TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

A REVOLUÇÃO NAS PERNAS DA LEDA


As pernas da Leda! Tem curvas de seda, coxas de promessas, abrem-se em duas como um lago para se mergulhar.


A Leda tem o dom feminino de crescer a libido. Anular o ambiente e distanciar-se dos presentes. É uma turbina que gera mais energia que uma Itaipu e toda e qualquer hidroelétrica na calha do Rio Paraná. As pernas são o choque que endoidece, pois a seguir vem um tronco esguio, cintura torneada em cada milímetro, peitinhos que cabem na palma das mãos. As pernas ..."..o companheiro precisa ler mais. Precisa voltar à leitura...". As pernas da Leda continuam subindo por duas bandas que formam um todo e que excitam com o nome de bunda. A bunda da ..."...mas isso está escrito, veja aqui está dito.....".A bunda de Leda eu ficaria para sempre olhando se não fosse umas costas de gazela, ágil como um gozo, prolongada qual o desejo. Os ombros da Leda.."...a contradição é a mesma, não acabou, o socialismo soviético é que se findou, mas a contradição.....". Os ombros da Leda iguais somente aos ombros da Leda. Pois deles nascem o pescoço mais cheiroso que meu olfato jamais se excitou igual. Estes cabelos curtos, deixando-me toda a extensão do pescoço.."..não é a mesma coisa. As forças produtivas já não são as mesmas, as democracias burguesas se consolidaram...".Toda a extensão do pescoço da Leda em que um dia vou me acabar de tanto beijar. Subir de baixo a cima e de cima a baixo. Enfiar as narinas no emaranhado dos cabelos encaracolados, seduzidos, beleza pura, ferormônio secretando aos borbotões. E o rosto lindo da Leda. Rosto de faces safadas, desejosas, promitente. Sedutor.."...não a burguesia é vitoriosa e o capitalismo milenar". Sedutor o rosto da Leda.


De repente o mundo caiu-me sobre a cabeça. Meire, vendo-me encantado com as pernas da Leda jogou-me um livro e gritou: "E o quê tens para dizer? E a discussão?"


Respondi no ato. Marx em A questão judaica disse: "A forma mais rígida da antítese entre o judeu e o cristão é a antítese religiosa. Como se resolve uma antítese? Tornando-a impossível. E como se torna impossível uma antítese religiosa? Abolindo a religião".


Todos olharam em volta. Em parte a perplexidade devia-se à demonstração de memorização que dera e por outra, a história tinha a ver com o que se discutia e não tinha, também, nada a ver. Tinha a ver, pois se discutia antítese entre os regimes socialistas e capitalistas de produção. Porém, nada tinha a ver com o tema específico, pois não se tratava de religião.


Ai Cezinha, com seu olhar de peixe morto e entediado falou: "a antítese entre capitalismo e socialismo não existe mais. A antítese foi retirada, pois o socialismo como experiência real de modo de produção não mais existe nem na China". Chico Poeta pediu a palavra e contestou: "mas o socialismo continua uma ideologia científica e muito forte. Os capitalistas têm tanto medo de que se reinstale que não param de falar em mundo livre, em libertar os Árabes, em implantar uma verdadeira democracia liberal". Marcos costurando com Cezinha, respondeu a Chico: o socialismo é anacrônico, assim como certa direita apegada ao linguajar da Guerra Fria. Agora vem uma modernidade no linguajar, no pensamento, na forma de articular um arco de coisas diferentes e isolar os radicais ".


Uma maré veio do outro lado da sala. Era Fernandão, com seus cento e cinqüenta quilos aos berros: "vamos parar de emburrecer. Vamos parar de ser o eco desta pequena burguesia amedrontada. Os recursos do planeta já estão vulneráveis pela ação produtiva do capitalismo. Os pobres estão em plena convulsão nas cidades de todos os países e muitos países já estão literalmente sublevados. Vamos parar de babaquice e pensar. A contradição forjada pela guerra fria é que se esgotou. Mas a antítese ao capitalismo é esta desgraça de planeta com seus recursos naturais arruinados e a gente pobre". E puto nas calças foi saindo, pisando nos outros participantes do debate. Arrastando e derrubando cadeiras. Saiu com tanta força que parecia ter destampado o esgoto de um recipiente cheio de água por onde se esvaziou rapidamente.


Nem deu tempo de meu olhar gordo voltar-se para as pernas da Leda e a reunião das esquerdas tinha sido adiada para um novo dia. Na onda eu fui.



Fui, mas pensando em tudo que um dia aconteceria.

4 comentários:

socorro moreira disse...

Quarta-feira passada, pasme, assisti um espetáculo de dança, no Teatro Municipal do Crato de um grupo de Goiás-"O Quásar".
Dança contemporânea, interpretando músicas de Tom Jobim, na voz de Elis.Fiquei impressionadíssima, principalmente, com as formas dos corpos dos bailarinos...Agora sei...Eram lêdas! Mas é tão diferente, a visão feminina, ante àquela beleza...Não é desejo, nem cobiça, nem inveja...é profundo encanto, diante da obra divina que o homem reproduz, e aperfeiçoa.
Lêda é um protótipo de beleza! Em cada ser, ela se manifesta em pedaços...No rosto, no olhar, num andar gracioso, na delicadeza dos pés, na textura macia da pele, no perfume guardado pelos anéis dos cabelos...A panturrilha das bailarinas...o cós, que tanto apertei, e só afunilou as minhas intenções!
Lêda é a mulher que teus olhos guarda, e acha...perdida em fragmentos, por toda natureza!
Na realidade, senti foi ciúmes de Lêda!

Glória disse...

risos...Socorro, não sinta inveja da Lêda pois como você mesmo falou, nós temos um pouco em qualquer canto do nosso ser, um tiquinho de tantas Lêdas que habitam o universo.

Um abraço para o apreciador da Lêda do texto e outro abração para você !

José do Vale Pinheiro Feitosa disse...

Socorro: o encanto se deve à sensibilidade artística que desfia fios transcendentais da rudeza com que se apresenta o mundo de hoje. Mas mulheres também já vêm a estética da beleza feminina com as pupilas do desejo e o fundo de olho da cobiça daquele corpo. Então é assim que lentamente a manifestação da sensibilidade é mais verdadeira e mais completa. Agora uma coisa dizes com muita certeza sobre a estética do corpo humano. A beleza que nele há é escultural mas isso não é tudo. É que a estética da beleza é parte da cultura, da sociedade, da associação, da convivência e, naturalmente, da vivência. Por isso é que a manifestação dos pedaços como o dizes é tomada pelo todo. Mais ainda, o pedaço humano não é só tato, é cheiro, audição, visão e sabor. Aí é que se constrói a inteireza da narrativa da estética da beleza. Como pretendia-se no conto, em toda filosofia, em toda política, luta e conquista, no centro se encontra o ser humano.

socorro moreira disse...

Falou!
Fecho com um brega dos anos sessenta:
"Lêda/a natureza/deu-te a beleza/de um prado em flor".
Adilson Ramos...nem sabia, que na memória existia!