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sábado, 24 de abril de 2010

Cartas a favor da escravidão - dica de leitura


Cartas a favor da escravidão é uma ótima pedida, uma leitura importante para entendermos nossa história, em especial, a história da escravidão e seus protagonistas. Cartas a favor da escravidão é um livro organizado por Tâmis Parris e editado pela Hedra. Na verdade são as cartas de José de Alencar (1829-1877), conhecido por ser um importante líder político cearense, deputado federal, ministro da Justiça e escritor. Sua obra literária também é famosa e importante, entre outras, O Guarani (1857), Iracema (1865) e Senhora (1875). 

Conforme a indicação do organizador, "Cartas a favor da escravidão reúne uma série de sete textos políticos inscritos no gênero epistolar que José de Alencar publicou em franca oposição a D. Pedro II sob o título Ao imperador: novas cartas políticas de Erasmo (1867-1868). O propósito central da obra era a defesa política da escravidão brasileira, que vinha sofrendo intensa pressão internacional e doméstica após a abolição nos Estados Unidos (1865)."

Vale a pena conferir.   

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Dia do Preto Cosme



"Condenado à forca  em Itapicuru-Mirim, Maranhão, o último líder da Balaiada,  Cosme Bento das Chagas, 40 anos que Caxias chama  "o infame Cosme". Herói da luta do povo por liberdade e cultura, teve o descortino de fundar uma escola em seu quilombo nas nascentes do Rio Preto. (Foi) executado em data incerta entre 19 e 25/09/1840. " 

Fonte:  Portal Vermelho

domingo, 4 de abril de 2010

Diferentes formas de escravidão


Passagem do livro de Tucídedes (IV, 80) que relata acontecimentos de 424 a.C.: 

“Ao mesmo tempo, havia nisto um pretexto conveniente para enviar para fora os hilotas, pois temia-se uma revolta deles, favorecida pela recente ocupação de Pilos. Não há dúvida alguma que tal medida lhes foi inspirada pela grande quantidade de homens jovens entre os hilotas, pois a conduta dos lacedemônios [espartanos] sempre foi guiada essencialmente por sua desconfiança daqueles. Os lacedemônios [espartanos] pediram-lhes que designassem aqueles que dentre eles que os houvessem melhor ajudado na guerra, dizendo que queriam alforriá-los. Na verdade, era apenas um ardil; eles achavam que aqueles que fossem os primeiros a reivindicar a liberdade por orgulho d’alma seriam igualmente os primeiros a sublevar-se.”
Fonte: (CARDOSO, Ciro F.S. Trabalho compulsório na Antigüidade: ensaio introdutório e coletânea de fontes primárias. Rio de Janeiro: Graal, 2003, p. 131).

Mais um exemplo da relação social da escravidão. Em Esparta, a escravidão era estatizada, os hilotas eram cedidos às famílias espartanas. O texto de Tucídedes relata a estratégia utilizada pelos espartanos para evitar rebeliões. Um exemplo da luta de classes, conceito marxista considerado obsoleto por seus detratores.

Aproveitando a postagem, divulgo artigo sobre a desigualdade jurídica numa sociedade pré-capitalista, no caso, o Brasil escravista: 


http://periodicos.urca.br/ojs/index.php/cadernos/article/viewFile/34/53

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Escravismo e escravidão.

