapasse os seus deveres. Se cada um acha que deve fazer a justiça segundo suas própria e particular convicção, o mundo ainda estaria na barbárie. Nesta situação os direitos seriam apropriados segundo a posição social e os méritos de cada um. O nosso velho coronel do sertão ainda estaria fazendo jurisprudência, os cangaceiros teriam sua própria justiça e os bandidos, armados com os mais possantes instrumentos e detentores das melhores técnicas de ação teriam impostos suas leis a todo (atenção até fazem isso em algumas comunidades, mas o Estado tem sempre a possibilidade e o dever de ir contra eles). Seria a fragmentação do direito.

Procurando ser mais didático Ignácio Cano reescreve o artigo 5º da Constituição segundo um certo pensamento militante daqueles que não contra os direitos humanos: "garantindo-se....a inviolabilidade do direito à vida, exceto quando os agentes policiais decidirem que a pessoa em questão representa um grave perigo para a sociedade, podendo então aplicar a pena de morte de forma automática e sem apelação. Ninguém será submetido à tortura, exceto quando a autoridade pública decidir que ela é necessária para a obtenção de informações ou para o castigo de suspeitos".

Olhe pessoal o texto reescrito por Ignácio Cano é ironia, a Constituição brasileira é contra a tortura e a pena de morte. Esclareço para que a defesa dos direitos humanos não venha, por ironia, ser tratada de má fé. De qualquer forma a democracia não é só a exposição das nossas diferenças, o melhor e mais importante efeito dela é construirmos algo em comum sobre os quais tenhamos, todos, paz.


Neste Final de Ano nada mais importante para todos. Termino esta mensagem com duas lembranças fundamentais: aqui mesmo nos nossos blogs surgiu uma grande polêmica em razão das ameaças pouco democráticas feitas contra o pensamento do nosso caro Dihelson e hoje todos estamos assistindo a desgraça do Paquistão. Desgraça provocada, inclusive, por uma política internacional equivocada na luta contra o terrorismo, perpetrada pelo Governo Americano. Uma política que foi na contramão do espírito democrático e das instituições como os direitos humanos, pois se baseava na força maior, na intimidação, tortura e quebra de todas as regras proteção humana, inclusive por preconceito étnico e religioso. Resultado, a morte de Benazir Bhutto e suas conseqüências é fortemente criticada como efeito da política externa de Bush Júnior.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Saudações

Meu caro,
se não há mais tempo
de vencer a si mesmo,
mire-se em uma girafa:
estique o pescoço,
alcance a folhinha mais verde.
Nosso corpo é de fato um bagaço:
músculos, carne, nervos e algumas cicatrizes.
Mas o silêncio necessita do pulso rápido e forte.
Sabe, meu caro,
os vermes lá debaixo
enlouquecidos
planejam congelar seu sorvete.
Ora, sorvete sem o suor descendo pela testa
não vale subir tantos degraus,
tantos galhos, tantos arames.
Mire-se em um macaco:
gargalhe, bufe à vontade,
mas não esqueça que banana,
bailarina e batata doce
aliviam a nostalgia.
Afinal, meu caro
sorvete congelado
nem girafa nem macaco desejam.
Sabe de uma coisa:
ao inferno macaco, girafa, sorvete.
Apague as luzes de 2007.
Tempo bom e camarada
bate à sua porta: Cintilante 2008.

Eremita

Passou 2007
Os últimos dias resolveram mudar o rítmo
Fizeram coreografia com um bando de tartarugas...
Céu nublado,tardes quentes,tudo mudo

Comida com cheiro de festa
doce, acastanhada...
Em algumas janelas do tempo
o dia esqueceu a neve, o saco de Papai Noel,
e a renas não fôram importadas...

Em algumas janelas , existe apenas uma vela!
Ninguém chegou, nem partiu
As bolsas ficaram vazias,
e as sacolas... repletas de plástico,
de fios, de futuros descartáveis.

Um pote de balas vazio,
um vestido surrado no armário,
um sapato apertado...
um perfume de amêndoas, quase enjoativo...

Um coração em saltos...
Aflição dentro do carro
Falta de um riso largo,
e de um chôro comovido.

Próxima semana é 2008
sem prata e sem ouro no bolso
Contas na farmácia
carrinho vazio, no supermercado
arroz, feijão e pão!

E o vinho espera abril
o milho espera S.João...
Até dezembro voltar
com cestas de intenções.

Há uma possibilidade de felicidade no ar...
Resgatar o coração,perdido na contra-mão

Há uma possibilidade de alegria
no final do dia, quando o sol esfria...
Uma bola prateada, que se chama lua,
enche de volúpia a nossa vida!

Há uma possibilidade de viver bem
E que Deus permita!

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

ATELIER MÁRIO PEIXOTO

Caríssimo amigo Salatiel...
Gostaria que os amigos do CARIRICULT visitassem essa obra de cunho magnífico, desse artista plástico que mora no Recife.
Seu nome é Mário Peixoto.
Um abração.
O site dele é http://www.ateliermariopeixoto.com

terça-feira, 25 de dezembro de 2007

VOCÊ TEM TEMPO PRA LER?

O tempo é convenção. As datas, as horas, os meses. Tudo organizando nossas vidas, nos deixando apressados, tristes ou enlouquecidos. Uma puta convenção. Antiga pra caralho. E fundamental pros ocidentais, como eu. Como você, certamente.

Uma convenção.

George Woodcock, pesquisador da teoria Anarquista, colocou num livro que o tempo era moeda. Na revolução industrial. Os patrões arranjavam um jeito escuso e canalha de alterar os relógios das fábricas para, assim, confundir seus empregados – que eram mais escravos enfiados em máquinas de tear, com seus pequenos ao lado, aturando o cheiro azedo e denso dos imensos galpões insalubres.

Era uma época nova. Os antigos tecelões e agricultores, que tinham uma relação estreita e pura com o tal tempo, estavam desabituados. E bebiam nas horas que lhe restavam. Bebiam, fumavam seus cigarros e perdiam a vida. Elas, as suas vidas, escorriam. Em forma de anos, horas e meses. A vida era dura.

Tempo cruel. Nas mãos de gente cruel. Não dava pra ser diferente.

As datas e as horas não existem. São números que usamos pra definir tudo nessa porra de vida. Isso é complicado. E deveras amplo pra se pensar, quando estamos acostumados à ele. Assim todo dia, mês e ano.

***

A paternidade me deixou desconfortável. Em relação ao tempo. Quer dizer, eu era um cara que sonhava em viver a margem. Ainda que sendo uma mentira deslavada, a doce ilusão de ser dono dessa consciência me trazia conforto. Conferia um certo brilho à minha vida.

Os Reveillons eram pretextos pra beber, fumar e viajar. Era tempo, tempo de folgas. Férias e outros baratos.

Dois em Porto Seguro. Onde o mar estava atulhado de casais que trepavam às escuras e policiais fardados – comigo foi assim. Num desses, em meu traje branco e formal, agachado com um amigo perto das pedras largas e pontudas do Arraial D’Ajuda, acendi um baseado. Tinha sementes e pipocava em nossas mãos. Policiais passaram e não vimos. Nos pediram fósforos, fumaram seus cigarros e fingiram nada ver de errado por ali.

Pareciam tristes. Cansados. Tentaram entabular uma conversa – o que era impossível, já que eu e meu amigo estávamos apavorados e sem graça. O baseadinho apagado entre os dedos, que ficaram rígidos. Trocamos apertos de mãos e eles seguiram adiante. Seus passos eram lentos. Sumiram na contraluz dos fogos que abarcavam aquele céu quase nublado.

Voltamos pra festa. De cara.

Alguns outros na casa dos velhos. Sempre eles. Que nunca souberam ao certo o que fazer com o tempo. Ainda assim, comemoravam. Coisas simples, de quem nunca teve grana pra grandes coisas - ainda hoje se esforçam pra abarrotar nossa mesa com pernis e outras ondas.

Porém, pra mim, carecia de significado. Sempre.

Então busquei outros rumos. Para muitos, estranhos. Foi quando resolvi me trancar em casa. Com uma garrafa de vinho Dom Bosco, um resto de molho Bolonhesa na geladeira – ainda decente – e cigarros. E discos da Rita Lee, na época em que ela tocava com a banda Tutti Frutti. Outros tempos.

