TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Coração Mole

Se pudesse o poeta andar descalço.
Guardar as asas na caixa de sapatos.

Esquecer por uma noite sua sombra.
Apagar a vela de sete dias.
Rezar em silêncio.

Deixar o defunto à vontade
catarolando aquela música da infância.

Talvez alguma ruga conhecida.
Um sorriso desfeito em última hora.

Se pudesse o poeta esquecer o chão que pisa.
Queimar a caixa de sapatos.

Assoprar o fogo.
Ouvir arderem suas asas.

Se pudesse o poeta dormir -
o coração no espetinho,
a língua dormente.

Mas as asas não se controlam
dentro da caixa de sapatos.

E o defunto não dorme.
Nunca canta.

É um defunto morto.
Morto demais da conta.

2 comentários:

José do Vale Pinheiro Feitosa disse...

E como o morto é morto, volta o poeta para suas asas por que não pode deixar de ser poeta.

Domingos Barroso disse...

As minhas asas,
as suas asas.

Um forte abraço.