Ainda hoje em pleno século XXI recebemos todos os dias notícias sobre a escravização de seres humanos, inclusive no Brasil. Pela legislação brasileira é crime escravizar um ser humano. O artigo 149 do Código Penal estabelece o crime para quem submete uma pessoa à condição análoga a de escravo. A escravidão é uma instituição presente na história da humanidade desde os seus primórdios. Mas é preciso esclarecer algumas questões que a envolvem. Não se deve confundir o escravismo com a escravidão e muito menos com o escravo. Confusão frequente inclusive entre alguns professores de História. Ainda mais quando vemos o tratamento a que muitos trabalhadores são submetidos em nosso país, seja no campo ou nas cidades.
O Escravismo é o modo de produção em que os meios de produção - a terra, os instrumentos de trabalho - e os produtores diretos - os trabalhadores - são monopólio de uma classe social de não-trabalhadores, os senhores de escravos. Um pressuposto para esse modo de produção é a existência de um mercado de escravos, pois o mecanismo de auto-reprodução natural era ineficiente. Em outras palavras, o Escravismo matava seus agentes produtivos - os escravos, de forma que esses trabalhadores não conseguiam reproduzir-se de forma "eficiente" para os seus senhores. Nos dias atuais, a classe trabalhadora consegue se reproduzir e todos os anos vemos milhares de jovens oferecendo-se no "mercado de trabalho". É, as chances da juventude são definidas pelo "mercado"...
Mas voltando ao Escravismo, a produção depende então do trabalhador escravizado, reduzido à relação de escravidão. A relação social de produção predominante é a escravidão. Jacob Gorender apresenta de forma clara e concisa, suas características: A escravidão completa se apresenta com a propriedade, a perpetuidade e a propriedade. "Às vezes, a escravidão se apresenta como escravidão incompleta. Não há por que seguir rigidamente conceitos definitórios, quando, na vida real, suas concretizações manifestam ausência de traços e e variações aproximativas¹." Foi o caso do Brasil quando da aprovação da Lei do Ventre Livre em 1871. A partir dali, pelo menos do ponto de vista formal, cessava a transmissão hereditária da condição de escravo. A escravidão então se tornava incompleta.
A escravidão então é uma relação entre duas partes. O senhor de escravos e o escravo. Ela ocorre como relação predominante e indispensável no Escravismo, mas também ocorre em outros modos de produção tais como o M.D.P. Capitalista, o M.D.P. Asiático e o M.D.P. Feudal. No Escravismo é a relação social decisiva. Tanto que para ocorrer a expansão da produção, havia a necessidade de anexação do trabalho humano, que se dava mediante a coerção violenta. Era uma das formas de obtenção de trabalhadores, o que hoje chamamos "mão-de-obra".
Mas a escravidão não era apenas uma relação social de produção. Em um sentido lato, não apresentava características produtivas, como no caso dos escravos domésticos ou dos servi caeseri, do Império Romano. Os senhores de escravos muitas vezes tinham orgulho em possuir um plantel. Eis a fala de um escravocrata brasileiro, Luiz Peixoto de Lacerda Werneck: "O escravo não é só um agente de trabalho e de produção. É preciso desconhecer o coração humano para assim pensar; o escravo é um objeto do luxo, um meio de satisfazer certas vaidades e certos vícios da natureza do homem. Assim como a propriedade territorial tem certos atrativos, assim também o escravo oferece ao senhor um certo gozo de domínio e império, que está no coração humano, não sabemos se bem ou mal."²
Os senhores de escravos sempre se preocuparam com o controle sobre seus trabalhadores. Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, o 2º Barão de Pati do Alferes, se pronunciou sobre a necessidade de se controlar os escravos. No seu livro, Memória sobre a fundação de huma fazenda na província do Rio de Janeiro, o Barão defendeu a idéia que: "O escravo deve ter domingo e dia santo, ouvir missa se a houver na fazenda, saber a doutrina cristã, confessar-se anualmente: é isto um freio que os sujeita, muito principalmente se o confessor sabe cumprir o seu dever e os exorta a terem moralidade, bons costumes e obediência cega a seus senhores e a quem os governa.(...) Nem se diga que o preto é sempre inimigo do senhor; isto só sucede com os dois extremos: demasiada severidade, ou frouxidão excessiva, porque esta torna-os iracíveis ao menor excesso de um senhor frouxo, e aquela toca-os à desesperação.(...) O negro deve ser castigado quando comete crime: o castigo deve ser proporcional ao delito: ele que apanha, não se esquece e corrige-se com esta pontualidade. Fazei pois justiça reta e imparcial ao vosso escravo, que ele, apesar de sua brutalidade, não deixará de reconhecer.³"
Eis aí algumas recomendações daquele nobre, algumas poderiam fazer parte do discurso de alguns ideólogos do conservadorismo brasileiro nos dias atuais, ou de alguma representação patronal. A classe trabalhadora ainda tem muito o que conquistar em nosso país. Em outro momento abordaremos o "ser escravo", também muitas vezes incompreendido pelos que estudam a questão.