Sozinho em minha casa, no último andar daquele prédio vazio, austero e silencioso, descobri que dava pra ser feliz. Assim, tomando vinho e comendo macarrão. Ouvindo a Titia Rita com sua voz límpida e ainda furiosa. Fumando meus cigarros e deitado em minha rede. Tinha também um livro do Henry Miller no peito, mas faltou coragem. Deu meia-noite e fiz um brinde solitário. A data: 31 do último mês do ano.

Eu era senhor do tempo. De meu tempo.

Nada do tumulto da orla. Milhares de rostinhos crédulos voltados pro alto. Esperando os fogos que iluminam e alardeiam o tal novo tempo. Garrafas de Cidra Cereser erguidas e sorrisos. Cervejas em lata e catadores de lixo, espreitando nossas costas.

O tempo não muda.

***

Conto os dias e meses e anos. Do meu filho. Como se ele fosse meu relógio – algo como relógio biológico; um trocadilho besta e eficiente. Ele terá quinze, enquanto eu estarei numa idade tal, provavelmente com longos cabelos brancos, algumas tatuagens e um ar excêntrico demais pras reuniões de pais e mestres. Ou então o contrário, mas com os sonhos pendurados no pescoço.

Conto o tempo através dele. Será assim. Suas férias e aniversários. A primeira foda. Passagens de séries na escola e outros baratos. Dias dos pais, das mães, crianças. Terei de me habituar a essas coisas. E rir – o que será um riso sincero, em se tratando dele. Tudo isso até o dia em que poderei lhe dizer o que acho verdadeiro e essencial. Até o momento em que estaremos conversando e eu, com um olhar resoluto, tentarei explicar de que é feito meu mundo; qual a matéria do meu tempo, do que chamo de tempo.

Espero que ele compreenda, mesmo que resolva não concordar com tudo – o que não deixará de ser fabuloso; comprovando que ele terá suas definições e, por tabela, sua vida no prumo mais desejado. Mas desejo que ele leve consigo um pouco do que me formou como gente, escritor, cozinheiro, mentiroso, sujeito comum, pai. Dentre outras coisas.

Será um tempo bom. Num dia de sol, quem sabe. Num ano que vai chegar em breve: a porra do tempo voa.

Até ano que vem.

UM TEMPO DE CÃO




Dia de cão. Isso existe. Tudo de adverso ocorre. Cadeia de problemas, isso quem não conhece? Agora é preciso entender que tudo depende do território e do momento da história deste. Na Europa, aí pelo início dos anos 40, tal cadeia era quase uma regra. As pessoas, famílias e populações inteiras estavam nas argolas de tal corrente da infelicidade.

Há pouco mais de um mês Flávio era um homem simples pela vida do Rio de Janeiro. Trabalhava, honrava pais e mães, obedecia as leis da religião e se divertia como todos, afinal ninguém é de ferro. Pois bem, a namorado do Flávio tinha um casal de tios portugueses já velhinhos e muito queridos. O casal viera da terrinha naqueles idos ruins do salazarismo, pré União Européia e, com esforço, sobreviveram nas terras cariocas. Trabalhos infindáveis, cuidados com as despesas e muita poupança. Aposentaram-se, retornaram ao seu amado Portugal, levaram presentes para os parentes, mas não demonstraram exuberância, poderiam despertar falsas ilusões.

O Flávio chegou do trabalho e foi avisado que o bom velhinho tinha sofrido um acidente vascular cerebral e estava necessitado de assistência médica intensiva. Pelo SUS, o Rio de Janeiro se encontra em pior situação que o salazarismo e nada conseguiram. Recorreram à assistência médica privada, mas essa só com grana antes de tudo e de todos. O casal tinha poupança, mas ninguém tinha acesso à conta deles. Nem a velhinha sua esposa sabia o número ou tinha autorização para tal. A parentela inteira teve que arcar com as despesas.

Enquanto isso a senhora começou a deteriorar sua vida de relação. Foi ficando fora do ar e as coisas fora do contexto das coisas. Nem dois dias e a velhinha de repente deixou esta vida para o éden do seu mítico trás-os-montes. A família cuidando de um em coma do qual ainda não retornou, foi cuidar do enterro da tia. Ah! A máfia da funerária.

Carcarás do bico afiado. Um modelo de caixão mais caro que outro. Uma cova que se abre por tantos reais que o Japão já pensa em atapetar seu chão com brita e ferro para que os mortos do Brasil não brotem nos seus quintais. Negociar é a ordem, isso enquanto a deterioração do cadáver se acentua. Finalmente chegaram em algo mais ou menos. Mais menos e voltaram para casa.

Mas carcará voa em todos os lugares. Um vizinho da velhinha era dono de funerária e questionou os preços da concorrência. Abriu um catálogo amarelecido pelo tempo, recoberto com sacos de plástico transparentes e apontou os dedos para as pechinchas. Uma aqui e outra ali, até que no calor da conversação começou a gaguejar. Explicou que ele era assim mesmo, excitado assim falava e continuou a negociação, cada vez mais agitado e engasgando nas cifras e opções, até que caiu duro no chão. Naquele dia mesmo foi prendado com a sua própria mercadoria.

Vida que segue. Aliás, morto que se carrega da capela até os confins dos muros do Cemitério do Caju. Parentes, alguns amigos e os coveiros empurrando o carrinho que passa na alameda principal sob a sombra de frondosas árvores. Mais na frente dobram numa estreita alameda, agora esburacada, sem árvores e uma seqüência quase ao infinito de lápides e túmulos. Lápides quebradas, cruzes arriadas, anjos mutilados, flores murchas, tocos de vela com o pavio negro e oleado.

Nova esquina e outra alameda na direção do sol poente. Estão indo para o canto último, aquele além dos limites do mundo, aquele em que o muro separa o cemitério da favela vizinha. A família, os amigos e os coveiros se equilibram no arruado irregular de túmulos de todos os tamanhos, ora penetrando o espaço da alameda e noutra ocasião deixando pedaços de cimento armado pelo chão, pedaços de tijolos e folhas de tintas descascadas.

Do abandono à ação. Começa um tiroteio nas vizinhanças. O ra tá tá tá das metralhas, os tiros avulsos das pistolas e o féretro se dispersa em busca de proteção. Os coveiros, nem de longe se acostumaram com a morte, correm dela mais que o diabo da cruz. Quando se viu, estavam alguns metros adiante, agachados atrás do mais alto dos túmulos. A família, em desespero, buscava abrigo. Afinal vieram homenagear a morta, não para irem juntos ao paraíso.

Mas uma companhia entre eles resistiu ao medo. Enquanto os medrosos se abrigavam dos tiros que nem vinham nas suas direções, permaneceu impassível onde, deste os primeiros tiros, estivera. O sol expondo toda a cena e no meio da alameda permaneceu sem mover-se um centímetro. Todos agachados, alguns soluçando, outros de olhos arregalados, gente se ajoelhando no cascalho irregular do chão do Caju e só alguém não se movera para nada, apesar dos tiros.

Os coveiros deixaram para trás o carrinho com o caixão e o corpo da tia da namorada do Flávio não tinha ânimo vital para, também, correr das balas perigosas das guerras das grandes cidades brasileiras.

Aconteceu um final.


O corpo ficou sendo enterrado enquanto os acompanhantes deixaram trás os coveiros na tarefa que lhes cabia. Preces, recomendações, jogar pétalas de flores dentro da cova, ninguém precisaria numa situação daquela. Era melhor ir para casa rezar pela morta e para que uma bala perdida não perfure as suas janelas.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

The Beatles - coisinha de Natal

A gente passa o tempo todo meio que tentando se convencer que a data tem sua representatividade nas compras, na agonia, no se enfuranr em casa e comer. Mas tem algo mais amplo. Que pode mudar as coisas.

Talvez por isso eu nunca goste do Natal. Porque ele não é o que me ensinaram. Enfim, dá tempo. Dá tempo de mudar e, no ano que vem, quem sabe, fazer a coisa certa. Esperemos.

2008: BI-CENTENÁRIO DA CHEGADA DA FAMILIA REAL PORTUGUESA AO BRASIL

vinda da família real ao Brasil
Chegada da família real portuguesa ao Brasil

(Há quase seis anos, escrevi o artigo abaixo, publicado no "Jornal do Cariri 13-1-2002. Felizmente, nos dias atuais o papel de Dom João VI na história do Brasil é visto de forma positiva. Aleluia!)

