TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

terça-feira, 10 de março de 2009

A Excomunhão da Vítima

Miguezim de Princesa

I
Peço à musa do improviso
Que me dê inspiração,
Ciência e sabedoria,
Inteligência e razão,
Peço a Deus que me proteja
Para falar de uma igreja
Que comete aberração.

II
Pelas fogueiras que arderam
No tempo da Inquisição,
Pelas mulheres queimadas
Sem apelo ou compaixão,
Pensava que o Vaticano
Tinha mudado de plano,
Abolido a excomunhão.

III
Mas o bispo Dom José,
Um homem conservador,
Tratou com impiedade
A vítima de um estuprador,
Massacrada e abusada,
Sofrida e violentada,
Sem futuro e sem amor.

IV
Depois que houve o estupro,
A menina engravidou.
Ela só tem nove anos,
A Justiça autorizou
Que a criança abortasse
Antes que à vida brotasse
Um fruto do desamor.

V
O aborto, já previsto
Na nossa legislação,
Teve o apoio declarado
Do ministro Temporão,
Que é médico bom e zeloso,
E mostrou ser corajoso
Ao enfrentar a questão.

VI
Além de excomungar
O ministro Temporão,
Dom José excomungou
Da menina, sem razão,
A mãe, a vó e a tia
E se brincar puniria
Até a quarta geração.

VII
É esquisito que a igreja,
Que tanto prega o perdão,
Resolva excomungar médicos
Que cumpriram sua missão
E num beco sem saída
Livraram uma pobre vida
Do fel da desilusão.

VIII
Mas o mundo está virado
E cheio de desatinos:
Missa virou presepada,
Tem dança até do pepino,
Padre que usa bermuda,
Deixando mulher buchuda
E bolindo com os meninos.

IX
Milhões morrendo de Aids:
É grande a devastação,
Mas a igreja acha bom
Furunfar sem proteção
E o padre prega na missa
Que camisinha na lingüiça
É uma coisa do Cão.

X
E esta quem me contou
Foi Lima do Camarão:
Dom José excomungou
A equipe de plantão,
A família da menina
E o ministro Temporão,
Mas para o estuprador,
Que por certo perdoou,
O arcebispo reservou
A vaga de sacristão.

13 comentários:

Armando Rafael disse...

Dr. José Flávio:
Que tal darmos ao vate "Miguezim de Princesa" este mote:

"Quando falta os argumentos, apela-se para a gozação"

Foi o que já começou a ocorrer.

Os cordelistas sempre utilizam o lúdico. E tem abestado que ainda vai acreditar que é verdade: o "estruprador foi promovido pelo arcebispo a sacristão..."

Assim como são as pessoas são as criaturas...

Unknown disse...

Fantástico.

Maurício Tavares disse...

Muito bom o cordel! O arcebispo é o lobo mau com voz de vovó boazinha!

Unknown disse...

Dr. José Flávio, não o conheço pessoalmente, mas já li seus textos e sei por ouvir, de sua competência profissional.

Acho que o seu cordel é bem escrito.
Parabéns.

jflavio disse...

Darlan,

O bicho não é meu, quem dera! É de Miguelzim de princesa, um cordelista e tanto. O cordel é uma espécie de caricatura e, ao contrário do que diz o meu amigo Armando, ele tem argumentos sim. Vejam como um poeta populat consegue magistralmente, dentro dos limites do seu universo, colocar tão claramente a mancada sensacional do Bispo. Não é a primeira vez que ele pisa na bola. entregou em 2006 o Padre Edwaldo de Casaforte, no Recife, ao Santo Ofício, só porque este participou de um culto ecumênico. Segue o Bento XVI para quem só a salvação no âmbito da igreja católica e desfaz o trabalho de João Paulo II, na busca de uma visão mais ecumênica.Dom José fechou o Instituto Teológico do Recife fundado por D. Hélder sob alegação que ensinava a Teologia da Libertação. O Bispo suspendeu ainda o pe João Carlos através de uma denúncia anônima, por e-mail, sem lhe dar direito a defesa e determinou:"Oito dias pra desaparecer daqui, da paróquia de Água Fria. Entregar minha paróquia, me despedir dos amigos, ir embora de Pernambuco(SIC). Não há dúvida que D José é muito polêmico, mas já devem ter puxado a orelha dele por ter colocado todos os holofotes do mundo em cima da igreja, uma instituição que historicamente trabalha na sombra.