Referências:
1 - GORENDER, Jacob. A Escravidão Reabilitada. São Paulo: Ática, 1991,p.85.
2- CONRAD, Robert. Os últimos anos da escravatura no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1975, p. 15-16.
3- WERNECK, Francisco Peixoto de Lacerda. Memória sobre a fundação de huma fazenda na província do Rio de Janeiro, p. 37.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Encontro: "Escravo, nem pensar!"

"De 10 a 12 de outubro, educadores e líderes populares participantes do programa "Escravo, nem pensar!", da Repórter Brasil, se reúnem com movimentos sociais e entidades para troca de experiências em Açailândia (MA)

Por Repórter Brasil

A ONG Repórter Brasil e o Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos (CDVDH) de Açailândia (MA) promoverão de 10 a 12 de outubro o I Encontro Nacional do "Escravo, nem pensar!" na cidade de Açailândia (MA). O programa existe desde 2004 e forma professores e líderes populares para atuarem na prevenção ao trabalho escravo nos municípios com alto índice de aliciamento ou de ocorrência deste crime. A partir do curso, os participantes são estimulados a multiplicar, na sala de aula e nas comunidades, as informações sobre esse tipo de violação dos direitos humanos.

O evento deve reunir cerca de 200 pessoas de seis Estados para promover troca de experiências e de produções culturais, além de dar destaque às experiências exemplares de prevenção e conscientização a respeito do trabalho escravo contemporâneo. Os seis Estados atendidos pelo programa até o momento são: Pará, Maranhão, Tocantins, Piauí, Mato Grosso e Bahia.

Segundo a coordenadora Fabiana Vezzali, um dos principais desdobramentos do encontro será a criação de uma rede de prevenção ao trabalho escravo entre os participantes do programa, para que continuem trocando informações e compartilhando experiências em relação a essas questões.

A programação prevê debates, oficinas e rodas de conversa sobre temas relacionados direta ou indiretamente ao trabalho escravo - como exploração sexual, questão agrária e meio ambiente - apresentações de trabalhos culturais desenvolvidos por participantes do "Escravo, nem pensar!" e apresentações culturais de grupos regionais.

Haverá também oficina de Comunicação que pretende estimular os participantes a publicarem fotos e textos sobre essas atividades durante o encontro. O endereço do blog é enenp.blogspot.com.

O evento tem o apoio da Prefeitura de Açailândia, Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, TAM Linhas Aéreas, Instituto Rosa Luxemburg Stiftung, Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, Ministério Público do Trabalho, Justiça do Trabalho e Organização Internacional do Trabalho.

"Escravo, nem pensar!"
O "Escravo, nem pensar!" nasceu em resposta às demandas do Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (PNETE), lançado em março de 2003 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O programa é considerado pelo governo federal e pelas entidades da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) como o primeiro grande projeto nacional de prevenção à escravidão, implantado de forma sistemática no país.

Mais de duas mil pessoas já participaram das formações do "Escravo, nem pensar!" desde 2004, em 37 municípios, de seis Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A formação dos participantes é apenas o ponto de partida para todo um trabalho que é desenvolvido no município. Após o curso, a Repórter Brasil faz visitas de acompanhamento a cada local, reunindo os participantes de seis em seis meses, durante um ano e meio.

Nesses encontros, eles têm contato com novos materiais e notícias sobre o assunto, discutem o que tem sido feito para prevenir o trabalho escravo, conversam sobre como superar as dificuldades e planejam ações futuras.

