sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

LUIZ GONZAGA EM PARIS, DURANTE A DITADURA, VISITA VIOLETA ARRAES - José do Vale Pinheiro Feitosa

A ditadura mais duradoura do Brasil, com maior número de vítimas fatais e grande número de torturados e desaparecidos foi engendrada como uma luta contra o comunismo. Este pintado com todos os ingredientes semióticos da visão negativa da cultura brasileira de então. Ser comunista no Brasil, era igual à prisão, tortura e até morte. Era como ser acusado de bruxa pela Inquisição Medieval.

Como os comunistas brasileiros não eram tantos, o suficiente para fazer face ao arbítrio, o linguajar da ditadora, inclusive em atos institucionais e notas de imprensa ameaçadoras, adotou um estilo do tipo chocolate sonho de valsa. Usaram a palavra subversivo contra todos os opositores (inclusive liberais e ex-aliados como Lacerda) subentendendo que no núcleo duro estava o comunismo.

Entendido que ser comunista no Brasil era ser usurpado de todos os direitos humanos e políticos.

Ai vem a história que me contou ontem José Almino, o filho mais velho do grande político Miguel Arraes, uma vítima de destaque da perseguição do golpe militar de 64. A história aconteceu com Violeta Arraes e Luiz Gonzaga.

Seu Luiz era um sertaneja muito esperto, nunca foi de muita leitura, enquanto serviu no Exército, por mais de 10 anos, nunca prestou sequer um concurso para cabo. Foi soldado a vida inteira e ligado aos músicos dos quartéis. Mas isso não impediu de ser um dos homens mais reconhecedores da própria situação, que tinha um criatividade sem igual e que sozinho criou o estilo de música nordestina que pontuou nas cidades e ocupou as mídias fonográficas, o rádio e os shows.

Seu Luiz inventou o regional nordestino com uma oportunidade sensacional. Não podia correr as estradas carregando um bando de músicos. Inventou a formação da sanfona, o bumbo e o triângulo. Este último sendo um músico achável em qualquer canto do nordeste. Era a formação que poderia levar num automóvel de passeio.

Um gaúcho se apresentou, com sucesso, a caráter, num programa de auditório. Seu Luiz mandou comprar no Juazeiro a roupa de couro mais enfeitada que tivesse. Daquelas que os vaqueiros não usam. Fernando Lobo (pai do Edu Lobo) que tinha programa de auditório até proibiu seu Luiz de usá-la. Mas assim ele criou o estilo.

Seu Luiz se juntou à melhor safra de poetas com temática nordestina, com aquele estilo matuto, assim como já fizera Catulo da Paixão Cearense. Eram letristas da cidade e educados, mas criaram o estilo de qualidade. Um Patativa do Assaré seria mais autêntico que estes doutores da letra nordestina? Difícil dizer, tal foi a dimensão que a música de Luiz Gonzaga cobriu a cultura nacional.

A verdade é que seu Luiz sempre esteve junto aos políticos e os adulava mesmo. Como vinha da terra dos coronéis, ao político da linha ideológica de direita ele era mais próximo. Elogiou o golpe de 64 e os militares por trás dele. E participou de campanhas eleitorais contra Miguel Arraes, inclusive tirando frases da própria lavra.

Aí vem a história com Violeta Arraes. Gonzaguinha foi para a Europa e levou seu Luiz a tiracolo. Em Paris, na companhia de outro músico amigo da Violeta, quis visita-la. E foram os três, incluindo seu Luiz até a casa de Violeta. Quando chegaram a Violeta os recebeu com agrado mas pontuou que antes de tudo gostaria de lembrar a seu Luiz a campanha dele contra Miguel Arraes que era um político que representava os interesses do camponês nordestino. A mesma origem de Seu Luiz.

Seu Luiz com muita calma. Disse mais ou menos assim: Dona Violeta, eu sou um matuto pobre, de família pobre, nasci num lugar perdido do mundo chamado Exu, toco um instrumento que pouco valor tem no meio dos ricos e a senhora ainda quer eu seja comunista?

Ou seja, levar porrada da ditadura!

Todos riram da tirada de seu Luiz.


Naqueles idos Gonzaguinha fazia parte da música de protesto, à esquerda do regime, com o Movimento Artístico Universitário (MAU) e seu Luiz foi seu padrinho em alguns festivais. Acontece que seu Luiz tinha caído num ostracismo artístico tremendo nos anos 60 e quem os recuperou foram os músicos da geração de Gonzaguinha como Caetano, Chico, Gil, Alceu entre outros.   

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

LAMPIÃO FEZ PROPAGANDA DA ASPIRINA - José do Vale Pinheiro Feitosa

Uma das gerações mais ricas culturalmente do Cariri foi aquela que envolveu entre outros o Rosemberg Cariry, o Luiz Carlos Salatiel, Zé Flávio, o Jackson Bantim, apenas para localizar esta geração pois a lista de nomes de igual peso não é pequena. Inclusive o Ronaldo Brito e o artista Plástico Bruno Pedrosa, um pouco antes, também se incluem nesta riqueza.

Riqueza em quê? No soerguimento e na releitura quase mítica (próximo ao místico) da cultura do interior nordestino. Aquele com base econômica na pecuária, na agricultura de sobrevivência e no algodão (o “ouro branco”). A cultura que arrastava consigo um catolicismo quase primitivo junto com elementos indígenas. Aliás a proliferação de “pastores neo e pentecostais” não é outra coisa que não a mesma base não institucional da religião popular, embora muito vista como mera exploração como era visto o catolicismo popular nordestino.

Valores icônicos dessa geração: a família patriarcal e da fazenda sertaneja, os poetas populares (Patativa, Zé de Matos), as danças de raiz (reizados, coco etc.), beatos e a dinâmica religiosa acumulada em Juazeiro, o cangaço e a música popular nordestina. Isso incluindo mitos, músicas e textos que pessoas com o nível de educação desta geração tão bem soube levantar. Incluindo aí a história regional do interior nordestino (não praiano e não cana de açúcar).

Mas eles tiveram uma grande vantagem comparativamente aos tradicionalistas que realizaram grandes pesquisas sobre o passado do interior nordestino. Aqueles seguiam a esteira ideológica dos Instituto de Geografia e História, em seu tradicionalismo se tornaram, assim, conversadores com tendência ao refúgio no passado. Já a geração que cito deu novo significado à história interiorana nos termos da modernidade. Da transformação de natureza crítica, significando refazer um campo mítico que substancie o deserto pragmático burguês com sua individualidade consumista.

O Luiz Carlos Maciel mantém um blog (ou mantinha acho que chamava-se Cariri Encantado) como evidência do que digo. De vez em quando ele e o Carlos Rafael dão significado territorial ao “movimento” desta geração (esqueci o nome exato). A filmografia do Rosemberg é uma prova eloquente do que digo. Os livros do Zé Flávio. Os espetáculos de teatro anunciados pelos blogs representam este momentum da nossa cultura.

Agora ao título não é? Isso encontrei no livro “Benjamin Abrahão Entre Anjos e Cangaceiros” de Frederico Pernambucano de Mello. As filmagens feitas por Benjamim não teriam sido financiadas apenas pela Aba Film, mas pelo esforço do governo Nazista Alemão em sua aproximação com a América Latina. E esse esforço traduzido pela empresa alemã Bayern fabricante da famosa Aspirina.
Lembram do filme Cinema, Aspirina e Urubus? Acho que de cineastas pernambucanos. Ele mostrava exatamente o esforço da Bayern em divulgar seu principal produto com uma camionete nos anos 30 pelas estradas precárias do sertão, levando filmes e um projetor de cinema que ia de pequena em pequena cidade carregando nela um pequeno gerador movido pela camionete.

De modo que a proeza de Benjamin Abrahão ao filmar e fotografar Lampião teria sido financiada, também, pela Bayern. Inclusive todo o equipamento cinematográfico e fotográfico era da Zeiss alemã. As provas de Frederico são imagens de Lampião apontando para um cartaz de propaganda da Aspirina de falando palavras e outra imagem dele distribuindo sachês de aspirina para o seu bando.

Não quero com isso apenas dizer que a pesquisa histórica do interior nordestino, empreendida pelos tradicionalista, ressaltando grandes figuras patriarcais e da igreja católica, não tenham grande importância para nosso autoconhecimento. O que pretendo apenas é apresentar que mesmo Lampião já não era aquele cangaceiro medieval que tantos pintam. Assim como a geração que soube dialogar com a história entre o passado e o presente.