Dom João VI, esse injustiçado

Armando Lopes Rafael

Estão apresentando - num seriado de TV - Dom João VI como um glutão, despreparado, omisso e preguiçoso...Os historiadores honestos dizem exatamente o contrário! No jornal "O Povo" de 13/11/2001, na coluna de Elio Gaspari, o historiador Evaldo Cabral de Mello afirmou:

"(a mini-série da Rede Globo) "Quinto dos Infernos" revela muito mais a cabeça dos telespectadores do século XXI do que a realidade do início do XIX".

O historiador Armando Alexandre dos Santos, por sua vez, assim se expressou:

"Na realidade, D. João, Príncipe-Regente e depois Rei, soube transformar em apenas 13 anos um Brasil que encontrou provinciano e acanhado em 1808, num Reino-Unido a Portugal, estuante de vitalidade e de virtualidades que até hoje, decorridos perto de dois séculos, ainda não foram suficientemente exploradas e ainda estão muito longe de se esgotar. Mais do que isso, soube prever a separação do Brasil de sua antiga Metrópole - intencionalmente não falamos de independência, uma vez que o Brasil desde 1815, quando foi elevado à condição de Reino Unido a Portugal e aos Algarves, já não era dependente de Portugal à maneira de uma província".

Já o historiador Oliveira Lima, no livro O Império Brasileiro (Itatiaia, S. Paulo, 1989, p. 182) escreveu:
"Foi moda, durante muito tempo, difamar D. Pedro I e zombar o mais possível do bom Rei D. João VI, a quem o Brasil deve sua organização autônoma, suas melhores fundações de cultura e até seus devaneios de grandeza". É verdade. Basta ver o que ele fez quando aqui chegou, com a família real, em 1808. Foi Dom João VI quem abriu os portos do Brasil às outras nações, criou o Banco do Brasil, a Biblioteca Pública, o Jardim Botânico, e tantas outras repartições que consolidaram o Brasil como nação, como o ensino médico, o curso de agricultura, a Imprensa Oficial, a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios e o Curso de Cirurgia etc.

"O estabelecimento de instituições monárquicas no Brasil, a partir de 1808, contribuiu estamos hoje certos e, aliás, alicerçados numa larga tradição histórica, para uma mutação pacífica do estado de colônia à situação de Estado Independente. A dinastia de Bragança ao transferir-se para o Rio de Janeiro, ao transportar para a colônia todo o aparelho institucional do reino abandonado às intenções napoleónicas, deu um passo gigantesco, não só garantindo a sua própria sobrevivência activa, institucional e política, como acentuando essa unidade administrativa e territorial no Brasil".

" A unidade territorial e política da antiga colônia portuguesa da América do Sul é normalmente aceite como uma conseqüência do estabelecimento, por parte dos portugueses, de um governo colonial centralizado que viria a permitir uma herança de unidade. A administração espanhola, bem pelo contrário, teria criado as condições para uma repartição de estados no seu império colonial americano".

Sobre a personalidade de Dom João VI, assim escreveu o escritor inglês Marcus Chekek, no livro "Carlota Joaquina" (José Olympio, 1949, pp. 210):

"Era acessível ao mais humilde dos seus súditos. Foi sempre um fervoroso católico e um protetor da música. Era caridoso, profundamente leal para com os seus amigos, leal para com os aliados do seu país, sentimental, fácil de levar e muito apegado a fisionomia e cenas familiares. A afeição e o respeito que gozou entre o seu povo foram postos à prova em inúmeras ocasiões. Os defeitos do seu caráter eram em geral os excessos das suas boas qualidades. Um homem menos bondoso ter-se-ia livrado de suas dificuldades com um divórcio, ou imposto disciplina a seus filhos pela severidade".

No Brasil, felizmente, renomados historiadores fizeram justiça a Dom João VI, a exemplo de Oliveira Lima ("Dom João VI no Brasil", 2ª ed., Rio, 1945, 2 vols); Pandiá Calógeras ("Formação Histórica do Brasil", 4ª ed., S.Paulo, 1945, pp 69-72) e Hélio Viana ("História do Brasil", 3ª ed.,S.Paulo, 1965, vol. II, pp 7-34).

O tempo (Senhor da Razão, segundo a Bíblia Sagrada) trabalha a favor da revisão de muitos conceitos que foram amplamente aceitos com "foros de verdade" até 1989 (ano da queda do Muro de Berlim). É o caso do que representou para o Brasil a instituição monárquica que vigorou aqui de 1500 a 1889 (389 anos, contra 111 anos da atual forma republicana).
É só aguardar. Quem viver, verá...

Zabumbeiros Cariris é notícia na Paraíba


O Jornal da Paraíba, um dos mais importantes diários de notícias do estado paraibano, editado em Campina Grande, publicou, no seu caderno de cultura, reportagem com a banda caririense Zabumbeiros Cariris. A matéria, assinada pela jornalista Maria Zita Almeida, e publicada no dia 30 de outubro, anunciou a apresentação que a banda realizou na cidade de Sousa (PB), mas trouxe comentário sobre a sua musicalidade, registrada no CD Zabumbeiros Cariris, editado com apoio da Universidade Regional do Cariri, durante o reitorado do prof. André Herzog. Diz a matéria:

"O Nordeste é uma terra de grandes mestres da cultura popular. Seus Estados apresentam, entre outras riquezas culturais, uma musicalidade bastante marcada por elementos da tradição oral, que influenciam cada vez mais novas gerações de músicos e artistas, que buscam no universo da tradição nordestina a matéria-prima para seus trabalhos artísticos. No Estado do Ceará, a banda Zabumbeiros Cariris vem se revelando devido ao trabalho musical realizado em cima deste vasto imaginário nordestino, ainda preservado nos inúmeros folguedos da cultura popular presentes na região.
Formado em outubro de 2002, na cidade Juazeiro do Norte, da união de vários músicos de gerações e influências diferentes, eles possuem um repertório autoral, formado por temas instrumentais e canções cujas letras nos remetem a fatos históricos e mitos do Cariri, como, por exemplo, a saga do Caldeirão do beato José Lourenço em "Santa Cruz do Deserto", o lamento de Corisco em "Louro de Fogo", a força nativa dos deuses caririenses em "Casa de Badzé", a simplicidade do forró rabecado em "Zé Cangaia", a pura e singela marcha de reisado "Pecinha pra Meu Amor" e o intenso baião em "São José".
Os Zabumbeiros Cariris apresentam uma música simples e vigorosa, baseada na sonoridade de instrumentos típicos da região, como o zabumba, om pífano e a rabeca. A alegria das marchinhas, o toque pesado do baião cabaçal, as levadas do xote e de coco, mescladas ao sotaque do samba matuto e do maxixe traduzem a forte musicalidade e o espírito vigoroso desse show, transportando as pessoas que curtem o som da banda ao mundo das quermesses e dos reisados (...)."

N. do A.: Para ouvir as músicas do CD dos Zabumbeiros acesse:
http://palcomp3.cifraclub.terra.com.br/zabumbeiroscariris/

domingo, 23 de dezembro de 2007

Outro ano que nos espera

Emerson Monteiro


Dentre as vidas vividas, ou por viver, a mais valiosa, que na verdade pesa com destaque e torna evidente a força do universo de todas elas, trata-se da vida atual, através de que vemo-nos, face a face, perante as decisões do momento, no comando de nossos destinos, neste belo dia. Isso porque o passado deixou-se lá atrás nas suas experiências de estrada e o futuro apenas virá adiante; inexiste ainda como coisa palpável, por razões lógicas.

O presente, portanto, equivale a sabor de fria realidade, que responde a que se veio, no dispor das oportunidades constantes, nos dias. Haja considerações das outras horas, servem, pois, de citação, instrumento de estudo, lanterna de popa, contudo, a significar valor inestimável, porém fora do âmbito imediato.

Quais avaliações filosóficas para destacar a importância deste 2007 que daqui há pouco sumirá nas nossas vidas, no foco da civilização de um tempo de raros desafios. Todo ano merece o máximo respeito. Alguém até escreveu “ser este o derradeiro ano do resto de nossas vidas”.

Quando as ocorrências exigem mudanças específicas na correção dos rumos da história, cabe aos responsáveis diretos, aos vivos desta geração, se mobilizar e redefinir as perspectivas desses rumos.

Pessoas ou países mostram as caras semelhantes. Coletividades inteiras multiplicam por muitas vezes o processo dos indivíduos de que as compõem. Cada pessoa soma no resultado. Se o mundo formou o que existe, todos respondem pelo todo produzido.

