TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

A ILHA E O CONTINENTE


Fernando Henrique Cardoso , um lobo travestido de cordeiro, governou o país por oito longos anos e poucas vezes se viu uma administração mais entreguista e elitista. Privatizou todo o patrimônio público nacional ( construído em quase quinhentos anos ) e até hoje não se sabe do dinheiro arrecadado no processo. Governou para uma cúpula paulista: para ele o Brasil só existe da Bahia para baixo. Esta é a visão exata do PSDB , um partido do Sudeste, que despreza o restante do país. Nem nomes como o do mineiro Aécio Neves ou o cearense Tasso Jereissati conseguem espaço: ali só há lugar para paulistas como Serra e Alckmin. Disto tudo já se sabia. Semana passada, no entanto, FHC, emitiu uma das suas mais preconceituosas e estapafúrdias opiniões, referindo-se ao Governo Lula : “ Queremos brasileiros melhor educados, e não liderados por gente que despreza a educação, a começar pela própria".
Esta citação merece, caros ouvintes, algumas reflexões, neste ensolarado sábado de dezembro. Claro que poderia ser apenas uma questão eminentemente política, nascida nas vésperas de um ano eleitoral. Não nos parece assim. FHC não consegue esconder o ciúme e o desespero. Lula ( apesar de toda mídia contrária) tem dado um verdadeiro banho nos seus antecessores , desde Deodoro. O país encontra-se com uma inimaginável saúde econômica, um IDH crescente e praticamente se quitou a dívida externa histórica. Alguém ainda ouviu falar de um tal de FMI? Mesmo na política externa, onde FHC pavoneava-se como doutor, Lula fez-se um estadista , empanando toda vaidade do seu antecessor. Não bastasse isso conseguiu , pela primeira vez, diminuir um pouco as desigualdades sociais, justamente com aqueles programas das bolsas , criticados sempre como eleitoreiros. Só que paulista não entende de miséria e tucano acredita ainda que o flagelo da seca e da fome pode esperar. Mas vamos um pouco adiante. FHC no discurso obtuso critica Lula por falar errado, cometer erros gramaticais. Pois com toda vida acadêmica , ele mesmo, na crítica, já cometeu um deslize imperdoável. Ao falar “Queremos brasileiros melhor educados...” já feriu mortalmente a gramática clássica. O Correto seria : “Queremos brasileiros mais bem educados...” Deixemos as gramatiquices de lado. Vamos a um ponto bem mais preocupante. FHC entende a educação como uma coisa eminentemente acadêmica e ligada à forma correta de se expressar. Para ele, não existe a família, não existe a modelagem do mundo, não existe caráter. Quanto tempo Patativa do Assaré freqüentou a escola? Chico Mendes ? Cego Aderaldo ? Cartola ? Gregório Bezerra ? Zé da Luz? Por outro lado, os maiores crimes brasileiros não são cometidos nos morros do Rio, mas nas duas torres do Planalto Central, cheias de engravatados de fala mansa e português escorreito.
Lula, a rigor, não se expressa linguisticamente de forma errônea. Ele fala a língua pura de 70% da população brasileira que inclusive pode reivindicar o status de língua oficial. Não discursa para os PhD´s da USP, mas sabe , como poucos, atingir o coração do povo brasileiro. Inteligente, formado nas faculdades das ruas e das fábricas, poderia ter estudado em universidades estrangeiras, mas preferiu alimentar o mito de ser o primeiro operário em mais de 500 anos a dirigir um país problemático como o Brasil e, para o desespero de tantos, com muito mais eficiência e capacidade do que os enfatiotados antecessores. Hoje possui uma popularidade imensa ( apesar de todo desgaste que lhe trouxe o PT) e tem todas as possibilidades de voltar para um terceiro mandato em 2014.
Lula incinerou, definitivamente, a mitologia elitista pregada por FHC. Ser poliglota , falar com correção, escrever livro de sociologia pode fazer qualquer homem mais informado, mas não o torna necessariamente mais culto. A academia , o mais das vezes, forma especialistas que não conseguem enxergar o mundo além da viseira imposta por sua profissão. Conseguem entender com todos os detalhes a reprodução da pulga, mas são incapazes de perceber a dor, o sofrimento, o sentimento do companheiro sentado do outro lado do microscópico. O mundo para eles acaba no quintal do laboratório universitário.
FHC não poderia ter sido mais destemperado. Ele que já pediu um dia se rasgassem todos os seus livros de sociologia, esta solicitando , agora, que apaguem seu nome , definitivamente, da história política do país. Sequer percebe que sua pequena ilha de elitismo acadêmico é cercada por um gigantesco continente de pessoas simples, trabalhadoras, muitas vezes pobres e semi-analfabetas, mas nem por isso menos dignas, cultas e felizes.

J. Flávio Vieira

3 comentários:

Glória disse...

Nunca tinha lido um texto tão verdadeiro. FHC além de tudo isso, é preconceituoso (racista) e não vê que aqueles lábios grossos que ele possui pode vir de uma descendência negra.

Flores no Asfalto disse...

Brilhante texto. Ao se referir ao português não-acadêmico de Lula, FHC quis atingir, isto sim, aos nordestinos sem acesso à educação de qualidade ou aos bancos acadêmicos tão confortáveis que, ele próprio nem viajando para onde quer que vá (e às custas do próprio PSDB) ousa sair deles.

Quando um dia olhar para o restante da sala de aula e ver que muitas cadeiras faltam, e que a maior parte são de madeira rústica, talvez o gabaritado acadêmico levante-se de seu trono sagrado.

Abraços, Doutor.
João Matias.

Marcos Vinícius Leonel disse...

Texto oportuno não só pela forma como revela a propiedade de grande estadista que é Lula, mas também pela forma com que enfoca a ladainha acadêmica da elite branca que ronda o poder no Brasil, feito urubus, desde o Brasil Colônia. Não só FHC, mas toda a corja proveniente do golpe de 64, precisam ser desmascarados com inteligência e argumentação, pois os fatos podem ser distorcidos, mas apagados da história eles jamais serão. E lembrar as falcatruas dos governos de FHC servem para lembrar a longevidade da ladroagem no Brasil. Óbvio, que isso não encobre e não deve neutralizar os inúmeros ladrões que estão no PT, fazendo uso da máquina para benefícios particulares e do partido.