Mesmo quando o diálogo desta geração, numa ou noutra obra, por vezes se congele de modo não dialético, a verdade é que esta geração deu movimento e criou uma ponte icônica que nos valoriza frente ao “estrangeiro”. Aliás, lembro muito bem do cronista e poeta Airton Monte espinafrando na sua coluna em jornal de Fortaleza o tratamento “mítico” dado a Patativa do Assaré (conheci muito bem a vaidade de Airton e isso pode ter sido a manifestação de algum ciúme com Rosemberg que passou a influir na Capital). Em que pese que a poesia é um coletivo além de Patativa, o que se passava com Airton era um certo mal-estar com os valores do sertão em relação ao suposto universalismo do litoral.

Ou seja, a velha luta entre Franco Rabelo (Litoral) e o Padre Cícero (Sertão). O que o pessoal da cultura litorânea nunca compreendeu é que o lugar no mundo atual é aquele da recriação do nosso próprio mundo. Por isso meu abraço a esta geração do mundo caririense. 

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

"Georreferenciamento" - José Nilton Mariano Saraiva

Você, refestelado na poltrona aí do outro lado da telinha, por acaso já ouviu falar em GEORREFERENCIAMENTO ??? Não ??? Despreocupe-se, a palavra parece não constar em nenhum dicionário. No entanto, saiba que além de complicada, aqui traduz e traz embutida mais uma grande sacanagem que querem perpetrar contra o Crato e o sue povo, tendo, como não poderia deixar de ser, Juazeiro do Norte como principal, “inocente” e privilegiado beneficiário (como o foi com a tal Região Metropolitana do Cariri, lembram ???).

Agora, entretanto, há que se atentar para a gravidade do problema que, embora de uma cretinice sem tamanho, materializar-se-á em curto espaço de tempo se a população e as diversas autoridades constituídas do município (Prefeitura, Câmara de Vereadores, Associações Comunitárias, Clubes de Serviço e por aí vai) não tomarem desde já uma providência enérgica, séria e urgente (mesmo ao custo de sublevar-se contra a ordem estabelecida).

Fato é que, como já não têm nada para nos tomar (porquanto através de manobras políticas pra lá de desonestas – vide a relacionada ao campus da Universidade Federal do Ceará  - conseguiram nos tirar tudo), agora a cambada de Juazeiro do Norte resolveu ser chegada a hora de nos tomar, simplesmente... parte do nosso território. Sim, senhores, é vero, acreditem e façam fé: um pedaço do nosso município, com tudo que lhe estiver sobre, poderá ser agregado a Juazeiro do Norte (via componente político).

Evidente que inconfessos interesses permearam tal situação. Assim, aproveitando que as nossas fronteiras municipais são imaginárias (assim como o são as estaduais), deu-se a articulação política via Secretaria de Planejamento do Estado do Ceará, Assembléia Legislativa, Instituto de Desenvolvimento Agrário do Ceará, Associação de Prefeitos do Ceará e União dos Vereadores do Ceará, e tendo como cabeça o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), chegou-se ao plano de se partir para uma tal “redefinição das fronteiras municipais” (objetivando o quê, mesmo ???).

Que, no caso específico, nada mais será do que “fatiar”, “dividir” ou “repartir” o nosso município entre Juazeiro do Norte, Barbalha, Farias Brito e Caririaçu. Claro que o maior quinhão – o distrito Santa Rosa, - onde futuramente seria instalado o nosso parque industrial, será destinado a Juazeiro do Norte.

A conseqüência disso tudo ??? A se concretizar tamanho golpe, nossa população decairá, os eleitores do município decrescerão e, por via de conseqüência, a nossa cota do Fundo de Participação dos Municípios será reduzida (pois é, além de queda...coice).

Assim, clamando para que as nossas autoridades acordem, saiam do marasmo, não se acovardem e atentem para a gravidade e o perigo que corremos (mesmo que tenham que botar a boca no mundo), e dada à similitude das situações, tomamos a liberdade de anexar o oportuno...

No caminho com Maiakóvski

“Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem; pisam as flores, matam nosso cão, E não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada”.


Senhor prefeito, senhores vereadores, povo do Crato: vergonha na cara e vamos à luta.

A CRISE VEM PELA CORRIDA DAS MOEDAS - José do Vale Pinheiro Feitosa

O mundo é assim. Já foi diferente. Será outro.

A SERASA EXPERIAN como é da natureza do seu negócio fez uma pesquisa com um recorte sociológico com base na capacidade de consumo. Desprezou o território e seu processo socioeconômico. Vamos tomar este caminho.

Antes uma explicação. Os limites do território processo é o espaço e a atividade humana (política e cultura). Os limites do recorte de consumo não é a produção e nem a circulação da mercadoria, mas o seu consumo. E no caso a capacidade de consumo.

Esta capacidade de consumo é controlada por outros fatores que não apenas a base econômica, por exemplo o poder do Estado, as máfias, as corporações, as multinacionais, os grupos de interesses ou as elites organizadas e mais outras organizações culturais como igrejas e tantas outras. Temos aí o efeito da concentração de poder de poucos repercutindo sobre todos.

Na verdade tal concentração tende a criar uma organização geral confluente no interesse do poder concentrado e marcar a vida das pessoas desde as opções de gravidez, passando pelo parto, os cuidados com a criança, a escolaridade, a inserção no mercado de trabalho e por último a capacidade de consumo.

Eis que o mundo todo funciona como este todo concentrado. Por isso vamos sofrer aperto no que se chama crise cambial. O desequilíbrio geral das moedas, especialmente dos países emergentes. A Argentina e Venezuela, por exemplo. O big brother americano vai elevar os juros e os dólares especulativo que faziam a festa dos emergentes vão fugir deles.

A estimativa é que esta corrida vá cair na jugular, extravasando os dólares que irrigavam as economias emergentes. Com a crise do país concentrador de riquezas estes dólares estavam na especulação de commodities e corriam para as economias emergentes para tirar melhores lucros do que na estagnação econômica americana.  

Eles estariam retornando ao leito seguro do poder imperial e os emergentes em crise cambial. Todo mundo. Inclusive o Brasil, Chile e México aqui na América Latina. Segundo estimativa o país com menor vulnerabilidade seria e própria Argentina que já dar cambalhotas.

A crise cambial, se acontecer com a força que se imagina, será a grande bandeira dos candidatos de oposição: Aécio Neves e Eduardo Campos. Este é o cenário.


Como todo cenário vejamos as cenas que nele se desenrolarão pois certamente na história não existe um escritor que defina o enredo todo. Muito é da percepção social e política. E aí na hora da onça beber vale a política, as alianças, os sacrifícios aceitáveis, a capacidade de luta e assim por diante. 

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

O CAOS DA MÍDIA - José do Vale Pinheiro Feitosa

Em 29 de setembro de 2006 um Boeing 737-800 SFP da Gol Transportes Aéreos, num voo entre Brasília e Manaus, foi praticamente jugulado caindo feito uma pedra após receber o choque de uma aeronave bem menor. Era o voo 1907 e nele morreram 154 pessoas.

O acidente gerou uma insegurança geral a respeito da qualidade do controle aéreo brasileiro. A grande mídia partiu para cima e fez o diagnóstico de um caos aéreo no país, com má fé, misturando então os frequentes atrasos decorrentes do boom de passageiros que antes não haviam subido numa avião e agora embarcavam em passagens mais baratas e financiadas.

A mídia criou um clima de desestabilização política quando em 17 de julho de 2007 um Airbus A320-233 da TAM, pousando em Guarulhos, que não conseguiu parar e foi terminar em tragédia matando todos a bordo. Na época o repórter da Globo Rodrigo Bocardi (atualmente na bancada do Bom Dia Brasil) foi até a pista de Guarulhos para mostras que não existiriam nela as tais ranhuras que serviriam para frenar o avião.

Era uma tese descida como um julgamento político. O Movimento Cansei pegou carona carregando na passeata senhorzinhos e madames globais na ação política. Mas aí a avaliação técnica mostrou outra coisa e quando houve o desmentido, a Televisão Globo manipulou uma imagem de uma janela do Palácio do Planalto quando um Assessor do Governo fez um gesto de alívio com o problema, então, politizado pela própria Globo.

