TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

terça-feira, 21 de abril de 2009

A vitalidade do cordel caririense

Emerson Monteiro

Ao ler recente produção de Maércio Lopes Siqueira, membro da Academia dos Cordelistas de Crato, intitulada O romance de Auriflora e o novo pavão misterioso, senti de perto a pujança das sete vidas do cordel. Instrumento de comunicação de massa mesmo antes de se falar em meios industriais da comunicação, o cordel preservou a leveza original dos primeiros livros gutenberguiano da invenção da imprensa no Ocidente. Saia dos salões burgueses e clericais para as feiras e os mercados medievais e embarcava pelo mundo, nos navios dos degredados que rumaram ao Novo Mundo, achando terra fértil no Nordeste, onde se impõe e resiste a todas inovações tecnológicas da transmissão dos bens simbólicos.
Esse jovem Maércio Lopes, autor de texto leve e espontâneo, atualiza a história anotada em verso pelo clássico de José Camelo de Melo Rezende (O romance do pavão misterioso), agora em tempos globalizado, ocasionando momentos gostosos de boa rima em roteiro digno dos melhores encômios televisivos e urbanos da mídia profana.
O livreto guarda o selo da Tupynanquim Editora, de Fortaleza, de Klévisson Viana, com capa ilustrada por xilogravura também da autoria de Maércio, num refino gráfico colorido em amarelo, datado de fevereiro de 2009.
Sem sombra de dúvidas, a Academia dos Cordelistas do Crato, com sua admirável cifra de mais de 500 títulos já publicados e seus tantos autores revelados mês a mês, insere-se na história da literatura popular de todas as épocas.
Nesta fase, a Academia tem Maércio Lopes na função de presidente e preserva a mesma intensidade produtiva com que se iniciou sob a brilhante lavra do folclorista e autor Elói Teles de Morais.
De um fôlego, entrega-se de moto próprio à leitura do cordel e das portas que se abrem ao toque do leitor um jogo aberto de ações e maquinações acontecem, passe mágico e livre de subterfúgios ou longas tiradas descritivas, que caracterizam, em geral, os romances oficiais da grande literatura. Os versos populares invadam, destarte, a simpatia das massas, por conta de facilitar a compreensão, no andamento das histórias saborosas, aos moldes da alma do homem simples, pouco afeito a turnos ociosos, na corrida pela sobrevivência, contudo dotado de senso artístico e alma criativa.
Portanto, somados os fatores atuais das técnicas aprimoradas do cordel e a verve qualificada desse moço de Santana do Cariri, no Ceará, há que se admitir a propulsão dos valores cordelianos sempre vivos, a persistirem na missão do dizer dos povos nordestinos.

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