TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

O fracasso de Copenhague (ou: você teria vergonha de trabalhar na Petrobras?)

Do Blog de André Forastieri


Hopenhagen, Hope (esperança) + Copenhague, ilumina a cidade sede da conferência

Uns meses atrás publiquei um texto sobre Apple, a Petrobras, e o capitalismo construtivo defendido por Umair Haque. Com o fiasco da cúpula ambiental de Copenhague, resolvi botar o assunto na roda de novo.

Porque agora todo mundo tem mais razões para se informar. Por exemplo, lendo o blog do Umair Haque.

Porque Lula, superstar do evento, e Dilma, nossa representante oficial por lá, são as duas pessoas que mais mandam na Petrobras. E porque a Petrobras só vai ficar maior na nova década, com pré-sal e tal.

Como empresa de energia, maior empresa do Brasil, e estatal ou quase, tem que dar o exemplo. É a história da mulher de César: não basta ser honesta, tem que estar acima de qualquer acusação de desonestidade.

O post teve uns comentários bem interessantes. Minha turma usa o cérebro (com as devidas exceções de uns convidados bem trapalhões, claro). E não me dá mole. Mais de um me questionou, “e tu, ó virgem vestal, terias vergonha de recusar um emprego bacanudo na Apple ou Petrobras?”

Minha resposta foi: Eu não teria vergonha de trabalhar em lugar nenhum. Quer dizer, talvez como carcereiro, ou como assessor de imprensa do Fernando Collor ou similar.

Já trabalhei na Folha e na Abril, já fiz frila para um monte de empresas diferentes, fiz conteúdo customizado para a HP e revista pôster do Rush etc.

Hoje meu trabalho é na Tambor e no meu blog, que encontrou abrigo no R7. Agora, uma coisa é não ter vergonha de trabalhar num tal lugar, outra é almejar.

E digo mais: continuo usando produtos da Petrobras e da Apple. Incoerência? É, sim, mas parcial. Boto fé zero em iniciativas ligadas ao consumo individual, numa questão deste tamanho. Iniciativas coletivas que façam barulho, encham o saco, contenham alguma inovação ou impactem em leis e em regras, em política e economia, opa, aí sim.

A questão chave, como eu defendia aqui outro dia, é tornar a insustentabilidade insustentável. Se a valorização das ações das empresas estiver organicamente vinculada ao seu desempenho social (o que inclui o seu desempenho ambiental) é que existirá estímulo eficiente para que elas se comportem da melhor maneira.

Ou seja: se poluir te der mais prejuízo que não poluir, você vira verde rapidinho. Vale para governos e para mim também.

Política ambiental global é política econômico-financeira global, e passa (entre outros lugares) pela regulamentação dos mercados internacionais, pelo final dos paraísos fiscais, por uma Organização Mundial do Comércio que possa ser levada a sério, por uma política de renda mínima global, pelo questionamento de leis antiquadas de propriedade intelectual, por um judiciário global que faça frente às transnacionais, por uma ONU fortalecida que represente adequadamente o Século 21… e por aí vamos, pelos caminhos da ficção científica.

Terreno mais que pantanoso, mas não há outra trilha à vista.


Por André Forastieri

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