Não se tratava de notícia. Tudo era a velha técnica do marketing político, era a velha forma de atacar os inimigos com as técnicas inovadoras da mídia. Ai nós que não somos idiotas, mas que fomos soterrados por uma avalanche que mostrava o caos no controle aéreo brasileiros estamos defronte de uma nova notícia negando todo o clima.

A Civil Air Navigation Service Organization (CANSO), sediada na Holanda publicou em sua revista Airspace Magazine uma matéria de capa sobre o bem sucedido controle do espaço aéreo do Brasil durante a RIO +20, a Copa das Federações e a Jornada da Juventude. Todas são ocasiões em que o controle brasileiro estava preparado para uma elevação no tráfego aéreo em até 30%. No entanto o crescimento foi de 18%.


Importante, a Rio +20 aconteceu em Junho de 2012, portanto entre cinco e seis anos após os referidos acidentes. Se houvesse um caos no controle aéreo esse necessariamente seria de infraestrutura e de recursos humanos e nesse intervalo não haveria mudanças entre o caos e um controle sobre stress de aumento de voos.    

domingo, 26 de janeiro de 2014

Não costumo fazer postagens de textos lidos na internet. Porém este texto a seguir é tão marcante que resolvi postar. Os estereótipos citados no artigo os vejo continuamente a atingem crianças do meu estreito convívio. Esse texto poderia ser a base de um bom debate público no rádio, na televisão, na internet, na Universidade e até em família e por isso o reproduzo.

A destruição da infância


Vicenç Navarro (*)
Está acontecendo algo sobre o qual não se comenta muito nos fóruns midiáticos e políticos do país (Espanha), e que está causando impacto enorme na qualidade de vida em nosso presente e em nosso futuro. Estou me referindo à grande deterioração do meio cultural no qual a criança está submersa. Um indicador disso, entre outros, é o mundo midiático ao qual as crianças estão expostas. E não me refiro somente ao número de horas que passam diante da televisão ou de outras mídias de entretenimento, o que continua sendo um problema grave (nos Estados Unidos, onde este tipo de estudo é sistematicamente realizado, o tempo de exposição subiu de uma hora e meia nos anos 1970 para cerca de quatro horas atualmente). Estou me referindo, além do tempo de exposição, à evidente deterioração dos conteúdos de produção midiática. A destruição no conteúdo educativo dos programas televisivos ou dos videogames tem sido eminente, com um aumento notável da promoção do consumismo, do individualismo, da violência, do narcisismo, do egocentrismo e do erotismo como instrumentos de manipulação.
 
A evidência de que isto se dá dessa maneira é assustadora. Estes conteúdos – que configuram de forma muito negativa os valores sociais – estão espalhados por toda a sociedade, incluindo os adultos. Mas o que é ainda mais preocupante é que muitos desses valores se apresentam com mais intensidade nos programas voltados para o público infantil. E a situação está piorando. Vou me explicar.


Em meados da década de 1970, foi feito um estudo sobre o conteúdo dos programas de televisão para meninos e meninas nos EUA. Foi realizado por pesquisadores da Johns Hopkins University. Nesta pesquisa, constatou-se que a violência, muito generalizada nos Estados Unidos, estava inclusive mais presente, paradoxalmente, na programação infantil. Tal estudo provocou uma revolta considerável naquele país. E fui eu a apresentá-lo no Congresso dos EUA, não enquanto professor realizador do estudo, mas como dirigente da Associação Americana de Saúde Pública (American Public Health - APH, segundo a sigla original), tendo sido escolhido entre o corpo diretivo pelos 50 mil membros dessa Associação.


O Comitê de Assuntos Sociais do Congresso dos EUA organizou uma série de depoimentos para analisar o que estava acontecendo nos programas de televisão orientados para crianças. E convocou uma sessão em que estavam, de um lado, os presidentes das três cadeias de televisão mais importantes do país (CBS, ABC e NBC) e, de outro, o representante da APHA (que era eu). Para sempre me lembrarei daquele momento. Ali estava eu, filho de La Sagrera, bairro popular por excelência de Barcelona, Espanha, com o enorme privilégio (em um país de imigrantes) de representar meus colegas da APHA e defender os interesses da população norte-americana diante de três das pessoas mais poderosas dos EUA, que durante seu depoimento tentavam ridicularizar o meu, alegando que eu estava exagerando quanto ao impacto desses programas nas crianças norte-americanas.
 
Como não podiam questionar os dados que documentavam a enorme violência dos programas infantis, centravam-se em negar que tiveram impacto nas crianças. Este argumento foi fácil de destruir, com a pergunta que lhes fiz diante do Congresso:
 
“Se vocês acreditam que seus programas não têm impacto entre as crianças, por que cada anúncio comercial que aparece nestes programas custa quase um milhão de dólares?”. Não responderam. Negar que tais programas tenham um impacto nos espectadores é absurdo. O Congresso dos EUA, por certo, não fez nada, pois não ousava contrariar estes grupos poderosos. 

A situação está se deteriorando

E a situação está inclusive pior atualmente. Esta fixação infantil pela mídia audiovisual está amplamente estendida, agora por meio dos videogames, que estão substituindo a televisão. O grau de exposição das crianças aos videogames alcançou um nível que ultrapassa em muito o tempo à frente da televisão. A transmissão dos valores por meio dos jogos eletrônicos, citados anteriormente, é massiva. É o equivalente ao fast food no universo psicológico, cultural e intelectual.
 
Tanto que, em vários países europeus, se considera proibir a importação de videogames dos EUA (que são extraordinariamente mais violentos), que destroem massivamente meninos e meninas. Acredito que as autoridades públicas espanholas deveriam considerar sua proibição, como já acontece em vários países da Europa.


Porém, para além da destruição que muitos desses videogames provocam na infância, a exposição a essa cultura tira as crianças de outras atividades. Existe evidência de que, quanto maior o tempo dedicado aos videogames, menor é a capacidade de leitura e de compreensão de textos. A leitura de livros – dos clássicos da infância, de Heidi ao Pequeno Príncipe – está diminuindo muito rapidamente. Serei criticado sob a alegação de que este texto denota nostalgia, o que não é certo, pois minha crítica não é ao fato de não lerem esses textos, mas sim à ausência de leitura desse tipo de texto, em que a narrativa conecta o indivíduo com a realidade que o cerca, ajudando a desenvolver uma visão solidária, amável e coletiva da sociedade. Enfatizar a força, o ego, o “eu” e a satisfação rápida e imediata do desejado, sem freios, levará todos nós a um suicídio coletivo.
 
E me preocupa o fato de que isto já esteja acontecendo. Se desejam ver seu futuro, vão agora aos Estados Unidos e o verão. As mudanças sofridas desde a década de 1980, quando se iniciou o período neoliberal com Reagan e Thatcher, foram enormes. O neoliberalismo, a exaustação ao "êxito" sem freios, ao individualismo, ao narcisismo, ao darwinismo, inundaram todas as áreas da cultura da infância. 

As meninas como objeto sexual

Outro elemento da deterioração da cultura infantojuvenil está na reprodução dos estereótipos, por trás da qual há uma relação de poder. Um dos mais marcados é o que reproduz a visão machista da sociedade, apresentando as mulheres como objetos eroticamente desejados, e que, notavelmente, afeta a infância. Essa visão já alcançou dimensões patológicas. Nos países mais machistas (e a Espanha está no topo da lista), a mulher está sempre muito decotada (e cada vez mais) e, se não, vejam os noticiários diários. Por que os homens não vão decotados à televisão quando dão as notícias, mas sim as mulheres?

A imagem erótica, com uma definição de beleza estabelecida pelo homem, está alcançando nível tamanho de exagero, que começa inclusive com as bonecas Barbie. Vários países europeus – como a França – estão pensando em proibir tais tipos de boneca. Está chegando a um nível que exige uma mobilização, protestando contra essa destruição por meio da promoção de valores que são prejudiciais à infância e à população em geral. Espero que o leitor se some a essas mobilizações. Se você ama seu país, sugiro que faça algo. Não deixe que manipulem nem a você, nem a seus filhos, filhas, netos e netas. Indigne-se! Faça algo!