Vive-se uma época de calmaria suspeita sobre inumeráveis barris de petróleo e ogivas nucleares. A Terra-mãe pena gemendo debaixo dos equívocos da raça humana, dona absoluta de tecnologias corrosivas. Milênios e milênios de trabalho e luta redundaram nesse filme antigo que, lagarto pegajoso, que invade as nossas casas e cobre nossos sofás. O preço conduz os corações e as mentes, poder totalitário das bolsas a impor normas e gritar ameaças de guerra.

Entretanto, novas respostas existem, no auge do império de medo e portas fechadas. Vêm através das íntimas consciências de cada uma das imprevisíveis criaturas humanas, fruto da luz transformadora, pela calha daquilo que se convencionou chamar de esperança e criatividade. Elaborar do espaço interior a renovação significativa de ampliar as atitudes para além das bases tão só materiais.

Há, por isso, níveis outros de apreensão da mesma realidade, tantas vezes inacessíveis a humanos, que surpreenderiam poetas e sonhadores. Testemunham essa possibilidade os cavaleiros andantes do espírito. Ano após ano, eles escrevem-se o discurso das eras.

Na dança, nações elaboram caminhos válidos. Turnos de idade se completam. Novas populações se sucedem. Nascem chorosas. Crescem ricas de força. Cantam. Falam. Constroem. Competem. Matam. Salvam. Criam fama. Chegam cedo e voltam tarde. Inveterados poluidores de rios, mares, lagos. Destruidores de florestas. Exterminadores de espécies. As folhas dos calendários viajam no vento das tardes azuis. Enquanto isso, vaidades provisórias tecem as notas da sinfonia de coisas eternas, nas dobras perfumadas do ano que começou.

Feliz Ano Velho e Próspero Ano Novo!

sábado, 22 de dezembro de 2007

Pastel de Miolos


Tem o lance da coerência. Ou seja, nunca perder o prumo da coisa, o essencial. E pra esses caras, o essencial ainda é (importante esse "ainda") tocar um bom punk rock comaqueal mesma temática que tantas vezes a gente acha batidona e antiquada.

Vale conferir o novo Ep dos caras. E outras ondas (orkut, fotolog etc). Tudo lincado lá.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Poema de Natal



Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.

Vinicius de Moraes

ESPERANÇA E AÇÃO

Pedro Esmeraldo

Aproxima-se o ano de 2008. Infelizmente uma velharia arcaica teima em querer liderar o destino desta cidade. Seria melhor que entregassem os pontos e dessem oportunidade aos jovens, orientando-os a seguir o caminho reto da política.
Falo principalmente da política escolar, vez que anda desprezada pelas autoridades, pois, têm o hábito de fechar escolas dos sítios, desprezando a sua população e privando de melhorar o índice de ensino elementar. Para a surpresa de muitos essas autoridades fecharam a Escola Maria Amélia Esmeraldo no Sítio São José, causando revolta em toda população.
Escola – define-se como uma função, constituindo-se um sistema com dedicação como uma posição administrativa de formação de professores. Considero como uma interação entre professores, alunos e sociedade.
Escola renovada deve ser dinâmica cultural, constantemente reformulada a fim de atender todas as funções sociais apresentadas simultaneamente de renovação em suas estruturas, observando os fatos diversos, com secretárias adequadas ao sistema escolar.
No decorrer do Ano a escolinha Maria Amélia do Sítio São José impulsionando por medidas arbitrárias do Secretário de Educação, sem conhecimentos dos fatos, achou por bem fechar essa referida escola, talvez por pirraça, deixando as crianças sem estudo e sem apoio cultural. Dizia esse secretário que lá não possuía alunos suficientes para mantê-la em atividade. Lugar densamente povoado, não é de bom alvitre fechar escolas, já que o índice de analfabetismo é muito grande e não é permitido de forma alguma privar essas crianças do estudo. Ao mesmo tempo, lembro a esse secretário que Crato é um município grande e cheio de problemas, não se concebe toldar a consciência do povo que vive desestimulado pelas autoridades do ensino, vez que fazem questão de tirar das crianças esse melhoramento. Ao meu ver, o nobre chefe do poder executivo deve ter bom senso e saber escolher pessoas adequadas, dignas de merecimentos para assessorar o seu gabinete, pois, trarão bom desempenho na sua profícua administração. Infelizmente, o chefe do poder executivo municipal não teve sorte na escolha de seus assessores, colocando pessoas inadequadas que atrapalham o desempenho de uma perfeita administração. Com isto, quero dizer, quem deveria ocupar cargos de assessorias são homens habilitados e eficientes nos cargos que devem ocupar.
Creio que o nobre prefeito compreendera e tomara decisões satisfatórias e escolhendo pessoas cursadas em sua área, já que talvez mudará o ritmo do desenvolvimento da administração cratense.
Com certeza, o Crato caminhará no caminho reto e equilibrado.
Todo cratense esperançoso deseja que o chefe do poder executivo faça uma programação mais digna e entre em entendimento com os demais secretários, aproximando-se do povo trazendo prosperidade e fé, tirando Crato deste marasmo.
Caríssimos,
Aproeitemos as horas disponíveis deste fim-de-semana/Natal (22 a 25 de dezembro) para atualizarmos nossas indispensáveis leituras. A Veja nº 2040, de 26.dez.2007, traz na Páginas Amarelas, uma entrevista com um dos maiores historiadores do Brasil, José Murilo de Carvalho. Pela lucidez do entrevistado vale a pena conferir...
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Entrevista: José Murilo de Carvalho

Tentação secular

O historiador aponta os riscos do projeto de Brasil potência e diz que o país está mais longe
dos ideais republicanos do que durante o Império


Ronaldo Soares

Oscar Cabral

"O nacionalismo associado aos ideais de grande potência sempre foi aliado do autoritarismo"

O historiador José Murilo de Carvalho, de 68 anos, é um dos mais sagazes intérpretes do Brasil desde o Império. No governo Lula, Carvalho identifica um mal secular, que ele chama de "síndrome de grande potência". O que é isso? É o ideal ressuscitado de grande império, cultivado no Brasil a partir da chegada da família real portuguesa, em 1808, e retomado mais tarde pelos governos militares. No atual governo, ele se manifesta no envio de tropas ao exterior, na pretensão de ter assento no Conselho de Segurança da ONU, nas práticas neoterceiro-mundistas do Itamaraty. Doutor em ciência política pela Universidade Stanford (EUA) e professor titular do Departamento de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Carvalho é autor de uma magistral biografia de dom Pedro II, lançada neste ano. Membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), esse mineiro de Andrelândia recebeu VEJA para uma entrevista no recinto preferido da ABL: a biblioteca de 22 000 volumes, onde há preciosidades como a primeira edição de Os Lusíadas, de 1572, e um raríssimo exemplar das Rhythmas, também de Camões, datado de 1595.

Veja – Que herança o Brasil deve à transferência da família real portuguesa para o país, em 1808?
Carvalho – A vinda da família real foi, sem dúvida, uma condição necessária para a existência do Brasil. Se dom João tivesse optado por ficar em Portugal, nosso país não existiria tal como é hoje. Aconteceria aqui o que houve na colônia espanhola da América, uma divisão em países, provavelmente uns cinco. O Brasil oscilou entre a fragmentação e a unidade até 1850. Mas não se fragmentou porque, com a transferência da coroa, se estabeleceu no Rio de Janeiro um centro de legitimidade política sobre as subdivisões da colônia. A atuação da corte no Rio foi fundamental para manter nossa unidade, inclusive com o uso da força contra movimentos separatistas. Viabilizou-se o projeto de grande império, que reforçou essa unidade. Entre os pontos negativos há o fato de que a corte portuguesa era uma das mais atrasadas da Europa. Não fez a reforma religiosa do catolicismo, nem a revolução econômica do capitalismo, nem a revolução científica. Outro ponto frágil foi a educação popular, que era um desastre na colônia e continuou desastrosa durante o Império e nos 100 anos de República.