Unknown disse...

Ah, certo.

E esse arcebispo, hein? Se a Inquisição tivesse o poder de outrora, já sei onde estaríamos!

Armando Rafael disse...

Dr. José Flávio:
O outro lado da moeda.

Quando assumiu a Arquidiocese de Olinda e Recife, Dom José encontrou uma “Casa de Mãe Joana”, como é de conhecimento público. Poderia ter pecado por omissão. Preferiu arrostar as incompreensões, injustiças, escárnios e calúnias. Dom José foi um digno sucessor de Dom Vital. Este último sofreu, no século XIX, os mesmos dissabores... Passou para a história e hoje caminha para a glória dos altares, pois o processo de beatificação corre célere.
Bom ressaltar que todas as decisões de Dom José – citadas por você – foram referendadas pelo Vaticano.

1 – O fechamento do Instituto de Teologia de Recife e do Seminário Regional Nordeste II, - fundados no episcopado de Dom Helder – ocorreu para cumprir orientação do Vaticano, já que a formação dos novos padres vinha sendo feita com nítida orientação esquerdista, conflitando com normas emanadas do Papa João Paulo II que condenou a Teologia da Libertação. Dom José apenas foi fiel a Roma;

2 – O afastamento do padre Reginaldo Velloso, destituído das funções de pároco do bairro Casa Amarela, ocorreu por reincidência (fora admoestado anteriormente) após constatação de que o mesmo vinha desvirtuando a doutrina da Igreja Católica, além de liderar uma conspiração contra a autoridade diocesana. Reginaldo Velloso hoje está casado e continua ligado aos movimentos da Teologia da Libertação condenados por João Paulo II;

3 - O padre João Carlos, da paróquia de Água Fria, na Zona Norte do Recife, se envolveu num caso de homicídio na Paraíba e mantinha um relacionamento amoroso com a prima. dele, Ivânia Quiroga, causando escândalo na comunidade. Foi admoestado várias vezes, mas não se emendou. Foi afastado pelo Arcebispo;

4 - Já o padre Edwaldo Gomes, da paróquia do bairro de Casa Forte, celebrou missa na companhia de dois bispos anglicanos, o que é expressamente proibido pelo Código Canônico (bispos anglicanos não podem participar de ritos da Igreja Católica.) A punição foi o afastamento por três meses da função de pároco, decisão posteriormente referendada pelo Vaticano:

5 – Dom José não excomungou a equipe médica e a mãe da menina, apenas anunciou que eles já estavam excomungados ipso facto. E lembrou que nenhum católico tem direito de alegar a laicidade do estado, quando este falso atributo se sobrepõe ao direito natural e à Lei Divina.

Aliás, sobre o aborto dos gêmeos, o Arcebispo de Maceió, Dom Antônio Muniz OSB, afirmou:
“Temos que condenar uma sociedade, que chegou a um tal grau de violência e desrespeito à pessoa humana, que matar dois seres humanos não significa nada para as pessoas”.
Sábias palavras.
Sobre essa decisão de Dom José
mais uma vez o Vaticano e a CNBB apresentaram solidariedade ao Arcebispo de Olinda e Recife.

jflavio disse...

Caro Armando,

Respeito de coração as suas crenças religiosas. Gostaria de ter todas as certezas que vc possui. Ainda bem que vc levanta os vários casos de desvios inúmeros dentro da própria santa igreja sem botar panos quentes : pedofilias, casamentos espúrios , homicídios, dentro de suas prórpias hostes. Ou seja, essa é a Igreja dos homens e não, propriamente a Igreja de Deus. Por isso mesmo acredito que a excomunhão feita por homens simples, puros e falíveis, não tem necessariamente o aval divino, assim como imagino não têm o homicídido, o incesto, a pedofilia praticados por padres e pastores. Assisti ao primeiro depoimento de D. José e ele foi taxativo na excomunhão, depois, claro, com a repercussão, terminou roendo a corda, embora eu saiba que , na verdade, a excomunhão já estava engatilhada. Só uma atitude me parece estranha e reprovável. Por que ele jogou toda a fúria em cima de uma pobre mãe já torturada de várias maneiras( por ter escolhido o marido errado, acossada pelo terrível sentimento de culpa e mais, certamente passando necessidade por conta da prisão do desgraçado que assim deixa de trabalhar e sustentar a família). Teria feito o mesmo se a filha fosse do Alckmin, ou do Antonio Ermírio ? Os teria excomungado também? Teria essa coragem? E mais, por que a Santa Sé não excomunga diariamente todos os Italianos que nas barbas do Vaticano, todos os dias procedem a inúmeros e incontáveis abortamentos perfeitamente legalizados? E na França ? E nos EUA? Ninguém excomungado ? Ao D. Antonio Muniz: matar dois seres humanos não reprsenta nada para a sociedade e isto é verdadeiramente triste e , por outro lado, morrerem três, o que certamente iria acontecer, não representa nada para a Igreja Católica! Se bem conheço no final diriam: "tá vendo no que dá andar pecando por aí !" Terríveis tempos estes em que vivemos ! A grande pergunta é : Respondam todos: o que cada um de vocês faria se uma tragédia deste tamanho se abatesse sobre sua família? Sem hipocrisisas , sem falsos moralismos. Nem respondam, apenas pensem !

