QUI, 08/11/2018 - 23:59
ATUALIZADO EM 09/11/2018 - 06:55
* Uma referência não muito sútil ao filme O
Exército de Brancaleone
Talvez o exemplo histórico mais próximo seja o da
Torre de Babel. São grupos de pessoas de várias procedências preparando-se para
tomar o poder. Ou “O Rato que Ruge”, que conta a tomada de Nova York por um
pequeno país, que tinha apenas a pretensão de ser derrotado para ser auxiliado,
mas encontrou Nova York em blackout.
Só dentre os “olavetes” (discípulos do filósofo
Olavo de Carvalho) há quase dez grupos independentes entre si, que mal se
conhecem. Tem mais tendências que os trotskista dos anos 70.
Há os seguidores do padre Paulo Ricardo,
reacionário de mão cheia, que juntou uma legião de padres para apoiar a
campanha de Bolsonaro. Há olavetes que detestam evangélicos e olavetes
que detestam católicos. O segundo grupo segue evangelicamente os ensinamentos
do mestre, que os proíbe criticar o Papa, mas os estimula a desancar a CNBB
(Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). São os mais ideológicos, acreditam
piamente no liberalismo amplo e irrestrito e no destino manifesto de Bolsonaro,
de ser um Donald Trump tropical.
Aliás, para o grupo, é Deus no céu, Olavo na terra,
e Trump no mundo. Deu um trabalhão para o general Heleno convencer o pessoal
que não bastava pensar como Trump para agir como Trump: era necessário dispor
de um exército como o dos EUA e uma economia como a norte-americana para
invadir outroS países. E parem com essa bobagem de pensar em invadir a
Venezuela!
Pararam.
Vão ser os primeiros a serem engolidos pela real
polítik. No início tinham a ilusão de que, pelo fato de Olavo ter fornecido os
três grandes motes da campanha – o kit gay, a Venezuela e a liberação das armas
– ele seria o grande ideólogo de Bolsonaro. Mas o capitão está mais para os ecos
de Olavo – tipo Lobão e Danilo Gentile – que para formulações mais complexas.
Há os youtubers, é claro. E uma profusão de
deputados recém-eleitos sem a menor informação sobre o que significa o trabalho
parlamentar. Ninguém conhece ninguém. Dia desses, em uma das reuniões dos
grupos de trabalho, passou um senhor de terno e gravata e imediatamente vários
recém-eleitos pediram que trouxesse água. Não era garçom, mas um deputado
bolsonariano.
A única bandeira que os une é a do antipetismo e os
gritos de guerra de manter Lula preso ou eliminado. Não há consenso nem mesmo
no campo das ideias reacionárias. Por exemplo, como fazer com evangélicos que
defendem aborto? Tem que tirar. Mas como?
O único grupo articulado é o dos militares da
infraestrutura, comandados pelo general da reserva Oswaldo Ferreira, com a
cabeça desenvolvimentista de Ernesto Geisel. Eles têm acesso direto e
irrestrito a Bolsonaro e já se constituem em um facho de racionalidade em meio
ao caos.
Se fortalecerão
mais ainda depois que caiu a ficha de Bolsonaro – e da legião estrangeira que o
cerca - sobre o enorme erro de entregar o Ministério da Justiça de porteira
fechada para o juiz Sérgio Moro. Especialmente depois que seu modelo, Donald
Trump, demitiu sumariamente o Procurador Geral de Justiça, por não concordar
com suas ações. Bolsonaro criou um Ministro indemissivel. O que acontecerá
quando ele quiser colocar na cadeia algum aliado estratégico de Bolsonaro?
Bolsonaro colocou no cargo mais estratégico do governo um Ministro
indemissível. E houve quem saudasse o convite como um lance de genialidade de
Bolsonaro.
O exemplo de Trump, desde o início atacado pela
justiça e pela mídia, consolidou em algumas alas de olavetes a crítica à Lava
Jato e ao partido da justiça.