Veja – Esse ideal de grande potência foi retomado em outros momentos da história brasileira.
Carvalho – Esse é um ideal recorrente. Foi retomado pelos governos militares e, ironicamente, está em voga novamente. São versões distintas do mesmo sonho (ou do mesmo complexo) de grandeza. Elas têm como base, naturalmente, o tamanho e as riquezas do país, motivos de orgulho nacional até hoje. No início do século XIX havia o sonho de fazer um império no modelo dos que existiam, sobretudo o da Grã-Bretanha. Nos governos militares esse ideal ressurgiu, mas num conceito de grande potência, a ser construída com a força econômica e militar, a vigilância implacável sobre o inimigo externo e a manutenção incondicional da soberania. O sonho foi retomado pelo atual governo e se manifesta, entre outras coisas, pelo envio de tropas ao exterior, pela pretensão de admissão no Conselho de Segurança da ONU, pelo empenho em exercer um papel de liderança na América Latina. Ainda é um ideal um tanto envergonhado, sem que haja uma clara estratégia de ação. Mas é possível identificar essas manifestações em setores do Itamaraty que praticam o neoterceiro-mundismo. Veja o caso do Centro de Estudos Brasileiros, em Oxford. De uma hora para outra, ninguém mais queria ajudá-lo. Há uma oposição explícita no Itamaraty e em outros setores do governo contra ele. Não que o governo tivesse de mantê-lo, mas era de esperar que se mostrasse interessado em ajudar. Era fácil, é pouco dinheiro. Não só não houve apoio, mas em certos setores houve uma objeção clara. Isso é fruto dessa política de se voltar mais para a América Latina, para a África, e não para os grandes centros. Acho lamentável, uma estratégia míope. Uma coisa não precisa excluir a outra.

Veja – Quais são os riscos embutidos nesse projeto de grande país?
Carvalho – É quase impossível um país como o Brasil não exercer um papel de liderança regional, pelo menos em relação a nações menores e de médio porte. A idéia é tentadora, exatamente pelo tamanho do país e seus recursos. O risco é que acabemos por desviar a atenção dos problemas internos em busca do sonho de grandeza externa. Hoje, não há liderança externa sem que a casa esteja arrumada. Não só na economia, mas principalmente no bem-estar da população. Nos Estados Unidos, falava-se em Destino Manifesto, e eles construíram um império. Nós sempre falhamos.

Veja – As tentações autoritárias que rondam setores do partido no governo decorrem desse ideal ressuscitado de grande potência?
Carvalho – A relação entre essa tentação e o sonho de grandeza atual não está clara. Os nacionalismos, que freqüentemente estão associados aos ideais de grande potência, sempre foram fortes aliados de autoritarismos, quando não seu instrumento. Lembremo-nos do Estado Novo. Mas no atual governo não está nítida a relação entre as duas coisas. As tentações autoritárias de natureza ideológica talvez venham mais de setores do PT do que do presidente. A motivação de Lula parece mais de natureza política. Diante do grande apoio popular que ele conquistou, imune a todas as denúncias surgidas de 2005 para cá, deve ser grande a tentação do autoritarismo populista diante dos obstáculos criados pela oposição. Um sinal que poderia apontar nessa direção é a aproximação com Hugo Chávez. Lula certamente está observando com atenção o comportamento de Chávez, que combina populismo, petróleo e uma política externa agressiva com claras pretensões de liderança na América do Sul. Se há de fato alguma intenção brasileira de exercer a liderança nesta parte do mundo, em algum momento haverá uma trombada com Chávez.

Veja – O senhor vê em Lula alguma inclinação a arroubos autoritários como os de Chávez?
Carvalho – Há uma armadilha aí. Os escândalos políticos não colaram no presidente porque ele é um distribuidor de benefícios. No atual mandato, a instituição que mais se desmoralizou foi o Congresso. Se você tem uma economia melhorando, um presidente com apoio popular e um Congresso desmoralizado, qual o resultado? A América Latina está nos mostrando o risco. Isso tem a ver com a discussão sobre o terceiro mandato. Um plebiscito como Chávez fez, para saber se a população quer ou não mais um mandato para Lula, pode acontecer aqui. Vai depender de quais são, do outro lado, os fatores de contenção. Creio que temos uma maturidade democrática bem mais sólida do que a Venezuela. Mas a minha impressão é que o presidente vai jogar com essa dúvida até bem próximo da eleição. Politicamente, é interessante para ele, para desorganizar a oposição, deixar no ar se vai se candidatar ou não.

Veja – Por que o Brasil ainda patina no atraso, muito atrás de países tão jovens como nós, caso dos Estados Unidos?
Carvalho – Porque somos um país sem revolução, sem rupturas. Não houve ruptura na Independência, e as guerras civis que aconteceram depois foram regionais. A proclamação da República foi menos agitada ainda do que a Independência. Outro exemplo: a escravidão. O próprio imperador era contra, mas aquilo foi se arrastando, se arrastando, até sermos o último país a promover a abolição. Foi tudo feito de forma tranqüila, com flores. Com essa falta de rupturas internas, a gente perde tempo e vai se atrasando nas reformas que precisam ser feitas. Se por um lado fomos poupados da violência de guerras civis, por outro as coisas caminharam com muita lentidão aqui. São raros os momentos em que houve algo parecido com um processo de ruptura.

Veja – Qual é o principal exemplo?
Carvalho – A Revolução de 1930. O Brasil moderno começou ali. Até então, o governo central estava praticamente desarmado, não tinha condições nem de pensar em adotar políticas públicas no país. A proclamação da República significou um fortalecimento do federalismo e a conseqüente perda de relevância do governo central na vida nacional. Mas a partir de 1930 o país começou a se mexer. Houve uma retomada da centralização imperial, não mais com um imperador, mas com um político muito hábil à frente do poder. Iniciou-se uma política de industrialização para o país, já no segundo mandato de Getúlio Vargas. A legislação social entrou com muita força. Adotou-se uma política econômica de substituição de importações. Ou seja, passou a haver um governo central com diretrizes nacionais.

Veja – Lula gosta de se comparar a Getúlio. A comparação faz sentido?
Carvalho – O que Lula fez foi uma guinada getulista. Ele manteve a política econômica de Fernando Henrique Cardoso e expandiu extraordinariamente a política social que seu antecessor havia iniciado. Isso mudou seu eleitorado na segunda eleição e passou a marcá-lo como líder popular, que muitos chamam de líder populista. Getúlio promoveu a inclusão social, introduziu a legislação trabalhista, a CLT, o que foi um marco extraordinário. A diferença entre ele e Lula é que a legislação de Vargas era para os operários sindicalizados do setor formal. Hoje, o setor formal da economia corresponde a 40%. As políticas de Lula se destinam aos 60% que constituem o setor informal da economia. O povão está sendo atendido. Essa foi a base do apoio de Lula em sua reeleição.

Veja – Na comparação com Fernando Henrique, quem se sai melhor?
Carvalho – Lula teve uma sorte enorme. O segundo mandato de Fernando Henrique foi um desastre, e contribuíram muito para isso os fatores externos, como as crises financeiras internacionais, que jogaram os juros lá para cima e desvalorizaram o real. Já o governo Lula pegou um período sem turbulências, com o aquecimento da economia mundial. O que não havia no primeiro mandato de Lula era desenvolvimento econômico. Mas as condições dadas pela manutenção da política de Fernando Henrique começaram a dar resultados agora, porque as taxas de crescimento econômico estão começando a subir.

Veja – Lula ainda teve a sorte da descoberta do campo de petróleo de Tupi...
Carvalho – O campo de Tupi caiu do céu para o sonho de grandeza. É uma boa notícia, mas também representa um alto risco, pois o petróleo pode ser uma maldição. Se as reservas forem do tamanho previsto e puderem de fato ser exploradas, haverá uma tentação muito grande: a de usar os recursos para fins paternalistas dentro do Brasil e projetos aventureiros fora do país, como faz Chávez. Temo pelo afogamento da República num mar de petróleo quando penso nas conseqüências internas: uma política populista-distributivista, um consumismo generalizado, um país transformado num imenso INSS, a antítese do ativismo cívico. Será necessária muita maturidade para o país não se lambuzar no ouro negro, para que ele resista ao "distributivismo" interno e ao "aventureirismo" externo.

Veja – Que conselhos o senhor daria ao político que quiser desbancar o candidato de Lula em 2010?
Carvalho – Assim como Lula teve de adotar o compromisso com a estabilidade econômica para se eleger pela primeira vez, quem quiser derrotá-lo terá de convencer o povo de que não vai mexer nas políticas sociais. Esse candidato vai ter de dialogar com o povão. Se ele se pautar apenas por temas de apelo junto à classe média, à opinião pública, como o combate à corrupção, estará perdido. Opinião pública não elege mais presidente. A reação contra a corrupção é algo muito específico da classe média, de gente que paga imposto e não vê nada sendo retribuído. Do ponto de vista de quem está recebendo o Bolsa Família, a questão da moralidade política vem em segundo lugar. Para quem vive em um mundo de necessidades, moralidade é luxo.

