Meu gosto musical é duvidoso. Dispersivo, multifacetado, local e mundial. Como dizem os cariocas: o meu e o da torcida do Flamengo. E neste caleidoscópio de consumo musical não existe um ideal estético. Todos os cânones e normas são aceitos. A música mais que outras formas de arte aceitou a diversidade, o local e o global; o formal e o folclórico nas formas de terreiro e nas formas de salão.
O Theatro Municipal do Rio de Janeiro completou cem anos ontem. Pois bem, nos séculos XIX e XX uma arte (?) popular e uma arte de elite são responsáveis pelas mais majestosas edificações. Principalmente no ocidente endinheirado: continuam fabulosas e evidentes, apesar dos zigurates da modernidade, as óperas em todas as grandes cidades. No popular os estádios até nas pequenas cidades.
Quem chegou à vida adulta ali no começo dos anos setenta, vindo do interior, sabe que a falta de um ideal estético é conseqüência do cinema, do rádio, televisão e da indústria fonográfica. Se fosse depender apenas do contato ao vivo com a música, o folclórico e religioso prevaleceriam, com as bandinhas, o mineiro-pau, reisados, dança do coco, os cânticos de renovação, das procissões, os desafios de viola e assim por diante. Os poucos músicos locais os encontraria na periferia boêmia. A banda de música e claro alguns corais. Mas sem aqueles meios (cinema, rádio...) a música seria outra.
Outro dia me dava conta da quantidade de fragmentos de peças clássicas que conhecia desde a infância. Não foi audiência ao vivo. Nem o interior cearense e nem a capital tinha muito a oferecer. Na capital tudo havia no epicentro do Conservatório Alberto Nepomuceno e no máximo em raras manifestações no Zé de Alencar. Então, as ouvi especialmente nas trilhas sonoras do cinema, no rádio e em eventuais discos. A ópera era e continua até hoje objeto de intenso estranhamento em parcela importante da população e, especialmente, da juventude.
O caleidoscópio musical que me faz de gosto duvidoso se fez simultâneo com o sertanejo já de poesia acadêmica (Luiz Gonzaga, HumbertoTeixeira e Zé Dantas); o samba com letras da classe média; o jazz com suas bandas, solistas e vocalistas; o rasgado ritmo da juventude; o bolero e com todo o seu lero romântico; a canção européia e tome japonês por emergência, a África por exuberância; os Árabes com seus cânticos semíticos; até os ritmos do Xingu.
E o mais duvidoso de tudo. Nasci, fiquei até vir embora, no sítio Batateira em primeiro momento e depois um bairro que chegou ao que é. Durante os meus dois últimos anos era o locutor e o discotecário, nas horas vagas do ensino, da Amplificadora a Voz do Povo. E que voz! Aquele canto de abandono, de traição, de vingança, de uma imensa dor de corno, aquilo que era ao mesmo tempo o chão pantanoso da “estética oficial” e a fina flor da dor do povo que não sai no jornal.
Que me perdoem o vício pelo indefensável. Que perdoem o hábito de manter a discussão. Não existe uma palavra final para nós. Apenas o mote solitário, neste ambiente plural: a arte é simultaneamente doméstica e das ruas; do particular e do coletivo; sentimental e racional; lamentosa e glorificadora; enfim, a arte é a expressão do tempo atual. A expressão do tempo atual é a simultaneidade.
Muitos acham meu gosto musical duvidoso. Até tenho dúvidas com esta falta de ideal. O máximo que posso é aprender com este alguém e adicionar mais um gosto ao meu portfólio (não é assim nesta tecnicidade moderna?)
O Theatro Municipal do Rio de Janeiro completou cem anos ontem. Pois bem, nos séculos XIX e XX uma arte (?) popular e uma arte de elite são responsáveis pelas mais majestosas edificações. Principalmente no ocidente endinheirado: continuam fabulosas e evidentes, apesar dos zigurates da modernidade, as óperas em todas as grandes cidades. No popular os estádios até nas pequenas cidades.