(*) Professor de Políticas Públicas. Universidade Pompeu Fabra, em Barcelona, e professor da Johns Hopkins University. Site pessoal: www.vnavarro.org

sábado, 25 de janeiro de 2014

A BOMBA DEMOGRÁFICA COM BILHÕES DE MEGATONS - José do Vale Pinheiro Feitosa

Pronto! A demografia voltou aos calos dos conservadores. Lembram das famosas previsões de Thomas Malthus? “As bombas demográficas” estão de volta. A catástrofe que assusta aos bens estabelecidos do Império (então o Inglês) e hoje das Multinacionais (que formam um todo orgânico a dirigir a humanidade).
As ditaduras são regimes que procuram eternizar os privilégios de classe. Ou quando nascidas no corpo de uma revolução, para estabelecer os privilégios da classe que a fez. As multinacionais (o organismo do 1% que carrega o desastre humano) têm horror a mudanças demográficas.
O que significarão para o consumo, o investimento e a acumulação subsequentes?
Olhem estes dados: daqui a cinco anos existirão 1 bilhão de pessoas com 60 anos e mais. Uma marca central do século XXI: o envelhecimento da população.
Enquanto no atual século a população mundial duplicará (passando de 6 para 11 bilhões) a população com 60 anos e mais aumentará 5 vezes, passando de 610 milhões para 3 bilhões. Isso quer dizer que em 2100 um quatro da população estará nessa faixa etária.
Três coisas contribuem para a velocidade e o resultado desses números: no passado recente houve uma alta taxa de fecundidade (exatamente por razões opostas a Malthus ou seja, por aumento da produtividade na produção de alimentos), agora houve uma redução drástica nas taxas de fecundidade e um aumento da esperança de vida ao nascer (a probabilidade da maioria das pessoas atingir uma certa idade).
Para se ter uma ideia do que significa o aumento da esperança de vida: no ano 1000 DC ela era de 24 anos, em 1820 na Europa Ocidental e nos EUA ela era de 26 anos. Atualmente no Japão e Coreia essa taxa é de 81 anos, a dos EUA 79 e a América Latina atingirá 75 anos. A África nestes termos tem o mais baixos resultados.  
A manutenção do quadro econômico de privilégios e sob a tutela do jogo capitalista das multinacionais e do sistema financeiro se torna instável. Muitos velhos significa menor produtividade por redução de atividade e aumento de gastos com cuidados de saúde e gerais. Isso desvia o jogo completamente.

Poderia haver uma face otimista. Sim. Mas com uma revolução histórica, com sistemas mais igualitários, onde conquistas científicas não sejam negócios exclusivos e mediados apenas por renda e salários, onde a solidariedade, o amor e o humanismo prevaleçam sobre o individualismo do grande acumulador de grana. 

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Quando se pensa na violência de dupla mão entre as 85 pessoas que controlam a riqueza que é a mesma de metade da humanidade, não tenhamos dúvidas que explosões virão. Vejam o que aconteceu num programa de televisão no Canadá.

Kevin O´Leary, um empresário bem sucedido, defensor entusiasmado da globalização financeira, que é coapresentador do programa ao saber o resultado da pesquisa que apontava aquela concentração, disse.

É uma grande coisa, porque isso inspira todo mundo. Faz com que as pessoas olhem para o 1% e diga – quero fazer parte dessa turma e passe a trabalhar duro para chegar ao topo. É uma notícia fantástica, é claro que eu aplaudo...o que poderia estar errado com isso?”.


A apresentadora ficou um minuto em silêncio e perguntou: “Verdade?” e continuou: “Então, uma pessoa que vive na África com um dólar por dia, ao acordar de manhã, deve ela pensar – eu serei Bill Gates?”  

O SOFRIMENTO QUE DENUNCIA - José do Vale Pinheiro Feitosa

Temos, simultaneamente, em nossa estrutura humana a mortalidade e a imortalidade. Ou seja, o tempo que se acaba e ao mesmo tempo a eternidade. Isso decorre de alguns atributos humanos: a memória, a racionalidade, a capacidade de fazer arte, portanto, de transcendência e o conjunto de ações compreendidas como cultura e política. Sujeitos da ação que somos, mesmo que mortais, nos expandimos além do corpo e do tempo (transcendência).

Vivemos o desastre de um ambiente formado numa civilização populosa, quando a consciência do território é o próprio planeta e não mais um pequeno trecho de terra. Todo orientado por concentração de decisões em poucas mãos (daí se origina a palavra imanente) funcionando em “jogos econômicos” que transpõem os atributos humanos. Daí e importância da democracia popular.  

A decorrência das decisões dos “barões do dinheiro” e de seus “jogos econômicos” é a brutal urbanização aliada a enormes privações sociais que atingem sobretudo migrantes e mulheres. Assim a cidade de São Paulo, o maior símbolo do desenvolvimento capitalista brasileiro, aquele que mais se aproxima do modelo dos Estados Unidos, tem alto índice de transtornos mentais. É a segunda cidade do mundo em relação a esses problemas, só perdendo para uma cidade americana.

São Paulo e sua região metropolitana segundo o Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas poderia ter 29,6% da sua população com transtornos mentais tais como ansiedade, mudanças comportamentais e abuso de substâncias químicas.

Estudo da Organização Mundial de Saúde estima que 700 milhões de pessoas sofrem algum tipo de transtorno mental, sendo a segunda causa de invalidez. A depressão é a principal de transtorno mental. A estimativa é que 300 milhões de pessoas sofrerão depressão e 90 milhões terão problemas por abuso com substâncias químicas.

Os transtornos mentais são a terceira causa de longos afastamentos do trabalho por doença. E mais nítidas são as evidências do jogo do capitalismo nessa origem segundo estudo da Faculdade de Saúde Pública de São Paulo.  “Ambiente de trabalho com pouco apoio social, excessivas demandas e baixo controle sobre tarefas, recompensa inadequadas comparada ao esforço de trabalho e comportamento individual excessivo.”


A conclusão mais próxima é que o componente de eternidade humana não suporta a permanente exploração e decisões que apenas respondem a um jogo de interesses restritos. Tudo leva a crer que os transtornos mentais não apenas são consequências do desastre desta situação como inclusive seja uma resposta de negação a ele. 

Um "adendo" necessário - José Nilton Mariano Saraiva

Lendariamente, “milagres” são fenômenos que não acontecem todos os dias. E mais: tal qual um raio, não caem (ou ocorrem) num mesmo local. E exatamente por isso, por serem raros, esporádicos, estanques e solitários, guardam certa curiosidade.

A reflexão é para lembrar que o jornal O POVO (deste 19.01.14, página 38) nos informa que quando do (suposto) “milagre da hóstia”, nada menos que 93 (noventa e três) “encenações” ocorreram no interstício de 02 anos, e todas na “capela-teatro” do Socorro, em Juazeiro do Norte. Com data e hora previamente marcadas pra acontecer.

Assim, em vista da “previsibilidade” e da atuação de “multiplicadores”, de pronto deu-se a adesão de glebas de paupérrimos fanáticos de outros estados do Nordeste. E o script era sempre o mesmo: o padre esperto, a beata inocente e, vapt-vupt, fiat-lux: o (suposto) “milagre” se materializava. Sem maiores delongas. Precisão de um relógio suíço. E assim, face à incessante difusão, exponencialmente as platéias cresceram, daí terem sido necessárias a repetência de incríveis 93 (noventa e três) “encenações” do (suposto) “milagre da hóstia”. 

Resultado: física e organicamente debilitado, o “instrumento” provocador do tal (suposto) milagre (Maria de Araújo) entrou em acelerado processo de “saturação”. E como continuou sendo irresponsavelmente usado sem maiores cuidados, o “instrumento” (Maria de Araújo) faliu. Porque explorada à exaustão. De forma desumana e insensível.

Assim, quando tardiamente a Igreja acordou para o tal “fenômeno”, o (suposto) “milagre” já atingira o objetivo colimado: beneficiar Cícero Romão Batista. Que só então foi “descredenciado” pela hierarquia da Igreja Católica e expulso das suas hostes, acusado de “charlatanismo”. O resto da história todo mundo já sabe: ingressou na política e ficou rico.

Portanto, este é um “adendo” que se faz necessário à nossa postagem anterior (“Os 100 anos de Maria de Araújo”) vez que objetiva mostrar que, contrariando a lenda, em um mesmo local (“capela-teatro” do Socorro, em Juazeiro do Norte), foram 93 (noventa e três) as “encenações” na tentativa de “viabilizar” o tal (suposto) “milagre da hóstia”. Na realidade, uma fraude grotesca, engodo sem tamanho, forçação de barra sem precedentes. Tanto que o Vaticano, por assim considerar, até os dias atuais não o reconheceu (mas o fará algum dia, por imposições político-mercantis, disso não tenham dúvidas).