Veja – Hoje existe mais corrupção no Brasil ou há mais controle e mais transparência nos atos públicos?
Carvalho – A corrupção aumentou, sim. Quando os republicanos falavam em corrupção no Império, a referência não era às pessoas, mas ao sistema em si, no sentido de que ele não funcionava. Em 1930 se chamava a República Velha de corrupta, mas também no sentido de que o sistema era corrupto, não as pessoas. A idéia de corrupção individual entrou no Brasil sobretudo contra Getúlio, quando a UDN começou a acusá-lo. Essa reação a Getúlio se estendeu a Juscelino, que foi o primeiro presidente real-mente gastador da história do Brasil. Com os governos militares, o estado cresceu. Quando crescem o estado e os bens disponíveis nas mãos dele, as oportunidades de corrupção aumentam enormemente. E, atualmente, ela é mais extensa e mais sistemática do que em outros tempos.

Veja – O senhor vê alguma saída para esse problema?
Carvalho – O que aconteceu no caso do mensalão mostra que o problema da corrupção perpassa praticamente todos os setores da sociedade, do governo e fora dele. Ocorre então essa sensação quase de fatalismo, de que a gente não tem o que fazer, de que isso é nosso, feijão-com-arroz, coisa brasileira. Quando tomamos a expressão república no sentido preciso da palavra, de coisa pública, como no modelo antigo, romano, de república, percebemos que estava presente a preocupação com o bem público, com a honestidade no trato com o bem público. Paradoxalmente, esses ideais republicanos estiveram muito mais presentes no Império, com dom Pedro II. A nossa República está muito longe disso. Não vejo solução a curto prazo.


Um Natal Brasileiro

Neste Natal queria ser diferente!fazer um Natal brasileiro completo em sua montagem. Naturalmente autêntico,usando nossa cultura e riqueza sem nada, nada... copiado de fora.

Minha árvore, uma linda carnaúba com suas folhagens bem largas. Enfeitando, só flores do campo diversos tipos, coloridas, mostrando a alegria bem nata da essência brasileira.

Luzes piscando ao redor nas cores da nossa bandeira verde, amarelo, azul e branco dizendo pra quem puder ver que estamos vivos, alertas felizes... Sobrevivendo...

Nada de presentes em volta só muitas crianças sentadas observando com alegria, cantando... Tentando mostrar que a esperança ainda se encontra presente, marcante batendo incontinenti, no coração brasileiro.

Nossa mesa linda, grande e farta só de frutas nacionais manga, uva, abacaxi, pequi, melancia, laranja, caju, acerola, banana nada de muita comida além... A não ser a rabanada de pão velho regadas com água de coco.

A música um som bem nativo nada de muito estridente mas só bem cadenciado o molejo e o trinado de um chorinho bem da terrinha, mostrando que nós brasileiros buscamos em nossas raízes a verdadeira faceta da nossa identidade.

Papai Noel de bermudas, descamisado já que aqui é verão. Nada de barba comprida, trenó Pra que? se nem neve nós temos.Viria de barcaça ou jangada saindo de dentro do mar.

Suas renas seriam golfinhos ou quem sabe até gaivotas. Elas o trariam felizescercados por andorinhas seguidas de outros pássaros araras, papagaios, periquitos canários, sabiás, tuiuius e bem-te-vis.

O calor dos nossos dias é como um imenso coração sempre aberto e hospitaleiro batendo com magia, euforia, solidariedade, amizade. Amor pelos seres humanos que são nossa sociedade vibrante por uma grande união.

Presentes distribuídos: empregos, saúde, escolas o fim dos desabrigados o fim da violência hostil o não a corrupção.Numa união: políticos versus o povo em prol de uma grande nação.

Feliz Natal meus irmãos
Feliz Natal meu povoFeliz Natal BRASIL!!!
Que sobreviva a esperança
vencendo o caos da nação.


Stella Siebra

"Entre Telhas" - Exposição da artista Plástica Josely Carvalho.


“Entre Telhas”

Exposição da artista Plástica Josely Carvalho.

Até 6 de Janeiro de 2008 no Centro Cultural Banco do Nordeste-Cariri

Josely Carvalho é uma artista plástica e pesquisadora de vanguarda, trabalha com instalações diferenciadas, onde soluções eletrônicas e digitais se mesclam a materiais artesanais ou industriais, como por exemplo, telhas, tijolos, madeira. Partindo dessa premissa, a artista alimenta sua obra através de componentes como: objeto, gravura, pintura, poesia, vídeo, som, livro-arte, fotografia, instalação e web art. Book of Roofs, sua obra mais importante, é um trabalho em progresso, de alcance amplo, onde a idéia de abrigo é explorada em todas as suas conseqüências e contradições. Segundo Josely a telha é ao mesmo tempo metáfora e materialização dessa idéia: “ela nos protege dos rigores da natureza, da hostilidade dos adversários e oferece refúgio para nossa interioridade, como o casco da tartaruga ou a concha do caracol. Mas ela serve também, nessa obra, como uma matriz geradora de sentidos, a partir da qual se arma uma trama de temas correlatos: o problema dos que não têm teto para se abrigar, as crianças abandonadas nas ruas das grandes cidades, os que deixam seu teto para migrar a outros países em busca de oportunidades, povos que perdem seu teto por invasão estrangeira, e assim por diante”. A idéia, originalmente materializada sob a forma de instalações, fazendo combinar esculturas constituídas de pilhas de telhas e projeções de vídeo sobre elas, migra mais recentemente para o ambiente virtual da Internet. O livro das telhas de Josely Carvalho, agora em formato eletrônico, é construído de modo que cada telha funciona como uma página e em cada uma delas inscreve-se um pensamento, uma imagem, um som, ou uma combinação deles todos, na tentativa de construir uma memória inicialmente individual da artista e, depois, com a colaboração de cada vez mais pessoas se unindo em volta de uma memória coletiva sobre a busca e a perda do abrigo. Desenvolvendo assim uma teia dialogal, através da web.

Josely Carvalho reside em Nova York desde 1976 sendo que nos últimos anos mantém um segundo ateliê no Rio de Janeiro. É constantemente contemplada com um grande número de bolsas e prêmios entre eles; National Endowment for the Arts 1995-96 (NEA); New York Foundation for the Arts 1987 & 1999 (NYFA); Rockefeller Foundation, Bellagio International Study Center, 2000; Art Matters Inc.; Creative Time.

Seu projeto Book of Roofs/Livro das Telhas (http://www.book-of-roofs.net) recebeu bolsa-premio do Creative Capital Foundation 2000-05; artista-em-residência na Harvestworks Media Lab Center, Nova York, 2001 e New York State Council for the Arts 2001-02. Com este projeto, tem participado de muitos eventos e exposições no Brasil, Europa e nos Estados Unidos assim como vários arquivos de web art. Entre eles: Museu de Arte Contemporânea do Paraná, 2000; Des Lee Gallery, Wildwood Press em St. Louis, MO., 2002; ISEA/2002, Nagoya, Japan; VIPER International Festival of Film/ Video and New Media, Basel, Switzerland; File 2002, São Paulo; Museu de Arte Contemporânea de São Paulo, 2003; SESC Flamengo, Rio de Janeiro, 2004; Centro Cultural da Caixa, Brasília, 2005.

Josely Carvalho tem realizado diversas exposições individuais, entre elas: Galerie 1816, Bretenoux, France; Centro Cultural da Caixa, Brasília; Art in General, Nova York; Museu de Arte Contemporânea de São Paulo; Intar Gallery, Nova York; Casa de Las Americas, Havana, Cuba; Museu de Arte de São Paulo; Museu de Arte Contemporânea do Paraná; Tyler Gallery, Tyler School of Art, Philadelphia; Gallery North, Miami Dade College, Miami; Olin Gallery, Kenyon College, Ohio; Insituto de Arte da Universidade de Brasilia; Hillwood Museum, N.Y.; Paço das Artes, São Paulo. Entre suas exposições coletivas encontram-se: Decade Show, New Museum of Contemporary Art; Bienal Internacional de Pintura, Cuenca; Mexican Museum, San Francisco; Museo del Barrio, N.Y.; Museu de Arte Moderna (MOMA), N.Y.; Franklin Furnace, Nova York; Museo de Bellas Artes, Caracas; Bronx Museum of Art, N.Y.

