TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quinta-feira, 23 de julho de 2009

PODE O HOMEM VIVER SEM AMOR E COMPAIXÃO?


A vida moderna carece de um princípio fundamental: Amor. A diferença entre o homem comum e o homem santo ou sábio é que o primeiro cai mas não sabe se levantar, e por isso acaba atacando e culpando o outro pela sua queda inevitável, e o segundo sabendo da inevitabilidade de sua queda aprende a se levantar agradecendo à Vida pelo aprendizado. A vida é um desafio constante para o aprendizado do desconhecido e da queda ontológica. A própria razão humana é uma queda. E não existe nada mais desconhecido para o homem moderno do que o Amor. Por isso, o sofrimento, o niilismo e a frieza das lógicas racionais dominantes.

Eu sei que um dia serei isolado por aqueles que não suportam a verdade que vem do alto da intuição. Sinto que é inevitável essa condição, pois não conheço nem um santo, sábio ou profeta que não tenha entrado em conflito. Todos eles um dia tiveram que optar entre seguir a lógica do mundo ou seguir a lógica do não-mundo (o ser transcendente em si mesmo). “Não podeis seguir a Deus e a Mamon”- afirmou Cristo. Como seguir o Amor transcendente que nada cobra, e seguir ao mesmo tempo o valor capital que tudo cobra?

Gosto muito das mensagens de um livro que ganhei de presente. Ele se chama IMITAÇÃO DE CRISTO. É um livro sem autoria conhecida, mas de uma verdade profunda e envolvente. É um livro que me conforta quando entro em crise e não tenho a quem recorrer no plano humano. E aí busco o consolo espiritual para minha dor. E cada vez mais sinto necessidade de escutá-lo em minhas leituras silenciosas. São tantas as guerras absurdas; tantas as injustiças caladas; tantas lágrimas não enxugadas; tantas misérias não resolvidas; tantos projetos de vida não concluídos. As vezes fico imaginando a vida de São Francisco. Quanta coragem e desprendimento! Casou-se com a noiva pobreza e tornou-se um santo respeitado e admirado. Por que vivemos em constantes guerras? Quarenta mil homicídios por ano no Brasil! Já é uma guerra não declarada! Muitas crianças abandonadas. Muitas riquezas guardadas e muita pobreza acumulada. Pão, terra e dignidade para todos, será uma utopia? O que estamos fazendo quando temos a oportunidade de refletir e falar? Nos escondemos em nossas profissões? Lembramos das nossas famílias e esquecemos os nossos irmãos excluídos?

Por dois anos freqüentei uma vez por semana a Central do Brasil, no centro deo Rio de Janeiro, e vizinhanças à noite (entregando pão com manteiga e um copo de leite entre 22: 00 e 23: 00 hs) junto com outros irmãos caridosos. Até hoje, ainda me lembro as diversas faces acolhidas. A fome se levantava e dizia: “Foi Deus que enviou vocês. Não me alimento há dois dias!”. Eles (mais de uma centena!) sempre agradeciam e nós agradecíamos mais ainda porque na verdade éramos nós que estávamos sendo assistidos. Tínhamos consciência disso! Eram crianças pequenas, crianças de colo, idosos, enfermos, mendigos, mulheres grávidas, moças, rapazes, homens sem tetos, desempregados que não conseguiam voltar para casa porque se tornava muito caro ir e voltar todos os dias para o lar. Ao terminar a jornada sentíamos que havíamos cumprido uma pequena parcela da missão.

Hoje, não tenho tempo para estender a mão. O que me aconteceu? Fui novamente envolvido na missão de dar educação no lugar do pão? O que é mais importante: o pão ou a educação? Eu sei que muitos irão afirmar que ambos são importantes. Mas, sabemos que uma grande parcela da população não tem a mínima condição (psicológica e física) de frequentar uma sala de aula. O que fazer? Esperar a solução do Estado Político preocupado com votos e eleições ou sair ajudando sem esperar nenhuma retribuição? Por isso, sinto saudades das faces famintas que apenas agradecem a oferta de um pedaço de pão e um copo de leite. Precisarei organizar o meu tempo para continuar nessa bela missão. A educação pode esperar um pouco porque outros precisam de comer e não de ouvir a minha rebuscada argumentação. Quando eu dava comida eu nada falava, apenas sorria e agradecia. Era uma outra forma de comunicação e relação. Como eu era feliz e não sabia! Mas, o que fazer se o meu garoto ainda precisava de televisão, computador, video-game e outras coisas de valor material?