Confira a programação

Sábado, 10.10

Manhã
Abertura
Apresentação cultural: A Gaiola
Debate: Papel da sociedade civil no combate e na prevenção ao trabalho escravo

Tarde
Oficinas:
.. Você, repórter por um dia
.. Comunicação interpessoal para mobilização social
.. Criatividade - pensando novas formas de abordar o tema do trabalho escravo
.. Dança afro-brasileira - cultura e resistência
.. Denúncias de trabalho escravo
.. Economia solidária
.. Educação e Liberdade - práticas dialógicas
.. Teatro do Oprimido

Noite
Abertura das exposições: Projetos do Prêmio "Escravo, nem pensar!", Festival da Abolição (TO) e Concurso de Xinguara (PA)
Confraternização

Domingo, 11.10

Manhã
Debate: Impactos dos grandes projetos de desenvolvimento no Brasil
Apresentações culturais: Retalhos de uma ida e O massacre do Eldorado

Tarde
Rodas:
.. Agrocombustíveis: os bastidores do plantio de energia
.. A Justiça e o combate ao trabalho escravo
.. A luta pela terra
.. Comunidades quilombolas: conquistas e desafios
.. Condições de trabalho no campo e na cidade
.. Falando sobre educação do campo
.. Quebradeira de coco babaçu: uma luta diária
.. Que desenvolvimento queremos?
.. Questão indígena: terras, trabalho e agronegócio
.. Tráfico e exploração sexual de meninas e mulheres

Noite
Apresentação cultural: Espetáculo Quilombagem

Segunda, 12.10

Manhã
Depoimentos de trabalhadores libertados
Atividade de formação dos Agentes Especiais do "Escravo, nem pensar!"
Apresentação cultural e encerramento: Grupo Capoeira Cidadã

Tarde
Sessão de Cinema: Migrantes, de Beto Novaes, Francisco Alves e Cleisson Vidal "


FONTE: REPÓRTER BRASIL

sábado, 12 de setembro de 2009

"Quando eu cheguei aqui, a coisa era muito diferente do que havia sido prometido."

Como uma pessoa livre se torna escrava?

Matéria do Repórter Brasil.

"Nos últimos tempos, uma praga atingiu as fazendas de cacau onde Uexlei Pereira trabalhava no Sul da Bahia, deixando muita gente sem serviço. Aliciado por um "gato", saiu de sua cidade, Ibirapitanga, com a oferta de um bom salário, alimentação e condições dignas de alojamento. No Sul do Pará, Uexlei percebeu que havia sido enganado. Quando foi resgatado, recebia havia dois meses só a comida. Não tinha idéia de quanto devia ao gato, conhecido como Baiano, e nem quando iria receber. A sua história não é diferente da dos demais trabalhadores que fogem do desemprego para cair na rede da escravidão. Abaixo, estão detalhados oito passos que transformam um homem livre em um escravo, padrão que pode sofrer variações dependendo da situação e do local, mas que se repete com freqüência.

1) Ao ouvir rumores de que existe serviço farto em fazendas, mesmo em terras distantes, o trabalhador ruma para esses locais. O Tocantins e a região Nordeste, tendo à frente os Estados do Maranhão e Piauí, são grandes fornecedores de mão-de-obra.

2) Alguns vão espontaneamente. Outros são aliciados por "gatos" (contratadores de mão-de-obra a serviço do fazendeiro). Estes, muitas vezes, vêm buscá-los de ônibus, de caminhão - o velho pau-de-arara - ou, para fugir da fiscalização da Polícia Rodoviária Federal, pagam passagens para os trabalhadores em ônibus ou trens de linha.

3) O destino principal é a região de expansão agrícola, onde a floresta amazônica tomba diariamente para dar lugar a pastos e plantações. Os estados do Pará e Mato Grosso são os campeões em resgates de trabalhadores pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

4) Há os "peões do trecho" que deixaram sua terra um dia e, sem residência fixa, vão de trecho em trecho, de um canto a outro em busca de trabalho. Nos chamados "hotéis peoneiros", onde se hospedam à espera de serviço, são encontrados pelos gatos, que "compram" suas dívidas e os levam às fazendas. A partir daí, os peões tornam-se seus devedores e devem trabalhar para abater o saldo. Alguns seguem contrariados, por estarem sendo negociados. Mas há os que vão felizes, pois acreditam ter conseguido um emprego que possibilitará honrar seus compromissos e ganhar dinheiro.