Muitas das batatadas, Bolsonaro deve aos seus gurus
internéticos. Já as correções nas declarações estapafúrdias, os fachos de
racionalidade – como voltar atrás na questão do Mercosul, do Meio Ambiente ou
da embaixada em Jerusalém – são atribuídas aos conselhos dos militares.
Dia desses, no
entanto, houve a maior saia justa. O general Oswaldo fez uma longa explanação
sobre a necessidade de investimentos nos diversos modais, o ferroviário, o
rodoviário, o portuário, o fluvial. Quando ousou dizer o óbvio – nos locais em
que não houver investimento privado, será necessário aportar investimento
público – foi apartado pelo príncipe Luiz Phillippe de Orleans e Bragança, que
teve um chilique, acusando-o de estar sendo influenciado por ideias comunistas.
Partiu dos militares a sugestão de criar uma Casa
Civil da Infraestrutura, sob o comando do general Oswaldo, diretamente ligada à
Presidência, para coordenar os Ministérios dos Transportes, Minas e Energia e
Telecomunicações.
Um ponto de convergência geral, aliás, é a
constatação de que o astronauta Marcos Cesar Pontes – nomeado Ministro da
Ciência e Tecnologia – é alienígena que vive no mundo da lua. No início,
impressionou pelo domínio do inglês. Depois, caiu a ficha que o inglês servia
apenas para o astronauta dizer tolices em duas línguas.
Outra decepção
foi com o superministro da Economia Paulo Guedes.
No início, os
olavetes, os militares, os youtubers, todos apostavam na genialidade de Guedes.
Agora, passaram a vê-lo como um trapalhão. Primeiro, quando foi afrontar
o presidente do Senado, Eunício de Oliveira, demonstrando ignorância em relação
ao be-a-bá do orçamento: o orçamento de um ano é aprovado no ano anterior. Ou
seja, o primeiro orçamento de Bolsonaro depende da atual composição do
Congresso. Por isso não é de bom alvitre afrontar o presidente do Senado.
Depois, quando
falou que o Banco do Brasil seria comprado pelo Bank foi America. Guedes não
tinha a menor ideia de que um dos aliados mais influentes de apoio a Bolsonaro,
o pessoal que garantiu o financiamento privado de campanha por todo o país
– o agronegócio – não vive sem o Banco do Brasil.
Depois que Guedes passou a se desdizer tanto quanto
o capitão, as diversas alas bolsonarianas desiludiram-se. Os olavetes deram-se
conta da terrível realidade de que o capitão não é muito letrado nem
intuitivo. Não é um um ideológico racional, formulador. Foram, então,
atrás da mediação dos filhos, até cair na real de que os filhos só sabiam
mesmo detonar aliados pelo Twitter. Foi o que ocorreu com o infeliz que se
apresentou como marqueteiro de Bolsonaro, foi desmentido pelo filho, demitido
da equipe de transição e, como bom marqueteiro, anunciou que deixava a equipe
para se dedicar a trabalhos voluntários na equipe que o dispensou.
Balaços pelo
Twitter é o de menos. Internamente, há uma guerra de dossiês. Basta alguém
sugerir um nome para o governo para meia hora depois aparecer um dossiê contra
o candidato, em geral apresentando pelo vice-presidente, general Mourão.
Foi um dossiê
que derrubou a candidatura a vice do príncipe de Orleans e Bragança, um sujeito
ultraconservador, mas de pensamento articulado – que fez a cabeça de Bolsonaro
com a brilhante constatação de que o início do fim do país foi a Constituição
de 1988. Ah, e o golpe da Proclamação da República.
A candidatura do príncipe soçobrou devido a
questões pessoais menores que, em nenhum outro ambiente, seriam motivo para
vetos. O que menos pesou foi o fato de, na juventude, ele ter sido skinhead.