Mais uma vez, o final do ano. Os espíritos já se banham nas doces águas do Natal e do Ano Novo. As luzes natalinas iluminam as praças e os jardins. Mensagens emboloradas já circulam pelos correios e pela Internet. O comércio rejubila-se com a consumista solidariedade. Os meninos do Grangeiro já estendem seus sapatos nas janelas na certeza da vinda do bom velhinho. Os da Batateira, tristes e desesperançados, preferem recolher as sandálias, na certeza de que Papai Noel nunca faz escala por lá. Os perus calam seus guglus e os leitões recolhem temerosos seus pernis : serão imolados em sacrifício nos altares natalinos.As famílias durante todo o ano desunidas , com os ares natalinos se tornam reunidas e , em trégua , recolhem um pouco as armas, até o toque de alvorada do ano novo.Lábios sussurrarão preces maquinalmente , num fervor vazio e superficial. Os bares e restaurantes se apinharão de confraternizações: um sem número de empresas reunindo funcionários e criando um momento fraterno e solidário que acabará daqui a pouquinho, embora devesse se estender por todos os dias do ano. Nos templos , homens e mulheres contritos se darão as mãos efusivamente, desejando-se felicidades mil ; as mesmas mãos que logo em seguida se fecharão para os mendigos e se cruzarão no peito para a miséria do mundo. As ceias natalinas, quanto mais fartas, mais prenhes de alimentos estranhos e estrambóticos: figo, nozes,tender, lentilhas, chesters, panettones , champanhe, passas e uvas.Servem mais para alimentar a vaidade dos anfitriões do que o estômago dos comensais. A Ceia que modificou os destinos da humanidade não foi regada apenas a vinho e pão?
As festas trazem sempre consigo alguma atmosfera de tristeza e de saudade. Com o passar do tempo, pessoas queridas já não respondem à chamada. Talvez porque, como dizia Manuel Bandeira, estejam todos dormindo, dormindo profundamente... Um belo dia estaremos sós diante da grande Távora vazia de cavaleiros.Algumas recordações se espreguiçarão a um canto, o passado grávido se debruçará em algum móvel da sala. . Talvez , neste dia, um comensal de longas barbas sente conosco na longa e solitária tábua e divida conosco o pão e o vinho, não mais que isto. Perceberemos então que a mesa se tornou gigantesca , acolhendo nossa nova família que agora possui irmãos de incontáveis cores e raças. Celebram as primícias da vida, com sua essência de fugacidade e de mistérios, enquanto se vai servindo a ceia farta regada pelo milagre dos peixes e dos pães.
As festas trazem sempre consigo alguma atmosfera de tristeza e de saudade. Com o passar do tempo, pessoas queridas já não respondem à chamada. Talvez porque, como dizia Manuel Bandeira, estejam todos dormindo, dormindo profundamente... Um belo dia estaremos sós diante da grande Távora vazia de cavaleiros.Algumas recordações se espreguiçarão a um canto, o passado grávido se debruçará em algum móvel da sala. . Talvez , neste dia, um comensal de longas barbas sente conosco na longa e solitária tábua e divida conosco o pão e o vinho, não mais que isto. Perceberemos então que a mesa se tornou gigantesca , acolhendo nossa nova família que agora possui irmãos de incontáveis cores e raças. Celebram as primícias da vida, com sua essência de fugacidade e de mistérios, enquanto se vai servindo a ceia farta regada pelo milagre dos peixes e dos pães.
J. Flávio Vieira
11 comentários:
Meu caro JFlávio,
que texto limpo de tão lúcido -
generoso.
Admiráveis abraços.
Abraço ao Domingos e Boas Festas , meu amigo !
J. Flavio,
Li bem direitinho. Penso igual. Sinto igual. Guardo dentro de mim o Natal que vivi com meus pais. Era mágico!.
Hoje a festa acabou.
Pensando nisso, resta-me apenas o sentimento que se espelha em datas longínquas. E pensando nessas lembranças boas, te deixo, meus desejos de um Natal Feliz com os teus. E um ano novo ainda melhor.
Sobre o Natal das famílias da Batateira.
Há mais de 20 anos , todos os anos, minha mãe faz um bolo natalino , e distribue entre 30 famílias da Batateira. Nos primeiros anos as crianças ganhavam brinquedos .Estas crianças hoje representam os chefes das famílias.
Detalhe. Esse povo são os conhecidos de Compadre Fernando, Comadre Gisélia , Dona Leonarda...
Existe um vínculo muito sério de fidelidade entre eles e a minha mãe. A Patrona da família "Dona Joaquina" , trabalhou para a minha avó , nos anos trinta. A partir daí , herdamos todas as suas descendentes. Ainda hoje , elas se espalham em dedicação por nossos lares.