5) Já na chegada, o peão vê que a realidade é bem diferente. A dívida que tem por conta do transporte aumentará em um ritmo crescente, uma vez que o material de trabalho pessoal, como botas, é comprado na cantina do próprio gato, do dono da fazenda ou de alguém indicado por eles. Os gastos com refeições, remédios, pilhas ou cigarros vão sendo anotados em um "caderninho", e o que é cobrado por um produto dificilmente será o seu preço real. Um par de chinelos pode custar o triplo. Além disso, é costume do gato não informar o montante, só anotar. Uma foice, que é um instrumento de trabalho e, portanto, deveria ser fornecido gratuitamente pelo empregador, já foi comprada por um peão por R$ 12,00 do gato. O equipamento mínimo de segurança também não costuma existir.

6) Após meses de serviço, o trabalhador não vê nada de dinheiro. Sob a promessa de que vai receber tudo no final, ele continua a derrubar a mata, aplicar veneno, erguer cercas, catar raízes e outras atividades agropecuárias, sempre em situações degradantes e insalubres. Cobra-se pelo uso de alojamentos sem condições de higiene.

7) No dia do pagamento, a dívida do trabalhador é maior do que o total que ele teria a receber. O acordo verbal com o gato também costuma ser quebrado, e o peão ganha um valor bem menor que o combinado inicialmente. Ao final, quem trabalhou meses sem receber nada acaba devedor do gato e do dono da fazenda e tem de continuar a suar para quitar a dívida. Ameaças psicológicas, força física e armas também podem ser usadas para mantê-lo no serviço."


terça-feira, 8 de setembro de 2009

Maranhenses escravizados. E o silêncio continua...


Maranhenses viviam como escravos em fazenda de soja. (Observação minha: mais uma do "agronegócio")

"A maioria dos 11 libertados estava no local há pouco mais de um ano; um deles era explorado criminosamente desde 2007. Eles catavam raízes na Fazenda Colorado II, área produtora de soja em Nova Canaã do Norte (MT)

Por Bianca Pyl

Aliciados no Estado do Maranhão, 11 trabalhadores viviam em condições análogas à escravidão na Fazenda Colorado II, situada na zona rural de Nova Canaã do Norte (MT), a quase 700 km da capital Cuiabá. Um jovem de apenas 17 anos de idade estava entre os libertados.

A maioria estava no local desde julho do ano passado; um deles era explorado criminosamente desde 2007. Eles trabalhavam na catação de raízes na propriedade de cultivo de soja, com cerca de 420 hectares.

A operação, que teve início nos primeiros dias de agosto, foi tumultuada. Ao tomar conhecimento da chegada dos representantes da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Mato Grosso (SRTE/MT) e da Procuradoria Regional do Trabalho da 23ª Região (PRT-23) na propriedade, o empregador conseguiu retirar os empregados do local. Para completar, os alojamentos foram derrubados e o acesso por terra até a frente de trabalho foi bloqueado com o emprego da vegetação retirada da beira da estrada.

Apesar dos problemas, o quadro de trabalho escravo foi caracterizado. Equipamentos de proteção individual (EPIs) e ferramentas não eram fornecidos. Foi encontrado ainda um caderno com anotações de dívidas dos trabalhadores referentes à compra de alimentos (como biscoitos e doces), fumo, cigarros, isqueiros, bota, chinelos e itens de higiene. O pagamento era feito por produção e variava de R$ 10 a R$ 15 por hectare limpo.

Os alojamentos eram barracos na mata feitos de lenha sob chão batido, cobertos com lona preta. As paredes também eram de lona. Não havia instalações sanitárias ou elétricas. A água utilizada vinha de uma represa.

A comida era preparada em fogueiras improvisadas por uma cozinheira que também fora aliciada. Eles comiam feijão, arroz e farinha. Muito raramente, servia-se carne. Caçavam e pescavam para reforçar a alimentação.