Armando Rafael disse...

José Flávio:
Quem, de sã consciência, pode negar os dolorosos desvios de conduta de certos clérigos ao longo de dois mil anos da Igreja Católica?
A pedofilia, por exemplo, é uma ferida purulenta que deixa marca na história e na vida das pessoas.
O que sempre defendi é que não podemos generalizar. Dizer "os padres são pedófilos".
Aqui mesmo, no nosso meio, quantos padres deixaram uma memória histórica pelo bem que fizeram.
Feita por homens, a Igreja é Santa e Pecadora. Mas ela tem ao final um saldo positivo, p. ex: na defesa dos direitos humanos, no avanço das conquistas nas áreas sociais, educação, ciência, etc.
Meses atrás um blogueiro fez um ataque - num dos blogs da cidade - à classe médica, chamando-a de mercenária.
Eu, estranho ao meio, saí em defesa daquela classe lembrando que existem incontáveis médicos humanistas, dedicados, competentes e que utilizam a profissão para a prática do bem...
Por alguns desvios de condutas (pouquíssimos aliás) não se pode lançar contra os demais médicos uma pecha tão injusta...

Este é ponto central porque me exponho na defesa da Igreja Católica.

Maurício Tavares disse...

Texto interessante de Contardo Calligaris na FSP em que ele lembra mais uma vez a confusão feita por católicos xiitas entre leis da igreja católica e leis divinas:

CONTARDO CALLIGARIS

Um arcebispo mais ou menos
Lula se expressou numa ordem perfeita: ele é (primeiro) cristão e (segundo) católico