Agora, aqui pra nós: “milagres” aos borbotões, produzidos como se fora em “escala industrial” merecem mesmo alguma credibilidade ??? Onde já se viu algo tão anômalo, excêntrico e extravagante ???

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Estatística de uma ditadura

Publicado no Observatório da Imprensa um artigo intitulado "Por que os Generais não imitam a Rede Globo" de autoria de Luiz Claudio Cunha extraio esta estatística da ditadura militar instalada em 64 e que fez a felicidade de muitos tolos:

A conta da ditadura de 21 anos prova que ela atuou sem o povo, apesar do povo, contra o povo. Foram 500 mil cidadãos investigados pelos órgãos de segurança; 200 mil detidos por suspeita de subversão; 50 mil presos só entre março e agosto de 1964; 11 mil acusados nos inquéritos das Auditorias Militares, cinco mil deles condenados, 1.792 dos quais por “crimes políticos” catalogados na Lei de Segurança Nacional; dez mil torturados nos porões do DOI-CODI; seis mil apelações ao Superior Tribunal Militar (STM), que manteve as condenações em dois mil casos; dez mil brasileiros exilados; 4.862 mandatos cassados, com suspensão dos direitos políticos, de presidentes a governadores, de senadores a deputados federais e estaduais, de prefeitos a vereadores; 1.148 funcionários públicos aposentados ou demitidos; 1.312 militares reformados; 1.202 sindicatos sob intervenção; 245 estudantes expulsos das universidades pelo Decreto 477 que proibia associação e manifestação; 128 brasileiros e dois estrangeiros banidos; quatro condenados à morte (sentenças depois comutadas para prisão perpétua); 707 processos políticos instaurados na Justiça Militar; 49 juízes expurgados; três ministros do Supremo afastados; o Congresso Nacional fechado por três vezes; sete assembleias estaduais postas em recesso; censura prévia à imprensa, à cultura e às artes; 400 mortos pela repressão; 144 deles desaparecidos até hoje.

Só os tolos consideram aquilo felicidade - José do Vale Pinheiro Feitosa

“Não tenha inveja daqueles que vivem no paraíso dos tolos, pois apenas um tolo consideraria que aquilo é felicidade” – Bertrand Russel em 1969, no Um Decálogo Liberal

Vamos juntar os “causos”: rolerzinho, aumento de presos no Brasil e 85 bilionários com patrimônio igual ao que tem metade da humanidade. São assuntos que abordei nas últimas três postagens.

Fazem sentido: a ditadura dos bilionários (decidem onde e como investir, como deve funcionar a produção, a distribuição e o consumo e, portanto, a política, a cultura, as instituições do Estado e a religião) exclui, persegue, aprisiona e pune. Cria regimes políticos e instituições, os mantém e os conserva.

E antes de tudo têm o controle quase absoluto da violência. Criam e controlam as forças que reprimem e punem. Uma civilização com esta característica é mais absoluta do que o Olimpo Grego. Naquela civilização os deuses (ou os conceitos que representavam) se contradiziam. Nesta a hegemonia pretende-se total.

Agora retorno ao décimo ponto de Bertrand Russel. Só os tolos acreditam que algo assim é duradouro e permanente. O controlador absoluto sofre o controle absoluto. O seu controlado o controla. O controla pela necessidade permanente que o controlador tem de controlar.


Mas é preciso enxergar que só os tolos consideram o seu sucesso dentro desta ordem como a felicidade.  

De "solução" a "decepção" - José Nilton Mariano Saraiva

Quando pela primeira vez se candidatou ao governo do Estado do Ceará, o “carro-chefe” da campanha do então candidato Cid Gomes focava na (in)segurança pública, porquanto um verdadeiro caos. Para tanto, deu-se divulgação exacerbada a um programa denominado “Ronda do Quarteirão”, que seria a redenção do setor.

Assim, uma turma de elite foi treinada para fazer frente à bandidagem e, sob o argumento de que necessitavam de equipamento capaz de enfrentar em igualdade de condições os mafiosos, a providência primeira do jovem governador recém-eleito foi adquirir centenas de caminhonetes da marca Hilux, tração 4 rodas, da Toyota, revendida no Ceará pela empresa Newland (a quem foi garantida a manutenção a frota por anos a fio).

No entanto, de “solução” o “Ronda do Quarteirão” transformou-se em “decepção”, porquanto efetivamente nada mudou no quesito segurança pública no Estado do Ceará. Assim, a bandidagem nunca se sentiu tão à vontade para “trabalhar”.  E mais: os caríssimos e luxuosos carrões em que circula a tropa de elite vivem se envolvendo em acidentes diversos, em razão (comenta-se), do despreparo dos seus guiadores na condução de máquinas tão sofisticadas (não teriam sido treinados para).

Fato é que, de lá até cá já se passaram sete anos, o Governador se acha no último ano do seu segundo mandato e a (in)segurança pública continua a grassar em todo o Estado, constituindo-se o seu calcanhar de Aquiles, enquanto a “menina dos olhos” do governador, o “Ronda do Quarteirão”, é pessimamente avaliado pela população.

Pois não é que agora, faltando menos de um ano para entregar o bastão a quem vier lhe suceder, o senhor Governador do Estado resolveu adquirir nada menos que mais 400 (quatrocentos) novos carros da marca Hilux, da Toyota, com valor unitário de R$ 179.000,00 (cento e setenta e nove mil reais) perfazendo um gasto total de R$ 71.600.000,00 (setenta e hum milhões e seiscentos mil reais), conforme o Diário Oficial do Ceará, de 14.01.14.

Além da “inoportunidade” em gastar toda essa grana já no final do seu mandato, o “detalhe” é que o processo licitatório para a compra dos 400 carrões teria sido ganho pela General Motors (Chevrolet), mas Sua Excelência arranjou um jeito (aumento na cilindrada dos carros) de privilegiar a Toyota e especificamente a empresa Newland (que continuará responsável pela manutenção da frota.


Será que alguém receberá alguma “comissão” ???

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

ABSOLUTISMO DITATORIAL - José do Vale Pinheiro Feitosa

Uma das coisas que mais incomodam a quem não é economista é a moeda. Ela é um instrumento de mensuração do esforço material humano. Se bem que se inclua em materiais coisas imateriais como a cultura, as marcas, e outras mais. Ao dar realidade ao valor que as coisas simbolicamente têm, a moeda é o meio para que elas circulem (ou mudem de dono) entre as pessoas. Também é a moeda o sinal para que algo novo se construa ou comece ao que chamam investir, financiar e outras mumunhas mais.

Mas economia mesmo é o trabalho humano. É produção, a distribuição e o seu consumo. E, portanto, é uma sentença a cada um. Ninguém consegue comer de uma vez só toda a comida de um restaurante, usar todos os sapatos de uma sapataria. A vem a estranheza.

Acaba de sair um relatório de uma ONG britânica chamada de Oxfam que revela que o patrimônio das 85 pessoas mais ricas do mundo equivale às posses de metade da população humana. Ou seja 85 pessoas contra 3,5 bilhões de pessoas. E toco a pensar em coisas como democracia.

A famosa frase de Churchill “Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos”, assim fica negada. A democracia como um sistema que reduz a condução do mundo (a economia) a 85 pessoas é um desastre oligárquico.

É uma ditadura de poucos sobre bilhões de seres humanos. Eles tomam decisões como aqueles velhos filmes hollywoodiano que mostravam os clubes privês da oligarquia imperial inglesa: tomando chá, praticando jogos e decidindo a vida de milhões por todos os continentes. Afinal é assim que de fato funciona o mundo na mão de meia dúzia de famílias mais concentradas em abuso e poderes do a famigerada nobreza francesa à vésperas da revolução.


Um fato histórico como esse torna todos os economistas em meros serviçais de decisões ad hoc e ontologicamente erradas sobre o futuro da humanidade.  

O AMPLO PORTÃO DA CADEIA NO BRASIL - José do Vale Pinheiro Feitosa

A Justiça acusa de cometer o crime, prende e, ao fim, não consegue provar nada. É um escândalo.” – Julita Lemgruber – Coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes.

Em dezembro de 2012 o Brasil dobrou a sua população carcerária em relação ao início da década. Estavam aprisionados 548.003 brasileiros na mais variada condição de sofrimento e descaso. Agora pasmem: 40% desses prisioneiros estavam em caráter provisório. Ou seja a Justiça ainda não tinha concluído o processo enquanto o brasileira ficava vendo o sol quadrado por até muitos anos. Presos sem condenação.