O empregador assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) proposto pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e efetuou o pagamento dos valores referentes as verbas da rescisão do contrato de trabalho, que totalizaram R$ 31,5 mil. Ao todo, foram lavrados 16 autos de infração."



domingo, 6 de setembro de 2009

As vítimas silenciosas no Brasil.

"A Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulgou, nesta quinta-feira (3), dados sobre os conflitos agrários do primeiro semestre deste ano. Mais do que sinais de recuo em números absolutos (de janeiro a julho de 2009, foram registrados 366 conflitos, que afetaram diretamente 193.174 pessoas; ao passo que no mesmo período de 2008, foram contabilizados 678 conflitos e 301.234 envolvidos) ou indicadores de intensificação em termos relativos (um assassinato a cada 30 conflitos, no 1º semestre de 2009, e um assassinato a cada 52 conflitos, nos primeiros seis meses de 2008), a regularidade do desrespeito aos direitos humanos e a persistência das condições geradoras e dos atos de confronto dão contornos à violência no campo brasileiro.

Dados sobre expulsões (promovidas por agentes privados) e despejos (executados pelo poder público) ilustram bem essa forte tendência de continuidade. Segundo Dirceu Fumagalli, da coordenação nacional da CPT, é possível identificar inclusive uma "sincronia" de ações em que o resultado final é sempre o mesmo: a negação do acesso de trabalhadores e comunidades à terra. "Quando os despejos não são feitos pelo Estado, a ação privada nas expulsões aumenta [como se deu em 2007]. Quando o próprio Estado faz mais despejos [como se verifica em 2008 e 2009], a ação privada diminui".

"O que vem ocorrendo no campo brasileiro é a persistência da violência. Há momentos em que esta violência declina e depois retorna. Mas se olharmos ao longo do tempo - considerando que imaginávamos que no terceiro milênio este processo seria superado, com uma ampla reforma agrária e uma série de políticas públicas -, vemos o quadro sem modificação", complementa Darci Frigo, da organização não-governamental (ONG) Terra de Direitos. "Permanecem as condições que permitem a perpetuação desta violência, seja por parte de agentes da força pública ou de milícias privadas".

Ao todo, foram 12 assassinatos, 44 tentativas de homicídio, 22 ameaças de morte e seis pessoas torturadas de janeiro a julho deste ano. Nos mesmos meses de 2008, foram 13 assassinatos, 32 tentativas de homicídio, 38 ameaças de morte e dois torturados. Se o mês de agosto de 2009 for incluído no balanço, o número sobe para 17 (confira lista divulgada pela CPT) - sem os cinco assassinados no Assentamento Chico Mendes, em Brejo da Madre de Deus (PE), em julho, pois o crime ainda está sob investigação.

De acordo com a CPT, 2.013 foram libertadas de trabalho escravo na metade inicial de 2009. Nos Estados do Acre, Pernambuco, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Tocantins e Bahia, o número de libertações já é maior que o registrado em todo o ano passado. Surpreendentemente, 39% (786 pessoas) dos que ganharam a liberdade no 1º semestre eram explorados no Sudeste.

Um dos dados mais preocupantes é a quantidade de adolescentes libertados da escravidão. Apenas no primeiro semestre de 2009, foram libertados 88 jovens com menos de 18 anos. No mesmo período em 2008, foram 16. "Isso mostra uma nova geração sob o jugo da escravidão, perpetuando o histórico de seus antepassados", comenta a CPT, que salienta que os dados ora divulgados são parciais, pois novas informações a respeito de conflitos ocorridos neste mesmo período poderão ser incluídas posteriormente no relatório anual.

Na visão de Dirceu, a estrutura estatal (incluindo os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário) atua a favor da permanência da concentração da terra, apontada por ele como causa fundamental dos conflitos agrários. "O Estado não está para cumprir os direitos constitucionais", declara. O representante da CPT lembra que não há uma a reforma agrária efetiva no país, que a impunidade não regride e que as políticas públicas que deveriam garantir qualidade de vida não são capazes de evitar a vulnerabilidade dos excluídos - que desemboca em fluxos migratórios e na sujeição ao trabalho escravo.