NA SEMANA passada, no Recife, descobriu-se que uma menina de nove anos estava grávida de gêmeos. A mãe imaginava que a barriga crescente fosse o efeito de um parasito. Mas não era um parasito; era o padrasto, que abusava regularmente a menina e a irmã (de 14 anos, portadora de uma deficiência mental). O abuso começou quando as crianças tinham, respectivamente, seis e 11 anos.
O padrasto foi preso, e uma equipe médica, autorizada pela mãe, interrompeu a gravidez da menina, seguindo a lei brasileira, que permite a interrupção de gravidez em caso de risco de vida para a mãe e também em caso de estupro. Quem conhece alguma menina de nove anos pode facilmente imaginar o que significaria submeter aquele corpo a uma gravidez completa e a um parto duplo.
Além disso, qualquer um pode intuir que carregar na barriga, parir e "maternar" o fruto de um estupro é devastador para a mãe assim como para os eventuais rebentos dessa catástrofe. Alguém dirá: "Mas a mulher acabará esquecendo o estuprador (que foi gentil, nem a matou, não é?), e o sentimento materno prevalecerá". Esse conto de fada (machista) não se aplica no caso da menina de Recife.
Pede-se o quê? Que ela esqueça que, durante três anos, quem devia ser para ela o equivalente a um pai se serviu de seu corpo de uma maneira que ela não tinha condição de entender e num quadro em que ela não tinha a quem recorrer, é isso? No meio da semana, o arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho, declarou que os que estivessem envolvidos na interrupção da gravidez da menina (a mãe, os médicos, os enfermeiros) fossem excomungados. Agora, o padrasto não; pois o crime dele seria mais leve. Isso, segundo o bispo, é a "lei de Deus". O bispo se confundiu: essa não é a lei de Deus, é a lei da Igreja Católica.
E faz alguns séculos que essa igreja não tem mais (se é que um dia teve) a autoridade moral para ela mesma acreditar que seus decretos sejam expressão da vontade divina. Portanto, sua persistência em tentar convencer os fiéis de que a voz da igreja coincide com a voz de Deus se parece estranhamente com a conduta do padrasto da história (e de qualquer pedófilo): trata-se, em ambos os casos, de tirar proveito da "simplicidade" de crianças e ingênuos. Mas voltemos aos fatos. O presidente Lula, "como cristão e como católico", achou lamentável a declaração do arcebispo. Dom José não gostou e afirmou que o presidente Lula é "um católico mais ou menos".
O presidente Lula se expressou numa ordem perfeita: ele é (primeiro) cristão e (segundo) católico. Ou seja, se a igreja diz algo que contraria seu entendimento da mensagem de Cristo, tanto pior para ela. A mensagem cristã da qual se trata não tem a ver com a interrupção de gravidez. Ela é mais fundamental: trata-se da liberdade do indivíduo e da consciência em sua relação com Deus. Explico.
É trivial constatar que, na modernidade, a decisão moral é um questionamento constante e, às vezes, atormentado: cada um, levando em conta as ideias de seu grupo, seus valores mais singulares, seus sentimentos, sua fé (se ele tem uma) e os fatos (caso a caso), chega a uma decisão ou a uma opinião que acredita justa. Um pouco menos trivial é lembrar que esse aspecto da modernidade é o melhor fruto da tradição judaico-cristã e, mais especificamente, da novidade cristã, pela qual Deus pode ser o mesmo para todos porque ele não se relaciona com grupos ou pelo intermédio de grupos, mas com cada indivíduo, um a um.
Ser moderno não significa topar qualquer parada e perder-se no relativismo. Ao contrário, ser moderno (e ser cristão) significa tomar a responsabilidade de decidir no nosso foro íntimo o que nos parece certo ou errado. Claro, é mais difícil do que procurar respostas feitas e abstratas no direito canônico. Mas, contrariamente ao que deve achar dom José, ninguém nunca disse que ser cristão (e moderno) seja fácil.
Felicito o presidente Lula, que falou como cristão, ao risco de parecer "católico mais ou menos". Quanto a dom José, ele falou como católico e se revelou como um "cristão mais ou menos". O dia em que ele quiser ser cristão, ele nos dirá, com suas palavras, por que e como, em seu foro íntimo, acha o gesto de quem interrompeu a dupla gravidez de uma criança de 30 quilos muito mais grave do que a abjeção de um padrasto que, por três anos, estuprou suas enteadas.

ccalligari@uol.com.br

Armando Rafael disse...

Texto interessante de Padre Luiz Carlos Lodi da Cruz, nos blogs católicos, em que ele lembra mais uma vez a confusão feita pelos defensores da vida e os abortistas.
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Dom José Cardoso Sobrinho, o Mártir em Defesa da Vida

Por Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz

Prezado Dom José Cardoso Sobrinho

Louvada seja Aquela que nos trouxe o Autor da Vida!
Aqui em Roma, em meio aos estudos de Bioética, desejaria ter mais calma para escrever esta carta de elogio à sua brilhante atuação como pastor diante da Arquidiocese de Olinda e Recife. Temo, porém, pecar por omissão se deixar para depois algo que deveria escrever hoje em apoio à sua defesa da vida de três crianças.

Sim, três são as crianças que o senhor defendeu: uma menina de nove anos, violentada pelo padrasto, e duas crianças gêmeas geradas neste ato de violência.

Em meu trabalho pró-vida, várias vezes deparei-me com casos de adolescentes ou crianças vítimas de estupro. Enquanto as feministas ofereciam aborto, nós, cristãos, oferecíamos acolhida, hospedagem, assistência espiritual e acompanhamento durante a gestação, parto e puerpério.
As crianças geradas em um estupro costumam ser alvo de um carinho especial de suas mães. Longe de perpetuar a lembrança da violência sofrida (como dizem alguns penalistas), o bebê serve de um doce remédio para o trauma do estupro. Podendo doar o bebê após o parto, elas se assustam só de pensar em ficar longe dele. Tremem ao se lembrar que um dia cogitaram em abortá-lo. O aborto, além de ser uma monstruosidade maior que o estupro, causa um trauma adicional à mulher violentada. A idéia do aborto como "alívio" para o estupro é uma falsidade que deveria ser banida dos livros de Direito Penal.