Mas isso é a média nacional. No Piauí e no Maranhão o índice de presos provisórios chega a 60%. No Rio Grande do Sul no Presídio Central 60% são presos provisórios. Agora querem compreender os patamares do inferno? Tem gente presa há mais de dois anos por ter furtado um pedaço de queijo num supermercado. Um prisioneiro do Rio de Janeiro foi preso em dezembro de 2011 com acusação de tráfico de droga. É réu primário, teve a primeira audiência em maio de 2012 quando o Juiz mandou que a defensoria do Estado enviassem as últimas manifestações por escrito. Um ano após, em abril de 2013 é que o processo retornou.

São exemplos. Mas o pior dos mundos é que um estudo da Universidade Cândido Mendes, coordenado por Julita Lembruger, conclui que 39% do presos do Rio de Janeiro são provisórios e que uma análise de coorte do resultado de julgamento desses presos mostrou que apenas 37,5% deles foram condenados a regimes fechado ou semiaberto. Se isso representa o conjunto temos que apenas no rio de Janeiro, um quarto das pessoas que estão presas o são injustamente. À revelia da lei e com a prática do anacronismo, da leniência e do preconceito dos tribunais e juízes.

Mesmo com a nova Lei das Medidas Cautelares que se encontra em vigor desde de 2011 e que deu aos juízes alternativas à prisão como o comparecimento em juízo, fiança em sede policial e em juízo, monitoração eletrônica, proibição de se ausentar da comarca, etc., os juízes continuam repetindo as velhas prática: prisão provisória. O estudo da Cândido Mendes mostrou isso no Rio de Janeiro.

Não é por menos que o déficit de vagas no sistema prisional brasileiro é de 238 mil vagas. Mas não deixe de considerar que prisão é uma questão social e representa a vontade de classes dominantes. Por isso de vez em quando algum siderado social pede redução da maioridade penal e deseja prender todos aqueles que representam o fel que seus corações amargos não suportam.


Se o uso de bebidas alcoólicas não enseja prisão, imagine que fumar maconha pode tornar alguém num preso. No futuro será ridículo alguém ser castigado por fumar uns ramos de mato.  

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

OS ROLERZINHOS DOS SHOPPINGS CENTERS VISTO POR UMA SOCIÓLOGA PAULISTA

Entrevista à socióloga Valquíria Padilha ao site Carta Maior

O que são os shoppings? – são espaços privados travestidos de públicos. Eles segregam, impedindo a entrada de quem não tem poder aquisitivo ou quem não se adequa ao ambiente do shopping, seja pelo modo de se vestir ou de se comportar. Eles funcionam como clubes privados, escolas privadas, hospitais privados: são bunkers onde as classes mais altas se possam sentir protegidas do mundo lá fora. São templos do consumo para poucos.

E os rolerzinhos? – Os shoppings são os símbolos do consumo: “compro, logo existo.”. Os jovens que sabem que eles não lhes pertencem, estão forçando acesso a esse espaço como a dizer: “quando a vem aqui a gente incomoda os burguesinhos que historicamente nos desprezam”. Uma longa história de invisibilidade vivida pelos pobres no Brasil está vindo à tona com essas “invasões” dos shoppings centers.

Esta é a luta de shopping “um direito de todos? – a crença generalizara de que pertencer ao shopping é alcançar a boa vida é a vitória da sociedade de consumo e um fracasso da humanidade. Todos foram cooptados pela crença alienada de que só é possível ser feliz assim. A ideologia consumista virou uma verdade absoluta. Consumir roupas de marca e equipamentos eletrônicos não vão conquistar liberdade ou emancipação. O desejo e a posse de mercadorias nos alienam a todos. Quando critico a segregação social dos shopping centers não desejo como solução que esses espaços sejam democratizados. Desejo que esses espaços sejam eliminados.

E o que a sociedade terá em troca? – que sejam substituídos por parques, espaços de cultura, bibliotecas, cinemas, teatros, circos, escolas, tudo aberto a todos igualmente. Uma sociedade emancipada e verdadeiramente rica precisa disso, e não de shopping centers. Qualquer solução na contramão da ordem vigente tem status de utopia, tamanha é a complexidade social. A publicidade é a espinha dorsal desse sistema. Ela é a maior descoberta e o maior trunfo da sociedade de consumo capitalista, manipulando desejos, criando necessidade, reduzindo sentimentos. E atinge a todos da mesma forma: ricos e pobres, quem vive na cidade e quem vive no campo. Na ordem do capital, não acredito em nenhuma resposta definitiva. Humanizar o capitalismo, ao menos seria possível, mas não concordo que apenas oferecer mais políticas públicas de lazer e cultura nas periferias seja a solução, pois continua aí a segregação dos espaços urbanos, a cidade continua dividida entre espaços para pobre e espaços para ricos. Isso não é solução, é paliativo.
 
E os juízes que concederam aos shoppings o direito de selecionar o acesso? – Os juízes que deram essas sentenças deveriam perder o direito de julgar se nosso país fosse sério e cumprisse a Constituição. É um absurdo autorizar o inautorizável. Um juiz não poderia permitir que um espaço aberto ao público pudesse segregar. Discriminação é ilegal. Racismo é crime inafiançável no Brasil. Esses juízes deveriam ser presos. Os donos desses shoppings também.





A FESTA DA SANTA CRUZ DA BAIXA RASA



Artigo de Cacá Araújo¹ 
Baseado em relatos populares

Um vaqueiro vindo do Pernambuco atravessava a Floresta do Araripe. Chegando à Baixa Rasa parou para descansar. Exausto, faminto e fraco, resolveu ali ficar, à espera de que alguém passasse e pudesse lhe ajudar, saciando-lhe a fome e a sede. Sua valentia de sertanejo ainda o ajudou a resistir por alguns dias.

O corpo sem forças. O desespero e a agonia já o dominavam quando, mesmo com a vista turva, conseguiu ver um grupo de homens montados em burros, que seguiam em comboio, certamente transportando mercadorias. Tentou gritar, mas sua voz, quase apagada pela tirania da fome e da sede, produziu apenas um fraco sussurro. Não foi ouvido e os homens seguiram seu destino rumo ao Crato.

Repentinamente um dos comboieiros, numa avivada de consciência, disse aos camaradas que lá para trás tinha visto um homem caído bem na beira da rodagem. Resolveram voltar para ajudá-lo, mas ele já havia morrido. Morte silente, testemunhada pelos pássaros e pelas plantas que pareciam chorar diante daquele quadro de desventura. Encontraram-no sobre folhas secas, a cabeça escorada numa raiz de árvore, os olhos abertos ainda reclamando um sopro de misericórdia. Fecharam-lhe os olhos. Libertaram sua alma. Seu corpo foi enterrado ali mesmo, no palco encantado de seu teatro de agonia. Com varas da mata fizeram a cruz que cravaram em sua cova. Isso aconteceu, segundo relatos, nos idos de 1880. Nascia, assim, o mito da Santa Cruz da Baixa Rasa.

O martírio daquele vaqueiro foi divulgado pelo grupo de comboieiros ao povo da região. Tomados pela compaixão e motivados pela forte religiosidade, os moradores dos arredores passaram a frequentar o lugar e rezar por sua alma, a fazer promessas, a suplicar milagres.

São diversas as histórias sobre a origem do mito. Mas o real é que vários milagres são atribuídos à Santa Cruz da Baixa Rasa, dentre eles o atendimento a uma promessa feita por uma senhora, em 1914, quando uma terrível peste espalhou-se por diversos pontos do Nordeste. Ela, com inabalável fé, pediu que a epidemia não chegasse ao Cariri. Foi atendida e o povo da região ficou livre da doença. Essa senhora era conhecida como Vó Pretinha, matriarca da família Estêvão, família que até hoje mantém a tradição de rezar aos pés da Santa Cruz da Baixa Rasa.

Muitas graças foram e são alcançadas e, todo 25 de janeiro, uma grande romaria de devotos acorre ao local, que fica a cerca de 20 quilômetros da cidade do Crato, dentro da Floresta Nacional do Araripe.

