Sei que não posso
contar com a antiga
exuberância da tartaruguinha
de pano. Esfolada, emagreceu.
O vento não a respeita
como outrora temia
seu robusto corpo
de areia.
A cada suspiro
da área de serviço
a porta range,
abre-se, consigo
arrasta a apática
tartaruguinha de pano.
Acabou-se o privilégio
do monge na sua cela.
A tartaruguinha de pano
sempre fora um encosto
de porta. Mas eu fingia
ser ela um centurião obeso
a proteger-me do vento.
Nunca usava chave.
Ferrolhos.
Trancas.
Bastava a porta encostada
pelo suntuoso dorso
da tartaruguinha
de pano.
Escrevia sossegado.
Nem os ruídos da garagem
nem a torneira aberta
nem os espasmos
da geladeira
embaraçavam-me
os pensamentos.
Às vezes esboçava eu
um lance de pescoço.
Lá reluzia ela
a tartaruguinha de pano
rígida, compenetrada
a suportar todo o fardo
que vinha de fora.
O vento esbarrava
diante do seu enlace
de judô. Mestra.
A tartaruguinha
de pano
era mestra
de judô.
Apenas com sutil trejeito
impedia o avanço do vento.
O que vejo:
um encosto de porta
feito de pano e areia
com feições de tartaruga
no canto,
ainda supondo
peso e alegria.
O vento (seu eterno rival)
agora a despreza friamente.
Bate porta,
entra por minhas vértebras,
arrepia-me a alma
e sai pela janela
do banheiro.
Creio que seja o momento
de aceitar a morte
da tartaruguinha
de pano.
Encaixotá-la.
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