Preciso trabalhar como professor para não negar a ele essas coisas que ele precisa. Mas, o meu coração não está em casa, mas na rua, na esquina, no beco cheio de moradores sem tetos mas que também são meus irmãos. Eu voltarei, depois da quimioterapia que estou fazendo. Será que minha família vai entender? O dinheiro vai ficar curto – com certeza - mas meu “coração” ficará grande e cheio de Amor!
Visitarei, na próxima semana, uma instituição de caridade chamada TOCA DE ASSIS.

“Não há no céu nem na terra coisa mais doce, mais forte, mais sublime, mais ampla, mais deliciosa, mais completa nem melhor que o amor. O amor nasceu de Deus e não pode descansar senão em Deus, elevando-se acima de todas as criaturas” – A Imitação de Cristo, p.209.

4 comentários:

Unknown disse...

Prof. Bernardo, não somos amigos, discordamos de muitas coisas, mas desejo ao senhor a pronta e total recuperação.
Tudo de bom.

Bernardo Melgaço disse...

Obrigado Darlam...pelas sinceras palavras de incentivo.

Um abraço,

Bernardo

Waltécio disse...

Olá Bernardo!

Hoje no café na P&C, onde costumo conversar pela manhã, Darlan me falou do seu texto e até me convidou a ler quando possível.

Acabo de fazer isso e quero deixar minhas palavras de apoio, respeito e admiração por toda a sua luta e história em particular.

Além de eu ser ateísta, costumo usar um termo pejorativo para rotular a mim mesmo: "cienciolatra". Li isso no livro "Thuillier, P., 1994. De Arquimedes a Einstein: a face oculta da invenção científica. Editora Jorge Zahar."

Somos opostos no mundo acadêmico, mas compreendo que em ambos os casos, necessários para a crítica e complementares na construção do conhecimento.

Odiaria viver em um mundo apenas com vários "Waltécios", todos com uma única opinião, todos iguais.

A gente já discutiu feio sobre alguns assuntos e gosto muito das lembranças que tenho desses momentos.

Li no texto como você descreve a dificuldade de ter de trabalhar e os anseios de seu espírito. Tenho o mesmo, pois queria me dedicar mais na divulgação da ciência e trabalhar com mais afinco para a melhoria de nosso povo brasileiro. Também tenho filhos e preciso cumprir minha carga horária como todo homem trabalhador.

Acredito que conseguiremos atingir nossos objetivos!

Novamente, espero que dê tudo certo, você se recupere e volte para suas atividades.

Lembro de você no ano passado, quando me perguntou: "há outro professor aqui na URCA que faça extensão, pesquisa e ensino"?

Não, Bernardo! Você possui nossos elogios e reconhecimento por tudo isso!!!

Abraço,

Waltécio

Bernardo Melgaço disse...

Prezado Waltécio,

Agradeço pelo apoio e compreensão. Mas, sinto que vou superar esse momento difícil da doença. Graças a Deus que tenho uma espiritualidade e acredito em algo que vai além dessa vida. Por isso, mais do que nunca sei que minha consciência está limpa e sabedora de que a vida continua – sempre! A vida é uma dádiva, mas infelizmente esquecemos de agradecer e aproveitar a sua doçura para o processo de evolução que está intrínseco em nosso modo de viver. Eu tive um sinal dessa vida maior em 1988 durante uma crise existencial. Vi e senti que poderia participar de um outro universo paralelo ao nosso em vida nesse plano tridimensional. E mais do que isso poderia Amar e ser Feliz como os santos e os anjos. Tive a experiência mágica do Caminho Maior onde podemos reconhecer a natureza e o lugar metafísico do paraíso....puro Amor Divino. Mas, a vida menor, dos dias de trabalho e afazeres domésticos comuns, nos atrai para o caminho material, pragmático muito distante desse outro universo que vivenciei em 1988. Por isso, cada vez mais me sinto atraído a retornar em quanto dá tempo ainda ao caminho que fiz em 1988. Nada terei a perder. E a vida voltará a ter sentido para mim: em companhia da minha centelha divina. Agora, só me resta esperar e buscar na fé a superação das lutas que travo com meu ego-psique. Os dois primeiros meses foram terríveis...crise a cada segundo! Agora sinto-me mais confiante, mais calmo. Creio, que quanto mais cedo nos conscientizarmos desse fato maior que é a travessia para o outro lado, melhor será para nos libertarmos do corpo e da mente, onde estamos exageradamente apegados. A vida tem uma finalidade maior que vai além de tudo aquilo que ouvimos e aprendemos no campo social, político, econômico e científico.
Um abraço,
Bernardo