Uma clareira aberta no coração da mata virgem. Ventos soprando a ancestralidade de um povo religioso, que ainda tem o privilégio de conviver com a natureza divina, mãe de todas as crenças e mitos e desejos e esperanças. Um oráculo nordestino onde os filhos da terra procuram respostas que lhes livrem da ação implacável da esfinge que a todo tempo lhes apavora com a possibilidade de condenação ao inferno. A Santa Cruz da Baixa Rasa é magia matuta. É a busca incansável da felicidade. É o céu que se insinua aos impuros que buscam a clemência de Deus.

Purgar os pecados, pagar promessas, cantar, rezar pela cura e por querer ser feliz. Aqui, instala-se um ritual misto de sagrado e de profano: missa, devotos, benditos, vaqueiros, bandas cabaçais, reisados, maneiro pau, penitentes, cantadores de viola, políticos de matizes diversos, pesquisadores, curiosos. É o espírito da devoção e da festa, como no princípio, onde o sagrado e o profano eram um só.


¹Cacá Araújo (texto e foto) é professor, dramaturgo e folclorista, diretor da Cia. Brasileira de Teatro Brincante, radicado em Crato-CE.

De Você Apenas Interessa a Grana - José do Vale Pinheiro Feitosa

Teve uma missa em que fui tirado do altar, no Convento das Clarissas, porque um padre famoso do Rio queria rezá-la. E fui ameaçado por esse padre, que dizia que faria reclamação ao bispo. Outro me proibiu de pisar na igreja dele. Fiz um casamento lá, e ele se incomodou pela vibração da alegria. Isso é uma perseguição que acontece pela disputa das ovelhas, sobretudo da ovelhas abastadas” – Ex-frade Jhonatha Gerber que acaba de desistir da batina e vai se tornar um psicólogo e assim ganhar a sua vida curando almas. Jornal O Globo Segunda-Feira 20 de Janeiro de 2014

Na maternidade um grande negócio para nascer, somados ao feitiço de serviços, berço, brinquedos e mamadeiras e produtos da Nestlé. Aí começa até o último sopro de vida a parafernália “científica” em razão de toda circulação da mercadoria. Some-se os interesses e todo tipo de serviço, de pequenos por for para atender à “legislação”, sem contar, para os pobres, as máfias organizadas.

Toda a vida neste mundo, assim como era o sofrer na terra da idade média, ainda com alguma paga mediada pelas igrejas no céu, se tornou a sopa amarga do progresso do materialismo financeiro. Considere o seu mais elevado momento de humanidade e exime o quanto ele se encontra na borda da mais ignóbil exploração do outro apenas para que tudo mais funcione e todos tenham direito a circular moedas para sobreviver.

O denominador comum dessa nova era de trevas, por incrível nascida do Iluminismo, é o interesse exclusivo pelo dinheiro que circula de mão em mão. O mão que te ama ou a que tua amas, é importante exatamente por isso: por te devolver em valor monetário tudo aquilo que do teu coração pensava ser humano.

Nenhum sonho, nenhuma discussão a valer consegue ultrapassar esse círculo de giz desenhado no chão ao qual ninguém ousa ultrapassar embora empecilho físico nenhum exista. A moeda, tua vida, teu sopro, é a circulação daquilo que mesmo não o necessites terás que trocar, absorver ou contribuir para a montanha de lixo.

Mas isso não diz tudo do humano e nem do planeta. Diz apenas da era, do momento da história, que criou esse arranjo tocado por lideranças, exércitos, crenças, fés, e instituições que existem para garantir a idade das trevas. Como antes, agora além do lamento, há a possibilidade de compreender.
O denominador comum é a compreensão desse era e em seguida a imaginação para superá-la mediante forte crítica. 

Uma crítica revolucionária e não reacionária como a de Jhonatha Gerber trocando o confessionário pelo divã.
    


sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

"Os 100 anos de Maria de Araújo" - José Nilton Mariano Saraiva

Manchete de um dos cadernos do jornal O POVO (Fortaleza-CE), edição de 15.01.14, alude sobre o relançamento do livro “Milagre do Joaseiro”, de autoria do norte-americano Ralph Della Cava, cuja primeira edição data de 1977, evidentemente tratando sobre Cícero Romão Batista.

Que se saiba, não há nenhuma novidade, adendo ou atualização, donde se conclui que teremos o mesmo, do mesmo, do mesmo. Ou seja, o velho, surrado e batido discurso de sempre. Até porque o tema exauriu-se faz tempo, embora os adeptos de Cícero Romão Batista teimem em mantê-lo em evidencia, porquanto a Igreja ainda não lhe tirou o cáustico carimbo de “charlatão”, dificultando sua ascensão à condição de “santo” (mas o fará, mais cedo ou mais tarde, por injunções político-mercantis).

Bem que o eminente autor, aproveitando ser este o ano centenário da beata Maria de Araújo, poderia agregar dois novos capítulos, específicos e necessários: primeiro, discorrendo em profundidade a respeito da “causa mortis” da coitada da beata; depois, tratando do extraordinário enriquecimento (presumivelmente ilícito) de Cícero Romão Batista (no entanto, por motivos óbvios ele jamais o faria, porquanto se o fizesse praticamente estaria a matar a “galinha dos ovos de ouro”).

Com relação à beata Maria de Araújo, por exemplo, sabe-se, apenas e tão-somente que, negra, analfabeta e filha de pais pobres, desde cedo foi adotada por Cícero Romão Batista, que a abrigou em sua própria residência; que, fanática, dispensava ao seu protetor obediência cega, leal e irrestrita, capaz até de por ele sacrificar-se (o que acabou acontecendo); e, o mais importante, que padecia de séria e gravíssima enfermidade, a ponto de recorrentemente expelir sangue pela boca (às vistas do esperto padrinho) muito antes do tal “milagre da hóstia”.

Pertinente, pois, o questionamento: a pobre coitada da beata serviu de mero e vulgar (embora eficiente) “instrumento”, a fim de viabilizar o engodo conhecido por “milagre da hóstia”, definido pela própria Igreja Católica como charlatanismo puro ???  Afinal, todos os indícios apontam que, presumivelmente acometida de tuberculose, ainda assim teria sido usada (desumanamente) até o limite da sua condição físico-orgânica, por aquele em quem tanto confiava.

Lembremo-nos que, à época da farsa, às pressas foram diligentemente confeccionados os famosos “paninhos”, depositários do sangue da beata, para uso exaustivo como uma das “provas do milagre”, mas que, depois, providencial e misteriosamente, sumiram (ou queimados foram) como se houvesse o temor de, num futuro não tão distante, com o vasto instrumental técnico que certamente adviria, um exame mais detalhado pudesse diagnosticar “in totum” algo comprometedor, capaz, inclusive, de “demolir” de vez com o tal “milagre”.

Tanto é que, mesmo sabendo-a a principal protagonista do tal “milagre”, “post mortem” as autoridades eclesiásticas de Juazeiro tomaram imediatas providencias visando apagá-la de vez da memória popular, via destruição de todo e qualquer vestígio que lembrasse sua presença. Assim, sintomaticamente o seu túmulo foi criminosamente violado e, de forma conveniente (para beneficiar Cícero Romão Batista, especificamente) seus restos mortais sumiram, escafederam-se, daí que Maria de Araújo passou a ser conhecida como “a mulher sem túmulo”. Donde se pode conjecturar que tal reflexão - o seu criminoso uso como “inocente útil” – abriga, sim, consistência e fundamento.  

Já no tocante ao estupendo e extraordinário enriquecimento de Cícero Romão Batista, quando ingressou na carreira política depois de expulso da Igreja, as evidencias indicam que o “modus operandi” usado não se diferenciaria em nada dos usados atualmente pelos desonestos políticos brasileiros, já que amealhou um colossal patrimônio (terrenos, imóveis, fazenda, gado e por ai vai) em tempo relativamente curto e, mais importante, sem que tivesse qualquer fonte de renda (nenhuma mesmo) compatível. A(s) dúvida(s), então, seria(m): sobras de campanha??? dinheiro não contabilizado ??? remessa do exterior ??? caixa dois ??? doações ??? descoberta de uma botija ???

E se, à época, houvesse um magistrado destemido e despachado tal qual o Joaquim Barbosa (dos dias atuais), será que Cícero Romão Batista se livraria de uma pena exemplar ???

Como se vê, o octogenário norte-americano Ralph Della Cava perdeu uma excelente oportunidade de se “reciclar”, no relançamento do seu livro, nos brindando com o “complemento” da história real, ao invés de vir com a mesma versão de 37 anos atrás (ao salgado preço de R$ 65,00).

