TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

segunda-feira, 20 de abril de 2009

A ALMA E O CORPO

Um ânimo (anima – sopro, ar, alento..) parece dar vida ao corpo. Pode morar aí uma grande ilusão, ao contrário do que pensava Sócrates, o ânimo não seria externo, mas apenas um manifesto temporal do próprio corpo. De qualquer modo, seguindo este caminho adiante, o ânimo depende de profunda e contínua relação do corpo com os elementos do planeta: oxigênio, água, carbono, sais minerais, oligoelementos e outras substâncias, inclusive da força de gravidade. É inegável que sem esta relação jamais existiu uma situação em que o ânimo permanecesse no corpo, advindo a morte. Com isso suspeita-se, cada vez mais, que ele seja uma manifestação intra-corporis.

Por isso não é de se estranhar que tenhamos profunda admiração (venerar, desejar etc.) com as forças, energias e grandes massas do planeta terra. Religiões existiram sobre elas. Depois a vida se civiliza num organismo coletivo e as religiões passaram a admirar as normas do coletivo, as fabulações da vida em sociedade, portanto as parábolas que orientam pessoas e grupos sobre o arco mais amplo daquelas regras históricas. As normas que foram além da materialidade da vida e transpuseram o ânimo para um todo histórico e coletivo, a unicidade que tudo explica. A vida coletiva e sua cultura.

O Dr. José Flávio tem aberto um diálogo com a religião católica. Incansável na busca de algo para dizer sobre as evidências do tempo. A questão da excomunhão dos católicos em Recife, a questão da Pedofilia entre padres, mas apontando isso tudo para o senso da falibilidade humana versus o atributo admitido ao Papa. Em recente comentário a uma postagem dele mesmo, José Flávio chegou ao ponto exato do seu diálogo: "Precisamos de intermediários? Por que nossa relação não é diretamente com o criador, já que ele está em todo lugar?"

O grande fato histórico é esse mesmo. O ânimo (ou melhor, a admiração) se manifesta com a unicidade do todo da civilização e da cultura diretamente. Individualmente. Sem intermediários. Sem hierarquias entre si e a unicidade (aquela mesma que é responsável por este modo de ver e viver o mundo). O mundo criado, explicado por uma singularidade (emprestada do falar da física da partícula) que condensa todas as normas e regras humanas em face do universo. Esse é o núcleo, sem dúvida alguma que permeia a história pelo menos desde o Renascimento. E não é sem razão que o renascimento seja o renascer greco-romano, as únicas civilizações que de fato consideraram o ânimo do próprio indivíduo.

Eis a razão pelas quais este núcleo de pensamento não pode aceitar uma forma de governo monárquica. Menos ainda papal. Ambas as formas de intermediação, de hierarquização entre as pessoas e as normas da civilização. Aliás, embora o papado tenha sobrevivido ao ocaso das monarquias européias e aos anseios da reforma protestante e anglicana, o certo é que para tal núcleo ele soa anacrônico em excesso. A verdadeira democracia, aquela em que os indivíduos são efetivamente livres para pensar e agir não pode acontecer sob a égide de quaisquer guarda-chuvas.

2 comentários:

Armando Rafael disse...

Caro José do Vale:
Sem alimentar discussões filosóficas (tenho consciência de que jamais chegaremos a um denominador comum), mas, apenas uma reflexão sobre sua frase:

“Eis a razão pelas quais este núcleo de pensamento não pode aceitar uma forma de governo monárquica”

Teoricamente, podem-se reduzir as formas de governo a três: monarquia, aristocracia e democracia. Cada uma delas pode corromper-se, dando origem a formas incorretas e injustas de governo: a corrupção da monarquia é a tirania. A corrupção da aristocracia é a oligarquia; e a corrupção da democracia é a demagogia.
Etimologicamente, república significa “coisa pública” (do latim res publica), quer dizer, os negócios de interesse da comunidade. Foi a partir da Revolução Francesa que se generalizou um novo sentido desta palavra: República passou a se definir por oposição à monarquia.
Diferente da monarquia (que é um regime natural, orgânico e que evoluiu ao longo do tempo) a república teve seus poderes “criados” por concepção cerebrina de Montesquieu (ele traçou num papel a teoria: Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário independentes e harmônicos entre si. A teoria na prática é diferente. Nunca funcionou a contento em república nenhuma a criação de Montesquieu, pois um dos poderes sempre se sobressai em relação aos demais. Num país, o mais forte é o executivo, noutro o executivo e por aí vai...
São Tomás de Aquino consagra cinco capítulos de sua obra “De regimine Principum” às formas de governo, onde afirma: “Absolutamente falando, se comparadas em princípio as três formas puras de governo, a monarquia decididamente é superior”. a) Porque é mais apta para conservar a paz e a unidade; b) porque permite um melhor aproveitamento das forças sociais; c)porque imita de modo mais perfeito o governo divino; d)porque está mais de acordo com a natureza; e) porque assim o demonstra a experiência da História.
Na natureza – observa São Tomás – o princípio monárquico está presente em tudo:entre os vários membros do corpo; na alma, a razão é a faculdade que preside as outras; as abelhas têm uma rainha, os rebanhos de animais têm seu chefe etc.
Isso muito razoavelmente, porque o próprio da multidão é derivar da unidade.

Na prática, a forma de governo ideal é a monarquia temperada com elementos aristocráticos e democráticos. (É esta a forma em vigor atualmente na Suécia, Noruega, Dinamarca, Holanda, Bélgica, Inglaterra (e por extensão: País de Gales, Escócia, Canadá, Austrália, Nova Zelândia), Espanha, Japão, dentre outras.
A Monarquia é uma forma de governo moderna e eficiente. Das 12 economias mais fortes do mundo atual, 8 são monarquias. Das 42 nações consideradas democráticas existentes hoje, há mais de 15 anos, 31 (73,8%) são Monarquias. Das 121 nações com regimes ditatoriais ou autoritários hoje existentes, 104 (85,9%) são Repúblicas.
70,4% das Monarquias (19 nações) mantêm uma renda per capita anual acima dos US$ 10.000,00. Nas Repúblicas, este índice cai para 29,6% (8 nações).
Proporcionalmente, as Monarquias detêm 55,3% do PNB mundial e 20,8% delas (10 nações) mantêm um PNB acima dos US$ 100.0 bilhões. Nas Repúblicas, este índice cai para 11,2% (16 nações).
E mais:
Das 42 nações tidas como democráticas, 33 delas (78,6%) têm o Parlamentarismo como sistema de governo. Só 2 nações (4,8%) convivem com o Presidencialismo (Costa Rica e EUA). Ou seja, a república presidencialista é um fracasso completo...

José do Vale Pinheiro Feitosa disse...

Como dizia, Armando, "este núcleo de pensamento não pode aceitar uma forma de governo monárquica". Ou seja, mono, única, centralizada, hieraquizada, uma cadeia de intermediações do indivíduo até Deus. Na civilização do renascimento, o indivíduo é ele em relação com o mundo, com a cultura, sua civilização e portanto, até para quem assim entende,
Deus ou seus deuses.