Desde o dia 19 de outubro está sendo realizada uma exposição de obras de Josely Carvalho no Centro Cultural Banco do Nordeste do Cariri na cidade de Juazeiro do Norte. Salientando que a exposição foi visitada por mais de mil pessoas. A artista foi convidada para expor na região a partir de um projeto idealizado por Ana Mae Barbosa*, Arte Educadora Professora Doutora aposentada da USP e uma das pioneiras da arte-educação no Brasil e Fábio Rodrigues**, Arte – Educador Professor Doutor, titular da Universidade Regional do Cariri. Que serão os curadores da exposição.Segundo Josely, - que veio até a região para conhecer de perto as influencias e segmentações artísticas caririenses - a apreciação do convite partiu do desejo de conhecer a região e de reconhecer-se como artista no contexto da terra como um todo. “O artista tem a tendência de querer ficar nas grandes capitais, todavia, é interessante realizar esse tipo de pesquisa in loco para que não haja uma espécie de separatismo em relação a grandes e pequenos centros, afinal para se ter uma real visão de mundo precisamos, no sentido ético, de sentir a interação entre o lugar e nossa obra” ressaltou.

“Entre Telhas”

De 19 de outubro de 2007 a 6 de janeiro de 2008 no Centro Cultural Banco do Nordeste- Cariri- Rua São Pedro 337- Centro- Juazeiro do Norte - CE

Fone- 88-3512-2855

De terça a sábado das 13 as 21horas

Texto: Hermínia Rachel Saraiva

Publicação do cariricult: Dihelson Mendonça

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quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Parabéns Zé Flávio!

O que seria de nós sem essa grande figura "Dr. Zé Flávio"? Parabéns Zé! Vida longa, saúde e paciência com a gente que lhe quer tanto bem.

CARIRI – A Nação das Utopias (parte 5)


Texto de Rosemberg Cariry


O boi Ápis mora em Baixa Dantas

Filho espiritual do padre Ibiapina, de Antônio Conselheiro e do padre Cícero, José Lourenço, um negro natural da Paraíba, ainda muito jovem, chegou ao povoado de Juazeiro do Norte (1890), atraído pelas notícias maravilhosas do “Sangue Aprecioso” da beata Maria de Araújo e pela fama milagreira do padre Cícero. O clima místico da cidade despertou a sua vocação religiosa e ele decidiu ser um beato. Ele poderia ter sido apenas mais um, entre as dezenas de beatos e beatas que perambulavam e esmolavam pelas ruas da cidade, vigiados de perto pelo olhar tolerante do padre Cícero. Mas a sua vivacidade, inteligência privilegiada e grande capacidade de liderança logo o fariam célebre na região. Seguindo os conselhos do padre Cícero, no início deste século, o beato José Lourenço arrendou o sítio Baixa Dantas, nas proximidades do Crato e para lá seguiu com diversas famílias, escolhidas entre as muitas que chegavam a Juazeiro nas grandes romarias. Organizando a comunidade com o rigor do trabalho e da oração, o beato José Lourenço conseguiu, em pouco tempo, resultados surpreendentes na agricultura, na criação de gado e na produção artesanal. A terra, até então tido como árida e encapoeirada, foi transformada, pelo esforço coletivo, em um verdadeiro pomar, produzindo frutas e hortaliças, além de algodão, café, arroz, feijão e mandioca. O produto da terra era repartido de forma igualitária entre os membros da comunidade que trabalhavam o dia inteiro e, à noite, se reuniam para as rezas, as novenas e as ladainhas.

A sorte da comunidade começou a mudar quando o beato recebeu do padre Cícero um boi zebu, de grande porte e beleza, que recebeu o nome de Mansinho e foi usado como reprodutor para melhorar os rebanhos da região. Por ser propriedade do padre Cícero e símbolo da bondade, da calma, da força pacífica e da fecundidade (rf. visão de Ezequiel), o boi Mansinho passou a ser tratado com muitos cuidados: banhos todos os dias, guirlandas de flores silvestres nos seus chifres e repasto do melhor capim. Como o “milagre da produção” realizado pelos “fanáticos e analfabetos” de Baixa Dantas já era visto como um perigo pela alta sociedade do Crato e de Juazeiro, o zelo com o boi terminou servindo para alimentar muitas fantasias maldosas. Ditos em palavras e firmados em letra de forma , os boatos davam conta de que a urina e as fezes do boi serviam de remédio (costume tradicional da medicina popular) e que era conduzido em procissão pelos seguidores do beato que o adoravam como Ápis - o boi sagrado do Egito. Floro Bartolomeu, influente político local e braço direito do padre Cícero, sentindo-se ameaçado pela crescente liderança do beato José Lourenço, acusa-o de “negro fanático”, manda prendê-lo e faz o boi Mansinho ser executado em praça pública do Juazeiro, para servir de exemplo contra os excessos da religiosidade popular. Que ficasse claro para o povo quem eram os verdadeiros líderes, representantes da “ordem e do progresso”, na região. Pouco tempo depois, liberto por influência de alguns pequenos proprietários de terra do Crato que também se beneficiavam com a mão-de-obra disponível no sítio Baixa Dantas, o beato retornou à comunidade, mas a desgraça viria novamente bater à sua porta. Com interesse nos muitos benefícios que foram realizados em suas terras, o Sr. João Brito, proprietário do sítio Baixa Dantas, despejou o beato José Lourenço e os romeiros da sua propriedade, sem pagar nenhuma indenização pelas benfeitorias realizadas.

Reinventando o paraíso

No ano de 1926, o padre Cícero procurou uma forma de aliviar os problemas causados pelo crescimento populacional de Juazeiro, que contínuo e desordenado. Ele orientou que as famílias de romeiros ocupassem as terras devolutas da chapada do Araripe e da Serra de São Pedro. O padre Cícero pediu ao beato José Lourenço que ele seguisse com várias famílias de romeiros para o sítio Caldeirão, de sua propriedade, localizado na cidade de Crato. O Caldeirão era um pedaço de terra “tirana”, seca e imprestável, de aspecto soturno com seus grotões (daí o nome “Caldeirão”) onde acumulava-se alguma água das boas invernadas. Esses grotões de água estagnada, com capacidade de resistir mesmo às secas mais sedentas, era também a morada da Mãe d’Água.

No Caldeirão, o beato estabeleceu a Irmandade da Santa Cruz do Deserto, ordem leiga de pobres penitentes - da qual ele era o “decurião” – aquele que planejava e governava a vida religiosa, social e econômica da comunidade. Trabalho, planejamento, inovação das técnicas agrícolas tradicionais, irrigação, disciplina, justiça social, fé em Deus e determinação para criar um novo mundo, foram os elementos fundamentais que transformaram o Caldeirão numa espécie de “celeiro do Cariri”. Plantações de algodão, arroz, cana e centenas de pés de frutas (laranja, abacate, cajá, banana, jaca, etc.) tomaram conta das paisagem. Desenvolveu-se a criação de pequenos animais domésticos e selvagens (bois, porcos, galinhas, emas, pavões, mocós, veados, teiús, preás etc.), foram erguidas 400 casas, um engenho para o fabrico da rapadura , um aviamento para a produção de farinha, depósitos para armazenar víveres, além de dois pequenos açudes que permitiam um sistema rústico de irrigação. Nas forjas, carpintarias e teares eram fabricados quase todos os bens de consumo e de produção de que a comunidade precisava: arados de madeira, moendas de engenho, prensas de aviamento, móveis, enxadas, pás, facas, tecido para roupa, alpargatas, gibões de vaqueiro, selas para animais, cabrestos, etc. A comunidade era auto-suficiente e os bens eram distribuídos de forma justa e igualitária entre os membros da comunidade (cada um trabalhava conforme a sua capacidade e recebia conforme a sua necessidade). Tudo o que sobrava da produção era armazenado e uma pequena parte destinada a venda e a troca com fins de venda e troca por alguns produtos impossíveis de serem produzidos na comunidade. A saúde da comunidade, preventiva e curativa, estava sob a responsabilidade do velho Bernardino, homem de grande conhecimento das qualidades farmacêuticas da flora regional e que tinha alguns conhecimentos práticos da medicina por ter sido enfermeiro em Recife. A fartura e a paz social do Caldeirão anunciavam-se aos olhos, barrigas e corações, de milhões de sertanejos como o “País de São Saruê” com suas farturas sem fim e delícias incontáveis. O beato Severino Tavares, arauto do evangelho popular, varava os sertões, anunciando a Terra da Promissão ( o País de São Saruê) para o novo povo escolhido por Deus (o selo da nova aliança se dera no Sangue vertido na boca da beata Maria). Ao Caldeirão, a cada ano, chegavam muitas famílias fugindo da fome e da servidão dos latifúndios. O crescimento da comunidade provocava inquietações nas autoridades e proprietários de terra da região que classificavam aquela experiência coletiva popular como “coisa de comunistas”. Denunciado em 1930, como subversivo e potencialmente perigoso para a ordem estabelecida, o beato José Lourenço recebe a vista de soldados das colunas revolucionárias tenentistas que tinham invadido o Cariri, sobretudo Juazeiro, o domínio do padre Cícero. No Caldeirão, os soldados nada encontraram, além de santos e utensílios de trabalhos. O beato e a sua comunidade são deixados em paz, os revolucionários tenentistas trataram de acomodar os seus novos interesses com os tradicionais interesses dos coronéis da região. A revolução de 1930 aconteceu para que tudo continuasse como antes ou como diziam seus líderes: “Vamos fazer a revolução antes que o povo a faça”. Na seca de 1932, enquanto milhares de camponeses morriam de fome nos campos de concentração organizados pelo Governo Federal, os camponeses que chegavam ao Caldeirão conseguiam sobreviver graças à grande quantidade de víveres estocados.