Eu só queria te dizer, que o povo da Batateira é muito especial para todos nós.
Quando visitar aquelas redondezas pergunte se eles conhecem Dona Valdenora de Seu Moreirinha.
Um Natal abençoado para você, Fabiana , Flora , e todos do seu coração.
Zé ,
A minha mãe tem 80 anos. Perdeu pais, esposo , sogros , irmãos... Mas não perdeu a magia do Natal. Nesta época ela se ilumina.
Passa o ano todo , juntando moedas num cofrinho.
Distribue suas prendas às famílias da Batateira , e caixas de chocolate com cartões e embalagem de presente a todos os amigos , filhos , netos , bisnetos , etc.etc.
Depois chega pra mim com o sorriso mais iluminadfo do mundo e diz :
Fiquei lisa , mas recebi de presente o prazer da doação.
Não faz por caridade... Faz os mimos, por alegria !
Estamos disputando quem ficará com esta herança... risos.
Ainda nem sabemos quais dos seus filhos , se enquadram no perfil. Valda é única !
Abraço
Zé ,
A minha mãe tem 80 anos. Perdeu pais, esposo , sogros , irmãos... Mas não perdeu a magia do Natal. Nesta época ela se ilumina.
Passa o ano todo , juntando moedas num cofrinho.
Distribue suas prendas às famílias da Batateira , e caixas de chocolate com cartões e embalagem de presente a todos os amigos , filhos , netos , bisnetos , etc.etc.
Depois chega pra mim com o sorriso mais iluminadfo do mundo e diz :
Fiquei lisa , mas recebi de presente o prazer da doação.
Não faz por caridade... Faz os mimos, por alegria !
Estamos disputando quem ficará com esta herança... risos.
Ainda nem sabemos quais dos seus filhos , se enquadram no perfil. Valda é única !
Abraço
Eu nunca vi qualquer elogio a um texto do Zé Flávio feito pelo Zé do Vale... Porque será ??
Mesmo numa obra-prima como essa que o Zé Flávio acabou de escrever, e que o mundo inteiro deveria reverenciar, eu não vejo a presença daquele rapazinho sequer pra dizer: Ficou bom!
Eu confesso que fiquei todo arrepiado, lendo esse texto belíssimo, humano e muito verdadeiro, que fala mais da hipocrisia humana do que uma reverência ao natal.
Para mim, final de ano é final de coisas boas. De recordações. Final de ano, final de vida, fim de existência, fim de tudo, fim dos tempos...
Quem sabe quantos de nossos queridos ainda sentarão à próxima mesa natalina ? Quantos partirão para outro mundo no ano que se aproxima ?
Uns dizem: Mais um Ano.
Eu digo:
MENOS um Ano!
Feliz Natal.
Feliz Ano Novo.
Se possível...
Dihelson Mendonça
Conheço poucas pessoas tão inteligentes, sensíveis, bonitas e talentosas como o Dihelson ...
Sei que ele é mortal , mas não precisa nos lembrar esse detalhe... Prefiro enxergar a sua imortalidade , os muitos natais que ainda viverá... E a felicidade de (com arte ) ser feliz , nessa trajetória de vida.
Não admito tristeza em seu olhar...
Mas sei o quanto suas mãos choram , brincam , improvisam , executam , e nos deleitam !
Abraços, meu amigo
Caro Dihelson,
O Zé do Vale é praticamente um irmão; Somos primos e amigos de infância. Nossos pais eram praticamente irmãos-sócios-amigos inseparáveis.Tia Gisélia, a mãe dele, era tb tia da minha e amigas de infância. Por diversas vezes o Zé do Vale tem comentado os textos , inclusive, no anterior, fez elogios rasgados, creio que no Cariricult. Eu fui o apresentador do seu Romance ( Paracuru)quando foi lançado aqui em Crato. Talvez não comentemos mais os textos um do outro porque somos suspeitíssimos para fazê-lo.
Cara Socorro,
D. Valda tem um coração enorme e sei que faz tudo isto sem que uma mão não perceba o que a outra faz. Pode parecer um pequeno gesto, mas imagino o que seria possível fazer se todos os 180 milhões de brasileiros fossem capazes de pequenos gestos iguais ao de D. Valda. Felicidades para você, para ela e para todos os que carregam o bom sangue de Moreirinha.
Cara Claude,
A festa carrega aquele anverso-reverso. Por um lado nos joga para baixo quando olhamos para trás e vemos que já há comensais que já não podem comparecer à festa. Por outro lado, nos alegramos com os novos amigos que vêm sentar á mesa.Este ano, tantos novos sentam conosco à ceia e outros tantos retornaram como você. Só isto já é suficiente para nos tornar felizes e realizados. Ótimas festas para vc e para os seus!
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