A imprensa que acusa o senhor teve o cuidado de não revelar como o aborto foi feito. E com razão. Pois enquanto os defensores da vida mostram com alegria a linda criança concebida em um estupro, os abortistas não podem mostrar os restos mortais dos bebês que foram assassinados. Em se tratando de dois bebês de quatro meses, é possível que os médicos tenham feito uma cesariana para extraí-los do ventre materno. E depois? Depois, devem tê-los jogado no lixo, esperando que morressem. Uma cena nada agradável, nem digna de quem professa a Medicina. Os autores desse assassínio precisaram ter o sangue frio de um algoz para olhar nos olhos de suas duas vítimas abortadas. Mas é a pura realidade.

Outro argumento usado pelos abortistas é que a menina-mãe, por causa de sua tenra idade, não poderia levar até o fim a gravidez. Por isso, o aborto seria "necessário" para salvar a vida dela. Evidentemente, como o senhor sabe, tudo isso é mentira. A menina não estava prestes a morrer nem o aborto se apresentava como a "solução". Uma gravidez como a dela exigiria um acompanhamento adequado. Médicos que honrassem o seu juramento fariam tudo para salvar os gêmeos, esperando que eles chegassem a uma idade gestacional em que poderiam sobreviver a uma operação cesariana.
Afinal, para que servem as nossas UTIs neonatais? Talvez os bebês morressem espontaneamente durante a gravidez. Mas os médicos não carregariam a culpa por esse aborto espontâneo.

Aos que levianamente criticam o senhor, defendendo o aborto como meio para salvar a vida da mãe, eu proponho o seguinte caso.
Suponhamos que, de fato, o aborto pudesse "curar" alguém. Façamos de conta que, em alguma hipótese, o aborto seja "terapêutico". Estaríamos diante de um caso semelhante ao de uma mulher que, oprimida pela fome durante o cerco de Jerusalém (ano 70 d.C), matou e devorou o próprio filho recém-nascido. O episódio é narrado pelo historiador Flávio Josefo. O raciocínio é o mesmo. Se a mulher não matasse seu filho, ambos morreriam de fome. Ao matá-lo, pelo menos uma das vidas foi salva.
Quem aplaude o aborto como meio para salvar a vida da mãe, deve, por coerência, aplaudir a atitude desse mulher que matou o filho para salvar a própria vida.

O senhor sabe muito bem - mas há muitos que não sabem e não querem saber - que nunca é lícito matar diretamente um inocente, nem sequer para salvar outro inocente. Por isso, o senhor está de parabéns por ter cumprido sua missão, que não é a de matar, mas a de dar a vida por suas ovelhas.

Permita-me agora referir-me a uma das mentiras que estão sendo apregoadas. A grande imprensa vem apregoando que, no caso da pobre menina de nove anos, o aborto foi legal. Ora, isso é absurdo. Não há aborto "legal" no Brasil, assim como não há furto "legal". Nossa Constituição, que protege o direito à propriedade (por isso, não há furto "legal"), também reconhece a inviolabilidade do direito à vida (por isso não há aborto "legal"). O que os médicos fizeram, aos olhos da lei penal, foi um crime. Ocorre que, nem sempre a pena é aplicada ao criminoso. Há hipóteses, chamadas de "escusas absolutórias", em que a pena não se aplica, embora subsista o crime. Um exemplo típico é o do furto praticado em prejuízo de ascendente, descendente ou cônjuge (art. 181, CP). Quem pratica tal furto (por exemplo, o filho que furta do pai) comete crime. No entanto, por razões de política criminal (como a preservação da intimidade da família) em tal caso o furto não se pune. Analogamente o aborto, que é sempre crime, tem dois casos em que a pena não se aplica: I - se não há outro meio (que não o aborto) para salvar a vida da gestante; II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido do consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal (art. 128, CP).

O médico que pratica aborto em ambas as hipóteses comete crime. A lei não autoriza a praticar o crime, mas pode deixar de aplicar a pena após o crime consumado.
Como, porém, houve crime, faz-se necessário um inquérito policial. A polícia, indiciando os médicos e outras pessoas envolvidas, verificará se de fato foram preenchidos os requisitos para a não-aplicação da pena. Em outras palavras: verificará se a atitude dos médicos, além de ilegal e criminosa, é também passível de sanção penal.

