TRAIDORES DA PÁTRIA (editorial
do jornal o Estado de São Paulo, de 20.11.24)
É de indignar todos os democratas deste país, sejam quais forem as
identidades político-ideológicas que possam distingui-los, a revelação de que
autoridades do governo de Jair Bolsonaro e militares das Forças Especiais do
Exército, além de um policial federal, TERIAM CONSPIRADO PARA ASSASSINAR,
NO FIM DE 2022, O ENTÃO PRESIDENTE ELEITO LULA DA SILVA, O VICE, GERALDO
ALCKMIN, E O MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) ALEXANDRE DE MORAES,
QUE À ÉPOCA ACUMULAVA O CARGO DE PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL
(TSE).
Como se sabe, na manhã de ontem a Polícia Federal (PF) deflagrou a Operação
Contragolpe, que culminou na prisão do general reformado Mário Fernandes,
ex-secretário executivo da Secretaria-Geral da Presidência (2020) e atualmente
assessor do deputado Eduardo Pazuello (PL-RJ). Além de Fernandes, outros três
militares com formação em Forças Especiais, conhecidos no Exército como “kids
pretos”, foram presos por suspeita de elaborar o plano homicida com vistas “à
abolição violenta do Estado Democrático de Direito”: Rafael Martins de
Oliveira, Rodrigo Bezerra de Azevedo e Hélio Ferreira Lima. O quinto envolvido
diretamente na trama, também preso, é o policial federal Wladimir Matos Soares.
A tentativa de golpe de Estado urdida pelos inconformados com a democracia, uma
súcia de civis e militares, da ativa e da reserva, TODOS DO ENTORNO DE
BOLSONARO, já era execrável por tudo o que se sabia a respeito da sedição até
agora. Por meio da desqualificação do processo eleitoral, entre outras artimanhas,
pretendia-se evitar a eleição de Lula da Silva como presidente da República.
Malfadado esse desiderato, partiu-se, então, para o impedimento da posse. A
rigor, o que a Operação Contragolpe fez foi mostrar ao País, com impressionante
riqueza de detalhes, até onde esses golpistas pretendiam chegar com seu furor
delitivo para manter Bolsonaro no poder, em afronta à vontade popular
legitimamente consagrada pelas urnas em 2022.
Chamado no ninho golpista de “Punhal Verde e Amarelo”, como se patriota fosse,
o plano dos militares liderados, do ponto de vista operacional, pelo general
Mário Fernandes, ex-comandante de Operações Especiais do Exército (2018-2020),
consistia, pasme o leitor, em envenenar Lula, “considerando a vulnerabilidade
de seu atual estado de saúde e sua frequência a hospitais”. Alckmin, segundo
consta, também seria envenenado. Já para matar Alexandre de Moraes, os
golpistas pretendiam detonar explosivos durante uma cerimônia pública. Eis a
dimensão da infâmia.
AINDA SEGUNDO A PF, AO MENOS UMA REUNIÃO PARA ARQUITETAR O TRIPLO HOMICÍDIO
TERIA SIDO REALIZADA NA RESIDENCIA DO GENERAL WALTER BRAGA NETTO, então
ministro da Defesa e candidato a vice na chapa de Bolsonaro pela reeleição.
ESTE JORNAL APUROU QUE A PF NÃO TEM DÚVIDAS SOBRE O “ENVOLVIMENTO DIRETO” DE
BRAGA NETTO NESSA TRAMA MAIS DO QUE ANTIDEMOCÁTICA, MACABRA.
Em um ofício de 221 páginas endereçado ao gabinete do ministro Alexandre de
Moraes, relator do Inquérito 4.874, que investiga no âmbito do STF a ação das
chamadas “milícias digitais antidemocráticas”, a PF detalhou como os militares
sediciosos monitoraram os passos de Lula, Alckmin e do próprio Moraes para
decidir como e quando agir. Resta claro que o País esteve muito próximo de ser
tragado por uma convulsão política e social inaudita em sua história recente. E
é lícito inferir que as consequências mais nefastas dessa extrema violência
política, gravíssima por sua mera cogitação, só não se materializaram porque o
Alto Comando do Exército não endossou a estupidez.
Mas que ninguém se deixe enganar. Se felizmente a intentona não foi adiante, o
simples fato de frutificar entre os mais bem treinados militares do Exército
esse ímpeto golpista em nada tranquiliza a Nação. O PAÍS SÓ ESTARÁ EM PAZ
QUANDO, UM POR UM, TODOS OS TRAIDORES DA CONSTITUIÇÃO, QUE, COMO DISSE ULYSSES
GUIMARÃES, TAMBÉM SÃO TRAIDORES DA PÁTRIA, FOREM JULGADOS POR SEUS CRIMES SOB A
ÉGIDE DO MESMO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO CONTRA O QUAL SE INSURGIRAM.