Quem chegou à vida adulta ali no começo dos anos setenta, vindo do interior, sabe que a falta de um ideal estético é conseqüência do cinema, do rádio, televisão e da indústria fonográfica. Se fosse depender apenas do contato ao vivo com a música, o folclórico e religioso prevaleceriam, com as bandinhas, o mineiro-pau, reisados, dança do coco, os cânticos de renovação, das procissões, os desafios de viola e assim por diante. Os poucos músicos locais os encontraria na periferia boêmia. A banda de música e claro alguns corais. Mas sem aqueles meios (cinema, rádio...) a música seria outra.
Outro dia me dava conta da quantidade de fragmentos de peças clássicas que conhecia desde a infância. Não foi audiência ao vivo. Nem o interior cearense e nem a capital tinha muito a oferecer. Na capital tudo havia no epicentro do Conservatório Alberto Nepomuceno e no máximo em raras manifestações no Zé de Alencar. Então, as ouvi especialmente nas trilhas sonoras do cinema, no rádio e em eventuais discos. A ópera era e continua até hoje objeto de intenso estranhamento em parcela importante da população e, especialmente, da juventude.
O caleidoscópio musical que me faz de gosto duvidoso se fez simultâneo com o sertanejo já de poesia acadêmica (Luiz Gonzaga, HumbertoTeixeira e Zé Dantas); o samba com letras da classe média; o jazz com suas bandas, solistas e vocalistas; o rasgado ritmo da juventude; o bolero e com todo o seu lero romântico; a canção européia e tome japonês por emergência, a África por exuberância; os Árabes com seus cânticos semíticos; até os ritmos do Xingu.
E o mais duvidoso de tudo. Nasci, fiquei até vir embora, no sítio Batateira em primeiro momento e depois um bairro que chegou ao que é. Durante os meus dois últimos anos era o locutor e o discotecário, nas horas vagas do ensino, da Amplificadora a Voz do Povo. E que voz! Aquele canto de abandono, de traição, de vingança, de uma imensa dor de corno, aquilo que era ao mesmo tempo o chão pantanoso da “estética oficial” e a fina flor da dor do povo que não sai no jornal.
Que me perdoem o vício pelo indefensável. Que perdoem o hábito de manter a discussão. Não existe uma palavra final para nós. Apenas o mote solitário, neste ambiente plural: a arte é simultaneamente doméstica e das ruas; do particular e do coletivo; sentimental e racional; lamentosa e glorificadora; enfim, a arte é a expressão do tempo atual. A expressão do tempo atual é a simultaneidade.
Muitos acham meu gosto musical duvidoso. Até tenho dúvidas com esta falta de ideal. O máximo que posso é aprender com este alguém e adicionar mais um gosto ao meu portfólio (não é assim nesta tecnicidade moderna?)
2 comentários:
Uma boa forma de resolver a questão é estudar música em profundidade. Aprender a tocar um instrumento. A visão de quem está por trás de um instrumento é completamente diferente de quem está na frente deste.
Eu costumo dizer que música é uma coisa que se escuta com a alma e sente-se pelos ouvidos. Afora isso, é apenas um monte de sons associados a lembranças. Mas eu não creio que isto seja gosto duvidoso, Zé. É apenas o gosto.
Falando em música, antes que eu me esqueça, benditos sejam os ouvidos de Socorro Moreira. A instrumentista onde o instrumento é a alma. Pouquíssimos atingem aquele estágio de audição e entendimento e percepção de harmonia, sem o auxílio de um instrumento musical. Nasceu musicista, pena que nunca praticou, mas vale da mesma forma!
Abraços,
Dihelson Mendonça
O que um artista espera do público quando escreve uma composição ou quando se apresenta?
O reconhecimento de todos? Ou se trata apenas de uma necessidade individual, que não deveria dizer respeito a mais ninguém?
E aquele que expõe e se expõe, quando criticado a resposta que dará, depende de seus gostos ou de sua educação?
Abraço.
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