Para Darci Frigo, além da ausência de avanços efetivos na política de democratização da terra, as obras de infra-estrutura de apoio ao agronegócio, como as previstas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal, também contribuem para este clima de pressão. "As populações locais e os grupos que se opõem [a esses empreendimentos] sofrem intimidações e, às vezes, chega-se ao recurso desta violência extrema", completa o advogado da Terra de Direitos, que acompanha questões de conflitos agrários país afora.

"Mesmo que tenhamos uma Secretaria Especial no país que tenha preocupações com uma política que respeite os direitos humanos, os Estados têm autonomia sobre as polícias. [O comando estadual] Tem vínculos políticos com grupos locais e acaba sendo conivente com a violência, inclusive com o processo de criminalização [dos movimentos sociais] como o que ocorre no Rio Grande do Sul. Lá, a própria Brigada Militar é agente da violência, apoiada por forças privadas", acrescenta Darci. "A relação das forças econômicas locais com os aparatos policial e judicial acaba sendo um fator que mantém a liberdade de atuação desses grupos que utilizam de violência".

Índices
Uma das questões relacionadas à violência no campo que está na ordem do dia é a atualização dos índices de produtividade. Em resposta à Jornada Nacional de Lutas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), realizada em diversos Estados da federação em meados de agosto, representantes da cúpula governamental prometeram publicar em 15 dias a portaria que atualiza os índices que seguem parâmetros de 1975. Com novos critérios de exigência, propriedades hoje consideradas produtivas podem vir a ser enquadradas como improdutivas e sujeitas à reforma agrária.

Logo após o anúncio, setores ligados aos ruralistas - encabeçados pelo ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes - condenaram a atualização. De tão sensível, a questão acabou sendo levada aos comandos partidários. Como forma de pressão, setores do PMDB ameaçam retaliações ao governo. O prazo inicial estipulado se encerrou e, ao que tudo indica, a portaria com os novos índices e a assinatura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, prometida aos movimentos sociais do campo, não deve ser publicada assim tão breve.

"Não será estranho se o governo enrolar mais alguns anos para atualizar os índices de produtividade", comenta Dirceu, da CPT, ligada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Ele, aliás, não vê muita distinção entre os ruralistas e o governo e mostra desconfiança sobre a efetividade do compromisso palaciano. "Não temos o Estado imparcial que faz a mediação entre os interesses do capital e do trabalho", sublinha.

Na última terça-feira (1º), a CPT apresentou nota pública à sociedade em apoio à atualização dos índices. "A conclusão óbvia a que se chega é que por trás desta guerra da bancada ruralista, teimando em manter os velhos índices de produtividade de 1975 está o intento de preservar o latifúndio improdutivo das empresas nacionais e estrangeiras, desconsiderando a função social da propriedade, estabelecida na nossa Constituição Federal, continuando o Brasil, assim, o campeão mundial do latifúndio depois de Serra Leoa".

A entidade questiona o número de 400 mil propriedades rurais que seriam afetadas pelos novos critérios e que inviabilizariam a produção agrícola do país. "Na realidade, este número corresponde a apenas 10% das propriedades rurais, embora ocupem 42,6% das terras. Com efeito, das 4.238.447 propriedades cadastradas pelo Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária], 3.838.000, ou seja, 90% não seriam afetadas pela medida. São estas propriedades as que garantem 70% do alimento que é posto na mesa dos brasileiros", coloca o documento da comissão.

"Onde há maior concentração de sem-terra é onde o número de assentamentos é menor. E isso justamente ao lado de áreas improdutivas, que a atualização dos índices poderia facilmente disponibilizar para assentamento das famílias", emenda a nota. Segundo a CPT, há uma concentração de ocupações e acampamentos nas Regiões Nordeste e Centro-Sul, em descompasso com os assentamentos instalados pelo governo na Amazônia. "Fica claro, pois, que onde há mais procura por terra, no Nordeste e no Centro-Sul, há menos disponibilidade de terras. E um dos fatores que limita esta disponibilidade são os índices defasados de produtividade"."


Fonte: Repórter Brasil.