Assim, só nos resta torcer para que futuramente apareça um “historiador” com “H” maiúsculo, capaz de direcionar os holofotes para a “face oculta” de Cícero Romão Batista (mesmo que nessa oportunidade ele já haja sido, provavelmente, ungido ao patamar de santidade).

Agora, risível, desrespeitoso e beirando à cretinice, é que hoje, 17.01.14, no aniversário do centenário de nascimento de Maria Madalena do Espírito Santo de Araújo, as autoridades juazeirenses tenham resolvido encenar o enterro da própria (para tanto a mídia foi usada para convocar a população), evidentemente que objetivando criar mais um local de exploração dos atarantados romeiros. Dúvidas: o que colocarão dentro do caixão ??? O que mesmo será enterrado ???

São uns impiedosos e insensíveis.


terça-feira, 14 de janeiro de 2014

"Jogo de cena" - José Nilton Mariano Saraiva

Como o ano é de eleições para a Presidência da República, Governadores, Senado e Câmeras Federal e Estadual, convém que o distinto eleitor reflita: afinal, PROS, PDS, PMDB, PSDB, PPS, PT e PSB (além dos partidos nanicos) têm alguma coisa em comum, além do fato de serem volúveis agremiações políticas brasileira ??? Algum projeto ou algo que de alguma forma as irmanem ??? Guardam alguma similitude em termos de defesa de um ideário programático comum ??? Pugnam por regras ou princípios consentâneos e igualitários ???  Trilham a mesma estrada e comungam dos mesmos objetivos ???

Claro que não. Longe disso. Transamazonicamente longe.

Pois foi esta a trajetória sinuosa, oportunista, chinfrim e um tanto quanto fedorenta percorrida pelo papo-furado, espertalhão e arrogante Ciro Gomes até aqui (politicamente), nem que para tanto tenha tido que abater e deixar pelo caminho, insepultos, restos mortais de fiéis companheiros de jornadas outras. E ai de quem cobrar-lhe fidelidade e coerência programático-ideológica: sua conhecida e pornográfica metralhadora giratória é acionada em todas as direções, sem dó nem piedade, independentemente de quem esteja à frente. O negócio é marcar posição. Seguir o script surrado e batido, mas de uma eficiência a toda prova e que objetiva, em última instância, angariar alguma “boquinha” pra si e seus áulicos. Enfim, manter-se empregado e muito bem remunerado, já que no Brasil, lamentavelmente, a “política” virou um rentável “meio de vida” (e a família Ferreira Gomes é o exemplo vivo e maior disso).

Quem não lembra, por exemplo, que, quando Lula da Silva disparou na disputa da eleição presidencial, Ciro Gomes rotulou-o de “despreparado” e “incendiário” para, após a vitória do oponente, silenciar e lacrar o bico com “superbond”, a fim de acomodar-se cândida e placidamente em um dos seus ministérios ???  E - suprema ironia - a partir de então, era Deus no céu e Lula da Terra.

Ou alguém já esqueceu que, mais recentemente, ao ter sua candidatura à Presidência da República abortada e descartada pelo próprio Lula (que optou por Dilma Rousseff), o senhor Ciro Gomes (então um poço transbordante de mágoas), compareceu aos mais diversos meios de comunicação (Globo, Record, SBT, Band e por aí vai) e, em horário nobre, afirmou para toda a nação, de forma contundente e desabrida, que o candidato Serra (seu inimigo maior), pelo currículo e pela experiência, era a pessoa mais preparada para dirigir o Brasil do que Dilma Rousseff; em seguida, depois de uma conversa entre quatro paredes com o staff lulista, virou coordenador da campanha da então candidata, aqui no Ceará ???

Naquela ocasião, informamos, aqui mesmo, com todas as letras, vírgulas e acentos disponíveis (postagem “Cada homem tem seu preço ???”) que “...para renunciar à candidatura presidencial e agüentar calado todo o corrosivo desgaste que atualmente atravessa, por baixo do panos mui provavelmente terá sido firmado, lá atrás, um “acordo de cavalheiros”, que garante ao senhor Ciro Gomes um ministério qualquer num futuro governo Dilma Rousseff (onde ele poderá abrigar todos os áulicos que o cercam e traficar influência)”.

Pois é, hoje, depois de fazer beicinho, de “detonar” alguns dos atuais ministros, de mostrar-se magoado com o andamento do processo da escolha sucessória ministerial, de ter sido considerado por toda a mídia brasileira como “carta fora do baralho” no primeiro escalão da presidente Dilma Rousseff, de viajar à Europa (Portugal) para “esfriar a cabeça e recarregar as baterias”, o senhor Ciro Gomes faz “charminho” e anuncia que “vai pensar” sobre se atende ou não o “honroso convite” da presidenta (que tentará a reeleição), para assumir um Ministério no seu governo. Já marcou até prazo para o anúncio: quando abril chegar.

Jogo de cena, perfumaria barata e de quinta categoria, enganação pura e simples. Ciro Gomes, apesar dos aparentes laivos de loucura e intempestividade, dos arroubos e estultices de praxe, dos desmentidos e vai-e-vem protocolares, já está escolhido ministro no atual governo Dilma Rousseff. E mais: deverá manter a posição num (quase certo) e previsível segundo mandato da presidenta.


Assim, enganou-se, gerou expectativa ou embarcou na canoa furada por ele oferecida, já que não é preciso se ser nenhum expert na política para se matar certas previsíveis charadas. 

sábado, 11 de janeiro de 2014

"Prostíbulo" global - José Nilton Mariano Saraiva

Alô, alô, galera. Atenção, muita atenção. Depois de propagado incessantemente em horário nobre e precedido de detalhadas análises “sócio-antropólogicas” por parte de “especialistas em relações humanas” (que, por incrível que pareça, tentam nos convencer da sua utilidade, porquanto retrataria “a vida como ela é”), a partir deste 14.01.2014, a Rede Globo mais uma vez “brindará” seus fiéis telespectadores com o seu “prostíbulo global”,  em pleno horário nobre, ao exibir o indecente, imoral e desprezível programa BBB (e que nem por isso deixa de ser um dos seus “campeões de audiência/bilheteria”). Serão meses de xaropadas, imoralidades e futilidades, ao vivo e a cores (e quem não tiver um mínimo de massa cinzenta na cachola, mas grana sobrando e nenhum compromisso com a seriedade, pode até passar o dia todo assistindo, desde que adquira o tal “pacote”).

A fórmula é velha e conhecida: numa tal “casa”, projetada com antecedência, são acomodados intelectuais de araque, gays, lésbicas, garanhões, homossexuais, malandros, prostitutas, marombados, mocinhas inocentes, anônimos aspirantes à fama e até vovós (pra dissimular), com ordens de infligir códigos, desrespeitar as leis, usar drogas, praticar sexo ao vivo e a cores e, enfim, exercitar a devassidão e o heterodoxo (se, por algum milagre, existir alguma mulher “virgem” entre eles e lá demorar, certamente de lá sairá “ex”, tal a pressão da “direção” para que tal se concretize).

Estimulados pelo pseudo-intelectual e apresentador Pedro Bial (quem te viu e quem te vê), e por um tal Boninho (um dos diretores graduados da emissora), os escolhidos não têm limites éticos, legais, morais ou alguma coisa que se pareça com respeito ou dignidade, já que tudo lhes é permitido, contanto que o “jogo” seja apimentado e “desperte” a curiosidade do público (independentemente do vazio do seu conteúdo).

Público, aliás, que é estimulado a “escolher” (pagando caro a ligação telefônica) os seus preferidos, expostos nos tais “paredões”, que por sua vez rendem milhões e milhões de reais à emissora e à operadora telefônica (para tanto, uma mega estrutura é montada e disponibilizada aos telespectadores), inclusive e principalmente para pais, mães, irmãos e demais familiares, que compulsoriamente se deixam envolver, em troca de uma futura viagem ao Rio de Janeiro (com mordomias inimagináveis), além de uma aparição relâmpago na telinha.

Enfim, o circo tá armado e nossas crianças e adolescentes sairão mais “cultas”, “sabidas” e “preparadas para a vida”, graças ao BBB (e ainda tem gente que não acredita na influência e tirania da televisão).

Agora, aqui pra nós, o que doe e maltrata é o apresentador global nos faltar com o respeito todos os dias, ao referir-se àquela cambada de vadios e malandros como... “os nossos heróis”.


Te manca, Pedro Bial. Tô fora !!!