TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

domingo, 26 de outubro de 2008

Res, non verba!



Crato, cidade da cultura e uma das de maior importância histórica no cenário do estado. Assim comumente nos é dado o mel dos elogios de um favo que também tem vespas. Estamos em 2008, em um período histórico de evolução científica e tecnológica nunca visto antes e ainda assim (como em quase todas as outras cidades) conseguimos a proeza de desenharmos na face social as maiores desigualdades sociais possíveis sobre a maquiagem falsa da democracia. Não somos uma democracia e tampouco estamos caminhando rumo a ela. Os investimentos em educação por parte do governo são escassos e muito aquém da demanda. Por outro lado a “educação” privada não tem tempo para educar ninguém, pois está ocupada em formar em cada sala de aula mais uma leva (de canalhas) para sustentar a máquina capitalista. Nesta mesma escola temos a projeção do que seja a vitória para cada aluno. O “ter” é a coluna que sustenta e é perpetuada nos centros educativos, sendo que os mesmos, no vastíssimo conteúdo histórico e filosófico que é (ir) responsável, agem rezando um credo de uma mudez absurda a respeito das maiores chagas que nos aflige. Então o “estudante” que sai “preparado” de uma escola hoje em dia (que por sinal, curiosamente muitas são ditas católicas) é aquele que é capaz de ignorar todos ao seu redor, todos os conflitos que o cercam, alienado da própria história, cultura, valores etc., e pode entrar nos cursos mais concorridos para poder, como ainda dizem: “ser gente” (sendo que até agora não são!).
Infelizmente a educação é sim a base de toda uma sociedade. A educação não é feita apenas nas escolas e é a partir disso que vemos a raiz de várias falhas que ferem a sociedade atual. Temos uma “cidade da cultura” bonita, mas o câncer da educação falida nos corrói a cada dia e ainda estamos preocupados com os olhos verdes da “Princesa do Cariri”, ou com sua maquiagem de carmim e pó de arroz para dar-nos um aspecto saudável tentando driblar a anemia gritante que nos aflige, muito bem harmonizada com o câncer anteriormente mencionado. Como um erro decorre do outro, num círculo perpétuo damos continuidade a tentativa de resolver os problemas subestimando-os ou falsificando verdades por medo de enfrentá-las.
A arte no Crato e no Cariri de uma forma geral tem seu céu e inferno entrelaçados. Grandes artistas e antes de tudo, grandes homens sustentam o Cariri como berço de uma cultura riquíssima, que representa de forma extremamente competente nosso nome em qualquer local do mundo, mas que, por estarem num deserto infernal, sem apoio, sem serem levados a sério, sem terem para melhor projetarem seus trabalhos uma política culturo-educacional que viabilize a recepção dos mesmos, estão a andar pela cidade como fantasmas, falando uma língua estranha e muitas vezes ridicularizada por não falarem do ganho imediato, na venda do trabalho, na arte como capital. Paralelo a isso estes mesmos artistas que fazem arte com um amor incondicional e que não teria sinônimo melhor do que heróis para classificá-los, têm que comer, beber, vestirem-se, divertirem-se e viverem.
Então meus caros, confessar que uma cidade que se diz “Princesa” ou” Cidade da Cultura” e que ignora no aspecto artístico-cultural (sendo que temos ainda inúmeros outros a serem colocados em pauta) de forma alienada e preconceituosa e dando sim, ouvidos e corações a afirmativas que lhe fazer ser gente de acordo com o que tem, que ouvem como missas “Quem quer comer minha piriquita?” ,“lapada na rachada” ou outra centena de bizarrices pseudo-musicais está no mínimo embriagada de uma prepotência nunca vista antes, cega e dando risada da situação. Artistas como Telma Saraiva, Divane Cabral, Padre Agiu de uma primeira geração composta de tantos outros nomes, além de uma outra decorrente desta que fez e faz milagres diariamente como Abidoral, Cleivan, Pachelly e outra centena da minha geração que se atira no mesmo páramo, são ignorados mortalmente pelas escolas, pela secretaria de educação (que em minha opinião é uma piada), salvo a secretaria de cultura que mesmo deixando a desejar em muitíssimos quesitos, vem trabalhando de forma nobre para tentar minimizar a situação e veicular o trabalho destes artistas.
Então resta saber até onde a presente situação vai ser levada como normal? Até onde vamos achar que um mês antes de expocrato vamos nos dar conta da vergonha que somos nesta sociedade elienada, bestificada, passiva e inconseqüente? Nosso referencial é por alunos dentro de salas de aulas e faze-los, quando muito, um sujeito esforçado para ignorar o próximo em prol de seus ganhos? Onde os “lisos” são motivos de chacota e não de compaixão, onde os “feios” devem moldar-se para o repouso das retinas julgadoras, onde a arte é a vazão para os instintos mais primitivos? É, pois necessário que nós, ditos artistas, façamos coro frente a situações como esta. Estamos muito bem acomodados cá escrevendo sobre a sombra de nossas sancas enfeitadas, ao som da rádio chapada do Araripe, gozando do que nos foi adquirido por esforço ou talento ao que se diz respeito à arte e cultura. Mas a nossa própria arte pode e deve ir muito além daqui. O Carircult e o Blog do Crato abriram-nos muitas portas e os agradeço pelos contatos que hoje cá estabeleço com os demais membros, mas está na hora de chutarmos a nossa própria portas para que a arte cá produzida possa ser vista e isso não se faz apenas escrevendo aqui. É urgente que o CaririCult e o Blog do Crato tomem a frente medidas para que o que tanto bradamos aqui tome corpo na sociedade e que os artistas do mundo, não andem em sua própria terra como extra-terrestes.

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