Com a morte do padre Cícero, em 1934, o sítio Caldeirão foi deixado em testamento para os padres Salesianos e estes logo reclamaram a retomada de posse da propriedade. O beato José Lourenço ainda tentou comprar o terreno, inutilmente. O clero regional, os políticos da Liga Eleitoral Católica e os grande proprietários de

terra viam no Caldeirão um exemplo que não deveria continuar por subverter a ordem vigente. Como preparação da destruição final, surgiram denúncias de que o beato era um perigoso líder comunista, que tinha um harém, que preparava o povo para a luta armada, etc. Os boatos e as calúnias antecipavam a repressão. Eram formas preventivas de proteger a (má) consciência para as violências e os horrores que logo viriam com a destruição da Comunidade. Eram estratégias para aqueles que precisariam, de alguma forma, ser, depois, justificados. Ao ter informações de primeira mão sobre a eminente invasão do Caldeirão, a Irmandade da Santa Cruz do Deserto resolveu que os beatos José Lourenço, Severino Tavares e alguns outros deveriam refugiar-se na chapada do Araripe. O Caldeirão ficou sob o comando de Isaías, um dos líderes da Irmandade. Tal precaução mostrou-se acertada por preservar parte da liderança popular. No dia 9 de setembro de 1936, uma expedição da polícia Militar, invadiu e destruiu o Caldeirão. As casas e armazéns foram saqueados e incendiados. Os homens, mulheres e crianças, humilhados e impotentes ante a agressão armada, foram aprisionados e amontoados nos currais de gado, sob coronhadas e pontapés dos policiais.

Surgiu a dissidência no seio da Irmandade. O beato José Lourenço, para a retomada do Caldeirão, pregava uma solução negociada com o governo. Já o beato Severino Tavares era partidário da retomada do Caldeirão pelas armas. Parte do povo refugiado aceitou a liderança do beato Severino Tavares e, em maio de 1937, atacou com paus, foices e pedras, policiais que foram atraídos até a chapada do Araripe. Morreram no embate o Capitão José Bezerra (um dos comandantes da invasão), o seu filho Anacleto e mais dois soldados. A morte do Capitão e dos soldados acendeu o pavio do barril de pólvora. O interventor Menezes Pimentel enviou reforços militares e três aviões para combater a “Nova Canudos”, o que resultou em um terrível massacre, com centenas de camponeses mortos, tanto entre os seguidores de Severino Tavares como entre os seguidores do beato José Lourenço. Alguns anos depois, quando ficou provada a sua inocência no caso dos policiais mortos na Chapada do Araripe, o beato José Lourenço pôde, por fim, estabelecer-se no sítio União, em Pernambuco, onde viveu até o ano de 1946, época em que morreu vitimado pela peste bubônica. O seu corpo foi conduzido em uma rede, nos ombros de homens que se revezavam na longa caminhada, para o Juazeiro do Norte, onde foi sepultado. Execrada e proibida durante décadas, a memória do beato José Lourenço e da comunidade do Caldeirão foi resgatada pelo povo Cariri, a partir do início da década de 80. O mito de José Lourenço fez o caminho inverso do mito de Tristão Gonçalves de Alencar Araripe. Se, no caso de Tristão Gonçalves, a “alma afoita” virou “alma santa”, no caso do beato José Lourenço, a “alma santa” virou “alma afoita” e tornou-se um símbolo da resistência popular. O beato José Lourenço, hoje, é legenda nas Romarias da Terra e nas invasões dos latifúndios pelo MST - Movimento dos Sem-Terra.

Sobre religiões e grandes idéias

"A foto aí em cima é emblemática. "Deus é fiel" sobre a bandeira brasileira, é este o desejo deles, estender sobre o país seus lemas furados. Deus é fiel! Deus não foi fiel com o garoto Victor arrastado pelas ruas do Rio de Janeiro. Deus está sendo fidelíssimo com Paulo Maluf, Collor, Hugo Chaves, com os Bush, com a familia real britânica... Deus não foi fiel com os inqiuilinos do World Trade Center, mas mostra-se fiel para com Osama Bin Laden e seus asseclas.


Esta coletivização de deus me parece um embuste contábil. Todo homem tem direito a um deus individual, único. Eu criei meu proprio deus e não divido com ninguém. Meu deus não está a venda.


Não tenho absolutamente nada de pessoal contra os evangélicos, desde que eles fiquem lá ajoelhadinhos em suas igrejas, o mesmo vale para os carismáticos, católicos, espíritas e fãs do Roupa Nova, mas ao que tudo indica o futuro está nas mãos deles.


Os evangélicos e religiosos em geral, mas em especial evangélicos e católicos travam uma guerra silenciosa por nossas cabeças. Eles já monopolizam as rede de rádios, estão invadindo as tvs, jornais, a câmara de vereadores, a assembléia legislativa... o congresso nacional está emtupido deles. E o que eles querem? Uma nação cristã! E que diabos é uma nação cristã? Na opinião deles é uma nação sem gays, lésbicas, sem prazer, sem sexo oral, sem bares, sem cerveja, sem debate de idéias, sem “prostitutas bonitas pra gente namorar”, sem bons livros, filmes, música... um mundo incolor. Por que incolor? Para que todos possam então voltar seus olhos pro céu, o futuro!


Em Londrina eles praticamente venceram. Vão aprovar a tal Lei Seca! Mas sei que eles estão atuantes em todo o país. São milhões de consumidores que não podem ser maltradados pelo comércio, indústria, entretenimento e claro, pelos políticos. E porque eles tem tanto poder? Porque eles, difentes de nós, simples mortais semi-ateus, temos que pagar impostos, já eles, felizardos de cristo, sonegadores autorizados, podem arrecadar milhóes sem a obrigação de contribuir com um único centavo para o país que eles querem governar! Eis a face destes cristãos oportunistas.


O futuro é cristão. Não aquele tipo de cristão que ama ao proximo e toma vinho com os amigos, mas aquele cristianismo medieval, teocentrista, assexuado, agrafo, atonal, insípido, incolor e inodoro.


Eles estao em toda parte, com suas bandas de hip hop, funk, rock, pop, sertanejo, erudito, blues, gospel o diabo! Logo eles estarão nas novelas, nos filmes, nos programas de auditório, nos livros, no teatro, no cinema, eles é que dirão o que eu posso ou não ver, ler, escrever, dizer e pensar... chegará o momento em que eles conseguirão expandir seus tentáculos pegajosos para todos os cantos, até chegar ao ponto de se estabelecer o tráfico de bons livros, filmes, música, até que se torne necessário a criação de uma máfia que talvez um dia cresça e tome finalmente o poder.


Não tenho absolutamente nada contra os evangélicos e cristãos em geral, até porque já não adianta nada."


Belo texto tirado de um blog, do Márcio Américo. Escritor que reside em Londrina. Vale a pena dar uma refletida. Principalmente por agora, perto do natal (vai em minúsculas mesmo), onde todo mundo acha bacana se trancar em casa, comer pra porra e sair no outro dia com a alma lavada, convictos de que fizeram um grande bem pra humanidade.