Pode ser que o delegado de polícia chegue, por exemplo, à conclusão - nada improvável - de que o consentimento da mãe da menina foi obtido mediante fraude ou coação. Nesse caso, uma vez comprovada a invalidade do consentimento, a conduta dos médicos se enquadrará no artigo 125 do Código Penal (aborto provocado sem o consentimento da gestante), cuja pena é reclusão de três a dez anos.

Se os genitores da menina gestante foram vítimas de fraude ou coação, será possível ainda acionar judicialmente os médicos requerendo uma reparação civil de danos. Claro que nada repara a perda de duas vidas, nem o trauma sofrido pela menina de nove anos submetida ao aborto, mas uma indenização serviria como meio de advertência para os profissionais da morte.

Escrevo tudo isso para dizer que o senhor está do lado, não apenas da lei de Deus, mas também da lei dos homens. O senhor é digno de aplausos pela Igreja Católica e pelo direito positivo brasileiro.

Peço que o senhor não desanime. Estamos do seu lado. E, mais ainda, o Senhor da Vida está do seu lado!

Os ataques que o senhor sofre por todos os lados, até mesmo por pessoas de dentro da Igreja, fazem-me lembrar o que predisse Jesus: "Não penseis que vim trazer paz à terra. Não vim trazer paz, mas espada. Com efeito, vim contrapor o homem ao seu pai, a filha à sua mãe e a nora à sua sogra. Em suma: os inimigos do homem serão os seus próprios familiares" (Mt 10,34-36).

As injúrias, as perseguições, as calúnias, tudo isso que o senhor está fazendo deve ser para nós, não só motivo de dor, mas motivo de grande alegria. Com efeito, assim se pronunciou Jesus na última das bem-aventuranças:
"Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por causa de mim.
Alegrai-vos e regozijai-vos, porque será grande a vossa recompensa nos céus, pois foi assim que perseguiram os profetas, que vieram antes de vós" (Mt 5,11-12).

Parabéns, Dom José Cardoso Sobrinho!
Subscreve o seu admirador, pedindo-lhe a bênção.

O escravo de Jesus em Maria,

--
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Presidente do Pró-Vida de Anápolis
Telefax: 55+62+3321-0900
Caixa Postal 456
75024-970 Anápolis GO
http://www.providaanapolis.org.br

Data Publicação: 09/03/2009

Maurício Tavares disse...

Engraçado, enquanto quase todos melhores colunistas do país se escandalizam com a atitude de Dedé só os velhos, a facção conservadora da igreja católica e a mídia abençoada pelo vaticano defendem o bom velhinho.Tem alguma coisa errada aí. Acho que a leitura da Folha de São Paulo deveria ser substituída pela leitura da Folha do Vaticano. O pensamento diverso e plural deve estar ali representado. Jornal de igreja parece jornal de sindicato. Antes de ler a gente já sabe o que está escrito.

jflavio disse...

No que tange às questões levantadas pelo Armando quanto ás generalizações , acho que ele tem inteira razão. Existem figuras sensacionais na Igreja e há por outro lado a banda podre como em toda instituição humana. O garnde problema da Igreja Católica é que ela tem uma cristã de um lado e uma visão estatal do outro e os conflitos terminam por se tornar ferquentes. O texto aposto pelo Maurício do Contardo me pareceu sensacional. Foi o melhor que li durante todo este período de polêmica. A Ética não pode ficar restrita ao relativismo desta ou daquela instituição, tem que se procurar regras universais. Kant já havia ainda no Século XVIII levantado a questão do "DEVER", no seu imperativo categórico : age de maneira que a tua ação possa se transformar numa lei universal ! Ou seja, a ética não é uma coisa estanque, um livro de receita, carece da interpretação e da ação de cada um de nós. A visão fenomenológica da ética, mais tarde, ampliou esta visão: precisam-se discutir os rumos temporalmente com toda sociedade.A partir dos anos 40, com a grande evolução tecnológica caímois num imenso vazio ético. Os códigos simplesmente não acompanharam o desenvolviemnto do universo. Questões como : desospitalização dos pacientes psuiátricos, bebê de proveta, inseminação artifical, clonagem, pílula, célula tronco, transgênicos, as drogas pulularam por todo canto. Simplesmente ética nenhuma fechada dá conta disso tudo. E todo dia nos defrontamos com esses desafios e temos que tomar decisões. Há que se ter uma visão da ética msi universal, se queremos viver em pleno Século XXI!